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quinta-feira, 18 de setembro de 2008

A extinta Cozinha dos Bandeirantes


Acredite: São Paulo tem uma cozinha típica e ela está acabando!

Por Rafael Andrade Jardim




Foto: Gabriel Oliveira/ Guia da Semana
SP x MG: Virado à paulista ou Tutu à mineira?

Em São Paulo você encontra de tudo quando o assunto é cozinha. Comida italiana, chinesa, japonesa, árabe, tailandesa. Na "Locomotiva do País", influências tanto daqui quanto de fora contribuíram para que o Estado virasse referência gastronômica aqui e até mesmo no exterior, já que é considerada a Capital Mundial da Boa Mesa.

Mas, se por um lado essa diversidade gastronômica permite aos comensais desfrutar de pratos típicos dos quatro cantos do globo, por outro esconde uma cozinha típica, desconhecida até mesmo dos paulistas. O próprio termo Cozinha Paulista, dito com a mesma força que cozinha mineira, cozinha baiana e até mesmo cozinha gaúcha, soa como novidade aos ouvidos, mesmo tendo esta culinária há muito tempo, logo após o descobrimento do Brasil e da fundação do Estado.

E com o passar do tempo, é cada vez mais difícil saborear a típica cozinha Bandeirante. Segundo a escritora e jornalista Regina de Paiva Ramos, autora do livro A Cozinha Paulista, "ela está desaparecendo pela forte influência da imigração". As massas, trazidas pelos italianos, os sushis, apresentados pelos japoneses, e as coalhadas, kibes e esfihas, dos árabes, conquistaram o paladar dos paulistas, fazendo com que pratos típicos fossem esquecidos pelas cozinhas de gerações passadas.


O sabor em segundo plano
A cozinha do Estado mais importante do Brasil teve três fortes influências. Índios, africanos e portugueses colocaram em uma mesma panela bacalhau, dendê e alimentos obtidos na natureza e deram início à culinária caipira. "Foi uma cozinha criada no lombo do burro", resume o chef Luiz Spagnolli. Ainda segundo ele, ela surge no início do século 16, com o ciclo do Bandeirismo e a atividade dos tropeiros. Daí o nome de um prato típico de São Paulo, o Arroz tropeiro.

Diferentemente da cozinha contemporânea, que busca o prazer pelo sabor, a culinária paulista primitiva foi desenvolvida por necessidade. Comia-se o que tinha e o que era mais fácil de preparar. "Era baseada em cereais e carnes curadas, que podiam ser transportadas em longas viagens feitas nos acampamentos", afirma Spagnolli. Os alimentos mais utilizados na época eram a farinha de milho, mandioca, o feijão, a moquecada, carne de caça e frutas desidratadas.

Foto: Gabriel Oliveira/ Guia da Semana


Dos navios negreiros chegaram pimentas, dendê e as inúmeras formas de utilizar o leite de coco. Nossos colonizadores desembarcaram aqui com a gordura, o açúcar e os peixes de outros mares. A esse cozido, os índios acrescentaram a mandioca, frutas e raízes. Todos esses ingredientes constituíram uma cozinha interiorana ou caipira.

Descendo a Serra e chegando ao litoral, encontra-se outra forte vertente da cozinha paulista, a Caiçara, boa parte dela baseada em frutos do mar. "Existe uma cozinha paulista do litoral, com pratos bastante característicos, mas que não se encontram mais em restaurantes", diz a escritora Regina.


Desbravadores
Não por acaso, quando se prova pratos típicos da cozinha paulista primitiva percebe-se no paladar a semelhança dela com a cozinha mineira atual. "Ela serviu de base para a formação da cultura gastronômica de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso", garante Spagnolli. A afirmação é comprovada em duas receitas idênticas, porém com nomes distintos: o Virado à paulista e o Tutu à mineira. "A diferença é que os mineiros sabem vender seu peixe e por isso difundiram sua gastronomia pelo País", opina.

Os pratos e receitas típicas do Estado de São Paulo foram levados a Minas e ao centro-oeste pelos Bandeirantes e Tropeiros. Alguns ingredientes hoje comuns em qualquer outra região do Brasil, como noz-moscada, manjericão e cebolinha, eram, naquele tempo, utilizados principalmente pelos paulistas.


Deixaram saudades
Não adianta procurar, pois alguns pratos típicos da cozinha paulista já não se encontram mais em nenhum restaurante do próprio Estado. O Virado à paulista, considerado o principal, felizmente ainda é achado com facilidade em muitos restaurantes. Porém, seu chará Cuscuz à paulista, não. Também não procure pela Paçoca de carne-seca, outra receita em extinção.

Pelos restaurantes do litoral paulista era comum pedir ao garçom o Azul Marinho (peixe com banana), o Escaldado de peixe com pirão e a Tainha na Brasa. "Hoje, essas receitas são preparadas apenas pelas famílias daquela região", conta Regina.

Outro prato que fez muito sucesso pelo interior do Estado foi Arroz com suã, que é o osso da costela do porco. "Hoje, se você pedir suã ao açougueiro, ele não conhece. Talvez só aqueles do interior, de cidades como Piracicaba e Sorocaba", relembra a escritora Regina.

