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sábado, 16 de outubro de 2010

Sequestro de Abilio Diniz também teve participação de estrangeiros

03/02/2002 - 00h54

A polícia de São Paulo acredita que um grupo de seis estrangeiros (possivelmente seis chilenos) está ligado ao sequestro do publicitário Washington Olivetto. Se confirmado, não será a primeira vez que um grupo de estrangeiros sequestra empresários brasileiros.

Na manhã do dia 11 de dezembro de 1989, o empresário Abilio Diniz, do grupo Pão de Açúcar, foi sequestrado quando se dirigia a seu escritório.

Os sequestradores usaram uma Caravan disfarçada de ambulância para bloquear o caminho do empresário, nas esquinas das ruas Sabuji e Seridó, no Jardim Europa (zona sudoeste de São Paulo). Pediram resgate de US$ 30 milhões.

A Caravan foi abandonada no Morumbi (zona sudoeste). Um cartão de uma oficina mecânica foi a primeira pista encontrada pela polícia, que prendeu o chileno Pedro Segundo Solar Venega.

A partir dessa prisão, foram identificados mais cinco participantes do sequestro, que foram encontrados em um apartamento no Jabaquara (zona sudoeste).

Com as informações dadas pelos detidos, a polícia encontrou o cativeiro do empresário.

No dia 17 de dezembro, após um cerco de 36 horas, os dez sequestradores _quatro chilenos, três argentinos, dois canadenses e um brasileiro_ se renderam.

Eles pertenciam ao MIR (Movimento de Esquerda Revolucionária), do Chile. Eles foram condenados a penas de 26 a 28 anos. Graças a um acordo de troca de presos entre o Brasil e o Canadá, aprovado pelo Congresso, os canadenses David Spencer e Christine Lamont foram extraditados para o Canadá.


a Folha Online e do Banco de Dados

Movimento de Esquerda Revolucionária

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
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O Movimento de Esquerda Revolucionária (em castelhano Movimiento de Izquierda Revolucionaria, MIR) foi fundado em 15 de agosto de 1965, reunindo militantes da Juventude Socialista, da Juventude Comunista e dois pequenos agrupamentos que atuavam na Universidade de Concepción, a Vanguarda Revolucionária Marxista e o Grupo Granma. A tese central do MIR era apoiar o caráter socialista da Revolução Chilena e a necessidade de fazer frente às ações terroristas praticadas pela Patria y Libertad - entidade neofascista, criada em 1970 pela extremadireita chilena e apoiada pela CIA - formulando uma estratégia dotada de instrumentos político-militares, capaz de recorrer a todas as formas de luta, inclusive o terrorismo, para evitar a derrubada do governo Allende.

Influenciados pela Revolução Cubana, desde 1967 praticaram guerrilha urbana e campesina. Reconhecido como partido durante o governo de Salvador Allende, voltou à clandestinidade e às ações armadas após o golpe militar de Augusto Pinochet (1973). Em abril de 1986 surgiu o MIR-político e o MIR-militar.

Em 1989 o grupo sequestrou o empresário brasileiro Abílio Diniz (Fonte: ISTOÉ - Saindo das trevas ). O grupo participa do Foro de São Paulo.






Em 1989, sequestro de Abílio Diniz foi relacionado ao PT e desmentido logo após eleições, mostra pesquisa


Por: Redação da Rede Brasil Atual

Investigação apontou que não houve envolvimento do Partido dos Trabalhadores no sequestro de Diniz. Envolvidos acusaram polícia de obrigá-los a vestir camisa da campanha de Lula

São Paulo - A cobertura da mídia sobre o sequestro do empresário Abílio Diniz, executivo do grupo Pão de Açúcar, em 1989, foi decisiva para o resultado do segundo turno das eleições, em que concorriam Fernando Collor de Mello (PRN) e Luís Inácio Lula da Silva (PT). A conclusão é da professora de comunicação Diana Paula de Souza que realizou a pesquisa "Jornalismo e narrativa: uma análise discursiva da construção de personagens jornalísticos no sequestro de Abíolio Diniz e suas repercussões políticas".

Jornais da época suscitavam envolvimento do PT na ação, usando fontes da polícia. Após a vitória de Collor, as acusações foram desmentidas. O estudo analisou os jornais O Globo, Jornal do Brasil (JB) e Folha de S. Paulo, de 17 a 20 de dezembro de 1989.

O sequestro de Diniz aconteceu em 11 de dezembro de 1989, por integrantes do Movimento de Esquerda Revolucionária (MIR), mas só foi revelado após a libertação do executivo, no dia 16 de dezembro, véspera do segundo turno da primeira eleição direta no Brasil, pós-ditadura.

