Um terreno de 60 mil metros quadrados na esquina da Av. Miguel Yunes com a Av. Interlagos, zona sul da cidade de São Paulo
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Coordenadas: 23°41'5"S 46°41'23"W
Depósito da Nuclemon (São Paulo)
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Este local é um prédio
Especial Energia Nuclear -
CHAMADA: NO CAPÍTULO DE HOJE DA SÉRIE DE REPORTAGENS ESPECIAIS SOBRE ENERGIA NUCLEAR, VOCÊ VAI OUVIR A HISTÓRIA DOS TRABALHADORES DA ANTIGA USINA SANTO AMARO, OU NUCLEMON, EM SÃO PAULO. ASSIM COMO OS ACIDENTADOS DE GOIÂNIA, ESSES TRABALHADORES BATALHAM POR UMA ASSISTÊNCIA ADEQUADA DO ESTADO BRASILEIRO.
A Usina Santo Amaro, ou Nuclemon, funcionou por mais de 50 anos na cidade de São Paulo. O local servia para o tratamento químico da chamada monazita, um tipo de areia usado na obtenção de terras raras. Purificadas, as terras raras são utilizadas na fabricação de materiais para ressonância magnética nuclear, sensores, certos tipos de imãs, entre outros.
A obtenção desse tipo de material precisa ser monitorada com muita atenção porque um de seus subprodutos é um composto com alta concentração de elementos radioativos como urânio e tório.
As condições de segurança da Nuclemon, no entanto, eram insuficientes. Em 1991, um ano antes de a Usina Santo Amaro ser fechada por problemas de viabilidade econômica, a Câmara Municipal de São Paulo instalou uma CPI para investigar as instalações da empresa. Os resultados da investigação foram obtidos pelo Grupo de Trabalho da Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados criada, há dois anos, para analisar a segurança nuclear no Brasil. Segundo o grupo, o trabalho da CPI apontou que o armazenamento de rejeitos nucleares da Nuclemon oferecia risco aos trabalhadores da usina e à população vizinha às instalações. Também constatou que os funcionários da empresa haviam sido expostos a um nível de radiação desnecessário.
TRILHA MUSICAL
Durante décadas, os trabalhadores da Nuclemon sofreram contaminação crônica, por inalação continuada de poeira rica em urânio e tório. O material se alojou em seus pulmões e hoje eles correm risco de desenvolver doenças como câncer e silicose. O problema é que, desde o fechamento da Nuclemon em 1992, os funcionários da empresa não contam com qualquer assistência da Indústrias Nucleares do Brasil, INB, estatal responsável pela usina.
O físico Robson Spinelli foi funcionário da INB até janeiro deste ano. Ele explica que, quando foram demitidos por conta do fechamento da usina, os trabalhadores da Nuclemon fizeram exames que os consideraram aptos a seguir outra atividade. Spinelli reconhece, contudo, que esses testes não levaram em conta os efeitos tardios da radiação.
"Em muitos casos, os sintomas vão aparecer depois que o trabalhador saiu da empresa. A nossa legislação não está dando cobertura a esse tipo de ação que pode ocorrer com os trabalhadores, em particular na área de radiação. Esses trabalhadores, uma vez desligados no processo demissional, considerados saudáveis entre aspas, foram desligados da empresa e foram para o mercado de trabalho em busca de novas opções."
Mas a legislação brasileira deveria, sim, abranger esses casos. Desde a década de 60, o Brasil é signatário da Convenção 115 da Organização Internacional do Trabalho, que estabelece que os trabalhadores em instalações nucleares expostos a radiações têm de passar por exames periódicos, mesmo após a demissão. Porém, como a regulamentação da convenção até hoje não saiu do papel, a Indústrias Nucleares do Brasil não se sente na obrigação de cumpri-la.
A partir de 2003, um grupo de ex-funcionários da Nuclemon reuniu-se algumas vezes com representantes da INB em busca de uma solução negociada. Com a ajuda do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador em São Paulo, os trabalhadores organizaram dados sobre seu estado de contaminação. Ficaram cientes, ainda, de que a convenção 115 da OIT os amparava. Mas apesar das novas informações, a INB explicou aos funcionários que, como não havia uma lei obrigando o acompanhamento médico após a demissão, nada poderia ser feito, a não ser por via judicial.
Para pessoas idosas, com pouco dinheiro e, na maioria, doentes, o caminho da Justiça é complicado. José Venâncio Alves, de 56 anos, trabalhou 20 anos na Nuclemon. Ele conta que um grupo de 40 trabalhadores da antiga usina somente conseguiu entrar com um processo na Justiça, no ano passado, depois que um advogado aceitou tocar o caso sem cobrar. Venâncio se diz abandonado, ainda mais quando se lembra das difíceis condições em que trabalhava na Nuclemon. Segundo ele, ninguém sabia do risco que corria. Muitos eram, inclusive, analfabetos.
