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sábado, 10 de maio de 2008

Um dândi abandonado (Entrevista com Fábio Assunção)

por André Bernardo TV Press

O ator Fábio Assunção costuma dizer que a beleza representou uma ameaça no início da carreira.

Por causa dos belos olhos azuis, ele parecia condenado a fazer sempre o papel de mocinho. Mas não foi bem assim.

Hoje, aos 29 anos, ele se orgulha de ter feito os mais variados tipos, como um vampiro sedutor em "Vamp", um mau-caráter em "Sonho Meu" e um mauricinho conservador em "Por Amor". Agora, Fábio está prestes a assumir o que acredita ser um dos papéis mais difíceis da carreira: o de fidalgo português em "Os Maias", a nova minissérie da Globo.

"Além de ser um personagem do Eça de Queirós, ele tem uma participação fundamental na história", orgulha-se.

De fato, a história de Carlos de Maia faz parte da espinha dorsal do romance escrito em 1888. O rapaz é abandonado pela mãe, que foge com o amante, perde o pai, que se suicida e é criado pelo avô.

Quando cresce, vai estudar Medicina na Universidade de Coimbra e depois de formado, retorna a Lisboa e se apaixona por Maria Eduarda, papel de Ana Paula Arósio, sem saber que ela é sua irmã.

DE TUDO UM POUCO - Fábio, hoje com 29 anos, se orgulha de ter feito os mais variados tipos de papéisPara compor o personagem, Fábio leu alguns livros de Eça de Queirós, assistiu a palestras sobre o escritor e teve aulas de etiqueta social para aprender, entre outras coisas, como sentar-se à mesa e como cumprimentar uma dama.

O arremate final ficou por conta de um par de lentes de contato na cor castanha. "No livro, o Eça não se cansa de fazer referências aos olhos castanhos da família Maia", justifica.

Além de satisfeito por estar fazendo um personagem de Eça de Queirós, Fábio não esconde a alegria por estar trabalhando com dois velhos amigos: o ator Selton Mello, com quem atuou em "Força de Um Desejo" ( QUE FARIA PAR COM ANA PAULA ARÓSIO , ESCOLHIDA PELO AUTOR,MAS JÁ ESTAVA COMPROMETIDA COM A NOVELA TERRA NOSTRA TB UM GRANDE SUCESSO ), e o diretor Luiz Fernando Carvalho, que o dirigiu em "O Rei do Gado". Mas, se Fábio esbanja cumplicidade cênica com Selton e Luiz Fernando, o mesmo não se pode dizer de Ana Paula Arósio. "Eu e a Ana ainda estamos nos conhecendo", observa.

Os dois ainda não fizeram uma cena juntos sequer e já foram convidados para repetir o par romântico em "Começar de Novo"( a novela ganhou o nome de O CLONE, ela seria Jade e ele faria os gemeos Lucas e Diogo e o clone Leo, e foi um enorme sucesso! ) , título provisório da próxima novela de Glória Perez.

P - Como você analisa o seu novo trabalho em "Os Maias"?
R - É óbvio que fazer um Eça de Queirós enriquece o currículo de qualquer ator. Mas sempre que começo um novo trabalho, me entrego a ele de corpo e alma. Honestamente, não saberia dizer qual dos trabalhos que eu fiz até hoje foi o mais importante. O resultado de uns pode não ter sido tão bom quando o de outros. Mas, no final das contas, sinto orgulho de tudo que fiz. Como me orgulho também por ter sido convidado para participar deste projeto. Mas sei que estou com uma "puta" responsabilidade nas mãos.

P - O que mais chamou a sua atenção no Carlos de Maia?
R - Foi o fato de ele não ter qualquer referência paterna ou materna na vida. O Carlos foi criado pelo avô. É um homem rico, que fala várias línguas e tem formação musical. Além disso, é um sujeito liberal, um autêntico dândi. Em Coimbra, ele faz amizade com um grupo de intelectuais que tece críticas à inércia de Portugal. A vida do Carlos só se transforma quando ele conhece e se apaixona por Maria Eduarda. Ela se transforma numa figura materna muito forte na vida do Carlos. Até o dia em que ele descobre que os dois são irmãos.

P - E o que acontece quando eles descobrem que são irmãos?

R - Eles têm mais uma noite de amor muito intensa. Mas não é uma noite de amor como outra qualquer. Eles transam quase que com raiva um do outro. A minissérie tem um apelo emocional muito forte. Mas ainda estou por gravar esta cena. Para falar a verdade, ainda não gravei uma cena sequer com a Ana Paula. Estamos nos conhecendo ainda. Daqui a uma ou duas semanas é que vamos pegar no pesado.