Segundo a pesquisadora, no dia 17 de dezembro começaram os "relatos jornalísticos sobre material de propaganda política do PT que teria sido encontrado junto com os sequestradores". E logo no início das investigações "percebe-se um esforço dos veículos para estabelecer uma conexão entre o sequestro e o então candidato à Presidência da República, Luís Inácio Lula da Silva", como no trecho de O Globo do dia 18 de dezembro. "Tuma assegurou que os terroristas integram duas organizações de extrema esquerda no Chile - Movimento de Esquerda Revolucionária (MIR) e Organização de Resistência Armada (Ora) e que em poder dos que foram presos foi apreendido material de propaganda política do PT".

Diana descreve que apesar da aparente objetividade do jornal, que atribui as informações a uma fonte principal, Romeu Tuma, há uma associação entre terrorismo, movimentos de esquerda e o Partido dos Trabalhadores. "A publicação faz uma ligação sutil do PT com o MIR e o ORA, já que se refere aos três organismo na mesma frase, sugerindo que o PT teria ligação com as organizações guerrilheiras". Os jornais citam também que camisetas e faixas do PT teriam sido encontradas com os sequestradores, mas que isso não seria indício de envolvimento do PT com o sequestro.

Por outro lado, Diana cita que Fernando Collor de Mello, concorrente de Lula no segundo turno, "teve o apoio de Roberto Marinho, dono das Organizações Globo, o que se refletiu no jornalismo praticado pelos veículos de comunicação do grupo". "O exemplo clássico foi a edição do Jornal Nacional que se seguiu ao último debate entre os dois candidatos, realizado no dia 14 de dezembro de 1989", descreve a pesquisa.

O estudo também reproduz um trecho do JB que de forma semelhante a O Globo destaca uma possível ligação do MIR com o PT. "Além da casa da Rua Ilashiro Miazaki, a polícia informou ter invadido um apartamento nas proximidades (Rua Charles Darwin), onde morariam os sequestradores que já estavam presos, e lá teria encontrado panfletos do MIR, propaganda eleitoral da campanha de Luís Inácio Lula da Silva, agendas com telefones de dois líderes petistas, o vice-prefeito paulistano Luiz Eduardo Greenhalgh e o vereador Eduardo Suplicy, presidente da Câmara Municipal, e de Airton Soares, do PDT. Foi encontrada também, segundo a polícia, uma barraca com ventilação no teto, que teria sido usada no sequestro do publicitário Luiz Sales, libertado no início de outubro após pagamento de um resgate de US$ 2,5 milhões. Ainda no final da tarde, o ministro da Justiça, Saulo Ramos, que acompanhava o caso através de telefonemas a cada 10 minutos, afirmou não ter nenhuma informação sobre a agenda".
Cobertura foi decisiva

Mario Sérgio Conti, em seu livro Notícias do Planalto: a imprensa e Fernando Collor, afirma que a eleição foi decidida na última semana, momento "em que a imprensa esteve envolvida nos fatos principais". Para Conti, o sequestro de Diniz está entre os fatores que podem ter contribuído para a eleição de Collor e derrota de Lula.

O autor, uma das fontes de Diana, narra que "na manhã de domingo, o dia da eleição, O Estado de S. Paulo noticiou na primeira página que 'um padre da zona sul, simpatizante do PT, foi avalista da casa alugada pelos sequestradores'. Fleury deu uma entrevista ao jornal dizendo ter sido encontrado material de propaganda petista numa casa alugada pelos sequestradores. O Estadão transcreveu declarações de Saulo Ramos e Romeu Tuma negando que houvesse qualquer evidência de que os criminosos fossem ligados ao PT. Saulo Ramos levantou a hipótese de que os bandidos espalharam material de propaganda petista na casa para que, se fossem presos, se beneficiassem das penas mais brandas que a lei estabelecia para os crimes com motivação política. Uma das reportagens de O Estado relato que Alcides Diniz, irmão do sequestrado, sustentava que o PT participara do sequestro. Mas a reportagem não esclarecia que Aldes Diniz era amigo de Leopoldo Collor e se engajara na campanha do candidato do PRN. A principal manchete do jornal O Rio Branco, do Acre, foi 'PT sequestra Abílio Diniz'".
Defesa

A análise da pesquisadora aponta que Lula só se defendeu da suposta conexão que os jornais faziam entre o PT e o sequestro numa pequena "retranca ao pé da página, espremida por um bloco de anúncios publicitários. O título é: "Lula teme 'maracutaia'", explica a especialista.

