FELIPE BÄCHTOLD
da Agência Folha
Por falta de estrutura, o IML (Instituto Médico Legal) de Luziânia (212 km de Goiânia), no entorno do Distrito Federal, vem deixando um corpo em decomposição armazenado no pátio da unidade, o que tem provocado forte cheiro e reclamações na vizinhança.
A direção do IML da cidade diz que não tem uma sala para acondicionar cadáveres encontrados em estado adiantado de decomposição e que é obrigada a colocar corpos no lado de fora do prédio. Duas geladeiras da unidade estão estragadas.
Vereadores do município estiveram na unidade do IML e reclamam que os equipamentos estão sucateados e que há falta de técnicos.
Vizinha do IML no bairro Setor Leste, a moradora Ana Paula Belo, 29, se diz "muito assustada" com o problema e conta que o mau cheiro piora durante a noite. "É uma calamidade. Deixar um corpo morto do lado de fora", diz.
O diretor do IML, Aleixo Braz de Carvalho, diz que a situação é atípica e que os moradores têm razão de reclamar.
Também afirma que vem cobrando do governo de Goiás melhorias na unidade há cinco anos. "Nós não temos a chave do cofre e não somos a pessoa certa para dizer se vai ser feito amanhã ou depois."
A Secretaria da Segurança Pública de Goiás afirma que os recursos para melhorias no IML de Luziânia já foram liberados e que a unidade deve ter novos equipamentos até o fim do ano. Também fala que providencia um concurso para contratação de técnicos para a área.
Força-tarefa faz ofensiva no Entorno
17 de setembro de 2007 |
Na madrugada de ontem, 80 policiais militares realizaram blitze em bares e festas na Cidade Ocidental. Quatro pessoas foram detidas. Em Luziânia, IML não tem estrutura para receber corpos e realizar perícias. TRÁFICO, EXTERMÍNIO E MEDO - Retrato do descaso
Prédio do IML de Luziânia é o reflexo do abandono do Entorno: infiltrações por todos os lados, equipamentos quebrados e carência de funcionários Amaury Ribeiro Jr. Da equipe do Correio Totalmente tomado por infiltrações, o prédio do Instituto Médico Legal (IML) de Luziânia é o exemplo do descaso do poder público com as mortes na região do Entorno do Distrito Federal. As goteiras podem ser vistas logo na entrada e, na ausência de uma sala apropriada, os corpos dos mortos em alto estado de decomposição são liberados a céu aberto numa varanda. Eles chegam a ficar 20 dias em caixões enferrujados perto do estacionamento do IML.
Os sinais do abandono continuam dentro do edifício, onde 40% das salas de alojamento e de perícia estão desativadas por causa das infiltrações. Na sala de necropsia, os corpos se avolumam em geladeiras que não funcionam mais, perto de um freezer empoeirado usado para guardar amostras de sangue. A sujeira tomou conta de todo o local, porque o IML não dispõe de nenhum funcionário na área de limpeza. Embora estejam guardadas no prédio várias armas, munição e cédulas de identidade em branco, o IML também não tem nenhum vigia.
Levantamento feito pelo Correio mostra que nos últimos seis meses 45 adolescentes foram assassinados por traficantes da região. As mesmas estatísticas revelam a execução de outros 157 jovens com idades de 18 a 26 anos. Os corpos de todas as vítimas seguiram para o prédio abandonado. Só nesse ano o IML já recebeu 420 cadáveres de pessoas mortas pelos mais variados motivos. “Estamos em estado de colapso. Encaminhamos várias reivindicações às autoridades, mas nenhuma delas foi atendida”, afirmou o diretor do IML, Aleixo Braz de Carvalho.
Braz informa que o IML só conta, em seu quadro de funcionários, com um motorista, um perito criminal, um técnico de necropsia e um médico legista. Nos cálculos do diretor, para funcionar em condições mínimas, o instituto necessitaria de, no mínimo, dois médicos, três técnicos de necropsia, quatro peritos e três motoristas. “Temos quatro carros, mas não há ninguém para conduzi-los. Então, por exemplo, se acontece um acidente em Águas Lindas, não temos condições de buscar o corpo de uma pessoa assassinada no Novo Gama ao mesmo tempo”, contou.
