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quinta-feira, 16 de setembro de 2010

#POLITICA ; Miriam Belchior é a ex de Celso Daniel e figura de confiança de Lula

Conheça Miriam Belchior, que deve substituir de Erenice Guerra na Casa Civil

Miriam Belchior e a ex-ministra-chefe da Casa Civil Erenice Guerra, durante a cerimônia de divulgação do 10º balanço do PAC, em junho deste ano

Miriam Belchior e a ex-ministra-chefe da Casa Civil Erenice Guerra, durante a cerimônia de divulgação do 10º balanço do PAC, em junho deste ano (Agência Brasil)

Miriam Belchior, secretária executiva do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), deve assumir na próxima semana o comando da Casa Civil, após a queda de Erenice Guerra. Ela esteve cotada para assumir a pasta logo após a saída de Dilma Rousseff, que renunciou ao cargo para concorrer à Presidência, mas foi preteria por Erenice a pedido de Dilma. Até o anúncio oficial do nome de Miriam, quem comanda a pasta interinamente é Carlos Eduardo Esteves Lima, atual secretário-executivo da Casa Civil

A provável nova ministra-chefe da Casa Civil integra o círculo de confiança do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que a convidou para integrar a equipe de transição em 2002, ano em que foi eleito pela primeira vez. Miriam também é amiga de Gilberto Carvalho, chefe de gabinete de Lula. Os dois trabalharam como secretários em Santo André, no ABC Paulista, na gestão de Celso Daniel, assassinado em 2002.

Ela foi casada com Celso Daniel durante 10 anos, mas o casal já estava separado quando o ex-prefeito foi assassinado. As circunstâncias ligadas à morte ganharam contornos políticos quando se descobriu no curso das investigações que funcionava em Santo André uma quadrilha que tomava dinheiro de empresas de ônibus e mantinha um caixa dois que, segundo denúncia do irmão do prefeito Celso Daniel, financiava campanhas do PT. O irmão do prefeito morto, o médico João Francisco Daniel, chegou a apontar Miriam como uma das integrantes do esquema. Em depoimento ao Ministério Público, ela negou qualquer participação no caso.

Miriam ocupou o cargo de assessora especial da Presidência da República até ser chamada em 2003 pelo então ministro da Casa Civil, José Dirceu, para integrar o ministério. Até a saída de Dilma, ocupou a função de subchefe de Avaliação e Monitoramento da pasta.

5 mistérios e uma certeza

Os bastidores do caso Celso Daniel, o crime
com elementos de romance policial que
provoca calafrios na cúpula do PT


João Gabriel de Lima

Montagem sobre fotos Fabiano Accorsi, Jonne Roriz/AE, Lawrence Bodnar/AE, Fernando Pilatos/Futura Press, Samir Baptista/AE, Epitacio Pessoa/AE e Marcelo Alves/Futura Press
Celso Daniel e Carlos Delmonte (nos destaques): trama com assassinatos, enganos, corrupção, sexo, romance...








O cadáver de Celso Daniel, que jaz embalsamado no Cemitério da Saudade, em Santo André, ainda assombra o PT. Nos últimos dois meses, os dois irmãos do prefeito assassinado, João Francisco e Bruno Daniel, depuseram na CPI dos Bingos. Voltaram a bater na tecla de sempre – a de que dois petistas de alto coturno, José Dirceu e Gilberto Carvalho, puxavam os fios do esquema de corrupção que se instalou em Santo André. Nos próximos dias os irmãos serão colocados frente a frente com Gilberto Carvalho em uma acareação promovida pela CPI. Essa idéia provoca calafrios até no presidente da República – Lula declarou recentemente que a CPI dos Bingos estaria "perdendo o foco". Na quarta-feira passada, mais um morto se juntou à pilha de cadáveres de alguma forma relacionados com o caso. Carlos Delmonte Printes, médico-legista que fez a autópsia de Celso Daniel e constatou marcas de tortura, foi encontrado sem vida em seu escritório. Até sexta-feira o episódio ainda intrigava a polícia e o Ministério Público. O exame pericial descartou causas naturais como um ataque do coração, mas também não havia marcas de violência que sustentassem a hipótese de assassinato.

