Essa é a disputa atual dentro do governo Lula. Se será curto ou longo o novo ciclo de alta dos juros iniciado pelo Copom (Comitê de Política Monetária) na reunião de abril e que será mantido no encontro da próxima semana. Quando surpreendeu o mercado e subiu os juros em 0,50 ponto percentual, elevando a taxa a 11,75% ao ano, o Banco Central, por intermédio de seu presidente Henrique Meirelles, disse ao chefe Luiz Inácio Lula da Silva que aquela "paulada" tinha o objetivo de sinalizar que o ciclo seria "intenso, mas curto". Agora, contudo, há quem duvide que o BC possa cumprir a promessa feita naquela época.
A inflação está num ritmo mais forte do que o imaginado inicialmente e fechará o ano acima de 5%, fugindo do centro da meta de 4,5% mas devendo ficar dentro do intervalo permitido, de dois pontos percentuais para cima ou para baixo. Diante desse novo cenário, o temor é que o processo de alta dos juros iniciado em abril se prolongue por mais tempo.
Dentro do Palácio do Planalto, logo depois da reunião de abril do Copom, auxiliares do presidente davam como certa uma retomada da queda dos juros no final desse ano. Agora, os mesmos assessores debatem sobre o que fazer para que o Banco Central tenha realmente condições de retomar o corte dos juros ainda neste ano. Veio daí a discussão sobre o aumento do superávit primário, hoje com meta de 3,8% do PIB (Produto Interno Bruto). A proposta ganhou adeptos dentro e fora do governo, foi encampada por toda equipe econômica --os ministros Guido Mantega (Fazenda), Paulo Bernardo (Planejamento) e Henrique Meirelles (BC)--, mas até agora não foi oficializada pelo Palácio do Planalto.
Com o aumento do superávit, o governo ajudaria a reduzir a demanda pública cortando efetivamente suas despesas acima do prometido inicialmente. Ajudaria assim o Banco Central na sua política de combate à inflação. Sabendo que o presidente Lula não morre de amores pelo tema, Mantega, como define um governista, teve a idéia de fazer "dois em um" para conquistar o coração do chefe: aumentaria o superávit, destinando esses recursos para a formação do caixa do Fundo Soberano do Brasil, uma idéia que conquistou a simpatia do presidente.
Só que o mecanismo elaborado pelo Ministério da Fazenda, tão logo foi anunciado por Mantega, ganhou opositores dentro e fora do governo. E levou o presidente a pedir tempo para rediscutir o assunto. De fato ele não desistiu da idéia, mas considerou o modelo proposto por Mantega muito complicado. O ministro da Fazenda, segundo um assessor, pode até convencer o chefe de que esse é o melhor caminho tanto para subir o superávit como para criar o Fundo Soberano. Mas terá de gastar muita saliva.
Lula ainda teria dúvidas se deve realmente subir o superávit. E, em decidindo, para quanto. Alguns assessores dão como certo que ele tomará tal decisão. Descartam, porém, que ele suba para 5%. Teria de cortar verbas do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e de programas sociais. Talvez 4,3% ou 4,5%. Mas aí há quem defenda fazer tudo informalmente, o que é visto como uma estratégia ruim até por assessores de Mantega. Seria, na definição de um deles, um "efeito Ricupero às avessas", ou seja, tomar uma medida boa e escondê-la, não procurando faturar economicamente com a decisão --para quem não se lembra, quando era ministro da Fazenda de FHC, Rubens Ricupero foi flagrado por um microfone aberto dizendo a célebre frase "o que é bom a gente fatura, o que é ruim a gente esconde".
Recentemente, quando a discussão do aumento do superávit foi retomada dentro do governo, Lula foi logo dizendo: "Lá vêm vocês de novo com essa história de superávit primário". Nova reunião do governo para tratar do tema pode ficar apenas para a próxima semana. Nessa, Lula ficará praticamente todos os dias fora de Brasília. Passa apenas a terça-feira na cidade. A conferir.
Valdo Cruz, 46, é repórter especial da Folha. Foi diretor-executivo da Sucursal de Brasília durante os dois mandatos de FHC e no primeiro de Lula. Ocupou a secretaria de redação da sucursal e atuou como repórter de economia. Escreve às terças. |
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