Sem folga, arquiteto diz que publicação é feita para os jovens
Clara Passi
À ocasião do centenário de Oscar Niemeyer, em 15 de dezembro, a enxurrada de reportagens publicadas versavam quase todas sobre o mesmo tema: o maior arquiteto que o Brasil já produziu completava um século de vida sem sair da prancheta. E se afirmava não só como um nome do passado, mas como referência da arquitetura feita hoje no mundo, assinando obras em lugares tão longínquos quanto o Cazaquistão. A prova cabal de que o gênio não pára veio há 10 dias, com o lançamento da revista Nosso caminho, simultâneo à abertura da exposição Oscar Niemeyer/projetos recentes, na Galeria Anna Maria Niemeyer, dirigida por sua filha, na Praça Santos Dumont, na Gávea. A prancheta de Niemeyer está mesmo fervilhando:
– A construção do Centro Administrativo do Governo do Estado de Minas Gerais, um projeto recente, já começou – enumera Niemeyer. – É uma obra tão importante que nove empresas já estão trabalhando em sua realização. O projeto de Avilés, na Espanha, também começou a ser construído. É uma praça que compreende um auditório e um museu. Tenho ainda em elaboração o projeto de um teatro de 2 mil lugares na Argentina e um centro cultural em Valparaíso, no Chile, todos já aprovados. Esses projetos estão contratados. O da Torre Digital de Brasília está sendo licitado para novembro.
"Isso não é usual"
Salvo o projeto para Minas Gerais, todos foram elaborados de lampejo nos últimos cinco meses.
– Isso não é usual – admite Niemeyer, sobre a intensidade da produção recente. – Sem contar o projeto de uma grande praça para a nova capital do Cazaquistão, Astana.
A exposição, que vai até o dia 30, traz esboços inéditos – que não estão à venda – da Torre de TV Digital e da Praça do Povo, em Brasília, do Centro Cultural de Valparaíso, no Chile, e do Projeto de Avilez, na Espanha.
Quem quiser ter um Niemeyer em casa pode arrebatar, por R$ 2 mil cada, desenhos figurativos da série Mulheres, editadas especialmente para a exposição. São duas imagens em serigrafia, com formato 50x70, com tiragem de 100 peças.
– Não me limito à arquitetura. E desenhar é uma das atividades que me ajudam a passar o tempo – revela.
Vera Lúcia Niemeyer, sua mulher, conta que já vendeu alguns desenhos. Ela se diz emocionada com o sucesso do lançamento da revista que dirige com o marido.
– Vendemos 300 exemplares só na noite de lançamento. Só tenho a agradecer os elogios à revista. Isso nos anima, dá esperança para prosseguir. Fiquei surpresa com a receptividade dos leitores.
O primeiro número da revista trimestral de 56 páginas teve tiragem de 5 mil exemplares e está à venda por R$ 30 nas filiais da Livraria da Travessa, na galeria e no escritório de Niemeyer, na Avenida Atlântica, em Copacabana, e traz, além de artigos sobre arquitetura, arte e cultura, trabalhos recentes dos arquitetos Jair Valera, João Cândido Niemeyer, João Filgueiras Lima (Lelé) e de Niemeyer. Não é a primeira incursão editorial do arquiteto. A revista Módulo, fundada e dirigida por ele, surgiu em 1955, mas sucumbiu à truculência do regime militar.
– A Módulo teve sua sede, meu escritório, invadida pelas forças do golpe. Sempre pensamos em retomá-la, o que fazemos agora com Nosso caminho – justifica Niemeyer.
Na opinião do arquiteto, a nova revista é "um veículo para os jovens se inteirarem melhor dos problemas da vida, do país e desta América Latina tão ameaçada":
– A Módulo era dedicada à arquitetura. Nosso caminho está voltada também para os problemas da vida, da política e deste mundo injusto que queremos modificar.
O passar dos anos parece não ter abalado o engajamento político do arquiteto, um dos baluartes da esquerda brasileira.
– Apesar de origem católica de minha família, cheia de preconceitos, mal saí para vida e compreendi o mundo injusto em que vivemos. Aos 20 e poucos anos já estava filiado ao Partido Comunista Brasileiro.
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