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terça-feira, 21 de abril de 2009

Genética em saúde mental


De que maneira e em que medida um gene pode modelar um comportamento humano? A resposta a tal pergunta tem inquietado estudiosos, em particular aqueles ligados à genética comportamental

Por Agência Notisa de Jornalismo Científico

shutterstock

O avanço nas pesquisas genéticas tem levado a contrastes nos resultados e discordâncias entre os estudiosos.

Significa dizer que, em contraposição ao entusiasmo provocado pelos estudos da área, que sugerem interações entre determinados genes e fatores ambientais específicos, não faltam análises científicas demonstrando a dificuldade de se alcançar novamente, com o devido rigor, os resultados obtidos anteriormente em diferentes contextos e grupos de indivíduos diversos. Em outras palavras, as conclusões de um pesquisador, quando testadas novamente, por vezes, mostram-se não tão conclusivas ou mesmo inteiramente falsas – como é próprio da verdadeira Ciência.

Com relação ao tema genética e comportamento, pode-se mesmo afirmar que, de maneira geral, o imbróglio científico parte da premissa de que o fenótipo de todo ser humano é o resultado de fatores genéticos (seus genes herdados) e ambientais (sua vida propriamente dita) – e da interação entre esses dois grandes conjuntos de fatores. O que pode ser sintetizado por meio da fórmula: P = G + E, onde “P” é o fenótipo (phenotype), “G” é o genótipo (genotype) e “E” é o ambiente (environment). Diante disso, a meta dos especialistas é exatamente compreender como se inter-relacionam os elementos dessa relação de fatores.

Teste do CO2

De acordo com Marco Battaglia, o transtorno do pânico apresenta uma característica “única”: a possibilidade de reproduzir episódios de transtorno de pânico no laboratório pelo uso de diferentes substâncias, entre elas o dióxido de carbono (CO2) inalado.

Segundo o pesquisador, pessoas com o transtorno apresentam uma reação além do normal ao CO2, pois elas possuem um detector para sufocação supersensível. “Consequentemente, [ao receberem uma concentração acima do normal de CO2] elas interpretam mal o alarme de sufocação e experimentam desconforto respiratório, hiperventilação e pânico. Nesse sentido, garante o pesquisador, o pânico não é medo, e os ataques de pânico podem ser mais bem encarados como falsos alarmes de origem biológica não condicionada”, disse.

O especialista explicou, ainda, que a inalação de CO2 em homens ativa um caminho de resposta que se origina na superfície ventral da medula e se estende até ponte, mesencéfalo, áreas límbica e paralímbica, os giros parahipocampal e fusiforme e a ínsula anterior. “A quimiossensibilidade central foi localizada na superfície ventral da medula e é operada tanto por neurônios serotonérgicos quanto por receptores muscarínicos colinérgicos”, acrescentou.

Sobre estes últimos, estudo realizado pelo próprio autor, em 2001, com um pequeno número de pessoas, apontou nesta direção. Após analisar 12 indivíduos com transtorno de pânico, os resultados revelaram que a resposta exagerada ao CO2 pode ser modulada por meio do bloqueio dos receptores muscarínicos centrais provocado pelo biperideno, um antagonista muscarínico que bloqueia a transmissão dos impulsos colinérgicos centrais.

“Parece improvável, entretanto, que a disfunção de qualquer sistema neurotransmissor único ou a estimulação do quimiorreceptor medular pelo CO2, isoladamente, possa responder pela complexa fenomenologia dos ataques de pânicos do transtorno”, afirma no artigo sobre a pesquisa, publicado nos Archives of General Psychiatry.

Conforme explicou Marco Battaglia, do departamento de neurociências do San Raffaele Institute, em Milão (Itália), durante simpósio no 17º Congresso Europeu de Psiquiatria, realizado no final de janeiro, em Lisboa, não obstante o nível de precaução com os relatos recentes da interação entre gene e ambiente, o gargalo – tanto conceitual quanto metodológico – para a aceitação ou rejeição dos novos resultados repousa no valor biológico que seja passível de mensuração e no real significado de qualquer novo achado.

“A divergência de resultados aconselha que se tenha prudência, visto que pode haver riscos de uma simplificação exagerada, sofisticação desnecessária e aumento excessivo da significância em, virtualmente, qualquer análise de variância focada em um conjunto de polimorfismos e fatores de risco ambientais para algumas ou uma única variável comportamental”, complementou (veja quadro Teste do CO2).

