Tecnologia poderá ser utilizada com outros tipos de vacina, revolucionando as campanhas de imunização em todo o mundo.
15 de janeiro de 2012 | 23h 33
Alexandre Gonçalves, de O Estado de S. Paulo
Pesquisadores do Instituto Butantã e da Universidade de
São Paulo (USP) desenvolveram uma vacina para hepatite B que pode ser
consumida por via oral. Os testes em humanos devem começar ainda este
ano. A grande esperança é que a tecnologia também funcione com outras
vacinas que, por enquanto, só são administradas por injeção.
"Seria uma verdadeira revolução", afirma o pesquisador Osvaldo Augusto Sant’Anna, do Instituto Butantã, órgão ligado à Secretaria de Estado da Saúde. "A cobertura vacinal aumentaria muito, especialmente nos lugares mais pobres e distantes onde é difícil chegar com um profissional de saúde."
Ele recorda o impacto da vacina Sabin, de administração oral, na erradicação da poliomielite. "Poderíamos repetir o mesmo feito com outras doenças", pondera o cientista, que coordena o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Toxinas.
Sant’Anna orgulha-se da simplicidade da ideia que inspirou a nova vacina: utilizar nanotubos de sílica para "proteger" os antígenos (responsáveis pela imunização) do suco gástrico e garantir a eficácia do produto (mais informações nesta página).
A pesquisadora Marcia Fantini, do Laboratório de Cristalografia do Instituto de Física da USP, prepara os nanotubos de sílica que o cientista do Butantã utiliza nos testes com camundongos. A pesquisadora utiliza a nanotecnologia, estudo da manipulação dos materiais na escala molecular. Os nanotubos utilizados na vacina, por exemplo, têm um diâmetro de 8 nanômetros. Cada unidade equivale à bilionésima parte de um metro.
Marcia recorda que a ideia de trabalharem juntos surgiu de diálogos no ônibus fretado que ia de Campinas para São Paulo, em 2001. Por coincidência, os dois pesquisadores viajavam no ônibus com alguma frequência.
"Outros países – como Estados Unidos e China – também pesquisam aplicações médicas para nanotubos de sílica", conta Marcia. "Mas nós fomos os primeiros a patentear o uso dessas estruturas na imunologia."
Empresa. Em 2005, Sant’Anna apresentou resultados preliminares do estudo em um simpósio dentro do Instituto Butantã. A farmacologista Regina Scivoleto, que se aposentara da USP, estava na plateia.
Ao deixar a universidade, Regina tinha uma clara ideia do abismo que separa a pesquisa do desenvolvimento de produtos no País. Por isso, decidiu tornar-se alguém que identifica oportunidades e constrói pontes entre a pesquisa na academia e a indústria. Conversou com o pesquisador do Butantã no fim da palestra e se comprometeu a colocá-lo em contato com o Laboratório Cristália.
O presidente do Cristália, Ogari Pacheco, afirma que a empresa já investiu R$ 30 milhões na pesquisa. "Temos uma particularidade", afirma o empresário, que também é médico. "Além de financiar a pesquisa, também oferecemos conhecimento. Temos pesquisadores da empresa que participam das discussões e do desenvolvimento do produto."
Ele ri ao relatar a surpresa do pesquisador do Butantã quando soube que a empresa financiaria o projeto. "Ele me disse: ‘você é um ET", recorda. "(O cientista) já tinha batido em outras portas antes, sem resultado. Foi o melhor elogio que já recebi até hoje."
Pacheco afirma que já começaram as pesquisas para utilizar a tecnologia em vacinas para outras doenças.
A sílica é um dos compostos mais abundantes da crosta terrestre. Formada pela união do oxigênio e do silício, é usada na fabricação do vidro. Em estudo publicado em 2006 na revista Small, os cientistas já haviam comprovado que a sílica nanoestruturada atuava, em camundongos, como um vigoroso adjuvante – substância que acompanha a vacina para amplificar a resposta do sistema imunológico e, consequentemente, a proteção.
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