O trecho de O Globo em que o então candidato petista se manifesta sobre o assunto sugere que "Lula não deu importância ao sequestro, já que estava em um jogo de futebol". "A ênfase nos termos populares utilizados por ele parece querer desqualificar o candidato para o cargo que pretendia ocupar", analisa a autora.
Desmentido

Os desmentidos sobre a ligação do sequestro de Diniz com o PT "se tornam mais enfáticos a partir do dia 19 de dezembro de 1989, quando o resultado das eleições já era sabido", cita Diana.

Conti descreve que "as investigações posteriores provaram que nenhum militante do PT estivera envolvido no sequestro de Abílio Diniz, realizado por aventureiros ligados a grupos esquerdistas da América Central. Os sequestradores disseram em juízo que policiais civis os torturaram e, antes de os apresentarem à imprensa, os forçaram a vestir camisetas do PT. A Polícia Civil estava sob o comando do secretário da Segurança, Luiz Antônio Fleury Filho. A vítima, Abílio Diniz, protestou contra a tortura de seus algozes. Quase um ano depjois, em outubro de 1990, o governador de São Paulo, Orestes Quércia, superior imediato de Fleury, disse numa entrevista ao Estado de S. Paulo que durante o sequestro 'houve pressões no sentido de que se conduzissem as investigações para envolver o PT'".

O JB chamou o atrelamento do PT ao drama do executivo de "trama policial". "Segundo o jornal, os advogados dos sequestradores 'denunciaram ontem que a polícia vestiu uma camiseta do candidato à Presidência da República pela Frente Brasil Popular, Luís Inácio Lula da Silva, em um deles e o fotografou, [...] a dois dias das eleições presidenciais". A polícia negou a denúncia dos advogados de armação.

Em O Globo,do dia 19, o ministro da Justiça Saulo Ramos suscita que "os sequestradores podem ter usado a camiseta do PT como disfarce, aproveitando a eleição".

No dia 20, O Globo sai com a manchete "Tuma: sequestro de Abílio não foi político". Na matéria, Romeu Tuma, então Diretor Geral do Departamento de Polícia Federal, admite que a associação do sequestro com o PT pode ter prejudicado Lula no segundo turno das eleições. "Ele admite que a associação entre o sequestro e o PT possa ter prejudicado Lula. O próprio Delegado não viu as supostas camisetas e repudia qualquer ligação do caso com o PT. A informação partiu do secretário de Segurança de São Paulo, Antônio Fleury Filho, e acabou sendo contestado pelos próprios sequestradores [...] Eles afirmaram terem sido obrigados por policiais a vestirem as camisetas após serem presos".

Também no dia 20, a Folha de S. Paulo publicou retranca "'Sequestro pode ter prejudicado Lula', que 'São Paulo foi o único Estado onde Collor cresceu significativamente entre o sábado e o domingo', segundo pesquisa de boca de urna realizada pelo Datafolha".







CRIMINOSOS DE LUXO

O governo cria uma fachada humanitária
para libertar seqüestradores de Abilio Diniz

Esdras Paiva, de Brasília

Christine e Spencer,
os canadenses:
privilégio à força
de um lobby
Foto: Andre Penner

Na semana passada, o presidente Fernando Henrique Cardoso assinou um documento com toda a aparência de coisa civilizada. É um acordo de transferência de presos com o Canadá. Pelo acordo, sempre que um canadense for condenado e preso no Brasil, tiver bom comportamento e concordar com a transferência, ele pode cumprir a pena no seu país de origem. A regra também vale para brasileiros presos no Canadá. Desde 1983, a ONU recomenda a seus países-membros que façam acordos parecidos, por razões humanitárias: o preso tem maior chance de recuperação num lugar familiar, onde se fala sua língua, e seus amigos e parentes podem visitá-lo nos fins de semana. Examinado por esse ângulo, o acordo é positivo. O problema é que não foi nada disso que aconteceu: é um acordo de ocasião, assinado sob pressão do Canadá e feito sob encomenda para dar tratamento de luxo a dois criminosos: os canadenses David Spencer, 35 anos, e Christine Lamont, 38, que participaram da quadrilha que seqüestrou o empresário Abilio Diniz, dono do grupo Pão de Açúcar, em dezembro de 1989.