"O pessoal não sabia de nada. Ficou um pouco esperto com aquele acidente de Goiânia. Um pouco antes. Começaram a falar que aquilo era radioativo, que aquela área ali tinha radiação.
A médica Maria Vera de Oliveira, do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador, acompanha o caso dos ex-funcionários da Nuclemon desde 1991. Ela atesta que os trabalhadores enfrentam problemas auditivos e respiratórios por conta da atividade na usina. Há casos, ainda, de câncer. A médica defende que essas pessoas recebam o mesmo tratamento hoje dispensado aos atuais funcionários da Indústrias Nucleares do Brasil.
"A empresa, os trabalhadores atuais da empresa dispõem de convênio médico e acho que isso deveria se estender a esses ex-trabalhadores também. Facilitaria muito o controle a que eles devem ser submetidos. Nós temos alguns trabalhadores que têm diagnóstico de neoplasia e esperam meses para conseguir um exame, tem dificuldade para conseguir consulta.
Nesta sexta-feira, dia 28, os ex-funcionários da Nuclemon que entraram na Justiça contra a INB vão ter uma primeira audiência com representantes da estatal. José Venâncio Alves, que está entre esses trabalhadores, diz que eles não vão aceitar um acordo que disponibilize apenas assistência médica.
"Nós queremos indenização por conta dos danos de saúde. Estamos dispostos a bater o pé que a gente quer indenização competente com o sofrimento desse povo que trabalhou tanto tempo"
O grupo de trabalho da Câmara que analisou a segurança nuclear no Brasil reconhece como justas as reivindicações dos ex-trabalhadores da Nuclemon. O relatório final do grupo, votado em março deste ano, propõe a criação de uma lei que autorize a União a indenizar os ex-funcionários da empresa vítimas de danos nucleares. O grupo também apresenta projeto de lei para regulamentar a Convenção 115 da OIT, de forma a garantir aos trabalhadores expostos a radiações um acompanhamento adequado por parte da empresa onde são empregados, mesmo após sua demissão.
De Brasília, Ana Raquel Macedo
AMANHÃ, NA ÚLTIMA EDIÇÃO DA SÉRIE ESPECIAL SOBRE ENERGIA NUCLEAR, VOCÊ VAI SABER POR QUE A ATUAL ESTRUTURA DE FISCALIZAÇÃO NUCLEAR NO BRASIL É CONSIDERADA FRÁGIL. VAI CONHECER, AINDA, AS PROPOSTAS DA CÂMARA DOS DEPUTADOS PARA SANAR ESSE PROBLEMA.
segunda-feira, 24 de abril de 2006
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Comunidade e autoridades discutem destino de depósito de resíduos radioativos na Zona Sul
Agosto 30, 2005
Um terreno de 60 mil metros quadrados na esquina da Av. Miguel Yunes com a Av. Interlagos, zona sul da cidade de São Paulo, que pertence à INB (Indústrias Nucleares do Brasil, empresa ligada ao Ministério de Ciência e Tecnologia) guarda quase uma tonelada de resíduos -em forma de substância cristalizada- de processamento de material radioativo produzidos pela usina Santo Amaro (USAN) da extinta Nuclemon, que foi desativada em 1995. Como esse material foi parara lá? Há perigo para a comunidade? Esses assuntos foram abordados segunda-feira (29) na reunião do Conselho Comunitário de Segurança de Campo Grande.
Qual a origem desse material?
Robson Spinelli, gerente de qualidade ambiental da IBN, explicou que no processo de descomissionamento da unidade Santo Amaro, as máquinas foram transferidas para uma unidade da mesma natureza -em termos de matéria prima- na cidade de Campos (RJ). A matéria prima foi transferida para a unidade na cidade de Caldas (MG), onde havia uma mina de urânio, desativada em 1995. Mas no final do processo de descomissionamento, quando Itamar Franco, então governador de Minas Gerais, soube do transporte de "lixo radioativo" de São Paulo para Minas, baixou um decreto proibindo o transporte de lixo radioativo de outro estado para o estado de Minas. A atitude do governador Itamar Franco inviabilizou a remoção do material que ainda restava na unidade de Santo Amaro para a unidade de Caldas. Onde armazenar esse material? Essa foi o problema enfrentado na época.
Como esse material foi parar lá?
Na unidade Interlagos (USIN), de 1989 a 1992, aproximadamente, foi executado um processo de extração de minerais pesados, utilizando solventes, a partir de areias monazíticas. Um desses minerais, a monazita, tem na sua composição dois elementos radioativos naturais: tório e urânio. Mas Spinelli ressaltou: "Não estamos falando do urânio elemento combustível para um reator nuclear; estamos falando de urânio natural, que a crosta terrestre de nosso planeta tem 99% de concentração desse material". O resíduo desse processo está armazenado lá até hoje, junto com o material da USAN.
