O presidente estimula o auditório a apresentar reivindicações, sem medo e com pressa, porque dentro de um ano ele será um "rei posto". Há pouco tempo para a distribuição de bondades e para a formulação de promessas. Em dezembro de 2010 outra pessoa terá sido eleita para a Presidência. Há risco para o povo, mas também há esperança de continuidade: "Se for quem eu penso que vai ser, a gente pode trazer junto aqui para fazer promessa." Rei posto, sim - pois ele não se refere a si mesmo como "rei morto". O discurso é quase místico: "Não faço isso por bondade, faço isso porque está no meu sangue, nas minhas entranhas. Sei de onde eu vim e para onde vou voltar."
Quem se oporá, em princípio, à concessão de incentivo fiscal - crédito do IPI, neste caso - a quem converter resíduo em matéria-prima? Pode ser bom para o ambiente, para toda a sociedade e, de modo especial, para os catadores de lixo organizados em cooperativas. Falta saber se as empresas precisam desse estímulo para usar o material reciclável. É um detalhe técnico, mas disso o presidente não cuida. Não é assunto para comício. Seja qual for a seleção de materiais para uso incentivado, o lance eleitoral está feito.
Da mesma forma, a promessa de entrega de imóveis federais a moradores de rua não se cumprirá imediatamente. Foi formulada antes, pelo mesmo governo, e seu cumprimento mal começou, mas quem se lembra disso? Seja qual for a fidelidade aos compromissos, o presidente não tem motivo de preocupação. Sempre sobra um saldo político aproveitável e sempre se pode responsabilizar os inimigos do povo, se os benefícios não se concretizarem.
Mas pelo menos com dinheiro o presidente não tem de se preocupar. Todos os presentes prometidos no encontro com os catadores e moradores de rua são relativamente baratos. Mas não haveria grande problema, se fossem caros. O governo dispõe de uma enorme tributação para distribuir benefícios a setores e a grupos selecionados segundo seus critérios de conveniência - ou segundo seus interesses eleitorais.
Por isso o presidente Lula não admite discutir a redução da carga tributária. É indispensável, segundo ele, a um Estado forte. A alegação é falsa. Estados muito mais fortes que o brasileiro - mais eficientes na prestação de serviços e mais poderosos militarmente - são mantidos com impostos menos pesados. Em 2007, pelo menos 12 dos países da OCDE, o clube dos industrializados, tinham carga inferior à brasileira.
A excessiva tributação do Brasil é um fator de força não para o Estado, mas para o governante. Impostos pesados servem para pressionar, para ameaçar e para causar danos. Mas servem também para financiar a distribuição de favores, a cooptação de aliados e a competição eleitoral. Mesmo com a recessão e com a concessão de benefícios anticrise, a tributação brasileira continuou mais pesada que a da maior parte dos emergentes. Com a reativação, os incentivos desnecessários serão eliminados, anunciou o secretário do Tesouro, Arno Augustin. Estímulos distribuídos segundo o critério do governo poderão, de fato, ser dispensáveis a partir de agora ou em breve. Mas o problema essencial permanecerá: os produtores brasileiros são onerados por tributos incompatíveis com o investimento e com o aumento da competitividade. Se esses tributos forem reordenados de forma ampla e racional, o Brasil será um país mais forte. Mas o governante terá menos recursos para o exercício do arbítrio e do poder pessoal ou de grupo. O presidente Lula sabe disso e fez sua escolha.
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