O crime que vitimou o prefeito petista, seqüestrado na noite de 18 de janeiro de 2002 e morto na tarde do dia seguinte, tem todos os ingredientes de um romance policial. Mistério, pistas falsas, sexo e luta pelo poder. A trama, no entanto, segue uma dinâmica peculiar: procura-se um assassino e, no lugar dele, são encontrados corruptos. Reduzido à sua essência, o caso se compõe de dois crimes. O primeiro é o assassinato do prefeito em si. O segundo, o esquema de corrupção formado na cidade que ele administrava. Há fortes indícios de que haja uma conexão entre ambos, mas não apareceu até agora uma prova definitiva. O primeiro crime, o assassinato, ainda está longe de ser solucionado. A polícia identificou e prendeu os integrantes da quadrilha que, na noite do dia 18, em São Paulo, seguiu o Mitsubishi Pajero onde estavam o prefeito e seu amigo Sérgio Gomes da Silva, rendeu-os, seqüestrou Celso Daniel e o abandonou no dia seguinte numa estrada, já sem vida e com marcas de tortura. Não é possível afirmar com certeza se houve um mandante. Suspeito de ser o arquiteto da ação, o empresário Sérgio Gomes da Silva teve prisão preventiva decretada e passou sete meses na cadeia. Foi solto em julho do ano passado por falta de provas. Já sobre o segundo crime, a propina que o PT cobrava de empresas que prestavam serviços à prefeitura, não há dúvidas. É um dos poucos casos de corrupção no Brasil que têm extrato bancário.

Os depoimentos na CPI e as investigações sobre a morte do legista fornecem uma grande oportunidade para esclarecer os mistérios relacionados à morte do prefeito e aprofundar a única certeza – a de que havia roubalheira em benefício do PT em sua administração. Enquanto não se souber exatamente o que aconteceu, o espectro de Celso Daniel continuará a assombrar o PT – assim como aqueles vilões de filmes de terror que morrem no final, mas ressuscitam no episódio seguinte provocando sustos ainda maiores.

A CERTEZA

Corrupção com recibo e extrato bancário

Examinando o caso Celso Daniel com óculos de hoje, pode-se dizer que a cidade de Santo André foi a precursora do mensalão. Na tarde do dia 24 de janeiro de 2002, cinco dias depois do assassinato do prefeito, a empresária Rosângela Gabrilli, dona de uma empresa de ônibus em Santo André, procurou o Ministério Público para fazer uma denúncia grave. Segundo ela, os donos de companhias rodoviárias da cidade eram obrigados a contribuir para uma caixinha do PT. O valor do mensalão seria proporcional à quantidade de ônibus que cada empresário possuía, à razão de 550 reais por veículo. A própria Rosângela, dona da Expresso Guarará, pagava 40.000 reais todos os meses. A empresária apontou três responsáveis pelo esquema de cobrança. Sérgio Gomes da Silva, o "Sombra", melhor amigo do prefeito. Klinger Luiz de Oliveira Sousa, ex-secretário de Serviços Municipais de Santo André. E Ronan Maria Pinto, sócio de Sérgio em três empresas, ele próprio um dos maiores concessionários do setor de transporte público na cidade. Em plena efervescência da campanha eleitoral, a denúncia foi desqualificada por vários petistas, que viram na atitude de Rosângela indícios de manobra eleitoreira. Mesmo assim, abriu-se uma CPI em Santo André e o Ministério Público foi chamado a investigar o caso.

