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sábado, 22 de novembro de 2008

O guru do laxante


Professor de ioga de São Paulo é acusado
de pôr em risco a vida dos alunos com lavagem
intestinal e de praticar abuso sexual


Gabriela Carelli

Antonio Milena/AE

Chá não identificado
Oliveira: a técnica de desintoxicação mandou dezoito para o hospital e um para a UTI

A ioga, prática indiana associada à busca da tranqüilidade por meio de exercícios físicos e respiratórios, tornou-se o pano de fundo de um patético incidente policial. Num episódio ocorrido no início do mês e que só veio à tona na semana passada, dezoito jovens foram parar no Hospital e Maternidade Emed, em Caieiras, na Grande São Paulo, com sintomas de desidratação profunda, confusão mental e diarréia. Dois deles entraram em coma pouco depois de chegar ao hospital e um permaneceu por três dias na UTI. Os jovens foram vítimas de intoxicação hídrica causada por uma limpeza intestinal ministrada pelo professor de ioga Cristóvão de Oliveira, de 43 anos, dono do centro Vydia. Eles estavam hospedados no ashram – espécie de estúdio com quartos – mantido por Oliveira na Serra da Cantareira, iniciando um período de trinta dias de retiro espiritual para meditação e desintoxicação. Cada um deles desembolsou 3 000 reais pela temporada. O professor sugeriu aos alunos uma técnica "avançada" de limpeza corporal, que serviria para tornar os exercícios mais eficientes. Cada um deles tinha de ingerir entre 40 e 60 litros de água com laxante. Além de esdrúxula, a técnica inventada por Oliveira é perigosa. O rim humano tem capacidade para filtrar, no máximo, cerca de 8 litros de água por dia. Na quantidade administrada pelo guru da Cantareira, a água pode causar danos irreversíveis ao rim, lesões cerebrais, e levar à morte.

Cristóvão de Oliveira, um dos professores de ioga mais badalados do Brasil, que tem entre seus 200 alunos várias celebridades, como Luciana Gimenez e Fernanda Lima, foi indiciado por tráfico de drogas. No dia em que ocorreu a intoxicação, a polícia apreendeu dois frascos no estúdio. Um deles continha chá de sene, laxante encontrado em lojas de produtos naturais. O outro, um chá escuro não identificado. Ambos foram encaminhados para análise no Instituto Adolfo Lutz. A situação de Oliveira pode se complicar ainda mais nesta semana. Oito mulheres que estavam entre as vítimas da intoxicação dizem ter sido vítimas de abuso sexual pelo professor nos últimos dois anos. O advogado delas, Ismar Marcílio de Freitas Júnior, informa que pedirá a abertura de um inquérito policial por abuso sexual e prática ilegal da medicina o mais rápido possível. "Estamos colhendo informações para dar início ao processo, inclusive ouvindo os pais das vítimas", diz o advogado.

O abuso sexual, segundo o relato das moças a VEJA, ocorria durante as sessões de massagem aplicadas por Oliveira no retiro da Cantareira ou nos dois outros estúdios que ele mantém, nos bairros dos Jardins e Perdizes. As massagens, ao custo de 230 reais a sessão, constituem o ponto forte do trabalho do guru. A técnica pretende desatar os "nós emocionais" dos pacientes e provoca dor intensa. Vários ex-alunos do guru do laxante relatam ter saído das sessões com hematomas, distensões musculares e deslocamento ósseo. Uma das jovens que acusam o guru de abuso sexual durante as massagens, que prefere manter sob sigilo sua identidade, deu o seguinte depoimento a VEJA: "Comecei a praticar ioga porque estava perdida na vida. Saía muito, bebia e às vezes usava cocaína. Encontrei o Cris (Cristóvão de Oliveira), parei com tudo e durante cinco anos dediquei minha vida à prática da ioga. Neste ano, em janeiro, ele me chamou para receber massagens. Nessas sessões, a dor é desesperadora. Ele dizia que eu sentia dor porque era uma falida, uma coitada, que precisava sofrer para superar tudo. Na segunda semana de massagem, começou a tentar fazer sexo comigo. Afirmava que eu era perversa, que tinha problemas com a minha sexualidade e precisava deixá-lo me curar. Eu negava, mas ele insistia. Depois de três semanas, aconteceu".

Pedro Moreno, de 32 anos, aluno de Oliveira desde os 20 e seu sócio no centro de Perdizes, rompeu a sociedade no dia do incidente com o laxante. "Nos últimos meses começaram os rumores sobre o assédio sexual às meninas. Saí porque meu senso ético não combina com o que parecia acontecer lá dentro", ele diz. O arquiteto Mário Reinert, outro ex-sócio de Oliveira, desfez a sociedade em 2005, quando visitou a Índia. "Ao chegar lá, vi que a interpretação da ioga feita por Cris era totalmente equivocada", conta. Existem vários tipos de ioga. Oliveira afirma praticar a variedade ashtanga vinyasa, a que tem exercícios mais vigorosos e pesados, popularizada por artistas como Madonna e Sting. A ashtanga do guru da Cantareira, porém, é conhecida nos meios da ioga por ser excessivamente intensa, quase um treinamento militar. Na prática, Oliveira criou uma variedade particular de ioga – que, como agora parece ter sido comprovado, pode ter resultados desastrosos.

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