P - Você teve alguma preocupação especial na hora de compor o personagem?
R - Tive todas. O Carlos não é um personagem fácil de fazer. Costumo defini-lo como um dândi. Mas o que é um dândi? Para responder a essa pergunta, assisti a várias palestras para entender melhor o universo de Eça de Queirós. Essas palestras sempre funcionam como um ótimo suporte técnico para o ator. Mesmo assim, tomei cuidado para não cair em nenhum estereótipo. Não estou priorizando o exterior em função do interior. Apenas fiz o que o personagem pedia. Por isso mesmo, deixei a barba crescer. Naquela época, ter barba era sinal de status e poder. Não podia prescindir dela. Além disso, passei a usar lentes de contato...

P - O que você achou da mudança do visual?
R - Ficou bacana. Mas não recorri às lentes por vaidade ou coisa parecida. Não componho personagem por compor. Não vou colocar uma cicatriz no rosto só porque eu acho que fica bonito. Acontece que, no livro, o Eça menciona os olhos castanhos da família Maia a todo instante. Foi uma coincidência o Luiz ter convidado dois atores de olhos claros para interpretar o Carlos e a Maria Eduarda. Não foi uma jogada de marketing da parte dele. Em todo caso, foi bom porque o uso das lentes dá uma "fechada" na expressão facial. Tenho o rosto muito colorido. O olho é claro e a boca, vermelha. Com as lentes de contato, o meu rosto perde a cor. Até o olhar fica diferente...

P - O fato de ter gravado as primeiras cenas em Portugal, terra natal do Eça de Queirós, facilitou a composição?
R - Facilitou e muito. Eu já tinha ido uma vez a Portugal, mas só passei quatro dias. Desta vez, fiquei 30. Foi maravilhoso. Além do mais, "Os Maias" é leitura obrigatória em Portugal. Todo mundo conhece o livro de cor e salteado. Eu andava nas ruas e as pessoas vinham desejar boa sorte. Adorei ter gravado em Portugal porque você já começa o trabalho imbuído do personagem. Estivemos em lugares que foram mencionados por Eça no livro. Foi realmente inesquecível.

P - O seu último trabalho na Globo foi "Força de Um Desejo", do Gilberto Braga. Em algum momento, você ficou receoso por emendar dois trabalhos de época?
R - Sim e não. Fiquei em dúvida quando me chamaram porque "Força de Um Desejo" é da mesma época que "Os Maias". Mas resolvi fazer porque as histórias do Brasil e de Portugal são muito diferentes. O Brasil vivia a época da escravidão, a Guerra do Paraguai... Já Portugal era um mundo completamente diferente. Para mim, não faz muita diferença. Entre um trabalho e outro, fiz cinema, teatro, um monte de coisa. Pode fazer diferença é para o público que só assiste tevê.

P - Qual é a sensação de voltar a trabalhar com o Selton Mello, que interpretou o irmão do seu personagem em "Força de Um Desejo"?

R - A sensação é muito boa. O Selton é um ótimo ator. Na minissérie, interpretamos o melhor amigo um do outro. O Ega, por sinal, é uma espécie de alter ego do Eça de Queirós. Eu e o Selton nos damos muito bem. Dentro e fora da Globo. O Luiz Fernando Carvalho é outro cara com quem tenho bastante afinidade. Ele deixa o ator "pirar" em cima do personagem. Costumo dar as sugestões e ele só apara as arestas. É uma parceria bem proveitosa.

P - Você começou a carreira na tevê em "Meu Bem, Meu Mal", de 90. Que balanço você faz de uma década de carreira?

R - O melhor possível. Foram 10 anos muito bem vividos. Em 89, cursava escola de teatro em São Paulo e, no ano seguinte, já estava no Rio fazendo novela. A tevê sempre abriu muitas portas para mim. Tive milhões de oportunidades de trabalho. Algumas boas, outras nem tanto. Mas adorei tudo o que fiz. Nem sempre, em termos de resultado. Às vezes, o resultado não corresponde às expectativas. Mas, de todos os trabalhos que fiz, não posso deixar de mencionar "O Rei do Gado" como o meu favorito. É daquelas novelas que você guarda no coração para a vida inteira. Gostei muito também de "Por Amor" e "Labirinto"

P - E do que você não gostou?
R - Para ser franco, nunca tive o azar de "entrar numa furada". Sempre fui muito criterioso e pretendo continuar sendo. Por isso mesmo, nenhum trabalho me frustrou a ponto de eu reclamar: "Meu Deus, onde foi que eu errei?". Às vezes, a linguagem não é tão boa quanto a história. Outras vezes, a história não é legal, mas o personagem que você interpreta é. Ou seja: todo e qualquer trabalho tem seus prós e contras.

P - Você chegou a sofrer preconceito no início de carreira?
R - Cheguei. As pessoas costumam achar que um ator tem de ser feio para ser talentoso. Você, então, começa a chamar a atenção pela beleza, não pelo trabalho. Mas existe preconceito também com o ator que é gay, com o filho do ator famoso e assim por diante. Quando comecei na Globo em "Meu Bem, Meu Mal", já tinha cinco anos de teatro. Já tinha encenado Nelson Rodrigues e Plínio Marcos no teatro. Não quis fazer novela para abrir uma grife ou ficar rico. Quis fazer porque adoro a profissão.

