Poupadores que foram prejudicados pelo Plano Collor I têm até o final de fevereiro de 2010 para solicitar na Justiça o ressarcimento de suas perdas, devidamente atualizadas com juros e correção monetária. A advogada da área Cível do escritório Innocenti Advogados Associados, Daniela Francisca Lima, afirma que o ideal é estar com a documentação em mãos até o final de janeiro. “É necessário que o poupador prejudicado esteja com a documentação, inclusive os extratos levantados no banco, no começo de fevereiro, para dar tempo de requerer os prejuízos. Se deixar para a última hora, pode não conseguir reaver as perdas”, alerta.
Segundo a advogada, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) vem pacificando o entendimento sobre o direito dos poupadores de pleitear os expurgos de suas cadernetas de poupança referentes aos Planos Collor I e II, até o montante não bloqueado pelo Banco Central.
“A restituição do rendimento vale para todos aqueles - pessoas físicas ou jurídicas - que mantinham saldo até o limite não bloqueado na caderneta de poupança nos meses de março, abril, maio e junho de 1990 e fevereiro de 1991 em qualquer banco do país, mesmo que ela já tenha sido encerrada. Após esse prazo, o dinheiro que hoje ainda está à disposição dos investidores será incorporado ao patrimônio dos bancos e as pessoas perderão o direito de recuperá-lo”, informa Daniela.
O Plano Brasil Novo ou Plano Collor I foi instituído por Fernando Collor de Melo por meio da Medida Provisória 168/90 (convertida na Lei 8.024/90), no dia seguinte ao da posse na presidência da República, em 15 de março de1990. O pacote econômico bloqueou todos os ativos financeiros que ultrapassassem o valor de NCZ$ 50 mil (cinquenta mil cruzados novos), transferindo os valores ao Banco Central – sendo que conforme o aniversário das contas deveria ser aplicada a correção pelo IPC e colocados à disposição do Banco Central os valores superiores a NCZ$ 50 mil. Ocorre que os saldos disponíveis aos poupadores e não transferidos para o Banco Central até o limite de NCZ$ 50 mil deveriam ser atualizados em abril de 1990 com base no IPC de março, o que não foi cumprido pelos bancos depositários.
“Para ingressar com o processo judicial, o poupador deve obrigatoriamente apresentar o extrato bancário (ou microfilmagem) de sua conta referente aos meses de março, abril, maio e junho de 1990 e fevereiro de 1991. O documento deve ser fornecido pelos bancos, após solicitação devidamente protocolada. Caso o poupador já tenha falecido, a solicitação deve ser feita pelo cônjuge, inventariante, herdeiro ou espólio”, explica a advogada.
16 de março de 1990. Um dia após a posse de Fernando Collor de Mello como primeiro presidente da República eleito pelo voto direto em mais de 25 anos, os brasileiros tiveram uma desagradável notícia. O governo resolveu botar a mão no dinheiro de poupadores com a justificativa de combate à inflação. Coube à economista Zélia Cardoso de Mello, primeira e única mulher a comandar o Ministério da Fazenda, anunciar o Plano Brasil Novo, que passou a história simplesmente como Plano Collor. Além de uma reforma administrativa ampla, da abertura da economia, de congelamento de preços e salários, a parte mais explosiva do plano consistia no bloqueio, por 18 meses, dos saldos superiores a NCz$ 50 mil nas contas correntes, de poupança e demais investimentos. Além do confisco, a ministra anunciou ainda o corte de três zeros no valor da moeda e a substituição do cruzado novo pelo cruzeiro.
Com a medida, calcula-se que foram congelados cerca de US$ 100 bilhões, equivalente a 30% do PIB. A inflação, que no último mês anterior ao anúncio fora de 81%, caiu para a média de 5% nos meses seguintes. Mas o tiro único desferido na inflação - como prometera o presidente eleito durante a campanha eleitoral - falhou e os preços voltaram a subir logo depois.
Economista formada na USP com passagens pela inicativa privada e pelo setor público, Zélia Cardoso de Mello era praticamente desconhecida do grande público. Mas por sua curta passagem pelo governo, foi considerada a mulher que mais poder teve na história republicana do país. Para montar o plano e o confisco, ela convocou uma equipe de economistas, com Antonio Kandir e Ibrahim Eris à frente.
O próprio Fernando Collor conta em seu livro de memórias que convenceu-se da necessidade de promover o confisco depois de uma reunião com um pequeno grupo de economistas. Faziam parte do grupo o professor Mário Henrique Simonsen, que já fora ministro da Fazenda e do Planejamento, e dois de seus mais brilhantes alunos: André Lara Rezende, uma das cabeças responsáveis pela elaboração do Plano Real, anos mais tarde; e o banqueiro Daniel Dantas, que ficaria mais conhecido não propriamente por seu conhecimento das ciências econômicas. Dantas, segundo Collor, foi radicalmente contra a medida.
O confisco criou um dilema para os seus ciadores: ou mantinha-se o arrocho monetário e corria-se o risco de uma forte recessão; ou afrouxava-se o aperto e corria-se o risco da volta da inflação. Aconteceram as duas coisas: no fim de 1990, a economia havia encolhido 4%. Em setemro do mesmo ano, a inflação já voltara a 20% e continuava em alta. O fracasso do plano foi reconhecido pelo sucessor de Zélia Cardoso. Marcílio Marques Moreira, que assumiu o Ministério da Fazenda em 1991 e ficou até o impeachment de Collor, considerou “exageradas” algumas medidas do plano. Tão exageradas que viraram casos de Justiça.
À época centenas de milhares de liminares foram concedidas pela Justiça para a liberação antecipada do bloqueio. Ainda hoje, tramitam na Justiça Estadual e Federal, 550 mil ações individuais e coletivas contra os planos Bresser e Verão, ambos editados durante o governo do presidente José Sarney, e os planos Collor I e II, do governo de Fernando Collor
O Supremo Tribunal Federal vai se manifestar sobre a constitucionalidade dos planos Bresser (87), Verão (89), Collor I (90) e Collor II (91) na ação movida pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif). Os bancos defendem, no STF, que o estado tem o direito de definir a política monetária para zelar pela moeda nacional e combater a inflação. Eles argumentam que apenas implementaram os planos por determinações do Executivo.
Os bancos se defendem contra a pretensão dos correntistas e poupadores a respeito dos índices de correção da poupança aplicados por ocasião da decretação dos planos econômicos. Se os correntistas levarem a melhor, os bancos podem perder até R$ 100 bilhões, de acordo com dados da Febraban (Federação Brasileira de Banco). Se os bancos levarem a pior, a Consif já afirmou que a única alternativa será acionar o estado para tentar conseguir o ressarcimento da quantia.
Apesar do abalo provocado na economia do país e nas contas pessoais dos cidadãos, há quem considere o plano mirabolante de Zélia Cardoso como uma medida precursora que lançou as bases econômicas para o Plano Real, que cinco anos depois haveria de estabilizar de forma duradoura a economia brasileira.
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