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quarta-feira, 23 de março de 2011

Rip

Sexo, escândalos, corrupção e fama: a diva
Elizabeth Taylor e os bastidores de 'Cleópatra', o filme de
35 milhões de dólares que pode quebrar a Fox
Atração incontrolável: as faíscas entre Liz e Burton surgiram logo de cara. Ela abandonou o marido, ele escapou da mulher


Não foi desta vez que a saga colossal e bizarra de Cleópatra, o filme mais caro da história, chegou ao tão aguardado "the end". As filmagens já se arrastam há três anos – e não se tem notícia de uma produção mais caótica, perdulária e escandalosa em Hollywood. Neste mês, o diretor Joseph L. Mankiewicz viajou até Paris para exibir um esboço de montagem da fita ao novo chefão dos estúdios Twentieth Century-Fox, Darryl Zanuck. O executivo ficou de cabelo em pé. Nessa primeira versão, Cleópatra é um filme confuso, irregular, monótono e excessivamente longo (sem os cortes, são insuportáveis seis horas). Zanuck é craque em consertar, na mesa de edição, as trapalhadas de alguns cineastas, transformando fitas esdrúxulas em filmes no mínimo toleráveis. Mas ele já confessou a pessoas próximas que não sabe o que fazer para dar um jeito em Cleópatra. Para Zanuck, há apenas uma certeza: cedo ou tarde, por pior que seja, o épico estrelado por Elizabeth Taylor e Richard Burton chegará às telas, pois a Fox já não pode voltar atrás num projeto com orçamento estimado em acachapantes 35 milhões de dólares. Os estúdios rivais, contudo, não estão tão certos disso – apostam que a concorrente irá à falência antes de concluir a malfadada aventura.

As últimas cenas de Cleópatra foram rodadas em julho, em locações históricas no Egito. Um mês antes, Liz Taylor enfim concluiu seu papel, nos estúdios Cinecittà, em Roma. Mankiewicz chegou tão exausto às últimas semanas da empreitada que tinha de ser carregado numa maca até o set. Desde então, é atormentado por outro desafio monumental: encontrar, entre centenas de rolos e dezenas de horas de filme, os trechos necessários para montar uma trama minimamente coerente. O problema (ou um deles) é que as filmagens jamais foram guiadas por um roteiro definitivo. O texto teve incontáveis e conflitantes versões. Em certo momento, o próprio diretor passou a escrever as cenas de madrugada para rodá-las na manhã seguinte. Não adiantou: boa parte do material é inútil. A Fox já calcula que será necessário retomar as filmagens mais uma vez para cobrir as enormes lacunas da história. Na reunião em Paris, Mankiewicz ainda tentou convencer Zanuck a dividir o épico em dois filmes de três horas cada. O executivo detestou a idéia. Para ele, o primeiro episódio não levaria ninguém aos cinemas – afinal, Liz e Burton contracenam pouco nessa parte. Ele também confessou outro temor: entre um capítulo e outro, o casal poderia desistir de seu tórrido romance clandestino fora das telas, talvez o único atrativo que ainda salve o filme nas bilheterias. Até o fechamento desta edição, a notícia em Hollywood era de que Liz e Burton ainda estavam juntos, apesar dos numerosos atritos, discussões e bebedeiras (de ambos).

cenário
Os cenários faraônicos: dinheiro no lixo

Contratos nababescos - O comentado namoro entre os protagonistas da película pode até atiçar a curiosidade do público e amenizar o desastre financeiro de Cleópatra quando o filme enfim chegar aos cinemas. Mas a verdade é que o caso amoroso entre a inglesa Taylor, de 30 anos, em seu terceiro casamento e mãe de três filhos, e o galês Burton, de 36, também casado e pai de duas filhas, foi uma das razões para o fiasco das filmagens. Desde o dia 22 de janeiro, quando se encontraram pela primeira vez no estúdio italiano – Burton de ressaca, Liz louca para cuidar dele –, a atração entre os dois foi evidente para todos (inclusive para o marido da atriz, o crooner Eddie Fisher, sempre junto dela no set). O flerte tornou-se o grande assunto das colunas de fofocas nas revistas e jornais americanos. Quando a coisa esquentou para valer, a produção praticamente parou. Burton, que já era um sujeito movido a elevados teores etílicos, passou a beber ainda mais para afogar a culpa pelo adultério. Abatido, prometia voltar para a mulher, Sybil, mas sempre acabava desistindo, hipnotizado pelos olhos azul-violeta da inglesinha. Liz, por sua vez, repetia uma mesma rotina: ignorava o marido para ficar com Burton e depois, arrependida, implorava por uma reconciliação. Fontes ligadas à produção dizem que ela chegou a tentar o suicídio depois de uma briga. Recentemente, porém, o casal parece ter superado seus remorsos. Ao notar que o namoro fascinava e até divertia o público, o par problemático assumiu de vez o relacionamento, abandonando os respectivos cônjuges.

