Perfil dos participantes do ato é tão eclético quanto a pauta de reivindicações que vai desde crise econômica a questões ambientais e futebol
Seguindo os moldes da manifestação “Ocupe Wall Street”, em Nova York, que completou um mês esta semana, a principal característica que une os participantes do movimento, batizado de "15-O São Paulo", é a forte atuação em blogs e redes sociais na internet, recurso utilizado em larga escala como ferramenta de mobilização. Os protestos fazem parte de um movimento global que acontece em 911 cidades em mais de 80 países.
Foto: Greg Salibian/iG
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Manifestantes acampados no Vale do Anhangabaú, no centro da capital paulista
A discriminalização das drogas, melhorias na saúde pública, serviços de banda larga gratuitos além de mudanças no sistema financeiro global, também estão no foco das discussões dos manifestantes brasileiros.
A exemplo da pauta variada, o perfil dos acampados também é bastante diversificado. De estudantes do ensino médio passando por profissionais liberais, professores, engenheiros, historiadores, músicos, grafiteiros, moradores de rua e aposentados o movimento tem em suas fileiras uma amostra das várias faces da sociedade.
Ao lado de uma mesa com cinco computadores com acesso a internet e alimentados por um gerador de força à gasolina, fruto de uma doação, o profissional liberal Rafael Vila Nova, de 26 anos, acampado no centro de São Paulo desde o dia 15, explica que o movimento é baseado em três pilares: apartidarismo, não violência e assembleísmo.
“Não queremos nenhuma conotação política. Queremos chamar a atenção das autoridades para que elas venham debater aqui conosco os temas da pauta, principalmente as questões econômicas de uma forma mais democrática e direta”, disse o jovem que trabalha com montagem de estandes para feiras e eventos.
De acordo com ele, os problemas econômicos que afetam o mundo, ainda não atingiram diretamente o País, mas podem chegar a qualquer momento e é necessário um debate mais próximo com a sociedade para evitar que os mesmos erros cometidos na Europa e nos Estados Unidos sejam praticados no Brasil. “ Passamos da era da informação para a era da colaboração e a sociedade precisa ter uma participação mais ativa na tomada de decisões para não acontecer como na Grécia, onde o capital e a regras de mercado destruíram o berço da democracia e da cultura ocidental”, disse.
Acampamento no centro da capital paulista - Foto: Greg Salibian/iG
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“Vi pelas redes sociais o que estava acontecendo e achei que podia dar minha contribuição”, disse Jéssica, que na tarde de terça-feira estava atuando no “comitê de comida” do acampamento no centro de São Paulo, onde era encarregada de lavar pratos e copos de plástico usados nas refeições dos manifestantes, cujo cardápio era composto por macarrão, alface e tomate, tudo fruto de doações feitas por simpatizantes e transeuntes que passam pelo alojamento improvisado.
O grafiteiro Adelson Chaves, de 32 anos, que estava organizando, no “comitê de comunicação” do movimento, a produção de faixas e cartazes com frases como “O capitalismo não está em crise; ele é a crise” e “Indignação não é suficiente”, se dizia preocupado com as questões econômicas e suas implicações para as pessoas de baixa renda.
“Parte dos problemas financeiros está no fato de existir uma grande concentração de renda e uma forte cultura exploratória de recursos humanos e naturais.” Chaves também reveza com outros membros da manifestação nos discursos com megafone e ainda canta músicas de Chico Science para manter o ânimo do grupo.
A decepção com a classe política e o atual sistema eleitoral levaram a estudante Carolina Stary, de 18 anos, a juntar-se ao acampamento no centro de São Paulo. Para ela, que participa do comitê de infraestrutura do movimento muitas pessoas no Brasil não se sente representadas pelas autoridades eleitas. “Votei pela primeira vez no ano passado, mas não me sinto representada por nenhum político. Decidi defender na manifestação um novo tipo de democracia, com mais voz ativa da sociedade seja de forma presencial, como aqui no acampamento, ou via redes sociais”, disse.
O historiador Leandro Cruz, de 29 anos, veio da cidade de Franca, no interior paulista, para participar da manifestação e segue acampado com os demais membros do movimento, sem previsão de retorno a sua cidade. “Milito pelas causas da educação e da preservação ambiental. Mas a questão econômica também me preocupa. Dizem que o Brasil ainda não sentiu os efeitos da crise, mas aqui, com o País em um bom momento, muitos ainda não participam desse bom momento e se vive pior que na Europa, que atravessa uma grande crise. Isso precisa mudar”, disse.
Para a mestranda em sociologia e participante do acampamento, de 27 anos, uma das características mais interessantes do movimento é que ele tem procurado ser amplo e tolerante com todas as vertentes, por isso a pauta acabou ficando mais abrangente.
“O movimento é inspirado nas manifestações contra a crise mundial em vários países, mas ganhou corpo com diversas manifestações que ocorreram ao longo do ano no País, como por exemplo, os protestos contra aumentos das tarifas de transporte público, contra a homofobia, contra a violência, entre outros”, disse.
As principais pautas do movimento são:
Contra o estado penal e a criminalização dos movimentos sociais e da classe trabalhadora;
Contra a utilização de armas nas manifestações populares;
Contra as remoções de famílias para construções de obras da Copa e Olimpíadas;
Fora Ricardo Teixeira, presidente da CBF;
Saúde pública e de qualidade;
Contra o aumento das passagens de ônibus e metrô;
Contra privatização dos transportes e à cultura do automóvel;
10% do PIB para a educação pública;
Internet banda larga para todos em regime público e gratuito;
Contra o racismo, preconceito e extermínio da juventude negra;
Legalização do aborto;
Por uma Comissão da Verdade, Memória e Justiça autônoma, que julgue os assassinos e torturadores;
Apoio às reivindicações dos trabalhadores em greve.
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