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sexta-feira, 3 de abril de 2009

O bilionário mais polêmico de Portugal

segunda fortuna do país, Joe berardo critica os dirigentes do sistema financeiro e será cada vez mais visto no Brasil pela sua incrível coleção de obras de arte

Luciano Suassuna, da Quinta dos Loridos

Sentado na cabeceira de uma mesa colocada na varanda da Quinta dos Loridos, vinícola a 75 quilômetros de Lisboa e uma das 15 propriedades que ele dispõe ao redor do mundo, Joe Berardo, 64 anos até o dia 4 de julho, fala a palavra "ações", fecha os dedos sobre os lábios, olha para o céu e abre a mão enquanto sopra. - Ações... puff.

Berardo tem a língua solta, como o presidente Lula, e é capaz de falar contra a banca como se fosse petista de carteirinha (leia quadro). "Lula faz me lembrar a mim próprio", diz Berardo.

"Ele fez na política o que eu fiz na economia." Ambos são migrantes que se fizeram sozinhos. Berardo parou os estudos na quarta série e deixou a Ilha da Madeira pela África do Sul, onde trabalhou como verdureiro e acabou por enriquecer ao recuperar minas de ouro desativadas. O surpreendente das suas declarações, contudo, é que ele é justamente um banqueiro.

Pela relação dos bilionários da revista Forbes, sua conta bancária emagreceu US$ 800 milhões de 2008 para hoje, basicamente em razão da queda dos ativos financeiros. "Royal Bank of Scotland, Citibank, perdi muito em toda a parte", diz. Ainda assim, ele perdeu menos que os outros - de quarta maior fortuna de Portugal em 2008, ele aparece agora como o segundo homem mais rico do país. Seu segredo: apesar de ter se beneficiado dos anos dourados do mercado acionário, Berardo nunca acreditou nos financistas. "Apanhei na cabeça com o (banco) BCP e o (banco) BPI por causa da extravagância dos bônus da diretoria", reclama. Como acionista do BCP, forçou a demissão do presidente Jardim Gonçalves, que alugava jatinho para passar o fim de semana em Nova York. Ao mesmo tempo, diversificou suas atividades para setores de mídia, enquanto se diverte com investimentos em vinhos e artes plásticas, duas de suas paixões.

JARDIM CHINÊS Buda da fertilidade e réplicas dos Guerreiros de Xian estarão disponíveis ao público em junho

É sob essa última condição que Berardo vai ser cada vez mais visto no Brasil. A partir do dia 22, 40 clássicos da sua coleção estarão em exibição nos museus de arte de São Paulo e do Rio Grande do Sul integrando a exposição 100 anos da arte francesa - 1860 a 1960, parte da comemoração do Ano da França no Brasil. Também prepara um museu em Barra de São João (RJ), perto de Búzios, onde vai instalar algumas das 500 peças de arte popular brasileira e africana, compradas recentemente de um colecionador nacional. "Quero participar do Brasil pela via cultural", diz. No início deste ano, ele passou seis semanas seguidas em São Paulo, para realizar no Hospital Albert Einstein uma cirurgia pioneira que o livrou da diabete. Emagreceu 15 quilos depois disto.

No contato pessoal, Joe Berardo esbanja bom humor, mas em Portugal é visto ora como um investidor agressivo, ora como um colecionador excêntrico. Tentou comprar o time de futebol do Benfica, mas acabou com apenas 1,5% das ações. No ano passado, colocou 45% de sobrepreço para levar a Sogrape, maior grupo vinícola do país, do qual já detém um terço. Até agora não recebeu resposta. "Mas não estou com pressa, o grupo paga bons dividendos", disse à ISTOÉ.

Na inauguração do museu Berardo, obrigatório para quem visita Lisboa, chamou a ministra da Cultura de "baby" (ela respondeu dizendo que não sabia o nome dele). Há cinco anos, anda apenas de preto ("até as cuecas", revela), sem gravata, em sinal de luto pela falta de consideração com a cultura - na realidade, ele se decepcionou com intelectuais que só estão nas artes "pela vaidade ou por interesse". Nesse momento, o ringtone de seu celular é a música Crazy, do rapper Gnarls Barkley.

