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sábado, 31 de maio de 2008

Farc tentaram estreitar relações com governo Lula

O líder da guerrilha enviou três cartas ao presidente brasileiro com o intuito de estabelecer “relações político-diplomáticas” e tratar de "temas de benefício recíproco"
Rodrigo Rangel

O ex-líder das Farc Raúl Reyes, morto em março durante um ataque das forças oficiais colombianas ao acampamento que mantinha no norte do Equador, tentou, oficialmente, estabelecer laços entre a guerrilha colombiana e o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. ÉPOCA teve acesso, com exclusividade, a três cartas que Reyes enviou para Lula em 2003, primeiro ano de governo do petista. As correspondências foram levadas ao gabinete presidencial, no Planalto, por um parlamentar do PT. Num dos textos, Reyes manifesta expressamente o desejo das Farc de estabelecer “relações político-diplomáticas” com o próprio Lula e com seu governo. O chefe guerrilheiro também pede uma conversa, “pessoalmente”, com o presidente brasileiro para tratar de “temas de benefício recíproco” (confira trechos abaixo).

Em outra carta, Reyes aproveita a chegada de Lula ao poder para tratar da presença da guerrilha na zona de fronteira entre Colômbia e Brasil. “Queremos aproveitar para ratificar, junto ao senhor, oficialmente, a política de fronteiras das FARC-EP: nossa organização tem profundo respeito pelos povos e governos vizinhos da Colômbia. Por essas razões, nossas unidades não intervêm em assuntos internos de seus países, nem estão autorizadas para executar operações militares fora das fronteiras da Colômbia”, escreveu Reyes, em correspondência datada de 20 de março de 2003. A afirmação sobre o que o ex-chefe guerrilheiro chama de política fronteiriça das Farc precede um pedido tácito a Lula para que a fronteira do Brasil com a Colômbia pudesse ser uma zona livre para a guerrilha: “Em troca, trabalhamos entusiasmados para fazer das fronteiras verdadeiros remansos de irmandade, concórdia e paz com nossos vizinhos, no marco de boas relações políticas de benefício recíproco”. As Farc atuam livremente na linha de fronteira colombo-brasileira, como mostrou reportagem recente de ÉPOCA (leia aqui).

Nas correspondências, escritas em espanhol, Raúl Reyes tratou, também, de fazer campanha contra o governo do presidente Álvaro Uribe e sua aliança com os Estados Unidos. Ele tenta obter o apoio de Lula para frente à política de Uribe. “Consideramos oportuno informar-lhe que o governo paramilitar, ilegítimo de Álvaro Uribe Vélez, cumpre sem reparos todas as exigências do Governo de [George W.] Bush sem que ninguém o pressione, e o faz por convicção e porque está plenamente identificado com as políticas do império estado-unidense”, escreveu. Ele relaciona a aliança do governo colombiano com a Casa Branca a uma suposta “geoestratégia norte-americana em nossa extensa e rica região amazônica”.


Se a Anistia Internacional estivesse preocupada com os direitos humanos, e não em tomar posições ideológicas, não passaria (vergonhosamente) a mão na cabeça das Farc – Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, guerrilha que utiliza os métodos humanitários por todos conhecidos.

Outro que, meio dissimuladamente, mima as Farc é Luiz Inácio Lula da Silva. Agora com a revelação das cartas do líder Raúl Reyes ao presidente brasileiro, em reportagem de “Época”, espera-se que ele venha a público dizer, afinal, de quem é amigo.

As cartas não têm um tom qualquer. O tom é de companheirismo, quase de bajulação, denotando uma relação de alta cumplicidade. De 2003 (data das cartas) até hoje, não se ouviu uma só palavra de reprovação de Lula às Farc. Se não quisesse essa cumplicidade, o presidente brasileiro deveria ter rechaçado publicamente o flerte político.

Jamais o fez. Está sempre escondido nesse discurso de suposta neutralidade, álibi evidente para se furtar a condenar o terror dos guerrilheiros colombianos, enquanto nos bastidores o assessor top (top top) Marco Aurélio Garcia faz tricô com os seqüestradores.

Ou Lula esclarece agora, de uma vez por todas, qual sua relação com as Farc, ou o Procurador Geral da República precisa abrir imediatamente um inquérito sobre as relações do Estado brasileiro com essa organização clandestina.

Guilherme Fiuza
Jornalista, é autor de Meu nome não é Johnny, que deu origem ao filme. Escreveu também o livro 3.000 Dias no Bunker, reportagem sobre a equipe que combateu a inflação no Brasil. Em política, foi editor de O Globo e assinou em NoMínimo um dos dez blogs mais lidos nessa área. Este espaço é uma janela para os grandes temas da atualidade, com alguma informação e muita opinião.

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