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quinta-feira, 12 de junho de 2008

As origens do escândalo


O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem uma ojeriza declarada por todas as leis que limitam explicitamente o seu poder como chefe do governo e do Estado. Ainda na semana passada, fez inflamado discurso contra a Lei Eleitoral, que veda ao governo celebrar convênios e contratos nos meses imediatamente anteriores e posteriores às eleições. Essa medida saneadora dos costumes políticos, adotada para coibir a influência indevida do poder público nas eleições, é vista por ele como ''o lado podre da hipocrisia brasileira''. Felizmente ele não confundiu ainda mais os seus ouvintes, explicando o que viria a ser ''o lado virtuoso da hipocrisia''. Dias antes, o presidente havia dito que também a Lei de Licitações restringe a liberdade dos governantes de fazer o que querem - o que é ótimo, pois a lei foi feita justamente para isso.

O presidente Lula, em tudo o mais um democrata, tem uma visão equivocada a respeito das leis que restringem os poderes do Estado e do governo. Ele parece não entender que, sem tais leis, os governantes disporão de um poder de arbítrio e de discricionariedade incompatível com os princípios que regem qualquer regime democrático.

Logo no início de seu primeiro governo, o presidente Lula, acolitado por seus auxiliares mais próximos, moveu uma virulenta campanha contra as agências reguladoras que haviam sido criadas no governo Fernando Henrique, e que, segundo ele, haviam ''terceirizado o governo''. Para Lula, as agências deveriam ser meros apêndices dos Ministérios a que estão ligadas.

As agências foram criadas exatamente para evitar que isso aconteça. São órgãos de Estado, não de governo, com a função de executar políticas setoriais definidas por lei, na área das concessões de serviços públicos. Defendem o mercado das ingerências do governo; defendem a sociedade das distorções dos mercados; quando a atividade econômica é propícia à formação de monopólios ou oligopólios, defendem as empresas menores do poder de mercado dos grandes conglomerados; e, finalmente, defendem os consumidores da ação discricionária do governo e do abuso do poder econômico das empresas. Para que possam cumprir essas missões, as agências precisam ser independentes, compostas por diretores com mandato definido em lei, que dispõem de orçamento próprio e de um corpo técnico competente.

Como, mesmo dispondo de ampla base parlamentar, o presidente não teve condições para remover de seu caminho essa estrutura legal, tratou de minar a autonomia das agências, nomeando para suas diretorias pessoas sem qualificação técnica, mas ''confiáveis''.

Algumas agências, apesar disso, mantiveram-se independentes. Mas com outras deu-se o mais temido dos desvirtuamentos que uma agência reguladora pode sofrer: a ''captura'' desse órgão pelo governo ou pela empresa ou empresas que por ele deveriam ser fiscalizadas ou reguladas.

O escândalo da VarigLog é um caso de manual das conseqüências nefastas da ''captura'' de uma agência reguladora. Os antigos diretores da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) foram colocados lá por padrinhos bem situados no governo e não por sua capacitação técnica. Não é de estranhar, portanto, que, quando a ex-diretora Denise Abreu tentou comprovar a origem do capital da Volo, tenha recebido um contravapor da ministra Dilma Rousseff, que disse que ''isso não era da alçada de uma agência reguladora, mas do Banco Central e da Receita''. Não apenas era matéria de competência da agência, como a chefe da Casa Civil não poderia orientar a conduta da Anac. Mas o ex-presidente da Anac Milton Zuanazzi se considerava subordinado de Dilma Rousseff: ''Obedeci e obedecerei. Orgulho-me de ser disciplinado e parceiro.'' E finalizou: ''Cumpri devotamente o mister.''

O Ministério Público Federal anunciou que reabrirá as investigações sobre a participação de capital estrangeiro na VarigLog. O procedimento, iniciado em 2006, havia sido suspenso porque, com a compra da VarigLog pela Gol, desaparecera o objeto da investigação. O foco da investigação deverá ser as denúncias feitas por Denise Abreu sobre a atuação de membros do governo em negociações de que não poderiam participar. Ou a investigação não terá nenhum sentido.

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