Na semana passada, o secretário de direitos humanos do Ministério da Justiça, José Gregori, anunciou que a transferência seria feita em respeito aos direitos humanos. Pouca gente acreditou nessa explicação do secretário Gregori (veja pesquisa ao lado). Estima-se que haja no Brasil cerca de 1.500 detentos que já cumpriram a totalidade de suas penas mas permanecem encarcerados. Nunca se viu uma movimentação do secretário Gregori, pelo menos pública e vistosa como a da semana passada, em benefício desses presos. Mais: as cadeias brasileiras, que não ficam muito acima do nível de pocilgas, onde os ocupantes vivem na imundície, submetidos a maus-tratos e estupros, abrigam hoje cerca de 50.000 pessoas que já cumpriram uma parte da pena e têm direito a passar ao regime da prisão semi-aberta ou pedir condicional, que equivale à libertação. Pois bem: as autoridades brasileiras também nunca deram uma demonstração convincente de estar muito preocupadas com esses injustiçados. A retórica dos direitos humanos, ao que parece, só vale para prisioneiros vips como Christine Lamont e David Spencer, que podem contar com um lobby canadense para trabalhar por eles.

Quando o acordo de transferência de presos foi aprovado pelo Congresso, em 1993, até a matemática das prisões já evidenciava o casuísmo: havia, na época, só dois canadenses detidos no Brasil — eles mesmos, Christine e Spencer — e um brasileiro preso no Canadá, um ex-sargento condenado por estuprar uma prostituta. Se o assunto fosse, de verdade, uma questão de direitos humanos, seria bem razoável que o secretário Gregori iniciasse negociações para fazer um acordo com a Bolívia, pois há quase 200 bolivianos presos no Brasil. Ou, numa iniciativa de quem se preocupa com seus próprios cidadãos, tentasse esse acordo com o Paraguai, onde há 129 brasileiros encarcerados.

Cela lotada, uma rotina
das prisões brasileiras:
50.000 presos já poderiam
trabalhar fora, mas
continuam esquecidos
atrás das grades
Foto: Antonio Milena

Christine formou-se em ciência política, dava aulas de inglês e trabalhava numa rádio comunitária. Sua família é abastada e vem ao Brasil pelo menos duas vezes ao ano para visitá-la. Filho de um alfaiate, Spencer é jornalista e trabalhava numa agência de notícias. Em 1988, o casal mudou-se para a Nicarágua, para trabalhar numa rádio que fazia propaganda da guerrilha de El Salvador. No ano seguinte, os dois vieram para o Brasil e, com cinco chilenos, dois argentinos e um brasileiro, meteram-se no mundo do crime ao seqüestrar Diniz. Julgado e condenado segundo as leis de um país democrático, Spencer divide uma cela de 6 metros quadrados com outro companheiro de seqüestro. Christine tem cela individual. Ambos têm rádio e televisão.

Abilio Diniz foi seqüestrado numa manhã de dezembro de 1989, quando ia para o trabalho em sua Mercedes. Foi fechado por dois veículos. Recebeu uma coronhada na cabeça, jogaram-no num carro disfarçado de ambulância e o levaram para uma casa alugada no bairro do Jabaquara, em São Paulo. Ali, a quadrilha tinha armas pesadas e um caixão, para o caso de precisarem matar o empresário. Diniz passou seis dias num cubículo ao qual só se tinha acesso por um poço seco. Respirava com dificuldade e Christine ocupava as horas de ócio apontando uma arma para sua cabeça. Por uma pista deixada por um dos dez seqüestradores, a polícia achou o cativeiro. Diniz foi libertado sem pagar o resgate de 32 milhões de dólares e os seqüestradores se renderam. Diniz saiu barbado, magro e trôpego. "Foram os piores dias da minha vida", disse, ao ser solto.

Condenados a penas que variam de 26 a 28 anos, os seqüestradores passaram a alegar que pertenciam a uma organização clandestina, o MIR, sigla em espanhol para Movimento de Esquerda Revolucionária, e que os 32 milhões de dólares seriam usados pela guerrilha de El Salvador — uma reivindicação que só revelaram depois que foram presos. A partir daí, pôs-se em movimento uma engrenagem para libertá-los sob a alegação de que tinham cometido um crime político, cuja pena máxima é de dez anos. No Supremo Tribunal Federal, acionado para esclarecer a questão, a tese foi derrotada. "Havia indícios de que o móvel do crime era político. Eles usaram a extorsão e o seqüestro para obter fundos para derrubar um governo estrangeiro. Mas isso não é crime político no direito brasileiro", diz o ministro Sepúlveda Pertence.

