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terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Paixão pelas palavras

Aos 67 anos, a autora das principais minisséries da Globo se considera uma mulher libertária e diz que hoje vive a vida com a qual sempre sonhou


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Por Redação Online

Aos 12 anos, dentro do navio que a trouxe de Portugal, onde nasceu, para São Paulo, onde vive, a sempre observadora Maria Adelaide Amaral, 67, teve a certeza de sua vida. ''Eu fiquei assombrada com aquelas moças fumando e conversando com os rapazes. Rapidamente concluí que queria ser como elas: livre e desenvolta.''

Convencer os pais de sua paixão pelo estudo, no entanto, era o primeiro passo para se livrar das amarras. ''Achavam desperdício porque, cedo ou tarde, iria me casar.'' Mas foi com Memórias de uma Moça Bem Comportada, livro da existencialista francesa Simone de Beauvoir - sua mestra -, que a futura jornalista, escritora e dramaturga descobriu o universo exuberante da literatura.

Hoje, Maria Adelaide considera-se ''totalmente libertária''. Chegou a se casar - um assunto que evita falar -, teve dois filhos e três netos, mas vive como sempre sonhou: da palavra escrita. Com 34 anos de carreira, a dramaturga acumula um montante de obras entre novelas, seriados, espetáculos teatrais, livros e minisséries. São de sua autoria A Muralha, A Casa das Sete Mulheres, JK (2006), entre outros grandes sucessos.

Em janeiro, uma nova série escrita por ela estreia na TV. Dalva e Herivelto conta a história de dois ícones da música popular brasileira, Dalva de Oliveira e Herivelto Martins. Ainda para 2010, prepara o remake da novela Ti-ti-ti.

E foi em seu impecável apartamento, no bairro de Higienópolis, em São Paulo, ocupado por livros, quadros e os gatos Bibelô e Miu-Miu, que a escritora, ouvindo música clássica, recebeu CONTIGO!. Falando firme e baixinho, deixando escapar palavrões - como toda legítima avó portuguesa - e com a praticidade de quem conhece os assombros da vida, Maria Adelaide contou um pouco mais de suas saborosas histórias.

Como tomou contato com as palavras?
Sempre fui fascinada por livros, peças de teatro e cinema. Tive acesso, meus pais eram pobres, mas tinham bom gosto (ironiza). Mas até os anos 60, o que se esperava das mulheres é que casassem e tivessem filhos. Meus pais achavam desperdício eu estudar, pois cedo ou tarde iria me casar. Ledo engano. Trabalhei minha vida inteira.

E se especializou em relacionamentos.
Sou muito curiosa pelo comportamento humano. Sempre gostei de ouvir conversas e observar casais. Há muitos anos, eu e meu ex-marido estávamos no Le Casserole (restaurante) conversando e, aí, uma mulher virou para o marido e falou assim: ''Está vendo, pelo menos eles conversam''. O papo rolou e, no fim, ela não era nem mulher do cara, era caso do sujeito (risos). Eu adoro histórias, o ser humano não cessa de me surpreender!

Na época de Queridos Amigos, você declarou que a personagem Lena (Debora Bloch) tinha muito de você. Teve um amor quase impossível?
Todo mundo um dia teve! Mas é assim que as coisas são. E, se fosse possível, não teria deixado tanta saudade (sorri). As melhores coisas são as que não se realizam. Viram um gancho em que você pode pendurar o que quiser.

O quanto você se considera uma pessoa libertária?
Eu sou uma pessoa de uma independência... total. Fui uma criança transgressora, brincava mais com os meninos. Era uma menina arrapazada, para o desgosto da minha mãe. Minha feminilidade eu sempre usei de outra maneira, na intimidade. Eu sempre achei que inteligência e conhecimento eram mais importantes.

Você nunca desejou, mas casou e teve filhos.
Isso é a vida. Na hora em que as coisas acontecem é ótimo. Sou dedicada à família, mas prezo as relações. Acho que as pessoas têm de se reunir por prazer, não por obrigação ou hábito.

Sofreu por essa postura diferenciada?
Muito! Eu era muito discriminada em Portugal. As mães das meninas não gostavam que as filhas brincassem comigo. Eu era muito irreverente, falava muito palavrão. Lavaram minha boca com sabão, botaram pimenta. Não adiantou nada. Eu falo palavrão desde que comecei a falar e meus irmãos não, é engraçado. Fui a única que fumou. Só maus hábitos (risos).

Parece que você sempre fez o que quis.
Nem sempre. Eu posso dizer que, em geral, sim nas coisas fundamentais. Mas engoli muito sapo e muitas vezes fiz o que não quis. Ninguém da mesma condição social que eu tinha faz o que quer. E continuo fazendo...

Já fez terapia?
Fiz em alguns momentos da minha vida. A última vez foi um ano e meio antes de me separar. Foi fundamental.

Por que não fala do casamento?
Faz parte dos meus tabus. Envolve outra pessoa e meus filhos. Foram 30 anos, valeu a pena enquanto durou e ponto final. É uma página virada.

Como é ser avó?
Acho bacana à beça. Eu os adoro, eles me adoram, mas não sou o tipo de avó que senta no chão para brincar. Prefiro ler história. Gosto de levar ao teatro, ao cinema, ao centro da cidade. Eu não tenho muito jeito com criança pequena, sou meio desajeitada.

É vaidosa?
Sou muito vaidosa com meu corpo, gosto de estar sempre em ordem, gosto de bons cremes. Mas eu sou frugal. Estou me lixando para grife. Me incomoda se me olho no espelho e me percebo um pouco mais bochechuda.

Algum problema com a idade?
Evidentemente envelhecer é chato, mas a outra opção é pior (risos). O chato são as limitações. Tomo cuidado com a alimentação e a bebida. Não tomo mais Dry Martini e parei de fumar.

Como é sua rotina?
Sou extremamente disciplinada. Acordo às 6h, levanto às 7h, faço 25 minutos de meditação. Faço pilates, caminho muito. Tenho fisioterapia e aula de inglês. Isso ocupa minhas manhãs. Depois, sento para escrever. Gosto de deixar as noites para os amigos. E adoro cozinhar.

Você tem a vida com que tanto sonhava?
À custa de muito trabalho, muito sacrifício e muita engolição de sapo. As coisas não foram nada fáceis. Tive muita sorte com os amigos e em dizer sim no lugar de não. Trabalho no que quero e ainda me pagam por isso!

Como Simone de Beauvoir, pretende escrever um livro de memórias?
Ah, quando eu for bem velhinha e puder falar aquilo que não posso agora (risos). A maior parte das pessoas está viva e eu não quero comprometer a vida de ninguém e nem a minha! São coisas íntimas e deliciosamente preservadas. Mas tenho muitas novelas e minisséries para escrever antes das minhas memórias.



FÁBIO ASSUNÇÃO logo DALVA E HERIVELTO



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