O desfecho não aliviou a situação do diretor Mankiewicz. Os pombinhos famosos faziam intermináveis pausas no almoço, aproveitavam longas noitadas e sumiam por vários dias seguidos na tentativa de escapar dos paparazzi de Roma. Mankiewicz mandou um bilhete à Fox em Hollywood: "Liz e Burton não estão apenas interpretando Cleópatra e Marco Antônio". Os executivos ficaram furiosos. A dupla era, de fato, culpada por uma fatia generosa do rombo orçamentário do filme. Mas a responsabilidade era também do próprio estúdio, que aceitou oferecer contratos nababescos aos protagonistas e perdeu o controle da produção. Elizabeth Taylor pediu, meio de brincadeira, um pagamento inédito: um milhão de dólares. Com o sucesso fabuloso de Gata em Teto de Zinco Quente, ela estava no auge, e já recebia convites demais. Para sua agradável surpresa, a Fox não disse "não" – e se propôs a negociar. Liz acabou lucrando ainda mais. Ficou assim: 750.000 dólares de cachê, 4.500 por semana para cobrir despesas pessoais e 50.000 a cada semana de atraso nas filmagens (que deveriam durar apenas quatro meses). A estrela exigiu ainda 10% da bilheteria, acomodações suntuosas, a contratação do próprio marido como assistente (por 150.000 dólares) e produção no exterior ("para pagar menos imposto", disse).

liz
O olhar fatal: Burton ficou de joelhos

Foi o início de uma cascata de atrasos e desperdícios. Primeiro, a Fox teve de esperar Liz concluir outro filme. Depois, por causa dos Jogos Olímpicos de 1960, precisou desistir de rodar em Roma, sede das competições. A saída escolhida foi mudar a produção para o estúdio Pinewood, na Inglaterra. Naquela época, o diretor de Cleópatra ainda era Rouben Mamolian (o favorito da Fox, Alfred Hitchcock, rejeitou o convite). Mamolian seria demitido meses depois, deixando míseros dez minutos de cenas concluídas. Explica-se: em Londres, Liz dividiu seu tempo entre uma luxuosa suíte do Hotel Dorchester e o hospital – sofreu uma infecção viral, contraiu meningite e, em março último, quase morreu em função de uma pneumonia (uma traqueostomia de emergência a salvou). Um mês depois, contando com a compaixão da Academia por seu drama pessoal, levou o Oscar de melhor atriz por Disque Butterfield 8. Com o prestígio em alta, Liz avisou à Fox que gostaria de ver Cleópatra entregue ao amigo Mankiewicz. O novo diretor imediatamente tirou o projeto da Inglaterra (onde chove demais e não há, evidentemente, paisagens egípcias ou romanas), descartou os gigantescos cenários já construídos, jogou fora os dez minutos rodados por Mamolian e rasgou o roteiro anterior. A Fox já havia torrado 7 milhões de dólares e Cleópatra ainda não tinha uma cena sequer.

Culto ao célebre - As coisas melhoraram pouco no Cinecittà, onde o affair entre Taylor e Burton não era o único escândalo do set. A desorganização dos americanos era tão grande que os funcionários italianos passavam meses recebendo salários sem ter o que fazer no estúdio. Os figurantes mais malandros apareciam no set, batiam cartão, saíam para fazer bicos na cidade e voltavam à noite, na hora de receber o pagamento do dia. Quando em Roma, faça como os romanos: os americanos também aplicavam seus golpes, cobrando faturas duplicadas, superfaturando pedidos e desviando rios de dinheiro dos cofres da Fox. A obra transformou-se num pesadelo para o estúdio. Em 1958, ao idealizar o projeto, a companhia pretendia usar Cleópatra justamente para recuperar suas finanças cambaleantes. O plano inicial era aproveitar um roteiro antigo, rodar tudo no próprio estúdio de Hollywood, concluir o trabalho em menos de um mês e gastar no máximo um milhão de dólares. A Fox queria usar uma atriz da casa, como Susan Hayward ou Joanne Woodward, ou uma opção relativamente barata, como Kim Novak ou as italianas Sophia Loren e Gina Lollobrigida. O produtor Walter Wanger, entretanto, bateu o pé para tirar Liz Taylor da Metro-Goldwyn-Mayer, apesar da reputação negativa da estrela nos bastidores de Hollywood.

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Demitida: Marilyn em seu último filme

Liz, diva impaciente e tempestuosa, tumultua quase todos os filmes de que participa – às vezes por causa do temperamento, outras em função da saúde frágil, resultado de um perigoso cotidiano regado a álcool e remédios. Também é famosa pelos ataques violentos de gulodice, em que come até não mais poder, seguidos por regimes de quase inanição, pelos quais acaba invariavelmente no hospital. O magnetismo da atriz na tela é inegável, mas até que ponto Hollywood é capaz de chegar para alimentar a febre hedonista de Liz e do resto de sua constelação? A indústria cinematográfica americana sempre cobriu seus grandes expoentes de fortuna e adulação, mas os disparates de Cleópatra mostram que, cada vez mais, o culto ao célebre derruba todos os limites. Curiosamente, o símbolo máximo dessa era de excessos em Hollywood foi vítima indireta dos caprichos de Liz. Em junho, Marilyn Monroe foi demitida de seu último filme, Alguém Tem de Ceder, justamente por causa do buraco provocado por Cleópatra nas contas da Fox. Marilyn, que também atrasou seu filme em função de problemas de saúde e sumiços jamais explicados, acabou sendo recontratada por exigência de Dean Martin, seu par na comédia romântica. Deveria retomar as filmagens neste mês. Foi encontrada morta no início de agosto – conforme a autópsia, foi um "provável suicídio" provocado por ingestão excessiva de barbitúricos. O filme, que ficou incompleto, jamais será visto (numa das cenas, Marilyn tornou-se a primeira grande estrela de Hollywood a tomar um banho de piscina completamente nua diante das câmeras). Seu cachê seria de 100.000 dólares. Numa entrevista publicada pela revista Life cinco dias antes de sua morte, Marilyn, ícone máximo do cinema na década passada, dizia, ao comentar a súbita demissão, que a "fama é tênue": "Ela sempre acaba indo embora, então adeus a ela".







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