A condução do caso de Christine Lamont e David Spencer malversa o conceito dos direitos humanos porque o aplica a um episódio de mera bandidagem como o seqüestro de um empresário tendo por exigência resgate em dinheiro. O Canadá tem obrigação de lutar pelo bem-estar de seus cidadãos, como faz no caso de Christine e Spencer. A obrigação do Brasil é cuidar do interesse dos seus — nesse caso, o brasileiro envolvido chama-se Abilio Diniz. Dando por demonstrado que se tratava de um episódio de crime político, várias entidades apressaram-se a cerrar fileiras em torno dos canadenses. O PT, movido pelo cacoete de abraçar qualquer causa em que vislumbre uma oportunidade de constranger o governo, desfraldou imediatamente a bandeira dos presos. Para apoiar o coro foi criado um organismo de ocasião, um Comitê pela Libertação dos Presos Políticos Internacionalistas. Segundo a própria organização, ela é formada pelo PT, PC do B, MST (sim, trabalhadores sem-terra!), os centros de direitos humanos da OAB e dos Advogados Criminalistas, o Sindicato dos Advogados e o Centro Acadêmico XI de Agosto, entre outras entidades. Dentro do governo, trapalhões aliaram-se a essa corrente e, incapazes de sustentar as pressões internacionais, ajudaram a tecer o arcabouço jurídico dentro do qual os prisioneiros acabarão libertados.

O secretário Gregori,
que cuida da área de
direitos humanos: medo
da greve de fome dos presos
Foto: Ana Araujo

A Anistia Internacional, esta sim uma organização sólida e de tradição, não quis envolver-se. Já em 1990, no Canadá, o país onde foram mais fortes a repercussão do caso e as pressões em favor dos presos, o porta-voz local da Anistia, John Tackaberry, dizia: "Estamos acompanhando o caso, mas é apenas uma questão de Justiça criminal, não um caso de presos políticos". Hoje, em São Paulo, o administrador de empresas Carlos Alberto Idoeta, membro do diretório nacional da Anistia Internacional, afirma que sua organização não pode abraçar a causa porque não identifica nos condenados em questão a condição de "prisioneiros de consciência". A argumentação corrente de que os seqüestradores de Abilio Diniz são criminosos políticos desrespeita o Judiciário brasileiro, que decidiu contra essa alegação, e desmoraliza o Brasil, equiparando-o a países onde não vigoram as liberdades públicas. Quem tem preso político é ditadura. Idoeta considera que a ação em favor dos seqüestradores de Diniz "desserve" a causa dos direitos humanos. Na verdade, cada vez que se alega que libertar seqüestradores é questão de direitos humanos fica um pouco mais difícil aplicar o mesmo argumento para convencer alguém de que não se deve torturar numa delegacia.

O caso dos seqüestradores canadenses teve uma progressão tumultuada no governo. Em setembro do ano passado, o vice-presidente Marco Maciel teve uma conversa com o secretário internacional do PT, Marco Aurélio Garcia, em São Paulo. Garcia, que já foi militante do MIR, pediu ao vice-presidente que estudasse a expulsão dos seqüestradores e comprometeu-se que o PT, nesse caso, não aproveitaria a oportunidade para manifestação política alguma. Sugeriu uma data: véspera do Natal, quando os olhos da opinião pública costumam ficar menos vigilantes. Em novembro, soube que estava tudo acertado. "Chegamos a festejar", diz o advogado dos canadenses, Iberê Bandeira de Mello. O embaixador do Chile, Heraldo Munhoz Valenzuela, teve a mesma indicação sobre a expulsão dos cinco chilenos envolvidos no seqüestro. No meio do caminho, o governo recebeu recado do empresário Abilio Diniz. Por intermédio do ministro Luiz Carlos Bresser Pereira, Diniz mandou dizer que, se a expulsão acontecesse, ele reagiria em público contra a medida. "Com todas as minhas forças", alertou. O governo interrompeu os acertos para a libertação.