Joe Berardo tem 40 mil peças, incluindo as coleções de selos, cartõespostais e caixas de fósforos que amealhou quando criança. Já emprestou obras para mais de 890 museus pelo mundo. Elas mapeiam 78 movimentos culturais do século XX. "Coleciono variedades para preservar", explica. "Nunca vendi um quadro." Mais que isso, criou uma associação responsável pela gestão desta coleção e colocou no estatuto que ninguém pode vender um quadro.

"Ninguém quer dizer meus filhos", diz Berardo com a franqueza característica. "Se eles quiserem, podem vender o título da associação." Casado há 40 anos com a mesma mulher, ele tem um filho e uma filha e cinco netos.

Desde 1969, quando comprou seu primeiro quadro - uma reprodução da Monalisa, que ele, como nada entendia, só descobriu não ser original porque sua mulher o alertou que a verdadeira estava no Louvre -, Berardo cultiva uma relação cada vez mais passional com a arte. Em março de 2001, estava ao lado do filho, Renato, quando viu pela televisão o Taleban destruir, no Afeganistão, as estátuas gigantes do Buda em pé, esculpidas no século V. Uma delas, com 53 metros de altura, era o maior Buda do mundo. A imagem do bombardeio deixou nele o mesmo vazio dos nichos que as abrigavam no Vale do Bamyan.

Era preciso fazer alguma coisa para preencher a lacuna, pensou.

Dois anos depois da destruição, Berardo embarcou para a China, onde encomendou réplicas de estátuas de Buda e dos Guerreiros de Xian. "São seis mil toneladas de pedra porque os Budas em pé tinham esse peso", diz. "Quis repor o que havia."

No início do verão europeu, as peças em granito e em mármore branco e rosa, que ocuparam 400 contêineres e levaram quase quatro anos para ser remontadas em Portugal, estarão abertas ao público na Quinta dos Loridos.

O ponto alto dos 30 hectares onde está o chamado Buddah Éden é um Buda da fertilidade, de 21 metros de altura, cujas 732 toneladas estão distribuídas em 278 peças fixadas apenas pelo encaixe e a força da gravidade.

Não deixa de ser intrigante como alguém tão zeloso com os negócios pode ser tão desprendido com os gastos em artes. "Investimento é uma coisa, cultura é outra", explica Berardo. "Se me dissessem que iam gastar 20 milhões de euros num Jardim Chinês, eu diria que são loucos." Tal como seus quadros ou Budas, Joe Berardo é assim, uma figura rara.

UM INVESTIDOR NO ATAQUE
Os responsáveis pela crise, segundo Joe Berardo

"Tive de apagar a tabuada. O que aprendi até hoje não serviu para esta crise. Pela primeira vez na vida, não vejo luz no fim do túnel"

"Todos nós fomos enganados. Os diretores dos bancos de investimento e dos hedge funds deveriam estar todos presos"

"Comprar derivativos é se colocar na boca do leão. E quem garante que esses papéis não vão começar a ser falsificados? Se fazem nota falsa, por que não vão fazer bond falso? É incontrolável"

"No momento, ninguém pode se considerar rico. É tudo um blefe"

"O (George) Soros é culpado por tudo isso. Quando atacou a libra, abriu a porta dos derivativos. Aí ninguém queria mais trabalhar. Soros deveria estar preso. Criou as apostas ilimitadas"

"(Warren) Buff ett também. Sua fundação é só para não pagar impostos"

"Já não levam mais um país, mas o mundo à bancarrota. Esses aí que fizeram a merda toda: (Bernard) Madoff, (Nick) Leeson (um operador que quase quebrou o Barings Bank, em 1995), Soros. Eles não têm responsabilidade. E agora, quem vai pagar o seguro desemprego, soldo da tropa, a educação pública?"

"As offshores são o câncer deste século. Deveriam ser ilegais. Aí não ia haver lavanderia. Mas os políticos não têm interesse em matar isso porque eles se beneficiam dos paraísos fiscais. Eu também, como tenho negócios, tenho offshore"

"A política é um sistema muito corrupto"

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