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terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Coluna criticou em 2003 visita de #Lula ao ditador #Kadafi

Vale a pena ler de novo


Em 2003, quando o ex-presidente Lula foi a Trípoli, na Líbia, publiquei uma coluna criticando o tom da visita, mostrando o equívoco de se transformar um encontro para fazer negócios em visita de amigos.

Agora, o novo governo brasileiro tem a oportunidade de fazer de um outro jeito, estabelecendo diferenças entre ser cúmplice de uma ditadura como aquela e discutir relações comerciais. Vale a pena ler de novo.

Destacamos aqui um dos trechos dessa coluna, publicada no dia 12 de dezembro de 2003, que pode ser lida abaixo na íntegra:

- Democracia não se impõe, não se ensina, mas se defende como princípio e avanço civilizatório.

Princípio de Trípoli

O ministro Celso Amorim justificou as extravagâncias do último périplo presidencial dizendo que não se trocam princípios por produtos. Agora, só precisa explicar que princípios o governo brasileiro foi defender na tenda do ditador Muamar Kadafi. Seriam democráticos, comerciais ou morais? Qual deles se reforça com uma visita sem propósito, pé ou cabeça?

O ministro respondeu às cobranças de que o presidente deveria ter feito uma defesa dos ideais democráticos que professa e pratica dando uma resposta estranha: "Se negociar só com democracias, o Brasil vai ter fazer só comércio interno." O chanceler conseguiu, assim, ofender todos os países com os quais o Brasil comercializa, ao mesmo tempo. Para um diplomata, realmente, isso é uma proeza rara. Será que o ministro está se referindo aos países da Europa, com quem o Brasil tem 25% do seu comércio externo? Aos Estados Unidos, com os quais tem outros 25%? À Argentina, com quem o Brasil tem 7,5%? São todos ditatoriais como a Líbia, com quem o Brasil tem 0,07% do seu comércio?

Outra idéia defendida pelo chefe do Itamaraty é que a viagem é de negócios. Realmente a idéia de visitar países árabes é muito boa, mas falta explicar por que a Arábia Saudita foi excluída do roteiro por falta de tempo, e horas generosas foram concedidas à Síria e à Líbia. Sem tempo para conversar com um parceiro com o qual o Brasil tem um comércio de US$ 1,2 bilhão, o presidente do Brasil foi ter aulas de geopolítica numa tenda de propaganda do ditador da Líbia, visitar o túmulo do pai do ditador e jantar com convidados vindos diretamente da esquerda que fracassou, por incompetência, ao chegar ao poder. Para todos eles, é ótimo posar ao lado do presidente brasileiro; para Lula, essa companhia não lhe faz justiça.

O Lula é a nova esquerda. Ele não tem rigorosamente nada a ver com os companheiros aos quais a sua diplomacia tenta vinculá-lo. Lula fez carreira democrática, o PT ganhou o poder pelo voto e, ao chegar à Presidência, pagou o alto preço de adequar programa e políticas à demanda do eleitorado por estabilidade. Fez reformas que havia abjurado, elevou juros quando havia prometido derrubá-los, renovou o acordo com o FMI quando havia gritado "Fora!" ao organismo. Fez isso porque a população não queria explosão inflacionária, nem aventuras econômicas. O ministro Tarso Genro explicou de forma cristalina na entrevista que me concedeu esta semana: se fosse pelo caminho da ruptura, o governo Lula teria provocado crise, insegurança, como aconteceu na Venezuela, que perdeu 15% do PIB.

Lula e seus assessores internacionais têm justificado o constrangedor silêncio sobre os princípios democráticos nas visitas a ditaduras dizendo que o Brasil não deve interferir em assuntos internos destes países. Falta explicar, agora, por que o presidente Lula disse que o presidente Bush se arrependeu de haver invadido o Iraque e não declara isso porque o ano que vem é ano eleitoral. Quem deu a Lula o direito de interpretar o pensamento do presidente de outro país numa conversa exatamente com os inimigos do país do qual se fala? Isso sim é fazer comentários inconvenientes.

A idéia da não intervenção em assuntos internos é bem mais precisa do que parece. E o Brasil sempre respeitou isso. O que não significa silenciar-se diante de ditadores. Democracia não se impõe, não se ensina, mas se defende como principio e avanço civilizatório. Governantes democráticos, quando visitam ditaduras, falam com os opositores do regime, coisa que Lula não fez em Cuba, nem poderia fazer em Trípoli. Em Cuba, alguns escaparam do fuzilamento; na Líbia, não se sabe.

A mais patética das respostas - e a mais comum - quando falam o assessor internacional Marco Aurélio Garcia e o ministro Celso Amorim, é acusar seus críticos de um suposto "colonialismo". Qualquer pessoa que discorde da orientação desorientada da atual política externa é um subserviente aos interesses americanos. Tática comum para desqualificar o interlocutor, muito usada em meios estudantis.

A invasão do Iraque, o desrespeito ao Conselho de Segurança da ONU, o retrocesso civilizatório da apropriação de um país para dividi-lo, como um botim, entre os amigos, os atos e palavras do presidente George Bush são indefensáveis. O governo Bush aumenta o risco global. Até o suspeito especulador George Soros acha isso e quer gastar dinheiro para vê-lo longe do poder.

O Brasil usou os foros e formas adequadas para fazer essa crítica. Defendeu esse ponto de vista na ONU, o presidente Lula fez fortes declarações sobre o tema refletindo a média do pensamento nacional. E continuou defendendo em todos os foros internacionais a postura de repúdio à barbárie praticada. Tudo isso é defesa de princípios. Reunir-se com certos líderes árabes e, com eles, criticar os Estados Unidos e chamar Kadafi de velho amigo, aceitar as imposições do seu esdrúxulo protocolo não é exatamente defesa de princípios, é erro diplomático.

Esta viagem do presidente Lula tinha o roteiro errado, foi mal preparada do ponto de vista do cerimonial, provocou constrangimentos e riscos à imagem do Brasil. Na boa diplomacia, quando um presidente apresenta uma proposta, é porque ela já foi testada pelos escalões diplomáticas. Para usar uma imagem cara ao presidente, ele tem que entrar só pra chutar pro gol. Lula propôs uma reunião entre árabes e latino-americanos que foi desdenhada por Kadafi com um argumento irrefutável: há muita divisão entre os árabes. E, disso, entende ele, que não é aceito pela maioria dos líderes árabes.








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