Em fevereiro deste ano, o secretário Gregori recebeu para uma conversa os pais de Christine, Marylin, professora de música, e Keith, médico em Vancouver. Explicou que o governo já pensara na expulsão, mas que Diniz recusara a idéia. Também disse que se tratava de um problema delicado, especialmente num ano eleitoral. "A opinião pública no Brasil é sensível à questão da segurança", disse Gregori. No início deste mês, as coisas voltaram a se mexer quando o advogado Iberê Bandeira de Mello avisou ao secretário Gregori que os seqüestradores iriam fazer uma greve de fome pela expulsão. Gregori assustou-se. "Isso vai ser um prato cheio para o PT", disse ele ao advogado, também tucano. Em plena Sexta-Feira da Paixão, Gregori telefonou para João Benedicto de Azevedo Marques, o secretário de Assuntos Penitenciários de São Paulo. João Marques estava tenso, pois temia que a greve de fome se espalhasse pela penitenciária do Carandiru, onde os dez seqüestradores estão presos. Depois de conversar com Gregori, Marques ficou aliviado e deu a notícia para o advogado Bandeira de Mello: os presos seriam expulsos. No final da noite, tudo mudou de novo. Gregori passou o final de semana conversando com o presidente Fernando Henrique e, no domingo, a solução já era outra: o tal acordo de transferência seria assinado. O tiro saiu pela culatra. O governo do Chile, que em 1994 libertou a brasileira Tânia Cordeiro Vaz, acusada de cometer um ato terrorista, exige reciprocidade: quer que os cinco chilenos sejam expulsos, e não transferidos. Os seqüestradores canadenses também não querem a transferência para seu país, insistem na expulsão e continuam em greve. Na semana passada, o arcebispo de São Paulo, dom Paulo Evaristo Arns, recebeu Begoña Ojëda, filha da presa chilena Maria Emília Marchi, de 51 anos. Begoña foi pedir ajuda a dom Paulo, que prometeu examinar o caso. Não se sabe que ajuda pode dar. Nessa história toda, quem teve realmente seus direitos humanos violados foi o empresário Diniz, que passou seis dias sob a ameaça de morrer a tiros caso sua família não entregasse 32 milhões de dólares a Christine, David Spencer e seus oito companheiros.

Posição inflexível

A execução do paraguaio Angel Francisco Breard, na semana passada, nos Estados Unidos, mostra como os americanos adotam uma atitude de inflexibilidade em relação aos presos estrangeiros que chega às raias da injustiça. Condenado pelo estupro e assassinato da americana Ruth Dickie, em 1992, no Estado da Virgínia, Breard assumiu a culpa pelo crime, em sua defesa alegou que estava possuído pelo demônio na ocasião e acabou recebendo a injeção letal por determinação da Suprema Corte de Justiça dos Estados Unidos. A questão aí não é a decisão de executar o réu, mas a forma como o processo foi conduzido. Contrariando um dispositivo da Convenção de Viena, de 1963, e um tratado entre Estados Unidos e Paraguai firmado no século passado, Breard não teve orientação dos organismos consulares de seu país. Os tribunais americanos nem sequer o informaram desse direito e as autoridades paraguaias só souberam de sua prisão com quatro anos de atraso.

Desde que Breard foi preso, a Justiça americana vinha enfrentando protestos de autoridades internacionais pela condução do processo, mas não deu ouvidos. Para evitar a execução, até a Corte Internacional de Justiça das Nações Unidas, com sede em Haia, pediu que o julgamento fosse suspenso. Não adiantou. Na última hora, o governo americano ainda tentou interferir para cancelar a decisão do Judiciário. A preocupação da secretária de Estado, Madeleine Albright, era pragmática, não humanitária. Ela teme que o tratamento ríspido e injusto possa ser dado a cidadãos americanos em outros países.

Com reportagem de Ricardo Balthazar, de São Paulo




Copyright © 1998, Abril S.A.








Seqüestradores de Diniz vivem "clandestinos"


Date: Sun, 30 Oct 2005 23:41:36 -0200

SÉRGIO DÁVILA
Enviado especial da Folha ao Canadá

Alguns crimes brasileiros nunca morrem. O seqüestro de Abilio Diniz é um
deles. O caso é daquelas histórias que dariam não só um filme, mas um
livro, um documentário e uma trilha sonora. Todos de suspense. Com pelo
menos um mistério: "E os canadenses?"

No dia 11 de dezembro de 1989, dez pessoas participaram do seqüestro do
empresário Abilio dos Santos Diniz, do Grupo Pão de Açúcar, hoje como
então uma das maiores fortunas do país. Do dia (17) em que seu cativeiro
foi estourado à libertação do último dos envolvidos, uma década
depois, o assunto não saiu da mídia. (Volta e meia, é ressuscitado,
como no lançamento da autobiografia de Diniz, em dezembro, na qual ele
menciona o ocorrido.)

Entre os dez seqüestradores havia um brasileiro e sete outros
latino-americanos diretamente ligados a movimentos guerrilheiros de
esquerda de El Salvador, da Argentina e do Chile. À época, havia grupos
também que, sob pretexto político, usavam o crime para proveito
financeiro próprio --e nunca foi provado que os dez seqüestradores não
agissem assim.

