Os desmentidos em série da ministra, numa sessão com a imprensa originalmente convocada para que ela pudesse celebrar as realizações do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), foram pontuadas por um curioso adendo. Além de garantir que o governo não participou da venda da Varig - "não decidimos isso enquanto ministérios", declarou, no seu melhor burocratês -, disse que "estranhou" as denúncias. Afinal, comentou, a denunciante era vista com "consideração razoável" no governo, por ter trabalhado na própria Casa Civil, na gestão do ministro José Dirceu. Em outras palavras, dado o retrospecto, não era de esperar que Denise revelasse o envolvimento do governo em favor dos interessados em ficar com a Varig - clientes do advogado Roberto Teixeira, compadre do presidente Lula. Um deles, Marco Antônio Audi, informou ao Estado ter pago US$ 5 milhões por seus serviços. "Sua influência foi cem por cento decisiva", assinalou.
O fato é que o caso já não se resume a uma palavra contra outra. Tirando o gás das negativas da ministra, três outros ex-diretores da Anac - Leur Lomanto, Jorge Velozo e Josef Barat - confirmaram a versão da antiga colega. "Não sei se chamaria isso de pressão, mas o problema é que queriam culpar a Anac pela quebra da Varig", apontou Lomanto. "Acho que os advogados, os representantes da empresa, informavam algo ao Planalto, mas a realidade era outra. Eles não cumpriam as exigências." Velozo, de seu lado, disse acreditar que "o Planalto tenha se mobilizado para acelerar o caso Varig". Segundo ele, a Anac também achava que o processo tinha que andar. "Mas dentro da legalidade e da segurança." Por fim, Barat não tem a menor dúvida sobre a intromissão do Planalto: "O que aconteceu foi um exemplo bem didático de como não se deve agir com uma agência reguladora." Nem tampouco com outras instituições envolvidas, como se verá.
Ao se opor à intenção da diretora Denise Abreu, de exigir que os sócios brasileiros do fundo Matlin Patterson demonstrassem a origem dos seus recursos - alegando que neste país é muito comum as pessoas sonegarem -, a titular da Casa Civil afirmou que essa providência cabia ao Banco Central e à Receita. Por via das dúvidas, Denise pediu um parecer ao procurador-geral da Anac, João Elídio. No mesmo dia ele se manifestou, concordando com a ministra. O procurador teria dito a Denise que foi pressionado. Ele estava hospitalizado quando recebeu um telefonema da secretária-executiva da Casa Civil, Erenice Guerra. "O que eu soube", relatou a ex-diretora, "é que ele teria saído do hospital e ido a uma reunião na Casa Civil. Pouco depois, emitiu seu parecer."
O longo braço do Planalto alcançou também, com uma violência assombrosa, o então procurador-geral da Fazenda Nacional, Manoel Felipe Brandão. Contrariando a posição do governo, ele não admitia a possibilidade de os novos donos da Varig não herdarem as suas dívidas. "Em poucos dias", lembra Denise, "ele saiu da Procuradoria", sendo substituído pelo procurador Luís Adams. "Aí foi emitido um parecer garantindo que não havia sucessão de dívidas." Era o que queriam os clientes brasileiros de Roberto Teixeira (na mesma linha, aliás, do juiz Luiz Roberto Ayub, responsável pelo processo de recuperação judicial da Varig e cujas decisões causavam espécie).
Diante de tantas evidências a ministra Dilma só conseguia repetir sete vezes - o número do mentiroso - que são todas falsas.
Só perdeu a calma uma vez, quando lhe fizeram uma pergunta sobre a amizade entre Lula e Roberto Teixeira.
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