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sexta-feira, 3 de abril de 2009

Entenda como as medidas do G20 afetam o Brasil


O encontro reuniu líderes das 20 principais economias globais


Os integrantes G20, grupo que reúne os países ricos e os principais emergentes, deram mais um passo na tentativa de recuperar a economia mundial.

Reunidos em Londres, os mandatários do grupo concordaram em uma série de medidas, que somadas chegam a US$ 5 trilhões, até o final de 2010. De acordo com o comunicado oficial, esse esforço deverá resultar em um aumento de 4% do PIB mundial.

Algumas ações já haviam sido prometidas na reunião anterior, em Washington. Entre elas, maior rigor na supervisão e na fiscalização de instituições financeiras.

Entre as novidades do texto está uma força-tarefa contra os paraísos fiscais e o anúncio de mais verba para o financiamento do comércio mundial.

O comunicado de Londres também menciona a "economia verde". Ou seja, os países deverão acelerar a transição para uma economia de baixo carbono.

Entenda como algumas das medidas podem afetar o Brasil.

Mais dinheiro para o FMI

De acordo com o comunicado, o Fundo Monetário Internacional (FMI) será o principal canal de transferência de recursos aos países.

Para isso, os membros do G20 concordaram em expandir os recurso do fundo em US$ 750 bilhões. O objetivo é auxiliar os países na adoção de medidas anticíclicas.

Nos últimos dias, o Fundo anunciou uma nova linha de crédito, voltada para a recuperação econômica dos países. Batizada de "flexível", a linha ainda exige contrapartidas, mas as condições são consideradas mais simples.

O primeiro empréstimo já foi pedido: veio do México, que precisa de US$ 47 bilhões para aumentar o crédito às empresas e ainda gerar empregos.

Essa linha é uma reivindicação antiga dos países em desenvolvimento, entre eles o Brasil. Dentre os motivos está o fato de que os países em débito não precisarão cumprir metas fiscais, como em outras linhas no passado.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que o Brasil, a princípio, não precisará recorrer à nova linha do FMI. Por enquanto, o país vem adotando medidas anticíclicas que ainda podem ser implementadas com o caixa do governo.

No entanto, poderá beneficiar indiretamente o Brasil, por exemplo, ajudando países que importam produtos brasileiros.

Mais dinheiro para financiamento ao comércio

Considerado o principal motor da economia mundial, o comércio entre países já sente os efeitos da crise econômica.

Segundo a Organização Mundial do Comércio, o fluxo de bens e serviços deve cair 9% este ano, a maior queda desde a Segunda Guerra Mundial.

Uma das explicações para essa freada está na falta de crédito no mercado internacional.

Empresas importadoras e exportadores dependem fortemente de financiamentos. Com a crise, os bancos ficaram mais receosos, diminuindo o volume de dinheiro à disposição - a chamada "crise de liquidez".

O volume aprovado hoje pelo G20 poderá atenuar o problema, que atinge principalmente países que dependem das exportações, como o Brasil.

O governo brasileiro prevê uma queda de 20% nas exportações este ano. Se isso acontecer, o país voltará ao patamar de 2007.

Expansão fiscal

Segundo o Fundo Monetário internacional, os países precisam gastar mais. Essa seria a maneira mais eficaz para retomar o crescimento econômico mundial.

O Fundo sugere que os países gastem, em média, 2% do seu PIB em medidas fiscais, seja por meio de gastos diretos ou via redução de impostos.

Os países do G20 concordaram. No documento assinado hoje, eles se comprometem a adotar planos fiscais no valor total de US$ 4 trilhões.

A teoria econômica diz que os governos devem gastar mais em épocas de crise, mas os especialistas alertam para excessos, já que os gastos precisam ser compensados com economias. Caso contrário, o gasto de hoje se tornará a dívida de amanhã.

Entre os países do G20, o Brasil é um dos que menos adotou medidas com impacto fiscal. De acordo com levantamento do FMI, esses gastos no país correspondem a 0,5% do PIB. Pelos cálculos do governo brasileiro, essa relação é de 1,3%.

Os especialistas afirmam que a comparação é complicada. O economista Kevin Gallagher, da Universidade de Boston, diz que os investidores costumam ser mais desconfiados em relação a economias como o Brasil.

"Brasil e Estados Unidos são vistos de forma de diferente aos olhos do investidor, ainda que o déficit brasileiro seja bem menor", diz o economista.

Política monetária expansionista (juros menores)

Uma das principais armas no combate à crise, a política monetária também foi citada na declaração de Londres.

Os países do G20 reafirmaram o compromisso de adotarem políticas monetárias expansionistas, ou seja, com juros menores.

É nesse campo que o Brasil ainda tem muito a contribuir. Isso porque os juros no país, apesar dos últimos cortes implementados pelo Banco Central, ainda são um dos maiores do mundo.

