Prestes a trocar a rotina de Brasília pela azáfama da campanha eleitoral, alguns ministros converteram os portais do governo em ‘palanques eletrônicos’. Aproveitam a vitrine oficial para realçar as benesses que levam aos Estados nos quais vão pedir votos em 2010.
Na última quinta, por exemplo, os visitantes da página do Ministério da Justiça foram submetidos a um texto que começa assim: “A moradora do município de Sapucaia do Sul, Luisa Angelina, está esperançosa de que a criminalidade na sua cidade diminua...”
Candidato do PT ao governo gaúcho, o ministro Tarso Genro passara pela cidade de Luisa, no interior do Rio Grande do Sul. Levara aos eleitores locais o “Terriório de Paz”, do Pronasci (Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania).
O texto do ministério informou que, no mesmo dia, Tarso implantara o Território da Paz em outros dois municípios gaúchos: “Assim como Luisa, moradores de Esteio e Cachoeirinha também começam a ser beneficiados por projetos [...] que vão melhorar a segurança pública”.
Anotaram-se comentários elogiosos dos prefeitos das três cidades –dois do PT e um do PSB. Realçaram-se tópicos do discurso de Tarso, o ministro-candidato.
Na mesma quinta, o Ministério do Desenvolvimento Social submeteu os visitantes do seu portal a um roteiro do titular da pasta pelo interior de Minas. Dividido entre uma candidatura ao governo do Estado e ao Senado, o petista Patrus Ananias visitaria três cidades mineiras.
Em Uberlândia, pronunciou uma palestra a vereadores. Discorreu sobre “os investimentos e programas sociais” que carreara para a cidade e região. Coisa de R$ 90 milhões, o texto fez questão de informar.
Patrus foi brindado com uma “honraria”. Uma “moção de aplauso em reconhecimento ao trabalho desenvolvido”.
Em Patrocínio, o ministro-candidato do Bolsa Família inaugurou dois centros de assistência social. Em Ituiutaba, Patrus abriu uma “Feira Regional Popular Solidária”. Nessa cidade, informou o texto, o ministro despejara “quase R$ 25 milhões anualmente”.
Candidato do PT ao Senado, o ministro José Pimentel (Previdência) deflagrou na última sexta o cadastramento dos agricultores familiares e assalariados rurais.
Gente que integra o grupo de “segurados especiais” da Previdência. A iniciativa visa mapear os dados dos trabalhadores rurais de todo país. Porém, o texto levado ao portal da Previdência dá especial relevo ao Ceará, Estado do candidato Pimentel.
A abertura passa a impressão de que o cadastramento se daria apenas no Estado natal do ministro: “Começa nesta sexta-feira, no Ceará, o cadastramento...” No segundo parágrafo: “O lançamento [...] contará com a participação do ministro...”
Só no quarto parágrafo informa-se: “Em todo o Brasil serão coletadas informações dos segurados especiais...” No parágrafo seguinte, retorna-se ao pedaço do mapa que interessa a Pimentel: “No Ceará, os dados [...] começarão a ser colhidos por 25 sindicatos...”
Na véspera, quinta-feira, o portal da Previdência anunciara que Pimentel iria à cidade cearense de Paracuru. Assinaria uma ordem de serviço para a construção de uma agência da Previdência. Na cidade, investimentos de R$ 845 mil. Em todo o Ceará, R$ 82,6 milhões.
Só então o texto se preocupa em mencionar o Brasil: 720 agências. Investimentos de R$ 618,3 milhões.
Entre todos os ministros-candidatos, Carlos Lupi (Trabalho) é o que se serve com maior frequência do "palanque eletrônico" de sua pasta. Candidato a uma cadeira no Congresso pelo PDT do Rio, Lupi transformou o Estado numa extensão de seu gabinete.
Na última quinta, a página eletrônica do ministério informou que Lupi estaria no Rio na sexta. Foi a Nova Iguaçu, na baixada fluminense. Para quê? Assinou com a prefeitura local um termo de compromisso para prover cursos profissionalizantes a 4 mil jovens. Bolsa de R$ 100. Por seis meses.
No final de novembro, a equipe de Lupi levara ao portal três textos laudatórios. Um no dia 26. Dois no dia 27. Num, Lupi inaugura agência do Sine em São Gonçalo. Noutro, o ministro leva qualificação profissional a jovens do Leste fluminense.
Mais: “A agenda de Lupi [...] inclui ainda visita ao canteiro de obras do Complexo Petroquímico de Itaboraí. Tida como a segunda maior obra do mundo em andamento...”
No terceiro texto, os visitantes do portal do Trabalho foram cientificados de que Lupi seria “homenageado pelas relevantes ações à frente do ministério”. Onde? No Rio, claro. “Ordem do Mérito dos Trabalhadores Brasileiros”, eis o nome da comenda.
A equipe de Lupi esmerou-se em lustrar-lhe a biografia: Em meio a cifras e programas, anotou: “Suas marcas à frente do ministério são a defesa dos direitos dos trabalhadores e a qualificação profissional como eixo da política de geração de emprego e promoção da cidadania”.
Informou-se o nome da mulher do ministro, o número de filhos do casal, as ligações de Lupi com Leonel Brizola etc, etc e tal. Os visitantes do portal só não foram informados do essencial. Não há no texto vestígio do nome da entidade que concedeu a honraria a Lupi.
Na última sexta, o "palanque virtual" da pasta do Trabalho noticiou que Lupi anuncia, nesta segunda, a abertura de uma linha de crédito para a compra de táxis (R$ 200 milhões). Vale para todo país. Mas virá à luz, obviamente, no Rio.
Não há ilegalidade na ação dos ministros. Sempre poderão alegar que estão apenas divulgando dados oficiais de suas pastas. O problema está no timbre das notas. Há um quê de 2010 em todas elas.
Não se deve perder de vista um detalhe: o funcionamento dos portais e os salários dos servidores que os abastecem são bancados pela Viúva. Uma veneranda, desprotegida e apartidária senhora.
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