‘Joana d'Arc dos subversivos torna-se chefe da Casa Civil’
‘Entrou para grupos clandestinos, organizou três assaltos’
‘Planejou assalto lendário –o roubo do cofre de Adhemar’
Enfrentou ‘22 dias de uma brutal tortura de eletrochoque’
‘1º marido seqüestrou avião para Cuba e permaneceu lá’
‘No Congresso, reclamam que ela não entende de política’
‘Ela tem uma reputação de negociadora dura, persistente’
Sérgio Lima/Folha
O documento tem quatro folhas. Traz o carimbo de “sensível”. Tem cara de dossiê. Um dossiê sobre Dilma Rousseff.
Produzido pelo Consulado dos EUA em São Paulo, foi ao banco de dados do Departamento de Estado norte-americano, em Washington. A migração ocorreu em 21 de junho de 2005.
Na véspera, Dilma assumira a chefia da Casa Civil de Lula. “Ela ocupou o lugar de José Dirceu, que caiu fora, semana passada, por causa de um escândalo de corrupção”, anota o texto remetido a Washington.
O documento foi obtido graças à lei de liberdade de informação dos EUA. Encontra-se publicado nas páginas do diário gaúcho "Zero Hora", edição deste domingo (11), junto com outros papéis. Coisa fina. O texto sobre Dilma tem oito tópicos. Lendo-os, descobre-se que a ministra foi virada do avesso pela equipe de informação do consulado paulistano dos EUA.
Varreram a biografia de Dilma do nascimento, em 14 de dezembro de 1947, no Estado de Minas Gerais, à chegada ao Planalto. No geral, é apresentada como um cacto. Abundam no texto os adjetivos híspidos: “durona”, “exigente”, “workaholic”.
Não escaparam, porém, os detalhes mais lúdicos e prosaicos: “Ela gosta de cinema e música clássica. Recentemente, ela perdeu peso, depois de [...] adotar a dieta do presidente [Lula]”.
Nos trechos dedicados à mocidade da ministra, o documento esboça o retrato de uma mocinha dona de agressivas certezas dogmáticas. Foi ao cárcere da ditadura precedida de inquietante legenda.
Diz o documento, a certa altura: “Ela foi capturada pelo Regime e aprisionada por três anos (o oficial se referiu a ela como Joana D'arc dos subversivos)”. Padeceu “22 dias de brutal tortura de eletrochoque”.
Vão abaixo algumas das informações guardadas nos arquivos de Washington:
Joana d'Arc dos subversivos torna-se chefe da Casa Civil: É esse o subtítulo do item dois do “dossiê Dilma”. Anota: “No dia 21 de Julho [de 2005], o presidente Lula nomeou Dilma Rousseff, 57, como sua nova ministra-chefe da Casa Civil. Ela ocupou o lugar de José Dirceu, que caiu fora, semana passada, por causa de um escândalo de corrupção. Dirceu estava envolvido profundamente nas estratégias políticas da administração, mas Rousseff anunciou na sua cerimônia de posse que tem a intenção de se focar mais em colocar em andamento a agenda política administrativa [...]”;
Gestora durona: “Rousseff entrou para o PT em 2001 e trabalhou no processo de transição de governo em 2002. Ela é uma gestora durona e exigente, que vai perseguir a qualificação da implementação de políticas administrativas. Ela está menos para o político de holofote, como [José] Dirceu, de ringue político, por ser mais focada em atacar a "burocracia".
Assaltos a banco e guerrilha: “Dilma Vana Rousseff nasceu em 14 de dezembro de 1947, o Estado de Minas Gerais. Seu pai era um promotor búlgaro, que se naturalizou e tinha cidadania brasileira. Ela se tornou ativamente envolvida com a oposição ao regime da dtadura mlitar em 1967, aos 19 anos, enquanto cursava Economia em Minas Gerais. Entrou para vários grupos clandestinos, organizou três assaltos a banco e então foi co-fundadora do grupo de guerrilha chamado Vanguarda Revolucionária Armada de Palmares”;
"Theft of Adhemar’s Safe": "Em 1969, ela planejou um assalto lendário conhecido como ‘o roubo do cofre de Adhemar’. A operação arrombou o apartamento carioca da amante do então governador de São Paulo, Adhemar de Barros, recolhendo US$ 2,5 milhões que Ademar guardava no local";
Marido seqüestrador e eletrocoques: “Rousseff se separou do primeiro marido, Cláudio Linhares, que, em janeiro de 1970, seqüestrou um avião para Cuba e permaneceu lá. Naquele mesmo mês, ela foi capturada pelo Regime e aprisionada por três anos (o oficial se referiu a ela como Joana D'arc dos subversivos), incluindo 22 dias de brutal tortura de eletrochoque”;
Formação acadêmica e gostos pessoais: “Rousseff tem grau de mestre em Teoria Econômica pela Universidade de Campinas e um doutorado não concluído em Economia. Em 1992, ela participou como visitante de um programa internacional nos EUA. Ela está atualmente separada do seu segundo marido (que também era um militante da oposição). Ela tem uma filha, Paula, em Porto Alegre, onde ela passa os finais de semana. Ela gosta de cinema e música clássica. Recentemente ela perdeu peso, depois de, alega-se, adotar a dieta do presidente”;
Da desconfiança aos elogios: “Com seu background técnico e um estilo no-nonsense, Rousseff recebeu respeito relutante do setor da Energia. Enquanto as Cias. norte-americanas estavam inicialmente desconfiadas quando ela foi designada para o cargo de [ministra das Minas e] Energia, agora admitem que ela fez um trabalho competente. Em particular eles a saúdam por sua disposição em ouvir e responder posições e idéias, mesmo quando está inclinada a uma conclusão diferente. Ela tem a uma reputação de negociadora dura, ser persistente e de prestar muita atenção aos detalhes. Adjetivos usados aqui por aqueles que trabalham com ela incluem exigente e workaholic”;
Inapetência política: “Diferentemente de José Dirceu, Rousseff nunca foi eleita para cargo público e seus contatos com o Congresso são limitados, o que sugere que a coordenação política da administração será tarefa de outros. A imprensa diz que Lula espera que ela produza um "choque de gestão" na administração, a qual, por causa da ineficiência administrativa, entraves burocráticos e, mais recentemente, pelos muitos escândalos de corrupção, encontra-se estagnada.
Queixas de aliados: “Alguns no Congresso reclamam que Rousseff não entende de política partidária. Em abril [de 2005], o Senado rejeitou [uma] nomeação para a Agência Nacional de Combustíveis em retaliação pela oposição dela à nomeação de um aliado do partido PMDB para uma subsidiária da Eletrobrás, Companhia Estatal de Eletricidade (Rousseff optou por dar a posição para Adhemar Palocci, irmão do [então] ministro Antônio Palocci)”.
Escrito por Josias de Souza às 17h57
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