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sábado, 7 de junho de 2008

Na primeira entrevista depois da prisão, o casal Anna Carolina Jatobá e Alexandre Nardoni dá a sua mais nova versão sobre o crime que chocou o País

Exclusivo

# IstoÉ - Exclusivo # Madrasta de Isabella: "não esganei ninguém"


CASO ISABELLA
Direto do Cárcere
Na primeira entrevista depois da prisão, o casal Anna Carolina Jatobá e Alexandre Nardoni dá a sua mais nova versão sobre o crime que chocou o País

Por ANTONIO CARLOS PRADO




FAMÍLIA Alexandre (à esq.), a irmã, a mãe e o pai; brincando com Isabella (ao centro) e junto à mulher, Anna Carolina, com um dos filhos no colo

Anna Carolina treme de frio na também fria sala de reunião da Penitenciária Feminina da cidade paulista de Tremembé. Veste-se a caráter, e isso é só um eufemismo para se dizer que Anna Carolina Jatobá, Carol para os amigos, Guigui desde a infância para os seus pais, está vestida de calça bege e camiseta branca, implacável uniforme de quem está preso. No pulso direito, um terço com continhas brancas de plástico faz a vez de pulseira. Ela se aquece com uma blusa cinza, um senhor empresta-lhe um xale preto. Anna Carolina chora, mas as lágrimas não impedem que seu olhar mergulhe direta e profundamente nos olhos de seu interlocutor. O frio, o choro e o olhar firme, é palpável que no final da manhã da quarta-feira 5 ela se sentia uma pessoa solitária - mas corajosa.

Almoçara a comida servida na cadeia: arroz, feijão, carne de panela e beterraba. Anna Carolina mora numa cela com oito presidiárias e não desfruta de nenhum privilégio. É uma a mais entre as 178 presas da instituição prisional.





Alexandre Nardoni está com frio na Penitenciária Masculina da mesma cidade de Tremembé, mais ou menos cinco quilômetros distante de sua mulher. Agora é metade da tarde e para os que vivem do "lado de cá" o dia já esquentou um pouco - mas as cadeias são sempre geladas. Alexandre chora, e com lágrimas nos olhos, se chega raras vezes a baixar o rosto, o levanta imediata e corajosamente para responder a qualquer pergunta que lhe seja feita. Também o seu traje é calça bege e camiseta branca, também a comida que come é aquela servida na cadeia, também divide a cela com outros presos, também não possui nenhuma regalia (um de seus companheiros de cela é Marcos Mantovani, acusado de envolvimento no esquema de desvio de dinheiro do BNDES). Enfim, também ele é apenas mais um detento entre os 380 que estão nessa penitenciária. No ato de se estar frente à frente com Alexandre, e ele jamais desvia o olhar enquanto conversa, decifra-se um enigma, o da boca: um leve sorriso, que algumas vezes se supôs ver em fotos e imagens de televisão, não é sorriso - é reflexo da conformação de sua arcada dentária superior.

O casal Anna Carolina e Alexandre está preso preventivamente sob a acusação de ter assassinado no final de março, em São Paulo, a garotinha Isabella, de cinco anos - a menina é filha somente dele. O Tribunal de Justiça julga nessa terça-feira 10 o mérito do habeas- corpus que pede a soltura de ambos e a Justiça já trabalha com a hipótese de libertá-los. É certo que nesse tipo de recurso não se discutem provas, mas, isso sim, se a prisão preenche requisitos técnicos. Ocorre, porém, que vieram a público discrepâncias que há entre os próprios documentos oficiais. O laudo da necropsia do IML, segundo peritos, é impreciso ao fixar duas causas para a morte de Isabella (esganadura e politraumatismo). Motivo: isso é biologicamente impossível. O mesmo laudo oficial descarta a possibilidade de esganadura ao relatar que "com relação ao osso hióide (pescoço) não foram observadas fraturas". Mais: falouse que as marcas no pescoço da menina eram compatíveis com as mãos de Anna Carolina, mas agora se sabe que não existem tais marcas. Como a denúncia do Ministério Público contra Anna Carolina é por esganadura, essa denúncia tem tudo para deixar de existir.

Também em relação a Alexandre o laudo da perícia começou na semana passada a suscitar dúvidas nos meios jurídicos. A tela de proteção na janela do apartamento, cortada e através da qual Isabella foi atirada, acabou sendo retirada do local do crime pela polícia, durante a investigação, e levada a laboratório. Foi então remontada numa simples moldura de madeira, sendo que alguém precisava segurar a moldura para que ela não caísse enquanto o perito testava pontos de coincidência entre manchas na camiseta de Alexandre e o rasgo na tela - ao jogar a filha, ele teria sujado a camiseta. Tecnicamente, isso é totalmente discrepante da posição, pressão e resistência da tela em seu lugar de origem - dela sobravam pontas na moldura montada e quem a segurava no teste jamais a manteria firme. Segundo o inquérito e a denúncia, a vítima foi defenestrada em decorrência de ter sido esganada. Como não houve esganadura e o exame da tela deveria ter sido feito no apartamento, a defesa do casal avalia que a Justiça possa tecnicamente anular todo o processo. O corpo de Isabella está enterrado. O caso e o motivo de sua morte, porém, continuam insepultos.