Para Braz, a situação do IML pode piorar com a chegada de pelo menos 374 agentes da Força Nacional de Segurança, já que o combate à criminalidade provocará um aumento nos pedidos de perícias e exames. O diretor acredita que os médicos e os peritos não conseguirão atender ao volume de solicitação. “É impossível fazer investigação sem perícia. Por ironia, a situação ainda não está pior porque os inquéritos e os processos estão parados nas delegacias, que também estão sem estrutura”, comentou.
Investimentos A análise do diretor está embasada em estatísticas. Um exemplo: em Cidade Ocidental, onde as adolescentes Natália de Oliveira, 14, e Raiane Maia, 17, foram brutalmente assassinadas em 12 de agosto, existem apenas cinco policiais civis trabalhando nas ruas. Se levar em conta que o município possui cerca de 50 mil habitantes, chega-se à conclusão que há um policial para cada 10 mil moradores da cidade. Isso explica porque nenhum dos 10 homicídios ocorridos esse ano no município não foi esclarecido até hoje.
Em entrevista ao Correio na última quinta-feira, o secretário de Segurança Pública de Goiás, Ernesto Roller, admitiu a necessidade de investimentos na política técnico-cientifica de Luziânia. Roller informou que o governo está fazendo um estudo sobre as necessidades e, que, após o concurso para preenchimento de vagas na Polícia Civil — serão 600 vagas ao todo — a intenção é fazer um concurso específico para a polícia técnica. “Vamos incrementar o setor para prestar um serviço à sociedade com o menor tempo de espera possível”, disse. Fonte: Correio Braziliense |
Sucateado, IML de Luziânia pode prejudicar atuação da Força Nacional no Entorno
Thomaz Pires
Do CorreioWeb
Thomaz Pires/CW
Viatura do IML parada há mais de seis meses no pátio
25/10/2007
11h37-Iniciada há menos de uma semana, a atuação da Força Nacional na região do Entorno do Distrito Federal já prevê dificuldades. Enquanto os 130 homens da tropa realizam as primeiras operações nas ruas da cidade goiana de Luziânia, o 17ª Núcleo de Polícia Técnico-Científico do Entorno Sul não consegue sequer atender aos chamados. A única viatura do Instituto Médico Legal (IML) permanece quebrada há mais de cinco meses no pátio. O serviço só funciona porque os agentes contam com um carro emprestado.
O plano de integrar os trabalhos da Força Nacional com as polícias de Goiás já preocupa o comando da tropa, que teme a ineficácia do processo diante da atual dificuldade já enfrentada pelo Instituto. De vital importância para o prosseguimento das operações, o IML de Luziânia é um único do Entorno Sul, responsável por atender nove municípios goianos.
O 17ª Núcleo de Polícia Técnico-Científico do Entorno conta hoje com apenas um perito, um médico legista e um técnico de necropsia – ou seja, três pessoas para atender, em média, dez ocorrências diárias, entre fazer o traslado de corpos, análises de armas e drogas apreendidas. A limitação no atendimento mobilizou o diretor do local, Aleixo Braz de Carvalho. Ele encaminhou na última semana um ofício ao governo goiano, solicitando ampliação de pessoal. No entanto, teve o pedido negado pela superintendente de polícia científico do estado, Helena Fernanda Martins, por falta de recurso nos cofres do estado. “Estão sendo enviados 500 homens para cá e querem que a gente trabalhe com esse quadro. Vamos fazer apenas o que estiver ao nosso alcance”, antecipa.
