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terça-feira, 4 de novembro de 2008

A casa ilustre de um clã Matarazzo,

Cenário de encontros políticos, o endereço dos Matarazzos, no Jardim América, é um pedaço da Itália em São Paulo. Lá, há espaço de sobra para histórias e peças singulares, caso da carroça siciliana do século 18
Marisa Folgato - O Estado de S.Paulo

SÃO PAULO - O tom avermelhado da fachada da construção de muitos arcos e grande varanda prepara o terreno para confirmar o que se vê tão logo as grossas portas de jacarandá (de cabreúva, sem as ferragens, por R$ 1.300 o m², no Velhão) com argolas douradas se abrem: aquele endereço no Jardim América mais parece um pedaço da Itália. Do sobrenome dos moradores, uma das famílias mais tradicionais de São Paulo, os Matarazzos, aos móveis e objetos, quase tudo ali tem sotaque italiano. Até no nome do decorador, o paulistano Germano Mariutti, falecido em 2007 e referência na cidade entre as décadas de 1970 e 1990. "Ele sempre foi muito amigo dos meus pais", diz a também decoradora Camilla Matarazzo.
Sala de visitas: destaque para o sofá vermelho desenhado por Germano Mariutti. Segundo o decorador William Maluf, o encosto recortado é bem característico da obra de Mariutti. Foto: Zeca Wittner/AE

O empresário Giannandrea Matarazzo, 79 anos, revela outras histórias sobre o decorador: "Inspirado numas luminárias que eu trouxe de Veneza e estão no hall, com metais em forma de folhas coloridas e lâmpadas que imitam velas, ele desenhou as arandelas do lavabo. E posso dizer que repetiu o modelo em outras obras da cidade", conta o patriarca. As luminárias combinam com as paredes e o piso de mármore rosa importado (modelo rosa tea, italiano, R$ 820 o m², na MGR Marmoraria) e as louças vinho do lavabo, com saleta acessada pelo hall, revestida com papel de parede (Wallpaper) e tecido listrado (da coleção seda Nova Delhi, R$ 286,40 o metro na Donatelli), num projeto de Camilla.

Ainda no hall, uma carroça siciliana do século 18, entalhada e pintada à mão, rouba a cena. "Foi presente do meu tio Ciccillo", lembra Giannandrea, referindo-se ao industrial Francisco Matarazzo Sobrinho, fundador do Museu de Arte Moderna e criador da Bienal de São Paulo. A peça foi direto para a casa comprada em 1966. "Um vizinho chegou a oferecer dois Mercedes-Benz em troca dela. Nós ficamos babando, claro, mas meu pai nem quis ouvir falar", conta, divertida, outra filha de Giannandrea,Claudia, chefe do cerimonial do Palácio dos Bandeirantes e autora de livros de etiqueta.

Segundo ela, a ajuda de Mariutti foi coisa de amigo mesmo. "Um dia, minha mãe pediu a opinião dele sobre a cor das portas da sala de jantar, se deveria usar branco. Ele disse que não e, num domingo, apareceu com as tintas." O resultado pode ser visto até hoje: desenhos em verde e dourado que se entrelaçam sobre fundo terracota. Mesma cor que, por escolha dele, cobre cadeiras e paredes, onde se destaca uma pequena fonte - italiana, claro. "É atribuída a Bernini (Gian Lorenzo Bernini, arquiteto, escultor e pintor do século 17, com obras no Vaticano)", ressalta o empresário.

Nessa sala de jantar, o ex-presidente Jânio Quadros - ex-professor de Giannandrea e de sua mulher, Teresa, e habitué da casa -, fez questão de acompanhar o discurso de renúncia de Richard Nixon, em 1974. De acordo com Claudia, a família teve de colocar, de improviso, uma televisão sobre a mesa. "Acompanhamos aquela situação, loucos para perguntar o que apenas meu irmão Andrea (atual secretário municipal das Subprefeituras), então com 17 anos, teve coragem de fazer, ?como o senhor, que já passou pela experiência, avalia essa renúncia??" O ex-presidente começou um discurso. "Mas um primo meu falou tanto que não deixou o Jânio responder", recorda Andrea.

Faisões, na Paulista

Na sala da lareira, uma proposta que Camilla apresentou na Casa Cor 1999 e levou para a casa paterna. "Mandei recortar as portas das estantes e criei nichos para as peças antigas de terracota que meus pais trouxeram do Peru, há décadas", explica a decoradora. A lareira é ladeada por leões de cerâmica vindos do Porto, também presente de Ciccillo. Mas a paixão de Giannandrea pelos animais percebe-se também no livro de gravuras inglesas de faisões, exposto num pedestal e nas paredes da sala íntima decoradas com imagens de pássaros, também inglesas, do século 19.

Giannandrea nasceu no casarão do avô, o senador italiano Andrea Matarazzo, na Avenida Paulista. "Criei faisões nos jardins da casa. Há uns 60 anos devia ter mais de 100 lá." Ele começou a trabalhar logo cedo com Ciccillo. "Era comum irmos almoçar com intelectuais em seu apartamento, no Conjunto Nacional." Quase todas as obras de arte de sua casa foram presenteadas pelo tio, reconhecido mecenas de São Paulo.

Antes de mudar para o endereço atual, em 1966, a família morava no Jardim Paulistano. "Achei que o negócio não ia dar certo quando minha mulher veio contar que era uma rua de grã-finos", revela ele. Mas o sobrado de 800 m² no terreno de 1.200 m², com cinco suítes e pé-direito alto, tinha o tamanho certo para o casal e quatro filhos (a caçula, Paola, mora nos Estados Unidos). Virou cenário de grandes encontros. "Quase todos os governadores passaram por aqui", garante o atual proprietário.




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