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quinta-feira, 26 de março de 2009

Camargo Corrêa recebeu R$ 129 milhões do PAC

Camargo Corrêa recebeu R$ 129 milhões do PAC


A construtora Camargo Corrêa, alvo da operação Castelo de Areia, deflagrada ontem pela Polícia Federal para investigar crimes financeiros, recebeu do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) cerca de R$ 129,5 milhões nos últimos três anos. O valor coloca a construtora em 15º lugar na lista das 20 empresas mais bem contempladas com a prestação de serviços à União, por meio de obras e projetos do PAC. No total, essas empresas receberam R$ 5,5 bilhões para tocar obras do programa desde 2007 (veja a lista). O levantamento não inclui obras pagas com recursos de empresas estatais, estados e prefeituras.

Só no ano passado, a construtora do Grupo Camargo Corrêa recebeu R$ 102,7 milhões para executar obras do PAC, enquanto em 2007 recebeu apenas 20% desse valor por projetos do programa. Dentre as obras mais importantes tocadas pela empresa está a participação na construção da Ferrovia Norte-Sul, no estado de Goiás, em especial no trecho Anápolis-Uruaçu. Em 2008, por essa obra, a Camargo Corrêa recebeu R$ 44,1 milhões do Ministério dos Transportes. No ano anterior, R$ 20,6 milhões foram pagos à empresa por meio de obras do PAC, dos quais 98% eram relacionados à ferrovia. Já este ano, até o último dia 17, mais R$ 5,8 milhões foram pagos por serviços prestados nesta mesma obra.

A Ferrovia Norte-Sul deverá possuir extensão total de 2,2 mil quilômetros, cortando os estados de Goiás, Maranhão, Pará e Tocantins. O projeto tem R$ 1,7 bilhão previsto no orçamento 2009. Nos últimos dois anos, período de existência do PAC, a União desembolsou R$ 1,2 bilhão dos recursos do pacote econômico com a ferrovia, que deverá ser entregue em 2011. Até lá, a previsão de investimentos é de R$ 6,8 bilhões com a obra, tocada quase que integralmente pela Valec Engenharia, Construções e Ferrovias S.A., empresa pública vinculada ao Ministério dos Transportes.

Parte da implantação do perímetro de irrigação Platôs de Guadalupe, no estado do Piauí, também é tocada pela Camargo Corrêa. Pouco mais de R$ 4,9 milhões foram pagos por essa obra no ano de 2008. Outra grande obra sob responsabilidade do grupo é a construção do edifício-sede do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília. No ano passado, R$ 7,8 milhões foram pagos à Camargo Corrêa por esta obra, que não está incluída no programa de aceleração do governo federal. O edifício está orçado em aproximadamente R$ 500 milhões e a conclusão das obras está prevista para 2012.

Outro destaque envolvendo a Camargo Corrêa foi no ano passado, quando a empresa anulou o contrato para execução de um trecho de um dos maiores projetos do PAC: a transposição do rio São Francisco. O contrato era de R$ 219 milhões e as obras de responsabilidade da construtora abrangiam 54 quilômetros. Ao todo, a transposição é orçada em R$ 6,8 bilhões, incluindo projetos ambientais e de revitalização de áreas.

Financiamento de campanhas eleitorais

A Camargo Corrêa também está entre as maiores doadoras em campanhas políticas eleitorais. Segundo o Tribunal Superior Eleitoiral (TSE), só no pleito de 2006, a construtora doou R$ 6,9 milhões para dar uma guinada na campanha de diversos políticos que disputavam cargos tanto no Executivo quanto no Legislativo. Na lista dos agraciados estão os governadores de Minas Gerais, Aécio Neves (PSDB-MG), e Bahia, Wagner (PT-BA), além da senadora Roseana Sarney (DEM-MA) e o atual secretário do Trabalho no estado de São Paulo, Guilherme Afif Domingos (DEM-SP). A exceção de Wagner, que naquele ano recebeu R$ 200 mil da construtora, os demais citados receberam individualmente o valor de R$ 300 mil.