A intenção da Força Nacional é realizar 1,3 mil mandados de prisão na região do Entorno. Nos primeiros seis dias de operação, as ações permaneceram direcionadas apenas ao policiamento preventivo. No entanto, o comando já antecipou que a segunda fase da atuação – com as ações repressivas - deve acontecer já nos primeiros meses de trabalho. A preocupação é com essa etapa da atuação, que, naturalmente, irá aumentar a carga de trabalho no IML de Luziânia. A expectativa é que o número de chamados no 17ª Núcleo de Polícia Técnico-Científico do Entorno seja até três vezes maior.
Ao relento
A última dificuldade no atendimento da Polícia Técnico-Científico do Entorno aconteceu há três dias, no município de Padre Bernardo (GO). Os peritos foram acionados ainda na madrugada para fazer a remoção de um cadáver. O corpo, no entanto, permaneceu 12 horas ao relento e o rabecão do IML nem chegou a aparecer por lá. A saída encontrada foi delegar o serviço ao agente funerário Ricardo Gonçalves. “A polícia me ligou pedindo para fazer a remoção e passando os dados da vítima. Atendi por saber que a situação está crítica”, conta ele.
Ciente do episódio, o comandante da Força Nacional no Entorno, tenente Welington Rodrigues, não esconde as preocupações. Para ele, as limitações no atendimento do IML de Luziânia correm o sério risco de interferir no andamento dos trabalhos no combate à violência na região do Entorno do DF, previstos para durarem cerca de seis meses. “A nossa atuação está diretamente ligada ao trabalho deles”, observa. “O governo do Estado também deveria ter levado isso em consideração quando fez o planejamento logístico, pois não foi tomada qualquer medida emergencial para aperfeiçoar o serviço deles”, completa.
A troca de favores entre Polícia Técnico-Científico do Entorno e funerárias não é algo recente. A reportagem conversou com empresas que atuam em Luziânia e constatou que as solicitações da polícia ocorrem no momento do aperto. “Eles ligam quando estão sobrecarregados nos chamados. A gente pega o serviço porque sabe se não for o corpo ficará exposto na rua”, explica um proprietário de funerário que preferiu não se identificar.
Formol
A precariedade na região do Entorno não se restringe aos atendimentos do IML. Na entrada da 17ª Núcleo de Polícia Técnico-Científico é possível perceber o abandono. As infiltrações nas paredes do prédio de 1200 metros quadrados e falta de limpeza são visíveis. O local sequer conta com o serviço de um zelador, dispensado há pouco mais de um mês por falta de pagamento. Quem passa próximo à sala do IML sente com facilidade o cheiro de formol envelhecido, que denuncia a falta de limpeza.
Municípios atendidos pela Polícia Técnico-Científico do Entorno
Cristalina
Luziânia
Valparaíso
Cidade Ocidental
Novo Gama
Santo Antônio do Descoberto
Águas Lindas
Padre Bernardo
Cocalzinho
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Foto: ED ALVES">
O único rabecão do IML de Luziânia tem problema nos freios, os pneus estão carecas e já enguiçou cinco vezes nesta semana |
Estado total de penúria
IML de Luziânia atende a nove cidades, mas só tem um perito e um rabecão
Carlos CaroneO sucateamento dos equipamentos e a falta de mão-de-obra nos departamentos de polícia técnica de Goiás transformam o atendimento à população no estado em um caos. Em Luziânia e cidades próximas, é comum corpos ficarem expostos durante horas ao sol e à chuva até a chegada do único perito criminal que trabalha em esquema de plantão, atendendo chamadas de nove municípios do Entorno do Distrito Federal.
O volume de casos envolvendo mortes violentas agrava ainda mais a situação e sobrecarrega o atendimento feito pelo Instituto Médico Legal (IML) de Luziânia, que cobre as cidades de Cristalina, Valparaíso, Cidade Ocidental, Novo Gama, Santo Antônio do Descoberto, Águas Lindas, Padre Bernardo, Cocalzinho, além de Luziânia.