Destoava do grupo um casal de canadenses. Cabelos e olhos claros,
escondidos por óculos fundo-de-garrafa, David Robert Spencer tinha 26
anos e parecia um daqueles criadores de uma pontocom destinados a ser
bilionários. Quatro anos mais velha, mas aparentando mais, talvez pelos
cabelos mal-pintados ou pela maquiagem pesada, Christine Gwen Lamont vinha
de uma família de classe média alta dos subúrbios de Vancouver, na
costa oeste do Canadá.

O primeiro mistério era: o que os dois faziam ali? A resposta varia
conforme o indagado. Para sua defesa na época, eles eram jovens
preocupados com a desigualdade social do mundo, como tantos no Canadá e
em países europeus desenvolvidos. Ao visitar El Salvador e a Nicarágua
nos anos 80, entraram de gaiatos numa operação destinada a ajudar
financeiramente guerrilheiros de esquerda que deu no seqüestro.

Se feita para a Promotoria de então, para os juízes que cuidaram do caso
e para pelo menos três autores de livros sobre o assunto, o casal sabia
da operação e estava tão envolvido quanto os outros oito --David chegou
a dirigir a Kombi que levaria Diniz ao cativeiro, Christine seria a
responsável pelas armas da casa.

O fato é que, depois de muito vaivém jurídico, os dois foram condenados
a 28 anos de prisão, ficaram quase dez no extinto Carandiru, em São
Paulo, foram enviados para cumprir o resto da pena no Canadá, no final de
1998, num acordo entre os dois países, e saíram em liberdade condicional
menos de três meses depois.

Naquele ano, 1999, eles e os pais dela, que lideraram uma campanha e
bancaram um lobby incansável pela libertação da dupla tanto no Canadá
quanto no Brasil, deram algumas entrevistas a órgãos de imprensa dos
dois países, falaram de planos futuros, comemoraram a vitória. E
sumiram.

O segundo mistério: como dois canadenses em liberdade condicional
conseguem desaparecer no próprio país que os vigia?

Desde setembro do ano passado, a Folha tenta localizá-los, para saber
como e do que vivem hoje em dia os seqüestradores canadenses de Abilio
Diniz.

No mês passado, descobriu o esquema de "clandestinidade" que montaram e
que é muito parecido com o da época em que viviam em São Paulo --com a
imensa diferença de que agora estão dentro da lei.

Presos em condicional

No Departamento de Correções da Província da Colúmbia Britânica, em
Vancouver, responsável pelo acompanhamento de presos em condicional, não
consta o nome de David Robert Spencer nem de Christine Gwen Lamont.
"Spencer... Lamont... Nada. Aos olhos da lei, eles são tão livres quanto
eu e você", disse à Folha Dennis Finlay, chefe do setor.

Ele era a última esperança de uma busca que começara nos arquivos que
sobraram das duas penitenciárias para onde os dois foram enviados em
1998, ela em Burnaby, ele em Abottsford (um dos prédios foi demolido
desde então, assim como o paulistano Carandiru, que os "hospedou" no
Brasil), e passara pelo Comitê de Condicional --"Nada consta, nem o
endereço atual deles".

A mesma negativa resultava das consultas aos Lamont e Spencer que aparecem
nas listas telefônicas do país. A última aposta era Langley,
cidadezinha a 50 quilômetros de Vancouver, onde Christine foi criada e os
pais, Keith e Marilyn, sempre viveram.

Nada nos jornais, arquivos ou documentos públicos. Era como se o
sobrenome "Lamont" tivesse sido apagado da história, feito as fotografias
oficiais soviéticas sob Stálin. Até que uma frase solta numa ata da
reunião regular do Conselho da Cidade de Langley, realizada às 19h de 29
de maio de 2000, chama a atenção. "O sr. Mike Walker reclama que a cerca
de cedro entre sua casa e a propriedade que foi dos Lamont se encontra em
estado lamentável."

Mike Walker, com número na lista telefônica, era vizinho dos Lamont até
que eles venderam a grande casa, de três acres, com piscina e muitas
árvores, "depois daquilo tudo", conta à Folha. O terreno hoje deu lugar
a três casas.

"Sei que eles mudaram para uma cidadezinha aqui perto. A sra. Omelaniec
sabe onde é." A sra. Omelaniec "perdeu" o telefone, mas não se incomoda
em dizer o nome da cidade. É Surrey, a 20 km. A Folha descobre o
endereço e passa a tentar entrar em contato com os Lamont.

Assim que o primeiro telefonema é atendido, pela mãe, entrará em ação
um "alerta vermelho" que envolverá as duas dezenas de pessoas, amigos,
colegas e familiares com quem a reportagem conversará ou se encontrará
nos dias seguintes: ninguém fala ou sabe nada de David e Christine.