Transtorno do pânico

A despeito das dificuldades, cada vez mais estudos têm procurado identificar os fatores de risco genéticos e ambientais que podem estar associados a condições diversas, como depressão, ansiedade e transtorno de pânico, dentre outros problemas. De acordo com Battaglia, embora, tipicamente, os sintomas do transtorno do pânico se instalem no começo da idade adulta, investigações em idades mais precoces podem ajudar a compreender melhor a doença. Nesse contexto, merece especial atenção o transtorno de ansiedade na infância, relacionado à separação da criança de sua figura de ligação, geralmente a mãe, que pode anteceder o transtorno de pânico.

“Alguns eventos adversos ocorrendo durante o período inicial da vida podem aumentar o risco de manifestação posterior de desordem em adição aos (ou em interação com os) fatores genéticos causais familiares”, explica Battaglia em artigo publicado em janeiro deste ano nos Archives of General Psychiatry.

O estudo teve como objetivo identificar as fontes de covariância – ou seja, em estatística, a probabilidade relacionada a variáveis independentes e aleatórias – entre a ansiedade de separação, a hipersensibilidade ao gás carbônico (CO2) – exame que avalia a reação da pessoa exposta ao CO2 – (veja quadro Teste do CO2) e o transtorno do pânico na vida adulta e analisar o efeito da perda da figura de referência parental na infância nesse contexto.

" Determinantes genéticos parecem ser a causa da ansiedade de separação continuar como transtorno do pânico "

Para tanto, foram incluídos na pesquisa 712 adultos jovens noruegueses, com 31 anos de idade em média (64% mulheres), sendo 356 pares de irmãos, todos gêmeos (49% idênticos ou monozigóticos) – com genes iguais. Os autores do estudo coletaram informações sobre a reatividade ao CO2 e sobre o histórico de episódios de transtorno do pânico, perda parental durante a infância e sintomas de ansiedade de separação.

Estudos indicam que transtorno do pânico pode ter sua origem na infância, a partir de um rompimento com a figura maternal

O levantamento das características clínicas e sociodemográficas mostrou que 6,6% dos participantes apresentavam transtorno do pânico, e 10,4% tinham um histórico de ansiedade de separação, números similares aos identificados por outros estudos na população em geral. Além disso, 4,1% relataram perda parental decorrente de morte, e 11,1%, por separação (divórcio, transferência no trabalho, serviço militar, etc.).

As análises preliminares mostraram que as respostas positivas ao CO2 foram preditas pela ansiedade de separação e pelo transtorno do pânico, mas não por um histórico de fobia social, transtorno obsessivo-compulsivo, transtorno de ansiedade generalizada, depressão ou fobias diante de sangue ou de machucados.

Os autores, então, testaram se a adição de um agente ambiental especificado – no caso, a perda parental na infância – poderia melhorar a capacidade do modelo metodológico para explicar possíveis associações. Segundo o artigo, a escolha da perda parental como agente ambiental se deu em função do fato de que, com frequência, os estudos fracassam em detectar um papel substancial para fatores compartilhados, e ela (a perda) responde por 4,9% da variância total do transtorno do pânico. “Nós avaliamos se a presença ou ausência de perda parental foi associada a estimativas de parâmetros diferentes, isso é, se sua ação poderia, em alguma medida, ser descrita em termos de interação”, explica Battaglia.

Os resultados mostraram que a covariância entre a ansiedade de separação na infância, a hipersensibilidade ao CO2 e o transtorno do pânico podem ser explicados por uma variável latente subjacente única, que influencia os três fenótipos. “Determinantes genéticos compartilhados parecem ser a causa básica principal de a ansiedade de separação na infância continuar como transtorno do pânico na fase adulta e da associação de ambos os quadros à sensibilidade elevada ao CO2”, afirmam.



Estudos comprovam que fobia social e depressão não têm ligação direta com ansiedade de separação
Divulgação

Referência literária

A Coleção Introdução à Psicologia, da editora Imago, foi concebida para utilização na formação de psicólogos. Nesta publicação há um vasto estudo sobre o conceito genético entendido pelo psicólogo Piaget.

Segundo eles, os efeitos genéticos parecem ser a causa básica mais importante de tal continuidade, porque a variável latente governando a covariação dos três fenótipos é, em grande medida (89%), influenciada por determinantes genéticos aditivos.