REPORTAGEM

A extinta Cozinha dos Bandeirantes

Acredite: São Paulo tem uma cozinha típica e ela está acabando!

Por Rafael Andrade Jardim




Foto: Gabriel Oliveira/ Guia da Semana
SP x MG: Virado à paulista ou Tutu à mineira?

Em São Paulo você encontra de tudo quando o assunto é cozinha. Comida italiana, chinesa, japonesa, árabe, tailandesa. Na "Locomotiva do País", influências tanto daqui quanto de fora contribuíram para que o Estado virasse referência gastronômica aqui e até mesmo no exterior, já que é considerada a Capital Mundial da Boa Mesa.

Mas, se por um lado essa diversidade gastronômica permite aos comensais desfrutar de pratos típicos dos quatro cantos do globo, por outro esconde uma cozinha típica, desconhecida até mesmo dos paulistas. O próprio termo Cozinha Paulista, dito com a mesma força que cozinha mineira, cozinha baiana e até mesmo cozinha gaúcha, soa como novidade aos ouvidos, mesmo tendo esta culinária há muito tempo, logo após o descobrimento do Brasil e da fundação do Estado.

E com o passar do tempo, é cada vez mais difícil saborear a típica cozinha Bandeirante. Segundo a escritora e jornalista Regina de Paiva Ramos, autora do livro A Cozinha Paulista, "ela está desaparecendo pela forte influência da imigração". As massas, trazidas pelos italianos, os sushis, apresentados pelos japoneses, e as coalhadas, kibes e esfihas, dos árabes, conquistaram o paladar dos paulistas, fazendo com que pratos típicos fossem esquecidos pelas cozinhas de gerações passadas.


O sabor em segundo plano
A cozinha do Estado mais importante do Brasil teve três fortes influências. Índios, africanos e portugueses colocaram em uma mesma panela bacalhau, dendê e alimentos obtidos na natureza e deram início à culinária caipira. "Foi uma cozinha criada no lombo do burro", resume o chef Luiz Spagnolli. Ainda segundo ele, ela surge no início do século 16, com o ciclo do Bandeirismo e a atividade dos tropeiros. Daí o nome de um prato típico de São Paulo, o Arroz tropeiro.

Diferentemente da cozinha contemporânea, que busca o prazer pelo sabor, a culinária paulista primitiva foi desenvolvida por necessidade. Comia-se o que tinha e o que era mais fácil de preparar. "Era baseada em cereais e carnes curadas, que podiam ser transportadas em longas viagens feitas nos acampamentos", afirma Spagnolli. Os alimentos mais utilizados na época eram a farinha de milho, mandioca, o feijão, a moquecada, carne de caça e frutas desidratadas.

Foto: Gabriel Oliveira/ Guia da Semana


Dos navios negreiros chegaram pimentas, dendê e as inúmeras formas de utilizar o leite de coco. Nossos colonizadores desembarcaram aqui com a gordura, o açúcar e os peixes de outros mares. A esse cozido, os índios acrescentaram a mandioca, frutas e raízes. Todos esses ingredientes constituíram uma cozinha interiorana ou caipira.

Descendo a Serra e chegando ao litoral, encontra-se outra forte vertente da cozinha paulista, a Caiçara, boa parte dela baseada em frutos do mar. "Existe uma cozinha paulista do litoral, com pratos bastante característicos, mas que não se encontram mais em restaurantes", diz a escritora Regina.


Desbravadores
Não por acaso, quando se prova pratos típicos da cozinha paulista primitiva percebe-se no paladar a semelhança dela com a cozinha mineira atual. "Ela serviu de base para a formação da cultura gastronômica de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso", garante Spagnolli. A afirmação é comprovada em duas receitas idênticas, porém com nomes distintos: o Virado à paulista e o Tutu à mineira. "A diferença é que os mineiros sabem vender seu peixe e por isso difundiram sua gastronomia pelo País", opina.

Os pratos e receitas típicas do Estado de São Paulo foram levados a Minas e ao centro-oeste pelos Bandeirantes e Tropeiros. Alguns ingredientes hoje comuns em qualquer outra região do Brasil, como noz-moscada, manjericão e cebolinha, eram, naquele tempo, utilizados principalmente pelos paulistas.


Deixaram saudades
Não adianta procurar, pois alguns pratos típicos da cozinha paulista já não se encontram mais em nenhum restaurante do próprio Estado. O Virado à paulista, considerado o principal, felizmente ainda é achado com facilidade em muitos restaurantes. Porém, seu chará Cuscuz à paulista, não. Também não procure pela Paçoca de carne-seca, outra receita em extinção.

Pelos restaurantes do litoral paulista era comum pedir ao garçom o Azul Marinho (peixe com banana), o Escaldado de peixe com pirão e a Tainha na Brasa. "Hoje, essas receitas são preparadas apenas pelas famílias daquela região", conta Regina.

Outro prato que fez muito sucesso pelo interior do Estado foi Arroz com suã, que é o osso da costela do porco. "Hoje, se você pedir suã ao açougueiro, ele não conhece. Talvez só aqueles do interior, de cidades como Piracicaba e Sorocaba", relembra a escritora Regina.



Para saber mais

A Cozinha Paulista
Regina Helena de Paiva Ramos
Editora Melhoramentos
ISBN: 8506031966

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