Ministro Napoleão Nunes Maia Filho não viu "defeito" em decisão de desembargador.
Caio Canguçu havia mantido prisão de pai e madrasta da menina Isabella.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou na noite desta sexta-feira (16) o pedido de habeas corpus para Alexandre Nardoni e Anna Jatobá, pai e madrasta da menina Isabella, morta em 29 de março. O ministro do STJ Napoleão Nunes Maia Filho não viu "defeito" na decisão do desembargador Caio Canguçu de Almeida, que, na terça-feira (13), decidiu manter os dois na prisão.
Para Maia filho, a determinação do desembargador da 4ª Câmara Criminal expõe "com fundamento e lógica" a necessidade de tornar exceção "uma importantíssima conquista cultural (direito à liberdade), quando diante da situação em que outro valor, igualmente relevante, se ergue e se impõe como merecedor de prioridade", segundo nota no site do STJ.
A entrada com o pedido de habeas corpus no STJ foi feita na tarde desta sexta-feira (16) pela defesa de Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá. O casal está preso desde a amdrugada de 8 de maio. Nardoni está na enfermaria do Centro de Detenção Provisória de Guarulhos, na Grande São Paulo, e Anna Jatobá, na Penitenciária Feminina de Tremembé, no interior do estado.
A justiça e a esperança
Essa violência não é criação exclusiva de nossa sociedade contemporânea, mas se agrava em um mundo cada vez menos capaz de acolher a pessoa. É como se os avanços feitos por um lado, através de melhorias sócio-econômicas e educacionais, de maior respeito às individualidades, fossem corroídos de outro, pela desestruturação dos laços afetivos e de solidariedade – em função tanto da desumanização causada pela pobreza quanto de uma cultura incapaz de recuperar o sentido para uma vida coisificada/reificada e reduzida à vontade de poder e consumo.
Diante dessa violência explícita, um sentimento de afundarmos na barbárie, na dor do absurdo, parece penetrar nos corações. A violência parece ir contra um instinto natural que garantiu a sobrevivência da espécie desde sempre, parece evocar uma barbárie que nossa sociedade ilustrada e bem pensante havia varrido para os recônditos da ignorância e da pobreza. E diante do absurdo, bradamos por rituais catárticos de punição.
Talvez, um pouco de nosso clamor por justiça tenha algo a ver com o “segredo do padre Brown”, o sacerdote-detetive de G.K. Chesterton, que desvendava os crimes colocando-se no lugar do criminoso, pois até mesmo ele – saudado por todos como modelo de bondade e retidão – poderia cometer os crimes mais hediondos, pois o ser humano é contraditório, sempre capaz tanto do bem quanto do mal. Assim, nossa catarse supõe também esse momento de fúria consentida, no qual – em nome da justiça – pedimos a mesma violência que queremos erradicar.
Queremos justiça. Mas, se a justiça for bem aplicada, o máximo que parece poder garantir é que o criminoso não voltará mais a realizar o crime. Isso já é muito, mas ainda é pouco. Não resolve o vazio que está em nós. Aquele pedaço de humanidade, de sentido e de esperança, que nos foi arrancado quando tomamos consciência do crime continua ali faltando, clamando por alguma coisa mais, por uma outra justiça que transcenda nossos limites.
Queremos uma outra justiça, que recupere o que foi perdido. Mas isso parece impossível... Só o perdão e a esperança podem nos trazer justiça, só eles podem – de alguma forma – recompor uma parte dessa humanidade desfigurada que nos resta depois da tragédia. É a lição que permanece na sociedade brasileira há vários anos, dada por Massataka Ota, o pai do menino assassinado Ives Ota, que passou a dedicar-se a trabalhar com meninos carentes e – surpresa! – criminosos condenados como os que mataram seu filho. É bom lembrar que perdão não significa impunidade, mas sim que a justiça é praticada visando o bem de todos e não a vingança.
O perdão abre o caminho para a esperança, que – como lembra Bento 16 em sua encíclica "Spes salvi" – não pode prescindir da vida eterna, mas deve se basear em uma prova que acontece já aqui e agora. A esperança nasce porque o aparentemente impossível acontece, porque da tragédia pode nascer uma flor de amor e de paixão pela vida, porque aquilo que nosso coração mais desejava pode – ainda que de forma embrionária – acontecer.
Foram algumas religiões, particularmente o cristianismo, que mostraram ao homem esses aparentes paradoxos: que o perdão é mais poderoso e construtivo que a vingança, que a esperança pode nascer mesmo na tragédia. Trata-se de um dado histórico: foi necessário que alguém dissesse ao ser humano “eu o perdôo”, para que ele fosse capaz de perceber sua capacidade de perdoar aos outros.
O perdão e a esperança são experiências humanas, quem faz a experiência se convence delas. Trata-se de uma comprovação empírica, da adesão à proposta lançada por uma testemunha, por alguém que já fez a experiência, não por um discurso bem intencionado. Por isso, diante de tamanha violência e absurdo, precisamos desses encontros pessoais em torno de experiências que podem construir a esperança.
FRANCISCO BORBA RIBEIRO NETO, sociólogo e biólogo, é coordenador de Projetos do Núcleo Fé e Cultura da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo).
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