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terça-feira, 18 de outubro de 2011

Júri de médicos acusados de retirar rins de pacientes vivos é retomado



Julgamento entra no segundo dia em fórum de Taubaté, interior de SP.
Réus negam crime de homicídio doloso; decisão deve sair na quarta (19).

Kleber Tomaz Do G1 SP
O julgamento de três médicos acusados de matar quatro pacientes num hospital de Taubaté, no Vale do Paraíba, interior de São Paulo, em 1986, ao retirar rins irregularmente das vítimas como parte de um suposto esquema de tráfico de órgãos humanos, foi retomado por volta das 9h15 desta terça-feira (18) no Fórum Central da cidade. O júri entra no seu segundo dia com o restante dos depoimentos das testemunhas de defesa - serão nove. Na segunda-feira (17), entre as 10h e pouco mais das 19h, foram ouvidas sete testemunhas da acusação e uma da defesa.

Posteriormente, o neurocirurgião Mariano Fiore Júnior, agora com 62 anos, o urologista Rui Noronha Sacramento, de 60 anos, e o nefrologista Pedro Henrique Masjuan Torrecillas serão interrogados, e ocorrerão os debates do Ministério Público e advogados de defesa. Os sete jurados vão, então, se reunir para decidir se os réus são culpados ou inocentes do crime de homicídio doloso (com intenção de matar).

Segundo informou a assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), a previsão do juiz Marco Antônio Montemor é que a leitura da sentença ocorra na noite de quarta-feira (19). Caso sejam condenados, cada um dos médicos poderá pegar pena de 6 a 20 anos de reclusão.

O trio de médicos responde em liberdade e no exercício legal da profissão por assassinato. Segundo a denúncia feita pelo Ministério Público, eles falsificaram prontuários de pacientes vivos, informando que eles estavam com morte encefálica (sem atividade cerebral e sem respiração natural) para convencer as famílias das vítimas a autorizarem a retirada dos rins para doação. A suspeita de comercialização ilegal de rins nunca foi comprovada.
O Ministério Público informa que, nos anos 80, a equipe médica da Faculdade de Medicina de Taubaté (Unitau) usava o extinto Hospital Santa Isabel de Clínicas (Hosic), onde atualmente está localizado o Hospital Regional de Taubaté, para cometer os crimes e desvio de conduta ética e moral. Como hoje, na época a instituição era popular, mas atendia convênios médicos particulares.

De acordo com a Promotoria, José Miguel da Silva, Alex de Lima, Irani Gobo e José Faria Carneiro estavam vivos quando entraram no extinto Hosic e morreram após a retirada desses órgãos há mais de 24 anos. Segundo o promotor Márcio Augusto Friggi de Carvalho, as vítimas morriam por outras complicações em razão da ausência desses órgãos.

DepoimentosNesta terça, serão ouvidas as seguintes testemunhas arroladas pelos advogados de defesa dos réus: Otávio Gaiotto Neto, Sandra Mara Batista, Cláudio Shiohama, Fernando Teixeira, Maria Cristina Teixeira, Francisco Carlos Missé, Jorge Kater, Celso Issamu e Ronaldo Abraham.
Na segunda prestaram depoimento as testemunhas solicitadas pela acusação: o médico Roosevelt de Sá Kalume (que revelou o caso), a médica Gilzélia Batista (responsável por guardar os prontuários médicos), a enfermeira Rita Maria Pereira (que afirmou ter visto um médico retirar os órgãos de um paciente vivo), o médico César Vilela, Ivã Gobbo (irmão de um dos pacientes mortos), Regina Teixeira (telefonista que trabalhava no setor de prontuários), Lenita Bueno (médica anestesista). Também foi ouvida na segunda a testemunha de defesa Paulo Arantes de Moura.

Denunciante internadoLogo após terminar o seu depoimento, Kalume foi internado no início da noite de segunda no Hospital Regional de Taubaté com taquicardia. Segundo a assessoria de imprensa do hospital, ele apresentou um quadro de estresse e está em observação. Não há previsão de alta médica do paciente.

Na segunda, amigos dos acusados se reuniam em manifestação favorável aos médicos, vestindo camisetas com os nomes dos réus. Familiares dos pacientes mortos em 1986 também estiveram presentes na sala do júri.

MédiumA acusação da Promotoria contra os médicos se baseia somente no homicídio doloso. Segundo Friggi de Carvalho, laudos do Instituto Médico-Legal (IML), da Polícia Técnico Científica e do Conselho Regional de Medicina (Cremesp) concluíram que os pacientes não estavam mortos antes da retirada dos rins.

Durante o processo, testemunhas relataram que até uma espécie de médium foi apresentado pelos médicos aos parentes para dizer que havia entrado em contato com o suposto morto no plano espiritual e ele havia pedido para os familiares autorizarem a doação.

Em setembro de 2010, em reportagem publicada pelo G1, os defensores dos réus negaram as acusações de que seus clientes forjaram documentos. Alegando inocência, a defesa deles sustentou que as retiradas dos rins foram feitas em pessoas que tiveram morte cerebral diagnosticada. Os réus disseram que exames de arteriografia mostraram que os pacientes estavam clinicamente mortos, em coma irreversível ou morte encefálica.

Os réus já disseram que os órgãos iam para o programa de transplantes de um convênio entre a Unitau e o Hospital das Clínicas (HC), da Universidade de São Paulo (USP), na capital paulista. Mas segundo o promotor Friggi de Carvalho, esse acordo jamais existiu. “Não há nenhum registro disso em lugar algum”, disse.

Caso KalumeO caso veio à tona em 1987, quando o então diretor da mesma faculdade, o médico Roosevelt Kalume, procurou o Cremesp para informar que um programa ilegal de retirada de rins de cadáveres para doação e transplantes acontecia sem o seu conhecimento e aval.
Na época, o assunto ficou conhecido nacionalmente e a imprensa o tratou como caso Kalume, em referência ao sobrenome do denunciante. O escândalo culminou com a abertura de inquérito policial em 1987 e até virou alvo em 2003 da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que apurava a atuação de organizações criminosas atuantes no tráfico de órgãos no Brasil.

Os médicos foram absolvidos das acusações de tráfico de órgãos e eutanásia nos procedimentos administrativos e éticos do Cremesp, em 1988, e do Conselho Federal de Medicina (CFM), em 1993. Além disso, o caso em Taubaté ajudou na discussão a respeito da elaboração da atual lei que trata sobre a regulamentação dos transplantes de órgãos no país até hoje. Segundo o CFM, a lei é a 9.434, de 1997.

Em 1993, Kalume chegou a publicar um livro sobre o caso. Para narrar os fatos, ele usou nomes diferentes dos personagens da vida real. “Transplante”, no entanto, deixou de ser publicado. Apesar disso, a obra também faz parte do processo contra os médicos.

Já em 1996, após quase dez anos de investigação, a Polícia Civil de Taubaté concluiu o inquérito que responsabilizou quatro médicos pelas mortes de quatro pacientes. Um dos acusados morreu em maio deste ano.
 












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