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sábado, 2 de janeiro de 2010

Ataque ao árbitro



Como a cobrança de uma conta de R$ 15 milhões virou uma disputa sobre honra entre advogados
Thiago Cid
Cacalos Garrastazu
NA DEFENSIVA
Mattos Filho, um dos advogados mais famosos do Brasil. Questionado, ele quer ir à Justiça contra outro advogado

A disputa começou com um tema bem delicado: a cobrança de uma conta de luz de R$ 15 milhões. Pelo caminho tradicional, o julgamento deveria envolver pareceres bem técnicos (e um tanto chatos), mas acabou tomando um rumo surpreendente e com temperatura de ebulição. O advogado do lado perdedor questiona a competência do árbitro, que no passado fez negócios com o lado vencedor. Em resposta, o árbitro pode entrar com uma ação na Justiça contra o advogado. Os oponentes são Ary Oswaldo Mattos Filho, fundador de um dos maiores escritórios de advocacia do país, que fazia o papel de juiz numa contenda entre duas companhias; e Hélio Pinto Ribeiro Filho, defensor da empresa derrotada. O rumo inesperado do episódio ajuda a entender e melhorar o funcionamento das câmaras de arbitragem, um jeito moderno de empresas resolverem diferenças sem precisar recorrer ao lento e sobrecarregado Poder Judiciário.

Na disputa original, a distribuidora de eletricidade Duke Energy afirmava que a fabricante têxtil Ledervin devia cerca de R$ 15 milhões por energia consumida. A Ledervin dizia que a Duke desrespeitara o contrato, por se recusar a rever o preço da energia após um pico de tarifa ocorrido no fim de 2007. Para solucionar o impasse, as duas recorreram à câmara de arbitragem da FGV. Foram chamados, para julgar o caso, três especialistas que fariam o papel de árbitros, sendo o principal deles o advogado Mattos Filho. Se houvesse empate nos dois primeiros votos, o decisivo caberia a Mattos Filho. Foi o que ocorreu, e ele se pronunciou em favor da Duke.

Em novembro, Ribeiro Filho, advogado da Ledervin, levou a disputa para a Justiça. Ele afirma que Mattos Filho não poderia ser considerado isento, porque o escritório que leva seu nome teria assessorado a Duke em uma emissão de papéis em 2008. “Afirmo que a arbitragem é nula”, diz Ribeiro Filho. O árbitro Mattos Filho afirma ter se afastado do escritório em 2005 e informado a todos os envolvidos sobre o negócio com a Duke – mas admite ter feito o aviso apenas “verbalmente”.

A arbitragem é mais rápida e barata que a Justiça comum – mas exige entendimento entre os oponentes

A presidente do Comitê Brasileiro de Arbitragem, Adriana Braghetta, afirma que o questionamento faz parte das regras do jogo. Mattos Filho, porém, considera sua reputação atacada e estuda como entrar com uma ação contra os advogados da empresa perdedora. A disputa sobre a conta de luz vai para a Justiça comum. Desde que a lei da arbitragem foi implementada, há 13 anos, em 790 casos a Justiça recebeu 33 pedidos de anulação de sentença. Desses, 14 foram concedidos.

Nada disso afeta o potencial das câmaras de arbitragem. Elas podem resolver casos de dívida e cobrança com apenas 60% do custo de recorrer à Justiça e um terço do tempo, segundo Selma Lemes, membro da Corte de Arbitragem Internacional. Só que os oponentes precisam conversar bem antes do jogo.







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