Timidez

De acordo com Andreia Possatti da Rocha e outros pesquisadores da UFGRS e da USP de Ribeirão Preto, em artigo publicado nos Arquivos Brasileiros de Endocrinologia e Metabologia (2007; 51/5), “dentro de uma espécie, os cromossomos homólogos são bastante similares entre si, mas em determinadas localizações do cromossomo (loci) pode haver variabilidade na sequência do DNA. Se a variação é encontrada em uma frequência superior a 1% da população, denomina-se polimorfismo”. Durante sua palestra, Battaglia citou como exemplo das possíveis associações entre fatores genéticos e comportamentais a possibilidade de que a timidez na infância possa ter alguma relação com a variação do polimorfismo da região promotora do 5-HTTLPR, gene transportador de serotonina, neurotransmissor cujo mau funcionamento tem sido associado a diversas doenças.

A pesquisa de Battaglia, publicada nos Archives of General Psychiatry, em 2005, teve como objetivo verificar se diferenças individuais na timidez-inibição comportamental e a variabilidade no gene 5-HTTLPR poderiam predizer um padrão de ativação do córtex cerebral reduzido em resposta a expressões faciais hostis, neutras ou pró-sociais.

O especialista explica que os padrões de ativação e desativação das regiões cerebrais ao estímulo afetivo ou durante um experimento variam quantitativamente entre os indivíduos e podem ser preditos, em parte, por diferenças individuais na propensão para experiências emocionalmente negativas e ansiedade por alguns genes polimórficos que influenciam o comportamento. Ao todo, participaram do estudo 49 crianças, que já haviam sido caracterizadas por seu grau de timidez e capacidade de reconhecer expressões faciais de emoções em estudo realizado anteriormente.

Entenda alguns conceitos

Condições internalizantes e externalizantes

“Os comportamentos que se internalizam restringem-se ao âmbito privado da criança, não sendo diretamente dirigidos para o entorno em que esta vive. Já os comportamentos externalizantes interferem no cumprimento de tarefas evolutivas como as requeridas pela escola, por terem alta prevalência, prognóstico pobre e por serem fatores de risco para inadaptação psicossocial na adolescência”.

FONTE: LYRA, Gabriela Franco Dias et al. A relação entre professores com sofrimento psíquico e crianças escolares com problemas de comportamento. Ciênc. saúde coletiva [online]. 2009, v. 14, nº. 2, pp. 435-444.

Agorafobia
“Medo fóbico de espaços abertos, mas designa atualmente uma perturbação fóbica constituída por fobias múltiplas e difusas, associadas à ansiedade generalizada e redução progressiva da possibilidade de afastamento dos locais onde o sujeito se sente seguro.”

FONTE: REIS, Gonçalo e TEIXEIRA, José A. Carvalho. Agorafobia: perspectivas fenomenológica e existencial. Aná. Psicológica, out. 2007, vol.25, nº. 4, p.675-682.

Neuroticismo
“Representa as diferenças individuais para experienciar padrões emocionais associados a um desconforto psicológico (aflição, angústia, sofrimento, etc.) (...). Um alto nível de neuroticismo identifica indivíduos que são propensos a vivenciar mais intensamente sofrimentos emocionais.”

FONTE: NUNES, C. H. S. (2000). A construção de um instrumento de medida para o fator neuroticismo/estabilidade emocional dentro do modelo de personalidade dos cinco grandes fatores. Dissertação de mestrado, UFRGS. Disponível em: http://hdl.handle. net/10183/1774.

Variância genética aditiva
“Em genética quantitativa, variância genética associada ao efeito médio de substituição do alelo dominante A pelo recessivo a.” (Definição retirada da obra Glossário de Biotecnologia, edição 2005.)

Potenciais relacionados a eventos (ERPs)
Em linhas gerais, resposta cerebral mensurada que é o resultado direto de um pensamento ou percepção.

FONTE: http://en.wikipedia.org/wiki/Event-related_potential

Utilizando a chamada técnica dos potenciais relacionados a eventos (ERPs) (veja quadro Entenda alguns conceitos), os resultados mostraram que, em resposta à leitura de expressões faciais, tanto a variação no gene 5-HTTLPR quanto o ERP prognosticam o grau de timidez na infância.

“Um padrão de ativação cortical cerebral reduzido em resposta a alguns estímulos sociais específicos (incluindo sinais não verbais de colegas de recusa ou neutralidade) podem, então, constituir uma base hereditária para a discriminação preconceituosa de algumas formas de informação socialmente relevantes, que, por sua vez, podem dificultar as interações sociais e, em última instância, reforçar uma disposição da criança para a timidez-inibição comportamental”, destaca o pesquisador no texto. “É claro que os resultados constituem um experimento laboratorial, com vantagens e desvantagens específicas”, alertou na palestra.

