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segunda-feira, 26 de outubro de 2009

"Lula fecha os olhos para os direitos humanos"




O advogado de presos políticos na Venezuela, na Rússia, na Bulgária e na Guatemala diz que o presidente ignora os abusos de Chávez e Ahmadinejad
Juliano Machado e Helio Gurovitz

O banqueiro venezuelano Eligio Cedeño, de 44 anos, cumpre prisão preventiva desde fevereiro de 2007, acusado de fraude financeira. No dia 14, uma corte de apelações ordenou que Cedeño esperasse seu julgamento em liberdade. Ele não só não foi libertado, como poderá ficar na cadeia até meados de 2010. Na semana passada, o principal advogado de Cedeño, o nova-iorquino Robert Amsterdam, reuniu-se em Brasília com o presidente do Senado, José Sarney, e outros senadores para denunciar os abusos da Justiça venezuelana, controlada pelo presidente Hugo Chávez. Em entrevista a ÉPOCA, Amsterdam demonstra frustração pela posição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em relação ao regime de Chávez e ao do líder iraniano Mahmoud Ahmadinejad.


ENTREVISTA - ROBERT AMSTERDAM

Rogério Cassimiro QUEM É
Advogado de 53 anos. Nascido em Nova York, mudou-se aos 5 anos para Toronto, no Canadá. Casado, tem cinco filhos. Mora em Londres, onde é sócio do escritório Amsterdam & Peroff


O QUE FAZ
É especializado em advogar para presos políticos e companhias privadas, principalmente em países com governos autoritários. Um de seus principais clientes é o russo Mikhail Khodorkovsky, ex-magnata do setor energético e opositor de Vladimir Putin, preso há seis anos por acusações de fraude

ÉPOCA – Por que o senhor decidiu apelar para o Brasil no caso de Eligio Cedeño?
Robert Amsterdam –
Se há um homem no mundo que consegue “lavar” a reputação de Hugo Chávez, seu nome é Lula. Por isso achei importante visitar o Brasil e apresentar o caso Cedeño. Precisamos tirar a máscara de Chávez, acabar com o mito de que ele é o pai dos pobres na Venezuela. Eu fui a Brasília (pela primeira vez, em junho) e percebi que havia uma cortina de fumaça nas informações sobre Chávez. Agora, vou entregar aos senadores um relatório com documentação farta das pressões sobre o Judiciário para manter Cedeño preso. Uma delas é o testemunho da juíza Yuri López, cuja família foi ameaçada.

ÉPOCA – Como se deu essa ameaça?
Amsterdam –
Ela teve a coragem de aceitar uma representação de Cedeño contra dois procuradores por terem pedido a colegas a revisão do processo. A juíza foi afastada do cargo, e um de seus filhos sofreu uma tentativa de sequestro (Yuri López vive como asilada política nos Estados Unidos).

ÉPOCA – Que meios Chávez usa para controlar o Judiciário?
Amsterdam –
Há meios formais e informais. Funciona assim: juízes da Corte Suprema são grampeados e os procuradores federais não ocupam o cargo de maneira fixa. Há uma espécie de sistema rotativo. Se algum deles faz algo que desagrade aos chefes, é afastado. O sistema de trabalho dos juízes é semelhante. Não há garantias para um trabalho isento. Há alguns dias, uma corte de apelação decidiu que Cedeño deveria aguardar o julgamento em liberdade. Desde então, coisas estranhas aconteceram. O tribunal aonde fomos para ter acesso à ordem de soltura estava fechado. E procuradores entraram com um recurso pedindo explicações sobre a decisão só para ganhar tempo. Agora entramos com um pedido de habeas corpus.

ÉPOCA – O governo dificulta seu acesso a Cedeño?
Amsterdam –
Quanto a isso, não posso reclamar muito. Mas já passei por situações complicadas. Em minha última visita a Caracas, alguns minutos depois de meu desembarque, a notícia de minha presença no país estava na internet. Também fui vítima do que chamam de “hack and tap” (algo como “hackear e grampear” ). Eles hackeiam seu computador e grampeiam seu telefone. Na Rússia já fui até preso, mas, mesmo que os agentes do governo tenham me perseguido, me espionado, mantinham tudo em sigilo. Na Venezuela, eles divulgaram na TV uma troca de e-mails entre mim e dois advogados venezuelanos, cujo assunto era uma estratégia de defesa para Cedeño.

