[Valid Atom 1.0]

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Réquiem para um jornal


Autor(es): Paulo Moreira Leite e Fabio Motta
Época - 19/07/2010

Sem credibilidade, sem dinheiro e sem leitores, o "Jornal do Brasil" anuncia o encerramento de uma história de 119 anos

HISTÓRIA
A sede faraônica, que derrubou as finanças e toda chance de recuperação econômica do jornal. Ao lado, a primeira edição, de 1891

O que distingue um grande jornal de uma publicação vulgar é a capacidade de traduzir as verdades de determinada sociedade em determinada época, em vez de apenas publicar notícias e anúncios em papel impresso. Lançado em 1891, no Rio de Janeiro, o Jornal do Brasil sempre será lembrado como um dos melhores jornais brasileiros do século XX, ainda que, afogado em dívidas impagáveis, nos últimos tempos sua credibilidade tenha virado fumaça enquanto os leitores partiam em debandada.

Na semana passada, o destino do jornal provocou reações de choque e tristeza quando o empresário Nelson Tanure, seu dono atual, anunciou a suspensão da edição impressa do JB para manter apenas um site na internet, senha em geral empregada para preparar a morte de uma publicação.

Graças a uma equipe montada na segunda metade dos anos 50 do século passado pela condessa Maurina Pereira Carneiro, então proprietária da publicação, durante 30 anos o Jornal do Brasil foi uma das melhores escolas da imprensa feita no país. Num encontro feliz entre talentos especiais, espírito renovador e circunstâncias favoráveis, como a emergência de leitores capazes de consumir um jornalismo sofisticado, o JB lançou diversas mudanças positivas de conteúdo e de forma, que logo seriam copiadas pelos concorrentes.

As novidades de paginação, como uma diagramação generosa com os espaços em branco, serviram para dar destaque a repórteres e editores que, a partir de um olhar marcado pelo universo da Zona Sul do Rio de Janeiro, construíram um retrato bastante fiel de um Brasil às voltas com mudanças decisivas na vida pública e no cotidiano de cada cidadão. Com a criação do Caderno B, espaço privilegiado para a vida cultural, o JB contou o que foi a bossa nova e o Cinema Novo. Também participou de debates ideológicos e ajudou a educar os leitores com um competente departamento de pesquisa. Em 1968, o prestígio do jornal era tão grande que as passeatas de estudantes faziam questão de passar em frente à sede só para sair nas fotografias, diz um executivo paulista.

A decadência de um jornal com tantos predicados costuma inspirar duas linhas de explicação. A primeira sustenta que, embora o jornal tenha sido um aliado do golpe de 64, a atuação na denúncia dos abusos do regime transformou a publicação em alvo para a retaliação do governo dos generais, que impediram o grupo de explorar novos mercados de mídia ao negar seu acesso às concessões de TV. O outro argumento sustenta que, apesar das pressões políticas, os executivos do JB desperdiçaram toda chance de equilíbrio financeiro em mordomias gigantescas e decisões desastradas. Um ponto pacífico é que a construção de uma sede faraônica abriu um rombo sem saída nas contas do jornal. Qualquer que seja a causa maior, o desmanche do Jornal do Brasil reduziu à lembrança um título que poderia ser não apenas realidade, mas ainda um orgulho da imprensa brasileira.



๑۩۞۩๑๑۩۞۩๑๑۩۞۩๑๑۩۞۩๑๑۩۞۩๑


LAST

Sphere: Related Content
26/10/2008 free counters