Há perigo de contaminação?
Spinelli garantiu que o material está armazenado adequadamente em bombonas plásticas, que encontram-se estocadas em um galpão lacrado, cujo acesso é restrito. Esse material, é radioativo? "É", segundo Spinelli. Qual tipo de radiação emitida? O urânio, particularmente, é emissor de ondas gama e alfa. "A radiação alfa é blindada até por uma folha de papel", segundo Spinelli, e as próprias bombonas oferecem proteção apropriada. "A radiação gama", explicou Spinelli, "assim como qualquer radiação eletromagnética, tem uma característica: quanto mais distante da fonte, menor a radiação". Spinelli garantiu que a radiação gama emitida pelos resíduos armazenados no local não chega aos limites do terreno e quem transita pelas avenidas Miguel Yunes ou Interlagos não sofrerá qualquer exposição.
Spinelli também informou que atendendo uma exigência da CETESB foram efetuados diversos estudos em toda a extensão do terreno para ver se havia contaminação química do solo ou da água, e foram detectados níveis de radiação natural. a nenhuma contaminação. Spinelli garantiu: "Não há contaminação de nosso solo".
Nuclemon
O deputado Ítalo Cardoso (PT/SP), presente à reunião, relatou que em 1992, quando era dirigente do Sindicato dos Químicos, conseguiu demonstrar que a Nuclemon -empresa com a qual sempre teve uma relação "difícil e truculenta"- estava "matando seus trabalhadores de forma irresponsável": exames nos funcionários da empresa detectaram a presença de urânio e tório nas fezes de vários trabalhadores. A Justiça concedeu, então, o direito que os trabalhadores fossem monitorados durante vários anos após seu desligamento da empresa. "Muitos continuam sendo monitorados até hoje, mesmo depois de dez anos que essa empresa fechou suas portas aqui", disse.
(In)Tranqüilidade
Quanto à liberação do terreno da Nuclemon, na Av. Santo Amaro, para uso irrestrito, "para construir inclusive residência", Cardoso questionou: "por que, então, se era tão tranqüilo assim, fizeram a raspagem de cinqüenta centímetros das terras da USAN?. E adivinha para onde levaram? Para cá", referindo-se à usina Interlagos. Quanto aos moradores do condomínio sendo construído no local, Cardoso afirmou: "Também lá eles não tem segurança. Por que ninguém diz o que foi feito com as terras extraídas da escavação para a fundação dos prédios?". Cardoso finalizou: "Eu não teria tanta segurança de dizer que estou numa área tranqüila". Cardoso lembrou do caso da Shell, e de "tantas outras situações onde foi dito que poderiam ficar tranqüilos. Eu não fico tranqüilo", reafirmou.
Vazamento
Cardoso denunciou que já houve vazamento do material armazenado na USIN, devido à perfuração das bombonas provocada pela expansão dos gases gerados pela água injetada para cristalizar os resíduos, e questionou -apesar das afirmações de Robson Spinelli- a eventual contaminação da água do subsolo.
Refrigerantes contaminados?
Guilherme Frontini, representante da Distrital Santo Amaro da Associação Comercial de São Paulo, denunciou que durante vinte anos a Pepsi Cola ocupou um terreno anexo ao da Usina Interlagos, e captou água de poços artesianos para fabricação de refrigerantes.
A palavra da CETESB
Ronald Magalhães, representante da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental CETESB, ligada à Secretaria do Meio Ambiente do governo de São Paulo, informou que somente a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEM) tem atribuições para lidar com a questão radioatividade nas instalações da empresa. Quanto à área externa, há dois aspectos: o monitoramento da questão radiológica em ambientes externos, e o estudo de passivo ambiental. Magalhães garantiu que foi feita uma "malha densa de amostragem", procurando dados de solo e água subterrânea na região de estudo, e "os dados preliminares indicam que não há contaminação da área". A CETESB está avaliando, atualmente, os procedimentos que levaram a tais conclusões, "o que é de praxe", explicou, para emitir um parecer definitivo quanto a essa área. Quanto à radioatividade, a CETESB apenas analisa os relatórios enviados pela INB, que se referem a coletas feitas pela própria empresa em poços, e não há indícios de contaminação por rádio 226 e rádio 228.
Remoção
Spinelli enfatizou que a INB tem interesse "em tirar esse material dali". Mas confessou que o principal problema é encontrar um destino apropriado para os resíduos armazenados na USIN. Barros Munhoz, subprefeito de Santo Amaro, comprometeu-se a falar com o prefeito Serra sobre o caso. Já Ítalo Cardoso convidou as autoridades e representes comunitários a comparecer à reunião que realizar-se-á com o Ministério Público na próxima quinta-feira para discutir o assunto. Pelo empenho demonstrado pelas autoridades em acabar com o depósito, parece provável que em pouco tempo a aventura nuclear seja nada mais uma página na história da zona sul.
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