"Há presas que fazem com a boca pol, pol, pol. É código: vão me matar"

ISTOÉ - Um motivo para a sra. não ter esganado Isabella.
Anna Carolina -
Eu amava, amo e amarei a Isabella para o resto da minha vida. Para mim, ela era minha filha. Não esganei ninguém.

ISTOÉ - Se tudo isso tivesse acontecido com outro casal, a sra. teria ido para a porta da delegacia e do IML e ficaria berrando "assassina, assassino"?
Anna -
Não sei dizer, eu não sei dizer.

ISTOÉ - A polícia lhe fez perguntas, dizendo ter a perícia em mãos, mas não a tinha. Por quê?
Anna -
Para me incriminar. O interrogatório foi cheio de pegadinhas. Eles queriam que eu caísse em contradição, não conseguiram porque eu só falei a verdade. Disseram que tinha sangue na minha sapatilha e me forçaram a explicar. Como poderia ter sangue se eu tirei os tamancos quando cheguei ao apartamento, desci descalça para socorrer a Isabella e essa sapatilha só calcei depois, na casa dos meus pais, onde cheguei descalça? Não cai em pegadinha quem diz a verdade.

ROGERIO LACANNA/AG. ISTOÉ
SEM SINAIS Anna é acusada de ter esganado Isabella. O laudo oficial diz não haver marcas no pescoço

ISTOÉ - Conte sobre aquela noite.
Anna -
O Alexandre subiu primeiro com a Isabella. Enquanto ele subia, eu vi um carro preto na garagem, com som ligado, e ouvi voz de homem e mulher. O Alexandre voltou, subimos com os outros filhos, ele com o Pietro e eu com o Cauã. Quando entramos no apartamento, deixei meus tamancos na cozinha. O Alexandre, depois de olhar o quarto da Isabella, perguntou surpreso onde ela estava. Fui ao quarto dela e vi o edredom revirado e o sapatinho no chão. Pensei que estava na nossa cama, olhei e não estava, fomos ao quarto dos meninos, foi aí que vimos a tela rasgada, o Alexandre subiu na cama e pôs a cabeça para fora através do furo, com o Pietro ainda no colo. O Alexandre começou a berrar, eu gritava, os meninos acordaram. Eu não acreditava, também fui olhar e vi o corpinho dela no chão jogado...

ISTOÉ - Todo esse seu choro é só porque a sra. está presa? Se estivesse em liberdade, tudo bem?
Anna -
Choro porque a Isabella morreu, choro de dor, choro porque estou pagando por uma coisa que não fiz.

ISTOÉ - Como era o seu relacionamento com a dona Ana Carolina Oliveira, mãe biológica de Isabella?
Anna -
No começo, eu tinha um pouco de ciúme, depois que o Pietro nasceu o meu ciúme passou, eu amadureci muito. Eu tinha um ciúme normal de mulher, tanto que freqüentava a sua casa quando ia apanhar a Isabella.

ISTOÉ - Segundo o inquérito e a denúncia, a sra. teria esganado por ciúme.
Anna -
Eu não esganei ninguém.

ISTOÉ - Segundo a polícia, havia sangue na bermuda de Alexandre e esperma e fluido vaginal em sua calça jeans, pressupondo uma relação sexual apressada, sem se despirem totalmente. Isso ocorreu no dia da morte de Isabella?
Anna -
Eu ri quando a polícia falou isso. O sangue na bermuda do Alexandre é porque ele encostou muito na Isabella caída, tentando salvá-la. No meu jeans, o que a polícia falou que era esperma ficou provado ser bolo de chocolate que comi na casa dos meus pais e derrubei na calça. Era sobra do bolo do aniversário do meu primo, que foi comemorado na véspera. Os policiais queriam que fosse esperma e secreção de vagina. Os testes deram bolo de chocolate.

ISTOÉ - A sra. conheceu a mãe de Isabella antes de conhecer o Alexandre?
Anna -
Não. Nós nos conhecemos pelo MSN, eu já estava com o Alexandre. Ela me pediu para levar o Pietro à casa dela. Foi assim que nos conhecemos pessoalmente.

ISTOÉ - Diz o inquérito que a sra. seria "barraqueira". Teria até machucado o braço numa briga porque quebrou com ele o vidro da lavanderia.
Anna -
Se sou "barraqueira" e me machuco, isso mostra que eu machuco a mim mesma e não parto para cima do outro.

ISTOÉ - Como era estar livre e agora estar presa?
Anna -
Choro todos os dias. Quando passo entre as presas, algumas ficam fazendo com a boca "pol, pol, pol", esse é o código de que vão me matar.

ISTOÉ - Como é vestir calça bege e camiseta branca todos os dias?
Anna -
Péssimo.

ISTOÉ - Isso já mexeu com sua vaidade e feminilidade?
Anna -
Vou me arrumar para quê? Não tenho mais vontade de nada.

ANTONIO CARLOS PRADO

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