P - Você se considera realizado profissionalmente?

R - Não sou rico. Vivo bem, com conforto. Não tenho qualquer investimento. Se parar de trabalhar, não tenho o que comer. Conquistei um nível de vida que todo mundo merece ter. Não acho que ganho mais do que mereço ou menos do que deveria. Para ser franco, se não pudesse atuar mais, ficaria extremamente infeliz.

Atividades paralelas

Há exatamente um ano, desde que "Força de Um Desejo" acabou, Fábio Assunção não aparece no vídeo.

Mesmo assim, ele não parou de trabalhar.

Em fevereiro, participou das filmagens de "Duas Vezes com Helena", de Mauro Faria.

No filme, ele interpreta Polidoro, jovem estudante que é induzido pelo professor, vivido por Carlos Gregório, a trair a própria mulher, papel de Christine Fernandes.

Dois meses depois, dublou o simpático Aladar no filme "Dinossauros", da Disney.

A atriz Malu Mader, que já trabalhou com Fábio em "Labirinto" e "Força de Um Desejo", emprestou a voz a Neera. "Nem vi aquilo como trabalho. Vi como diversão mesmo!", empolga-se.

Em junho, Fábio voltou a trabalhar com Malu em "Bellini e A Esfinge", adaptação de Roberto Santucci para o livro de Toni Belloto, marido de Malu e guitarrista do Titãs.

No longa, o ator interpreta "um detetive com jeitinho brasileiro". Paralelamente às filmagens, Fábio ensaiou também o espetáculo "Quem Tem Medo de Virgínia Woolf?", de Edward Albee. Apesar do corre-corre, ele adorou filmar nos lugares mais barra-pesada do Centro de São Paulo, como prostíbulos e delegacias.

Para o ator, o segredo da bem-sucedida parceria com Malu é o perfeccionismo. "Sempre trocamos informação e passamos os textos antes de gravar", analisa.

Em 15 anos de carreira, Fábio já atuou nas mais diferentes áreas.

Embora tenha se tornado conhecido graças à imagem de galã da Globo, o ator declara verdadeira paixão pelo teatro. "No palco, não existe fórmula.

Você nunca sabe o que pode dar certo e o que pode dar errado", reconhece.

Para ele, a tevê só não é perfeita porque o ritmo industrial não permite que o ator faça um trabalho minucioso gravando 20 cenas por dia.

Mesmo assim, ressalva que a capacidade de se comunicar com um público que não tem acesso ao cinema e ao teatro é a principal virtude da tevê. "Prefiro ter sucesso a ser famoso.

A fama tem um 'quê' de histeria. Já ter sucesso é ser reconhecido pelo talento", diferencia.

Desprezo pela fama

Antes de se tornar ator, Fábio Assunção sonhou em fazer sucesso como "guitar hero" de uma banda de rock.

Aos 15 anos, já empunhava uma guitarra no grupo Delta T.

Só que os acordes estridentes produzidos pelo rapaz não eram encarados com bons olhos - e ouvidos - pela família. Encorajado pelos pais, trocou os ensaios de música pelas aulas de teatro.

Em pouco tempo, passou a cursar Artes Dramáticas na Faculdade de São Caetano do Sul, em São Paulo.

Não demorou para estrear como ator profissional na peça "Beijo no Asfalto", de Nelson Rodrigues, em 85. "O palco é onde me sinto mais à vontade.

Adoro conversar com a platéia antes de cada espetáculo", conta.

Em 90, Fábio foi "descoberto" pela Globo e convidado para "Meu Bem, Meu Mal", de Cassiano Gabus Mendes.

Apesar de pequeno, o papel de Marco Antônio levou o ator a encabeçar o musical "Blue Jeans", de Wolf Maya.

Logo, Fábio passou a excursionar com o espetáculo pelo interior do país e a fazer bailes de debutantes em busca de uns trocados.

Por diversas vezes, Fábio Assunção teve de recorrer à escolta policial para fugir do assédio enlouquecido da multidão.

Com o tempo, o ator acabou percebendo que aquelas fãs não valorizavam o seu trabalho. Elas o viam apenas como um objeto em exposição. "Hoje, prefiro o assédio respeitoso àqueles puxões de cabelo", raciocina.

Atualmente, Fábio leva uma vida quase monástica.

Avesso a badalações, detesta lugares públicos, com muita gente e confusão. Prefere ficar em casa, tocando o piano recém-comprado. "De vez em quando, também componho e escrevo algumas letras", gaba-se.

Bem-humorado, Fábio não lembra da última vez que foi a um shopping.

O máximo que se permite é sair para jantar com a mulher, a modelo Priscila (hoje ex-mulher).

A mudança aparentemente radical aconteceu quando Fábio notou que tanta badalação só prejudicava o lado profissional. "Não estou condenando quem faz, mas chegou uma hora que decidi priorizar minha carreira de ator", jura.

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