A prova de que Rosângela falava a verdade veio em abril de 2003. A empresária encontrou no fundo de uma gaveta da Expresso Guarará, de sua propriedade, um fax datado de 30 de dezembro de 1998, em que se informava qual seria o valor da caixinha do mês – 100.000 reais – e qual parte caberia a cada uma das sete empresas de ônibus na cidade. No mesmo fax havia o número da conta bancária de Sérgio Gomes da Silva. Com base no fax, o Ministério Público pediu a quebra do sigilo bancário de Sérgio e constatou que havia depósitos na conta dele, na mesma data, exatamente nos valores discriminados no fax. Segundo Rosângela, a caixinha costumava ser paga em dinheiro vivo, transportado em envelopes – naquele tempo os corruptos ainda não se deixavam apanhar de cuecas recheadas. Em ocasiões especiais, o depósito era feito diretamente na conta de Sérgio Gomes da Silva. Trinta de dezembro, véspera de feriado e dia de folga dos office-boys das empresas de ônibus, era uma dessas ocasiões. Os extratos bancários levantados pelo Ministério Público mostraram que o dinheiro tinha entrada e saída. No histórico da conta de Sérgio, próximo às datas em que ele recebeu o dinheiro, havia vários depósitos em favor de amigos, entre eles Ivone de Santana, a namorada de Celso Daniel na época de seu assassinato. "Era um empréstimo pessoal, Sérgio e eu somos amigos há anos", disse Ivone a VEJA. Assim, a partir da única certeza do caso – a de que havia caixinha político-eleitoral em Santo André – surge o primeiro mistério: quem estava por trás do esquema? E quem se beneficiou dele?

I MISTÉRIO

Quem chefiava a quadrilha que arrecadava dinheiro para o PT em Santo André?

Fotos Ricardo Trida/Futura Press
Ronan Maria Pinto, Sérgio Gomes da Silva, o "Sombra", e Klinger Luiz de Oliveira Sousa: testemunhas os apontam como coordenadores do esquema de corrupção em Santo André. Klinger e Ronan escaparam por pouco da cadeia. Sérgio ficou sete meses preso

Durante muito tempo se difundiu a versão de que Celso Daniel foi assassinado porque tentou acabar com o esquema de propina de Santo André. A mais recente virada no caso, em setembro deste ano, trouxe um forte indício de que o prefeito sabia do esquema e se beneficiava dele. O Ministério Público de Santo André localizou uma diarista que prestava serviços ao casal Ivone de Santana e Celso Daniel. Ela concordou em falar desde que seu nome não aparecesse nos autos. Certa vez, durante uma faxina no apartamento, a diarista encontrou três sacos de dinheiro escondidos sob um lençol. No dia seguinte, os sacos não estavam mais lá. "Isso constitui para nós uma prova cabal de que Celso não apenas sabia do esquema como participava dele", diz o promotor Roberto Wider Filho, de Santo André, que investiga o caso desde o princípio. "Até então, o que sabíamos através de depoimentos de amigos e parentes era que o prefeito talvez conhecesse o esquema, mas o tolerava desde que o dinheiro fosse todo para o partido. E teria ficado chateado ao perceber que alguns correligionários se locupletavam."

Fica ainda mais difícil acreditar que Celso Daniel não participava quando se levam em consideração os estreitos laços de amizade entre os petistas de Santo André no tempo da administração do prefeito. Eram como uma quadrilha, no bom sentido do termo – o do poema de Carlos Drummond de Andrade que evoca uma dança. Miriam que amava Celso que amava Ivone que se casou com Michel mas que também amava Celso. Ronan que era sócio de Sérgio que era amigo de Celso que preparava Klinger para ser seu sucessor. Celso que é irmão de Bruno que é casado com Marilena que é amiga de Sérgio.

