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terça-feira, 21 de abril de 2009

Proibido de trabalhar



Recebo diariamente inúmeros emails. Pessoas querendo saber como estão as pesquisas com células-tronco, oferecendo-se como cobaias, perguntando sobre doenças hereditárias, testes genéticos ou sobre aspectos éticos. Infelizmente é impossível atender a todos ou transcrever seus relatos. Mas acabo de receber um email surpreendente de um jovem chamado Sisenando.

Seu relato me indignou.Vou transcrevê-lo abaixo. Sisenando é portador de uma neuropatia classificada como Charcot-Marie- Tooth (CMT). Trata-se de uma doença que atinge os nervos periféricos e que dentre as doenças neuromusculares está entre as mais benignas. Nas formas mais graves pode levar à incapacidade para andar, mas os portadores têm uma expectativa de vida normal.

Sinesando tem uma reivindicação que não é comum hoje em dia. Enquanto recebemos inúmeras solicitações de atestados médicos de pessoas que querem aposentadoria, ele me pede o oposto. Solicita meu apoio porque ele quer trabalhar, uma possibilidade que acaba de lhe ser negada. Além do desconhecimento a falta de sensibilidade dos profissionais que indeferiram sua admissão a um novo cargo, conquistado por seu mérito e esforço pessoal, me deixaram indignada. Eis o seu relato:


"Doutora Mayana Zatz,

Meu nome é Sisenando. Tenho 25 anos e sou portador de Charcot-Marie-Tooth. Estou com um problema burocrático por causa de desinformação médica que pode comprometer toda minha vida profissional, e, por isso, que escrevo pedindo sua ajuda.

Sou formado em Direito e pretendo seguir carreira jurídica através de concurso público. Passei em dois recentemente (Escrevente e Oficial de Defensoria); fui convocado a tomar posse, mas a perícia médica considerou-me inapto ao trabalho.

Embora eu tenha limitação dos movimentos das mãos e pernas, já estou adaptado ao meu paradigma. Uso cadeira-de-rodas, tenho mobilidade em ambiente térreo, domino informática, escrevo, digito em velocidade útil (uma das provas era de digitação, e passei). O quadro evolutivo de minha doença estagnou-se aos 16 anos.

Além disso, fiz estágio durante quatro anos, exercendo funções equiparáveis às dos cargos para os quais passei em concurso (de natureza administrativa).

As perícias médicas não me consideraram inapto por eu não conseguir trabalhar, mas, sim, por julgarem que minha doença é evolutiva a ponto de eu piorar até a morte em pouco tempo. Sei disso porque, no momento em que o médico do departamento de perícias me disse que eu estava apto ao trabalho, um segundo médico retrucou "mas essa é uma doença evolutiva". Depois disso, quando fui buscar o laudo, estava escrito: "não apto - portador de doença evolutiva".

Este resultado também me impede de prestar novos concursos (porque futuras perícias ficarão vinculadas às perícias aqui citadas), e, se eu não combatê-lo, ficarei relegado ao desemprego, já que o mercado de trabalho não se importa muito com capacidades se a pessoa não se sustentar sobre as duas pernas.

Estou providenciando um Mandado de Segurança para conseguir efetivar minha convocação nestes concursos públicos. Para bem instruí-lo, necessito de pareceres de especialistas.

Infelizmente, meus recursos não me permitem pagar muitas consultas e viagens para a capital em busca desses pareceres (ainda estou desempregado por conta disso tudo); além disso, os médicos da rede pública são muito receosos e dificilmente consigo um laudo útil, só se limitam a atestar que tenho neuropatia e nada mais; e tenho certeza que o seu parecer dispensaria uma coleção de laudos médicos.

O que eu sei sobre minha doença (por médicos, literatura médica, e por experiência, já que possuo quatro tios com o mesmo problema - o mais velho com 50 anos), é que não haverá evolução/piora de meu estado físico em razão do Charcot-Marie-Tooth. Também faço fisioterapia e me exercito regularmente. Não notei piora desde os 18 anos, pelo contrário, estou mais ágil por força dos exercícios.

Dito isto, para não tomar mais seu precioso tempo, gostaria de saber se você poderia, como especialista, me dar uma parecer por escrito sobre minha doença, e sobre o que conhece a respeito da evolução dela -- inclusive sobre expectativa de vida. Seu parecer pode salvar minha vida e meu futuro profissional.

Sisenando."

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