"Os dois? Não vejo há oito anos", dirá a jornalista Kim Bolan, melhor
amiga de Christine ainda hoje. "Eu tinha o e-mail dele em algum lugar, mas
não consigo achar", falará Stephen Stewart, um dos melhores amigos de
David. "Não estou autorizada a comentar esse assunto", responderá
Heather, irmã de Christine. "Aqui não tem nenhum William", gritará o
próprio pai de David, William, ao desligar o telefone.

Nomes falsos

Até que os pais de Christine resolvem abrir a porta ao repórter, depois
de várias tentativas, com a advertência de que não responderão nada.
Parecidos com os atores Henry Fonda e Rita Moreno na velhice, o
ex-cirurgião, 75, e a ex-professora de piano, "72 e meio", não respondem
mas fazem perguntas. Sobre o Brasil.

Como vai a saúde de dom Paulo Evaristo Arns, com quem tiveram muito
contato durante a luta pela libertação da filha. Se ainda há muitas
crianças de rua em São Paulo. Ainda existe a praça da Sé. Que tal anda
o governo de Luiz Inácio Lula da Silva. O brasileiro foi a favor ou
contra a invasão do Iraque. Se o filme "Cidade de Deus" é mesmo muito
violento.

Da conversa com eles e com outros que aceitaram falar na condição de
anonimidade, a Folha conseguiu refazer a trajetória do casal desde 1999 e
descobrir como eles vivem hoje em dia. Primeiro, não usam mais os
próprios nomes quando trabalham, mas pseudônimos desconhecidos --como na
época do seqüestro, aliás, em que eram "Modesto" e "Susana".

Depois, moram em Vancouver, numa boa casa de uma cidade que foi escolhida
em pesquisa recente como "a melhor do mundo para viver". Casaram-se em
2000, mas não têm filhos. Fizeram uma festa apenas para amigos em 6 de
maio de 2002, quando a pena de ambos foi oficialmente extinta.

Almoçam esporadicamente aos domingos na casa dos pais dela, mas fizeram
um pacto em que a palavra "seqüestro" e o nome "Abilio Diniz" estão
proibidos. Christine, 46, pinta sempre o cabelo grisalho. Bem-humorado,
David, 42, é o piadista da família e brinca com a vaidade da mulher.

Ele trabalha como roteirista de filmes na emergente indústria
cinematográfica canadense --embora ninguém revele seu nome de guerra e o
oficial não conste de nenhum dos três sindicatos de roteiristas do
Canadá, todos consultados pela Folha, nem do banco de dados eletrônico
IMDb, maior arquivo mundial do gênero.

Uma comédia sua, de alguns anos atrás, contava a história de um sujeito
que ganhou na loteria, mas viu seu bilhete ser enterrado no caixão de um
parente. Escreve textos como free-lancer para jornais locais, sempre com
outros nomes. Escreve e deleta de seu computador repetidamente um livro de
memórias há alguns anos.

Christine voltou a estudar, na mesma Universidade Simon Fraser em que
conheceu o jovem idealista no começo dos anos 80 por quem se apaixonaria
e da qual abandonou os cursos de comunicação e ciências sociais. Agora,
tenta se graduar em criminologia.

O La Quena Coffee House, na Commercial Drive, em Vancouver, onde eles
primeiro tiveram contato com membros ligados à guerrilha de El Salvador,
fechou --virou uma galeria de arte e o escritório de uma pontocom.

Desde 1999, os dois não saíram do Canadá uma única vez, apesar de
poderem legalmente desde 2002. Pretendem fazer uma viagem nos próximos
meses, talvez para a Europa. Nunca visitariam os EUA sob George W. Bush,
dizem os amigos, e o Brasil também não está nos planos imediatos.

Não que o contato deles com o país ou a turma de seqüestradores tenha
sido completamente interrompido. Uma vez, em 2000, uma pessoa presenciou
Christine conversar por correio eletrônico instantâneo com a chilena
Maria Emília Marchi, a quem ficou muito ligada --elas ficaram presas
juntas em São Paulo.

Já David freqüenta sempre o CoDevelopment Canada, também conhecido como
CoDev ou CoDesarrollo Canada, uma ONG esquerdista que ajuda sindicatos e
associações de professores da América Latina --Brasil incluído, onde a
entidade já participou do Fórum Social de Porto Alegre.

O enviado da CoDev geralmente é Stephen Stewart, que fala português
fluente. E é um dos melhores amigos de David Spencer.

--
"It is not depravity that afflicts the human race so
much as a general lack of intelligence."
­ Agnes Repplier, American writer and social critic (1858-1950)

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