Marcela Rocha
Especial para Terra Magazine
A oposição ao governo ingressa nesta quarta-feira, 18, no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) com uma ação contra o governo federal. "Qualquer pessoa que vá a um evento do Programa de Aceleração do Crescimento consegue identificar que o fato é uma campanha eleitoral antecipada e não um evento do PAC", justifica o líder do DEM na Câmara, deputado Ronaldo Caiado (GO).
Viagens da ministra para inspeção das obras do Programa causaram frisson na oposição. Sob alegação de que a ministra já iniciou sua campanha eleitoral, DEM e PSDB argumentam que o evento realizado na semana passada, em Brasília, com prefeitos de todo o País, serviu de palanque para a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff.
Cotada para ser a candidata petista nas eleições presidenciais de 2010, Dilma já ganhou do presidente Lula a alcunha de "mãe do PAC". Para Caiado, porém, o Programa não passa de "um artifício montado para alavancar uma candidatura". Explica:
- Não traz investimentos, não tem nada que diferencie do governo anterior, não tem ações de contenção de desemprego.
Questionado sobre a emenda da reeleição no governo FHC, na qual houve apoio do DEM, ex-PFL, o deputado lava as mãos e critica:
- Eu não era deputado à época. Hoje, fazendo uma avaliação, condeno o apoio. Ou melhor, condeno a reeleição e o uso do aparelho estatal para realização de campanhas.
Leia a entrevista com o líder do DEM, Ronaldo Caiado:
Terra Magazine - Por que o DEM quer entrar com essa representação no Tribunal Superior Eleitoral?
Ronaldo Caiado - Por que isso compete à legislação vigente e ela não pode ser uma para o presidente e outra para a oposição. Portanto esperamos que se façam valer as regras e normas. Eles não podem continuar completamente imunes e nós totalmente bloqueados para qualquer ação político-partidária de campanha.
Qual o critério objetivo que diferencia uma inspeção de obra do PAC e um comício de campanha?
Primeiro a maneira que está sendo apresentada. Todos sabem que ela é a candidata e que esse PAC é um artifício montado para alavancar uma candidatura. Não traz investimentos, não tem nada que diferencie do governo anterior, não tem ações de contenção de desemprego. Mas isto está mais do que claro. Qualquer pessoa que vá a um evento do Programa consegue identificar que o fato é uma campanha eleitoral antecipada e não um evento do PAC. Afinal sabemos que a candidata não tem densidade eleitoral e o presidente resolveu assumir o compromisso de trabalhar para que até o final deste ano ela tenha ao menos 20% de aprovação.
A representação no TSE não pode ser encarada como uma ação tática do DEM, do ponto de vista político?
Somos oposição ao governo e temos a responsabilidade de denunciar isto. Ele não pode acreditar que fará aqui o mesmo que Chávez faz na Venezuela, guardadas as devidas proporções.
Quando o partido apoiou a emenda da reeleição no governo FHC, também não deveria ter sido barrado o uso da máquina pelo presidente e candidato à reeleição?
Eu não era deputado à época. Hoje, fazendo uma avaliação, condeno o apoio. Ou melhor, condeno a reeleição e o uso do aparelho estatal para realização de campanhas.
Terra Magazine
O cérebro do roubo ao cofre
Com passado pouco conhecido,
a ministra envolveu-se em ações
espetaculares da guerrilha
Alexandre Oltramari
Antonio Milena |
A ficha nos arquivos militares de Dilma Rousseff, hoje ministra das Minas e Energia: só em 1969, ela organizou três ações de roubo de armamentos em unidades do Exército no Rio de Janeiro |
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No atual governo, há dois ex-guerrilheiros com posto de ministro de Estado. Um é o ex-presidente do PT, José Dirceu, ministro da Casa Civil, cuja trajetória política é bastante conhecida. Foi preso pelo regime militar, recebeu treinamento de guerrilha em Cuba e, antes de voltar às escondidas para o Brasil, submeteu-se a uma cirurgia plástica no rosto para despistar a polícia. O outro integrante do primeiro escalão com passagem pela guerrilha contra a ditadura militar é a ministra Dilma Rousseff, das Minas e Energia — mulher de fala pausada, mãos gesticuladoras, olhar austero e passado que poucos conhecem. Até agora, tudo o que se disse a respeito da ministra dava conta apenas de que combatera nas fileiras da Vanguarda Armada Revolucionária Palmares, a VAR-Palmares, um dos principais grupos armados da década de 60. Dilma Rousseff, no entanto, teve uma militância armada muito mais ativa e muito mais importante. Ela, ao contrário de José Dirceu, pegou em armas, foi duramente perseguida, presa e torturada e teve papel relevante numa das ações mais espetaculares da guerrilha urbana no Brasil — o célebre roubo do cofre do governador paulista Adhemar de Barros, que rendeu 2,5 milhões de dólares.