" Estrutura familiar parece interagir com genes serotonérgicos intensificando o risco de problemas afetivos "

5-HTTLPR

Gene transportador de serotonina pode influenciar algumas pessoas a serem mais tímidas, dificultando sua interação social

Segundo Marco Battaglia, os focos de investigação atualmente têm sido exatamente o gene 5-HTTLPR. Em estudo recente, o especialista, juntamente com outros pesquisadores, procurou examinar a influência da estrutura familiar e dos genes TPH2 G-703T e 5-HTTLPR, ambos polimorfismos serotonérgicos, sobre os sintomas afetivos de 608 pré-adolescentes (10 a 14 anos) italianos.

“Nós postulamos que o 5-HTTLPR pode ser relevante no início da vida, e que esta influência poderia ser detectável em relação a diferentes variáveis do ambiente familiar tanto para condições internalizantes quanto para as externalizantes” (veja quadro Entenda alguns conceitos), explicou Battaglia.

De acordo com artigo sobre a pesquisa que aguarda publicação na edição impressa do Journal of Child Psychology na Psychiatry, embora os dados ainda necessitem de confirmação, os cientistas concluíram que a estrutura familiar parece interagir com os genes serotonérgicos principais intensificando o risco de problemas afetivos – dado que “pode contribuir na identificação/prevenção do risco de depressão na infância”.

O pesquisador citou também estudo publicado em 2006, no periódico científico Molecular Psychiatry, que analisou possíveis associações entre os genes GAD1 e GAD2 e o risco de depressão maior, transtorno de ansiedade generalizada, transtorno de pânico, agorafobia, fobia social e neuroticismo (veja quadro Entenda alguns conceitos).

Como explica o artigo, as enzimas descarboxilase do ácido glutâmico (GAD) sintetizam o ácido gama-aminobutírico (GABA) a partir do glutamato. Diversos estudos têm associado anormalidades no sistema neurotransmissor do GABA a transtornos de humor e ansiedade, o que torna a GAD um “gene de susceptibilidade razoável para estas condições”.







imagens: shutterstock
Transtornos de ansiedade e depressão podem ser identificados ainda na infância, por meio da detecção de anormalidade de certos genes

Após investigar 1.128 indivíduos, a pesquisa, conduzida nos Estados Unidos, concluiu que as variações no gene GAD1 talvez contribuam para diferenças individuais no neuroticismo (Fator N) e tenham impacto sobre a susceptibilidade a transtornos de ansiedade e depressão maior.

Gás carbônico

O avanço natural dos experimentos levou a uma pergunta fundamental: ante todos os resultados, qual é a relação causal entre ataque de pânico natural e a ansiedade e hiperventilação induzida por CO2?

No intuito de lançar luz sobre a questão, Battaglia conduziu outro estudo, tornado público em 2007, para verificar se (e em que medida) a ansiedade aguda induzida pelo CO2 e o transtorno do pânico compartilham os mesmos determinantes genéticos e ambientais. “Por razões desconhecidas, a inalação de misturas de ar enriquecidas com CO2 provocam sintomas parecidos com os do pânico em pessoas com o transtorno e em seus parentes não afetados”, afirma no texto publicado no American Journal of Medical Genetics.

A análise, que teve como base 356 pares de irmãos gêmeos, mostrou os determinantes que levam a pessoa a ter uma reação exagerada diante de um estímulo com excesso de CO2. Além disso, a correlação fenotípica entre a ansiedade pós CO2 e o pânico segundo o DSM-IV (Manual diagnóstico e estatístico de doenças mentais da Associação Americana de Psiquiatria) foi, em grande medida, devido a influências genéticas aditivas (veja quadro Entenda alguns conceitos), enquanto que os agentes ambientais compartilhados ou únicos contribuíram para explicar uma proporção relativamente menor da correlação entre estes e os traços. “[O estudo] sugeriu que os fatores genéticos influenciando a reposta humana após inalação de CO2 e o pânico de origem natural eram perfeitamente correlacionados e poderiam ser suficientes para responder por 100% da associação entre os fenótipos”, destacou o pesquisador durante sua palestra. Em outras palavras, os dados sugerem que os “fatores ambientais dão uma contribuição modesta – ou nula – à covariância da ansiedade provocada pelo CO2 com o pânico de origem natural”, conclui no artigo.