Estados Unidos e União Européia, que já praticavam taxas de juros relativamente baixas, já não encontram mais espaço para reduções significativas

"Durante um bom tempo tivemos uma política monetária mais prudente, conservadora. Agora podemos reduzi-la. De certa forma é uma vantagem", diz o economista Felipe Salto, da consultoria Tendências.

No caso brasileiro, os juros altos - tão criticados - passaram a ser o grande trunfo. Espera-se que o país reduza ainda mais suas taxas, a fim de estimular o crédito e o consumo.

Maior supervisão do sistema financeiro

Os países do G20 concordaram que a falta de fiscalização e supervisão sobre o mundo financeiro foi a base da crise. Por isso, decidiram que é preciso apertar o cerco a essas empresas.

Além das instituições financeiras, o grupo de países também decidiu regulamentar e fiscalizar o trabalho das agências de rating.

Essas empresas são especializadas em avaliar e classificar outras empresas e governos de acordo com sua capacidade pagadora. Foi por meio das agências de rating, por exemplo, que o Brasil conquistou o "nível de investimento" (investment grade).

Os países do G20 também declararam guerra contra os paraísos fiscais. "A era do segredo bancário acabou", diz o texto. O grupo concordou em adotar sanções contra os países que não se adequarem às regras de transparência bancária.

Muitas empresas, inclusive brasileiras, costumam utilizar esses paraísos como forma de pagar menos impostos. Mas elas não deverão ter prejuízos, na avaliação do economista e ex-diretor do Banco Central, Carlos Langoni.

"Esse tipo de mudança é feita gradualmente. As empresas que têm conta nos paraísos fiscais terão tempo para se adaptar", diz o economista.

Segundo Langoni, de uma forma geral uma maior supervisão bancária será bem-vinda. "Os bancos brasileiros já são pouco alavancados (menos risco), mas o sistema mundial é integrado", diz. Ou seja, instituições mais sólidas lá foram também poderão beneficiar o sistema financeiro no Brasil.

Mais voz para os países em desenvolvimento

Houve finalmente consenso entre os países do G20 de que é preciso ampliar a participação de países pobres e emergentes no comando das instituições multilaterais, entre elas o FMI e o Banco Mundial.

Uma das recomendações do G20 é de que a reestruturação aconteça até 2011.

O Brasil tem sido um dos principais defensores dessa reforma. O governo brasileiro, no entanto, não definiu quanto o país pretende destinar ao Fundo, a fim de aumentar seu poder decisório.

Ainda assim, a medida pode ser considerada uma vitória para os países emergentes, na avaliação de especialistas.

Langoni vê uma certa carga de "retórica" nessa discussão, mas concorda que o Brasil deve, sim, aumentar sua participação no Fundo.

"Tem retórica também. Participa mais quem paga mais, e o Brasil ainda não disse quanto está disposto a pagar", diz.

"No entanto, o Brasil tem agora uma grande chance de participar mais. O FMI ainda é a grande instituição financeira mundial. Estar presente ali é também participar das decisões da economia internacional", diz o economista.

Compromisso com Doha e com livre comércio

Assim como na declaração anterior, assinada em Washington, a reunião de Londres também conclamou os países a resistirem a tentações protecionistas.

Uma das medidas sugeridas é a conclusão da Rodada Doha de comércio, que poderia impulsionar a economia mundial com US$ 150 bilhões ao ano.

Além disso, os países pediram maior transparência na adoção de medidas protecionistas. Segundo o texto, essas medidas devem ser evitadas. Mas se adotadas, deverão ser imediatamente notificadas à Organização Mundial do Comércio.

Como resultado, a OMC irá divulgar trimestralmente todas as medidas protecionistas adotadas por cada um dos países.

Um dos principais exportadores do mundo, o Brasil tem a ganhar com a decisão. O país tem sido um dos principais defensores da conclusão da Rodada Doha.

O Brasil não está entre os que adotaram medidas protecionistas. No entanto, seu principal parceiro comercial, a Argentina, vem recorrendo a medidas de proteção contra produtores brasileiros.

Estímulo a uma economia mais limpa

Ainda que de forma rápida, o documento do G20 fala da importância de que a recuperação econômica aconteça de forma "limpa". Ou seja, os países deverão estimular a economia, mas de olho nas mudanças climáticas.

Se o conselho for considerado de forma séria pelos países, o Brasil pode se beneficiar. O país é um dos maiores produtores mundiais de etanol de cana, mas encontra barreiras em outros países, como nos Estados Unidos.

No entanto, mesmo com o etanol, a recomendação do G20 também vale para o Brasil. Segundo especialistas, o país tem falhado em dar prioridade para uma economia de baixo carbono.

Uma das medidas do governo, o estímulo à venda de carros vai de encontro ao conceito de economia de baixo carbono.

A energia solar e a eólica, por exemplo, também não foram contempladas no pacote habitacional anunciado pelo governo.

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