Ao contrário do que ocorre no poema, os petistas da quadrilha de Santo André têm nome e sobrenome. Miriam Belchior, a primeira mulher do prefeito, Ivone de Santana, sua última namorada, e os irmãos Michel e Maurício Mindrisz, amigos de toda a vida de Celso, se conheceram na adolescência. Eram da turma que freqüentava o boulevard Oliveira Lima, no centro de Santo André, um dos primeiros calçadões do Brasil. Chegaram a cunhar o verbo "boulevardiar", que significava paquerar no calçadão. Celso começou a namorar Miriam Belchior na juventude. Na mesma ocasião, outra moça, Ivone de Santana, se apaixonou por ele. Celso namorava firme uma, mas não desprezava a outra. Quando ele finalmente se decidiu por Miriam, Ivone se casou com Michel Mindrisz, um dos melhores amigos de Celso e filho da dona da loja de roupas onde ela trabalhava. Foram felizes, mas Ivone continuou vendo Celso durante o casamento. Chegou a ter uma filha desse caso extraconjugal, a qual Michel acabou assumindo. Depois que Celso se separou de Miriam, ele e Ivone, já bem mais maduros, voltaram a ter um relacionamento. Essa contradança amorosa é relevante para o caso por uma razão: toda a turma do Boulevard – Ivone, Miriam, Maurício e Michel – ocupou cargos em um ou mais mandatos de Celso Daniel à frente da prefeitura de Santo André (foram três no total, o último inconcluso). O fato ilustra uma característica marcante do estilo administrativo do prefeito. Ele gostava de se cercar de amigos íntimos, de extrema confiança.

O empresário Sérgio Gomes da Silva, por exemplo, era de máxima confiança. Foi apresentado ao prefeito por Marilena, mulher de seu irmão mais novo, Bruno Daniel. Corria o ano de 1988, Celso estava em campanha para prefeito e queria ter um esquema de segurança. Sérgio era versado em artes marciais, conhecia muita gente na área e montou uma equipe para o candidato. Eleito, Celso lhe deu a coordenação da guarda municipal e da defesa civil. Sérgio foi ganhando a intimidade do chefe e cresceu dentro da prefeitura. Logo estava pilotando os chamados "projetos matriciais", iniciativas que envolviam diferentes secretarias. Isso significa que era poderosíssimo, pois estava encarregado de cobrar os secretários, motivo pelo qual todos o chamavam de "Sérgio Chefe". Marilena, a mulher de Bruno, que havia sido nomeada secretária de Educação, largou a Pasta após uma divergência com o prefeito. O relacionamento entre os dois irmãos, que eram muito próximos, ficou estremecido. Sérgio de certa maneira ocupou o espaço vago, tanto que muitos dos amigos comuns a ambos definem a relação dos dois como fraterna. Ele ficou tão íntimo da turma do Boulevard que se tornou sócio de Celso, Maurício Mindrisz e Miriam Belchior numa empresa de consultoria. Esteve próximo às atividades políticas de Celso até 1996, quando fez um novo amigo, Ronan Maria Pinto, e entrou em sociedade com ele em três empresas de ônibus. Além disso, Sérgio tornou-se consultor de Ronan na área de coleta de lixo, atividade pela qual os petistas nutrem uma curiosa atração. Juntos, ambos prestaram vários serviços à prefeitura de Santo André durante os mandatos de Celso Daniel.

O Ministério Público de Santo André detectou irregularidades em vários desses contratos, e os investiga até hoje. Os rendimentos declarados de Sérgio Gomes se multiplicaram por dez entre 1996 e 2000. Enquanto o "Sombra" enriquecia, Celso Daniel também fazia um novo amigo. Arquiteto nascido no Maranhão, Klinger Luiz de Oliveira Sousa foi aluno do prefeito, que também era professor, na pós-graduação da Fundação Getulio Vargas de São Paulo. Acabou guindado ao cargo de secretário de Administração quando o prefeito se elegeu para o seu segundo mandato, em 1996. Corriam rumores de que Celso preparava Klinger para ser seu sucessor.

Não há indícios de rachas na "Turma do Boulevard" que sustentem a tese de que o prefeito, indignado com o esquema de corrupção, tenha brigado com seus até então fiéis colaboradores. Se alguma divergência houve, acabou em esfiha. Em janeiro de 2002, uma semana antes do crime bárbaro, Celso resolveu ir ao restaurante Arabia, em São Paulo, para comemorar sua indicação a coordenador da campanha eleitoral de Luiz Inácio Lula da Silva, que considerava o ápice de sua carreira política. Convidou três companheiros petistas para o evento. O primeiro era Sérgio Gomes da Silva. O segundo, Klinger Luiz de Oliveira Sousa. E o terceiro... Bem, o terceiro será revelado no próximo capítulo.

