Imigrante ilegal brasileiro tem dois grandes sonhos: casa própria no Brasil e ser legal nos Estados Unidos. Os jovens vivem na dúvida. Reclamam do trabalho duro, mas mandam dinheiro para o Brasil.
Os mais velhos que não falam inglês querem voltar. Não param de reclamar da vida nos Estados Unidos. Muitos voltam, com dinheiro, sem inglês, menos português e passam o resto da vida reclamando do Brasil.
As três babás que cuidaram dos meus filhos, todas já senhoras, caíram fora tão logo juntaram o suficiente para comprar o apartamento. Não paravam, nem param, de se queixar da vida. Ruim aqui que nem aí.
Trabalhavam muito e não gastavam nada. Vidas miseráveis, sempre com medo de que aquele dinheiro vivo acumulado no colchão fosse roubado. Odiavam ter contas em bancos e não confiavam em ninguém. Quem dorme bem em cima de US$ 10 ou 20 mil?
Se consolavam falando sobre amigas que trabalhavam em regime de semi-escravidão em casas de patrões ricos que confiscavam os passaportes, pagavam US$ 100 por semana e achavam que as empregadas deveriam estar agradecidas porque moravam em Nova York, tinham TVs, usavam cosméticos de madames e faziam poupança.
Na década de 90 surgiram vários escândalos e um deles, envolvendo um casal de milionários indianos, virou manchete. A empregada vivia presa no porão. Quando reclamava, apanhava. Um dia conseguiu escapar, o casal foi parar na prisão e vários outros casos de abusos foram expostos. Desde então, tem sido raros os escândalos, mas as máfias chinesas estão a todo vapor.
A China, cada vez mais rica, é também uma das grandes exportadoras de imigrantes ilegais. Chineses pagam até US$ 70 mil para entrar nos Estados Unidos, tornam-se escravos até que a dívida seja paga. Na Chinatown, em Manhattan, muitos têm apenas uma cama onde podem passar oito horas porque é dividida, sem mudar lençóis, com outros dois miseráveis nas 16 horas seguintes.
A recessão afetou os brasileiros e a área de construção foi a mais derrubada. Não há números de quantos voltaram, mas uma medida confiável é a quantidade de dólares remetidos para o Brasil. O número começou a crescer no ano 2000, chegou a US$ 7 bilhões em 2008, mas no último ano caiu quase 5% . Não é um número brutal. Tragédia maior é dos mexicanos, que mandavam US$ 23 bilhões por ano. O New York Times agora publica matérias com mães mexicanas que mandam dinheiro para os filhos nos Estados Unidos.
Para os que mandam dinheiro para sustentar família ou fazer poupança, o pior foi a desvalorização do dólar. Quando Marcélio chegou aqui em 2005, o dólar estava a três por um. Hoje está por volta de 1,70. Ele trabalha em construção de casas em Nova Jérsei e diz que hoje trabalha 70% menos do que há três anos. Começou a sentir a bolha imobiliária em 2006.
No inverno, trabalha dois dias por semana, só dá para pagar o essencial, mas Marcélio este mês é pioneiro num programa criado pela Caixa Econômica Federal, que viu uma oportunidade de ajudar e ganhar às custas do imigrante.
No ano passado, criou o Crédito Imobiliário para Emigrantes. O esquema é simples e bem bolado. O imigrante abre uma conta de poupança na Caixa - pessoalmente ou por procuração - e se compromete a fazer remessas de um valor fixo por 12 meses. Se faltar um mês, precisa recomeçar da estaca zero. Quando completa um ano, escolhe a casa e a Caixa financia 60% em 180 meses por 11,90% ao ano. Quem quiser, pode fazer remessas menores ou maiores.
Marcelio é de Poços de Caldas e escolheu uma casa de R$ 120 mil. Seu pagamento mensal , dependendo do câmbio, está por volta de US$ 700 por mês.
A poupança é calculada em reais e o pagamento dele fica na faixa de US$1.200 por mês. A casa tem 180 metros quadrados num bairro bom da cidade. Com o esquema da Caixa, ele diz que planeja voltar daqui a três anos. Se tivesse de fazer sua própria poupança, calcula que teria de malhar pelo menos mais oito anos ralando na construção em Nova Jérsei. Soube do plano pelos jornais locais. Vai voltar para construir em Poços.
Construção é trabalho gratificante pelos dólares. Na década de 80, fiz uma reportagem sobre um brasileiro que ficou rico com pouco mais de 40 anos. Vivia num casão. Tinha cara de 70. Trabalhava em construção de estradas, casas e piscinas. Não gastava nada, nem permitia que as duas filhas fossem à escola porque iam descobrir droga e sexo. Eram primitivos.
A Caixa não resolve este tipo de problema. Nem o da legalização dos papéis - green card e cidadania - mas realiza o sonho da casa própria.
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