ÉPOCA – Como o senhor vê a posição do presidente Lula, que usa o argumento do respeito à soberania para não interferir nos problemas da Venezuela?
Amsterdam –
Respeito o presidente Lula e seu grande apoio popular. Mas ele é um intervencionista que finge não ser. A situação da embaixada brasileira em Honduras é de total violação de qualquer aspecto do Direito Diplomático, mas ele diz que não há intervenção. Lula vai receber (o presidente iraniano, Mahmoud) Ahmadinejad após uma repressão brutal contra estudantes iranianos em Teerã. E ainda há Chávez, o homem que certa vez disse publicamente para a polícia jogar “uma boa dose de gás” na cara de estudantes que protestavam em Caracas. Defendo presos políticos e o respeito aos direitos humanos em países subdesenvolvidos há 30 anos e nunca vi um líder, legítimo ou não, que tenha sido capaz disso. Não digo que Lula não seja consciente do perigo que Chávez representa, mas isso não adianta nada quando Lula diz haver democracia na Venezuela.

Vamos ser bem claros: não existe democracia na ausência da lei. E quem mais deveria estar ciente disso é Lula. Não se pode fingir que há eleições livres e justas num país em que as leis são interpretadas de acordo com a vontade de uma pessoa. A prisão de Cedeño é uma questão absolutamente política, pois ele manifestava apoio a opositores de Chávez, mesmo sem participação ativa. Para Chávez, deixar Cedeño na cadeia é uma questão de honra. Ele apresentou-se voluntariamente à polícia, de tão convencido de que era inocente (Cedeño era diretor de um banco que fez uma operação de câmbio para dar dólares a uma empresa na compra de computadores americanos. As máquinas não existiam. Ele afirma não saber da fraude na negociação, que recebera a autorização do governo venezuelano).

ÉPOCA – Como o Brasil pode ajudar?
Amsterdam –
Sou um dos que consideram (o ex-chanceler alemão) Gerhard Schröder um criminoso, por causa de sua defesa intransigente aos interesses da Alemanha com a Rússia. Schröder estava simplesmente dizendo que era preciso ser aliado de um Estado de terror, que trata seus presos políticos de forma brutal. Chávez é um dos poucos líderes que apoiam abertamente uma organização (as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) que sequestra pessoas e se financia com isso, além do narcotráfico. A última pessoa que Lula poderia apoiar no mundo é Chávez. O que Lula deveria apoiar é o respeito às leis e aos negócios limpos entre seus vizinhos, não esse Estado sem lei e completamente fora de controle. Chávez acredita que seu futuro está diretamente ligado ao de Lula. E Lula, hoje, está numa situação privilegiada: seu país tem grandes reservas de energia, uma economia estável e um papel de líder no eixo Sul-Sul. Tudo isso vai completamente contra o que vigora na Venezuela. Chávez não tem lugar nesse modelo.

ÉPOCA – O apoio de Lula a Chávez é injustificável, então?
Amsterdam –
É compreensível que o governo brasileiro tenha seus interesses na Venezuela. Não estou dizendo que Lula precise cortar as relações diplomáticas com Caracas. Mas lamento que Lula esteja aderindo a uma estratégia dos chineses e russos de não interferir em coisas horríveis a sua volta. Lula fecha os olhos para os direitos humanos, algo que transcende a questão da soberania nacional. Tivemos o caso recente do Irã, que executou estudantes, e, em seguida, Lula deu uma grotesca declaração de que eles eram uns perdedores (como no futebol). Agora que o Brasil virou sede das Olimpíadas e é reconhecido como força internacional, será que os brasileiros vão querer ver grandes protestos às vésperas dos Jogos por ser um país que apoia regimes desse tipo? Se o Brasil quiser mesmo o ingresso da Venezuela no Mercosul, é bom refletir sobre em que termos se dará essa inclusão.

”Lula diz haver democracia na Venezuela. Vamos ser claros: não há
democracia na ausência de lei. E Lula é quem mais deveria saber isso”










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