" A estrutura familiar parece interagir com os genes serotonérgicos principais intensificando o risco de problemas afetivos "

Experimento em animais

Na opinião de Battaglia, uma das melhores possibilidades de avanço no estágio atual do conhecimento científico reside no que, ao menos para ouvidos leigos, poderia soar como um recuo: o modelo animal. “Nós, pesquisadores, devemos nos esforçar para utilizar endofenótipos fisiológicos e quantitativos facilmente exportáveis da pesquisa humana para a animal, em que G x E (genética x ambiente) é mais fácil de ser explorado. O conhecimento obtido a partir da pesquisa animal poderia ser, então, reimportado para o homem, quando se verificaria, por fim, a validade da interação sugerida anteriormente entre gene e ambiente.

O próprio especialista está conduzindo um estudo com ratos, cujos objetivos podem ser sintetizados numa série de perguntas. A separação precoce da mãe pode induzir hipersensibilidade ao CO2 em ratos? Se sim, ela é específica ou estável? É possível identificar os genes simultaneamente implicados na hipersensibilidade ao CO2 e na ansiedade? Há evidência de interação entre fatores genéticos e ambientais?

Os cientistas apontam para um caminho inverso: levar os testes em humanos para os animais, a fim de validar a teoria entre gene e ambiente

A pesquisa, cujos resultados ainda não foram divulgados, analisou ratos recém-nascidos que foram desmamados e colocados junto a mães “adotivas” após terem passado 24 horas com a mãe biológica. Os pesquisadores acompanharam os níveis de estresse dos ratinhos e, entre o 16º e o 18º dia de vida, expuseram-nos a diversas concentrações de CO2, ar e O2 (oxigênio) A pesquisa, cujos resultados ainda não foram divulgados, analisou ratos recém-nascidos que foram desmamados e colocados junto a mães “adotivas” após terem passado 24 horas com a mãe biológica. Os pesquisadores acompanharam os níveis de estresse dos ratinhos e, entre o 16º e o 18º dia de vida, expuseram-nos a diversas concentrações de CO2, ar e O2 (oxigênio) e registraram os comportamentos de esquiva não condicionados. Procedimentos que foram repetidos quando os roedores completaram 60 dias. “O que eu posso antecipar é que os paralelismos que estamos encontrando entre os homens e os animais são, realmente, surpreendentes, e nós pretendemos divulgá-los este ano em um primeiro artigo [sobre o estudo]”, disse Battaglia.

O futuro
Pesquisadores adiantam que resultados de pesquisas com animais surpreendem

Em breve entrevista à Agência Notisa, representando a Psique, logo após sua palestra no Congresso Europeu de Psiquiatria, em Portugal, o especialista britânico Marcus Munafo, do departamento de Psicologia Experimental da University of Bristol, pontuou melhor sua opinião sobre as pesquisas e os resultados já produzidos em genética e comportamento.

Qual é exatamente sua opinião sobre as pesquisas conduzidas até o momento?
Eu não sou contra os dados, uma vez que dados são apenas dados. Apenas defendo que, às vezes, os cientistas aceitam muito rapidamente a interpretação mais otimista dos dados, quando, de fato, um posicionamento mais balanceado pareça ser mais adequado. Considero isso um problema, pois significa que nós podemos prosseguir em determinadas linhas de pesquisa acreditando que haja realmente algo [a ser confirmado ou descoberto], quando, na verdade, talvez não exista nada do que estamos procurando, e os resultados acabam por se mostrar falsos. A questão realmente importante é: quão perto estamos chegando de uma verdade? Não se trata de olhar para os dados e simplesmente dizer se eles são interessantes ou não.

Qual é a sua opinião sobre a qualidade dos dados publicados?
Eu acho que alguns são muito interessantes. Eu acredito que eles vão resultar em mais pesquisas, que podem ser mais aprofundadas, que talvez sejam maiores e que talvez produzam respostas mais definitivas. Porém, provavelmente, ainda teremos 5 ou 10 anos pela frente até que encontremos uma resposta verdadeira. Neste momento, ainda é muito cedo, as pesquisas têm sido conduzidas há apenas 2, 3 ou 4 anos, e serão necessários mais tempo e estudos amplos até que tenhamos certeza com relação ao que estamos analisando.

Muitos pesquisadores são por demais otimistas com relação aos resultados produzidos?
Sim, e eu acho que não podemos esquecer que todo cientista é um ser humano, e eles sempre tendem a ver os próprios dados da melhor maneira possível – e isso é tanto verdade para mim quanto para qualquer outra pessoa. É simplesmente uma constatação de como são os seres humanos e de como as coisas funcionam no meio científico.