O assalto ao cofre ocorreu na tarde de 18 de julho de 1969, no Rio de Janeiro. Até então, fora "o maior golpe da história do terrorismo mundial", segundo informa o jornalista Elio Gaspari em seu livro A Ditadura Escancarada. Naquela tarde, a bordo de três veículos, um grupo formado por onze homens e duas mulheres, todos da VAR-Palmares, chegou à mansão do irmão de Ana Capriglioni, amante do governador, no bairro de Santa Teresa, no Rio. Quatro guerrilheiros ficaram em frente à casa. Nove entraram, renderam os empregados, cortaram as duas linhas telefônicas e dividiram-se: um grupo ficou vigiando os empregados e outro subiu ao quarto para chegar ao cofre. Pesava 350 quilos. Devia deslizar sobre uma prancha de madeira pela escadaria de mármore, mas acabou rolando escada abaixo. A ação durou 28 minutos e foi coordenada por Dilma Rousseff e Carlos Franklin Paixão de Araújo, que então comandava a guerrilha urbana da VAR-Palmares em todo o país e mais tarde se tornaria pai da única filha de Dilma. O casal planejou, monitorou e coordenou o assalto ao cofre de Adhemar de Barros. Dilma, no entanto, não teve participação física na ação. "Se tivesse tido, não teria nenhum problema em admitir", diz a ministra, com orgulho de seu passado de combatente.
"A Dilma era tão importante que não podia ir para a linha de frente. Ela tinha tanta informação que sua prisão colocaria em risco toda a organização. Era o cérebro da ação", diz o ex-sargento e ex-guerrilheiro Darcy Rodrigues, que adotava o codinome "Leo" e, em outra ação espetacular, ajudou o capitão Carlos Lamarca a roubar uma Kombi carregada de fuzis de dentro de um quartel do Exército, em Osasco, na região metropolitana de São Paulo. "Quem passava as orientações do comando nacional para a gente era ela." O ex-sargento conta que uma das funções de Dilma era indicar o tipo de armamento que deveria ser usado nas ações e informar onde poderia ser roubado. Só em 1969, ela organizou três ações de roubo de armas em unidades do Exército, no Rio. Quando foi presa, em janeiro de 1970, o promotor militar que preparou a acusação classificou-a com epítetos superlativos: "Joana D'Arc da guerrilha" e "papisa da subversão". Dilma passou três anos encarcerada em São Paulo e foi submetida aos suplícios da tortura.
| Décio Bar |
O capitão Carlos Lamarca, o maior mito da esquerda armada no Brasil, e Iara Iavelberg, com quem o capitão manteve um tórrido e tumultuado romance. Com Lamarca, Dilma Rousseff polemizou sobre os rumos da guerrilha, numa famosa reunião realizada em Teresópolis. Com Iara, ia à praia, falava de cinema, e tornaram-se confidentes |
A atual ministra era tão temida que o Exército chegou a ordenar a transferência de um guerrilheiro preso em Belo Horizonte, o estudante Ângelo Pezzuti, temendo que Dilma conseguisse montar uma ação armada de invasão da prisão e libertação do companheiro. Durante o famoso encontro da cúpula da VAR-Palmares realizado em setembro de 1969, em Teresópolis, região serrana do Rio, Dilma Rousseff polemizou duramente com Carlos Lamarca, o maior mito da esquerda guerrilheira. Lamarca queria intensificar as ações de guerrilha rural, e Dilma achava que as operações armadas deveriam ser abrandadas, priorizando a mobilização de massas nas grandes cidades. Do encontro, produziu-se um racha. Dos 37 presentes, apenas sete acompanharam Lamarca. Ficaram com boa parte das armas da VAR-Palmares e metade da fortuna do cofre de Adhemar de Barros. Os demais concordaram com a posição de Dilma Rousseff.
A divergência com Carlos Lamarca não impediu Dilma de manter uma sólida amizade com a guerrilheira Iara Iavelberg, musa da esquerda nos anos 60, com quem o capitão manteve um tórrido e tumultuado romance. Dilma chegou a hospedá-la em seu apartamento, no Rio. Juntas, iam à praia, falavam de cinema, tornaram-se confidentes. Nos três anos que passou na cadeia, seu nome chegou a aparecer em listas de guerrilheiros a ser soltos em troca da libertação de autoridades seqüestradas — mas a ação que renderia sua liberdade foi malsucedida. Aos 55 anos, recentemente separada de Carlos Franklin de Araújo, Dilma Rousseff não lembra a guerrilheira radical de trinta anos atrás, embora exiba a mesma firmeza. "Ela é uma mulher suave e determinada", diz a jornalista Judith Patarra, autora do livro Iara, que conta a trajetória de Iara Iavelberg (1944-1971). "Quando a vi na televisão, percebi que Dilma continua a mesma. É uma mulher espetacular e será uma sargentona no governo. Ela não é mulher de meio-tom", resume o ex-companheiro de guerrilha Darcy Rodrigues.
Com reportagem de Luís Henrique Amaral
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