O Contas Abertas entrou em contato com todos os candidatos citados para saber a opinião deles a respeito do envolvimento da Camargo Corrêa na investigação da PF. No entanto, até o fechamento da matéria, apenas a senadora Roseana Sarney se manifestou. Ela disse que doações para sua campanha foram realizadas conforme a legislação e que não comenta eventuais problemas das empresas que lhe apoiaram no pleito eleitoral “até porque não é o candidato que administra a campanha”.

Outros nomes da política nacional, igualmente famosos e conhecidos, também estão relacionados entre os beneficiários das doações da Camargo Corrêa. Na prestação de contas do PSDB, por exemplo, a construtora aparece como a doadora mais generosa, com R$ 3,9 milhões repassados ao partido. Para o PT, a contribuição foi um pouco menor, R$ 2 milhões, além de R$ 1,5 milhão aos Democratas (ex-PFL).

Já em 2008, a construtora doou apenas R$ 2 milhões para os candidatos nas eleições municipais. Um quarto desse valor foi destinado à candidata à prefeitura da capital paranaense, Curitiba, Gleisi Helena Hoffmann (PT). Ela é a atual presidente do partido no estado. Mas o montante (R$ 500 mil), maior valor doado pela construtora a um só candidato, e sua popularidade entre os afetos do seu marido, o ministro Paulo Bernardo, do Planejamento, não foram suficientes para eleger Hoffmann.

Quem ficou com o segundo maior valor doado pela Camargo Corrêa, mas em compensação levou a reeleição ao cargo de prefeito de Curitiba, foi Carlos Alberto Richa (PSDB-PR). Richa recebeu R$ 300 mil da empresa em 2008, segundo informações do TSE.

O Contas Abertas também entrou em contato com os dois candidatos a prefeitura de Curitiba para saber a opinião deles a respeito do envolvimento da Camargo Corrêa na operação da Polícia Federal. Gleisi Hoffmann afirmou que as doações para a campanha no ano passado obedeceram à legislação. Quanto à acusação da PF contra a empreiteira, ela afirma não ter elementos para avaliar a situação da empresa, mas acredita que a polícia está cumprindo seu papel constitucional e que a Justiça também o fará. Já o prefeito eleito Alberto Richa não comentou o assunto.

Operação Castelo de Areia

Os principais crimes investigados pela Polícia Federal na operação deflagrada ontem envolvem evasão de divisas, formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, fraude a licitações, dentre outros. Segundo a Polícia Federal, uma quadrilha, infiltrada na construtora, movimentava dinheiro sem origem lícita aparente por meio de empresas de fachada e operações conhecidas como dólar-cabo - sem registro no Banco Central, por meio de depósito em conta brasileira de doleiros que possuem contas no exterior para transferência ao destino final do dinheiro.

O objetivo da PF era prender funcionários da construtora, além do articulador do esquema criminoso e dos doleiros identificados. No total, foram expedidos 10 mandados de prisão e 16 mandados de busca e apreensão. Somadas, as sentenças por esses crimes podem chegar a 27 anos de prisão.

Em nota, a construtora Camargo Corrêa se diz perplexa com a operação e que confia nos funcionários detidos, embora ainda não tenha acesso às informações da PF. “A Camargo Corrêa vem a público manifestar sua perplexidade diante dos fatos ocorridos, quando a sua sede em São Paulo foi invadida e isolada pela Polícia Federal, cumprindo mandado da Justiça. Até o momento a empresa não teve acesso ao teor do processo que autoriza essa ação”, apontou a empresa.

“O Grupo reafirma que confia em seus diretores e funcionários e que repudia a forma como foi constituída a ação, atingindo e constrangendo a comunidade Camargo Corrêa e trazendo incalculáveis prejuízos à imagem de suas empresas”, informou a construtora.

Amanda Costa e Milton Júnior
Do Contas Abertas

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