Que mudanças você espera para o futuro?
Eu acredito que nós estamos começando a antever como a pesquisa sobre a interação entre os genes e o ambiente deverá ser no futuro. Nós teremos de conduzir estudos muito maiores, o que é difícil, pois eles são muito mais caros, mas obviamente mais confiáveis.

Como estabelecer isso?
Precisamos estimular e aumentar a colaboração entre os pesquisadores de maneira a permitir que nós disponhamos de amostras maiores, para que combinemos dados de diferentes partes do mundo. Desta forma, poderemos também compartilhar novas tecnologias que estão sendo empregadas, além de buscar um grau muito maior de rigor científico [quanto aos resultados]. Em outras palavras, dizer que um resultado provavelmente é verdadeiro se tornará mais difícil, pois os parâmetros serão cada vez mais rigorosos.







Alguns cientistas questionam os resultados obtidos das pesquisas entre os genes, saúde mental e meio ambiente em que o homem está inserido

Há quem discorde

Com a diminuição dos custos da genotipagem, os estudos de associação sobre genes candidatos têm se proliferado. Entretanto, a produção de evidência científica consistente indicando o envolvimento de variantes genéticas específicas com doenças psiquiátricas continua algo raro. Pior: em uma pesquisa sobre 600 associações positivas (gene x ambiente) já publicadas, apenas seis foram replicadas de maneira consistente (três vezes ou mais) até hoje. É o que afirmou Marcus Munafo, do departamento de Psicologia Experimental da University of Bristol (Reino Unido) e revisor do periódico científico Biological Psychology, durante simpósio no 17º Congresso Europeu de Psiquiatria, realizado em Lisboa.

“Os estudos iniciais quase sempre (96,8%) produzem um conjunto de resultados falso-positivos publicáveis”, ressaltou o especialista, que publicou um artigo sobre o assunto este ano no periódico Biological Psychiatry. Para ele, os estudos sobre genes candidatos sugerem um effect size pequeno, logo, com frequência, têm poder estatístico limitado, e fornecem apenas uma explicação parcial para os mecanismos por trás dos transtornos.

Durante sua palestra, Munafo criticou, por exemplo, muitos dos resultados alardeados com relação ao gene 5-HTTPR, com base na revisão sistemática conduzida por ele, repetidamente, relatado como sendo associado à depressão e ao neuroticismo. “A revisão sistemática e a meta-análise por nós conduzida sobre os efeitos do 5-HTTLPR e dos eventos de vida produtores de estresse identificaram 13 estudos tentando replicar os resultados originais (ou pretendendo fazê-lo) – e apenas dois relataram uma interação comparável utilizando um resultado categórico”, observou.

Para ele, de maneira geral, a evidência para um efeito da relação entre o gene 5-HTTLPR e eventos de vida produtores de estresse sobre a depressão é modesto. “Isso pode ser devido à heterogeneidade entre os estudos (embora nós não tenhamos observado isto). Embora haja evidência convergente a partir dos dados [produzidos pelas pesquisas] animais, a evidência humana não é admirável”, disse.

Ainda de acordo com a meta-análise de Munafo, levando-se em conta os cinco estudos com dados suficientes disponíveis, não foram identificados quaisquer efeitos do genótipo 5-HTTLPR ou da interação entre genes e ambiente. “Nossas simulações indicaram que para n = mil (número de estudos analisados), o poder estatístico variou de aproximadamente 10% a 65%. Em todos os cenários, a capacidade de detectar o efeito principal do gene foi igual àquele detectado para a interação entre gene e ambiente”, destacou.

Munafo defendeu que, com uma definição vaga de replicação [dos resultados já obtidos], os estudos com falsos positivos irão quase sempre se replicar. “Os estudos sobre a interação entre gene e ambiente demonstram bem isso”, alfinetou.

Para saber mais

Conceitos básicos em Genética quantitativa
Artigo do Instituto de Biociências da USP.
Link: http://www.ib.usp.br/evolucao/QTL/conceitos.html

Glossário do Conselho de Informação sobre Biotecnologia
Link: http://www.cib.org.br/glossario.php

Data and Theory Point to Mainly Additive Genetic Variance for Complex Traits
Hill WG, Goddard ME, Visscher PM, 2008. PLoS Genet 4(2): e1000008. doi:10.1371/journal.pgen.1000008
Link: http://www.plosgenetics.org/article/info:doi/10.1371/journal.pgen.1000008

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