MATHEUS PICHONELLI
da Agência Folha
Uma associação do Rio de Janeiro entrou com ação na Justiça contra a União e o governo do Acre por considerar que houve uso de cobaias humanas em estudos sobre a malária no Estado.
Segundo a Abraspec (Associação Brasileira de Apoio e Proteção aos Sujeitos da Pesquisa Clínica), pessoas contratadas em 2003 pela Secretaria da Saúde do Acre foram expostas até 2007 a cerca de 300 picadas diárias do mosquito transmissor da malária, para colher o inseto e fazer os estudos sobre a doença.
A malária é uma doença infecciosa provocada por protozoário e transmitida pelo mosquito Anopheles. Entre os sintomas da doença, para a qual não há vacina, estão calafrios, suor, anemia e aumento do tamanho do baço e do fígado.
A entidade pede a condenação da União por suposta negligência. A ação ocorre após reportagem publicada, em maio, em um site noticioso local.
A Abraspec afirma que os agentes são tratados de maneira "indigna" e "degradante" e correm risco de morrer. Contesta também o uso de dinheiro público para esses estudos.
Um desses funcionários afirmou nesta terça-feira à Folha que ficava com as calças suspensas e pernas esticadas em lugares abertos, geralmente perto de rios, na região de Cruzeiro do Sul (AC) para atrair os mosquitos.
"Ficávamos com um tubo de sucção para puxar o mosquito quando pousava. Eu mesmo peguei malária oito vezes, e falavam que era normal", disse Marcílio Ferreira.
Nesta terça-feira, a Justiça Federal no Acre intimou o governo do Estado e a União a prestarem esclarecimentos em 72 horas.
Em nota, a Secretaria da Saúde negou o uso de "cobaias humanas". Disse que a captura de mosquitos transmissores é um procedimento de rotina. Segundo a pasta, técnicos são treinados para a obtenção de espécies de insetos quando pousam na pele, mas não há contato direto. Para isso são usados equipamentos, como fardas, para proteção.
Segundo a coordenação-geral do Programa Nacional de Controle da Malária, do Ministério da Saúde, a técnica de "isca humana" é recomendada por ser "mais direta e satisfatória".
O procurador da República no Acre Anselmo Lopes disse hoje que ainda não é possível afirmar se a técnica foi desenvolvida com segurança ou se a vida dos funcionários esteve em risco.
"Estamos recolhendo informações. Pessoas relatam que contraíram malária, mas não temos provas disso. Podemos pedir ajuda à Polícia Federal."
A AGU (Advocacia-Geral da União) informou ontem que ainda não havia sido intimada da ação.
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