Em vez de um discurso, o escritor cubano Senel Paz agradeceu hoje com uma bem-humorada história envolvendo Eça de Queiroz o Prémio de Criação Literária Casa da América Latina 2008, atribuído ao seu romance «No Céu com Diamantes».
«Imaginemos que Eça de Queiroz, inolvidável cônsul de Portugal em Havana em princípios do século XX, por travessuras do tempo, é quem recebe o pedido de visto para que este servidor viaje até Lisboa», começou por dizer Senel Paz, na sessão de entrega do prémio, realizada na Casa da América Latina.
Em seguida, descreveu como Eça, instalado no seu escritório, na Avenida de las Misiones, numa cadeira giratória, resolve folhear o livro do autor premiado, que acaba de lhe ser entregue por um criado, para decidir se aquele merece ou não o visto.Inquietam-no as primeiras páginas, com a história inicial, «um tanto absurda», de um rapaz e do seu amigo, da cabrita Canela e de personagens «que falam como o Quixote ou como Sherazade», mas interrompe a leitura por considerar o desenvolvimento da história «incompreensível», com «vozes que discutem», «uma avó que adivinha o futuro, uma mãe envolvida numa Revolução tão caótica como o próprio romance (...) e mistérios acompanhados por um quarteto inglês, oriundo de Liverpool».
Em consequência, escreve uma carta ao secretário-geral da Casa da América Latina, Mário Quartin Graça, defendendo que é sua convicção que o «escritor Senel Paz está doido varrido».«Não lhe vejo mérito para conceder-lhe o visto, mas mais louco está o júri que o premiou e a Casa que você dirige, por acolher semelhante prémio para uma região de escritores alucinados, mas considerando que o autor não tem a culpa e que certamente vive ansioso por conhecer Lisboa, dar-lhe-ei o visto«, escreve o cônsul português.
Fazendo acompanhar a carta de uns »buenos habanos« - que se perderam pelo caminho, acrescentou Paz - Eça terminava enviando saudações a Fernando Pessoa e a José Saramago, que esteve presente na sessão.
O prémio, composto por um troféu, um diploma e a quantia de 10 mil euros, foi atribuído a Senel Paz por unanimidade de um júri constituído por Maria Fernanda Abreu (presidente), Fernando Pinto do Amaral, José Manuel de Vasconcelos e Quartin Graça (sem direito a voto).O autor terminou a sua intervenção agradecendo »a todos«: »A Eça de Queiroz pela sua amabilidade, a sua obra e os seus dias 'habaneros', ao júri pela sua generosidade e a esta Casa por patrocinar um prémio que é, ao mesmo tempo, um abraço à literatura do meu continente«.
Senel Paz estará sábado na Feira do Livro de Lisboa, a partir das 17:00, a autografar o seu romance, no pavilhão 151, da Sextante, sua editora.
05-06-2008 Sphere: Related Content
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