O IML conta apenas com um perito, um assistente de necropsia, um motorista e um único rabecão para atender às ocorrências, tanto de crimes quanto de acidentes automobilísticos que ocorrem dentro da região do Entorno Sul. Apenas nos primeiros dez dias do ano, 26 corpos foram recolhidos pelo IML, 17 deles resultados de morte violentas. O número corresponde a uma média de 2,5 cadáveres recolhidos por dia. "É um trabalho muito difícil quando não se tem a infra-estrutura necessária para trabalhar", justificou o diretor do órgão, Aleixo Braz de Carvalho.
A pequena equipe do IML precisa se desdobrar para atender, em média, a dez ocorrências diárias, entre fazer a retirada de corpos, análises de armas e drogas apreendidas. A limitação no atendimento mobilizou o diretor do local. Ele chegou a encaminhar um ofício ao governo goiano, solicitando ampliação de pessoal. No entanto, teve o pedido negado pela superintendente de Polícia Científica do estado, Helena Fernanda Martins, por falta de recurso. A reportagem tentou entrar em contato com a Secretaria de Segurança de Goiás, mas não teve retorno.
Sem perícia
A ausência de peritos criminais no local do acidente ocorrido na manhã de quinta-feira, na BR-020, próximo a Formosa (GO), onde duas pessoas morreram e outras quatro ficaram feridas, comprometeu seriamente a identificação do que pode ter provocado a colisão. Esse é apenas um dos exemplos que, sistematicamente, traz à tona o grave problema sobre a falta de profissionais que atendam às ocorrências de crimes violentos e acidentes automobilísticos na região do Entorno do DF.
A falta de peritos acaba atrapalhando o desempenho de outros servidores ligados à área de segurança pública. A equipe do Jornal de Brasília apurou, por exemplo, que existem agentes da Polícia Civil goiana sendo desviados de suas funções para simplesmente dirigir o rabecão do IML de Luziânia. Segundo o presidente do Sindicato dos Policiais Civis de Goiás (Sinpol-GO), Silveira Alves, todo o trabalho nas delegacias acaba sendo prejudicado. "É inconcebível que policiais treinados deixem de investigar crimes e concluir inquéritos para virarem motoristas", reclama.
O estado do único rabecão que existe no IML de Luziânia é desesperador. Sem freio, com pneus carecas, amassado e enferrujado, o veículo enguiçou cinco vezes nesta semana apenas no percurso entre Goiânia e Luziânia. "Chega a ser perigoso dirigir um carro desses. O banco chegou a ficar todo molhado nesse dia porque os vidros não levantavam", disse um funcionário que não quis se identificar.
Apesar da infra-estrutura de cidade pequena, o IML de Luziânia registra números semelhantes ao de grandes metrópoles. Em todo o ano passado, a equipe recolheu 683 corpos nas nove cidades do Entorno Sul – 398 tiveram morte provocada por disparos de arma de fogo ou por instrumentos péfuro-cortantes, como facas.
Noite toda
No momento em que a reportagem estava no IML, um homem tentava liberar o corpo do sobrinho, mesmo após passar toda a noite e parte da madrugada ao lado do corpo, esperando a chegada da perícia. Entre 20h30 de quinta-feira e 4h30 de ontem, Carlos da Silva esperou pela chegada dos peritos a um matagal localizado no Setor de Chácaras de Águas Lindas.
No chão, durante oito horas, ficou o corpo de Uender Francisco de Arruda, 23 anos. Ele foi vítima de um grupo de homens ainda não identificados que o atacaram com golpes de garrafa na cabeça e uma facada no peito. O rapaz morreu no local. "É uma vergonha que mesmo após passar por um imenso sofrimento, os moradores do Entorno precisem passar por isso, ter que ficar tantas horas esperando a chegada do rabecão para recolher o corpo de nossos parentes", disse Carlos, revoltado.
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"É inconcebível que policiais treinados deixem de investigar crimes e concluir inquéritos para virarem motoristas" Silveira Alves, presidente do Sindicato dos Policiais Civis de Goiás |
Publicado em: 12/01/2008
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