II MISTÉRIO

Qual a real participação de José Dirceu
e Gilberto Carvalho no esquema de
corrupção da prefeitura petista?

Fotos Dida Sampaio/AE, Caio Guatelli/AE e Celso Junior/AE
Luiz Eduardo Greenhalgh irritou a família de Celso Daniel ao insistir na versão de crime comum. Gilberto Carvalho (ao centro) e José Dirceu foram apontados pelos irmãos do prefeito assassinado como integrantes do esquema de corrupção

No dia 24 de maio de 2002, apresentou-se ao Ministério Público de Santo André uma testemunha que pediu para não ser identificada. Ela aparece nos autos do processo com o nome de "Testemunha Número Um". Diante de quatro promotores, o depoente, que declarou ser pessoa próxima do prefeito, disse ter conhecimento do esquema de caixinha denunciado por Rosângela Gabrilli. Endossou o nome dos coordenadores: Sérgio, Klinger e Ronan. A partir daí, fez acréscimos bombásticos. Segundo a Testemunha Número Um, Gilberto Carvalho, um dos homens mais próximos de Lula na burocracia petista, sabia do esquema. Mais do que isso. Gilberto Carvalho teria dito à Testemunha Número Um que ele próprio teria sido por diversas vezes o portador do dinheiro da caixinha, que entregava pessoalmente ao presidente do partido, o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu.

Um mês depois, em junho, a Testemunha Número Um assumiu sua identidade. Tratava-se de João Francisco Daniel, o irmão mais velho do prefeito. Na ocasião, vários cardeais petistas – entre eles o deputado Luiz Eduardo Greenhalgh, escalado pelo partido para acompanhar o caso – vieram a público desqualificar João Francisco, dizendo que ele estava a serviço da "direita" e que era brigado com o irmão. Contra esse argumento, o irmão do prefeito lembrou a VEJA que, meses antes do seqüestro, ele próprio, João Francisco, Celso e respectivas mulheres haviam viajado juntos para a Itália, de férias. Recentemente, João Francisco contou a mesma história envolvendo Gilberto Carvalho e José Dirceu à CPI dos Bingos. Em outro depoimento à mesma CPI, o irmão mais novo de Celso, Bruno, endossou a versão. De acordo com João Francisco, Miriam Belchior, a primeira mulher do prefeito, também sabia da história em seus detalhes.

Ex-seminarista e ligado à esquerda católica, Gilberto Carvalho foi um dos fundadores do PT no Paraná. Quando saiu de seu estado natal, ocupou várias funções na burocracia do partido, em geral diretamente ligadas a Luiz Inácio Lula da Silva. Por essa razão, quando Celso Daniel o nomeou secretário de Comunicação de sua prefeitura, ele foi visto pela turma do Boulevard como um enviado especial do próprio Lula ao ABC paulista. Era atípico Celso escolher colaboradores fora do círculo de seus amigos mais próximos. Gilberto, no entanto, se adaptou bem. Tornou-se próximo não apenas de Celso Daniel, mas também de Sérgio Gomes da Silva e Klinger Luiz de Oliveira Sousa, que os irmãos de Celso apontam como os chefões da corrupção. Naquela noite no restaurante Arabia em que Celso comemorava sua ascensão a coordenador de campanha no PT, Sérgio, Klinger e Gilberto Carvalho brindaram com ele. "Acho uma injustiça dizerem que Celso brigou comigo porque soube de algum suposto esquema. Éramos muito próximos até o fim da vida, e se alguém saiu extremamente prejudicado dessa história fui eu", disse Klinger a VEJA. A reportagem da revista tentou confirmar o encontro no restaurante com Gilberto Carvalho, mas ele não retornou as ligações. Além dele, Miriam Belchior e José Dirceu também foram procurados. Informados do assunto que seria tratado, não atenderam à reportagem de VEJA.

III MISTÉRIO

Por que o Ministério Público e a
Polícia Civil chegaram a conclusões
tão diferentes sobre o caso?

Fotos Agliberto Lima/AE, Marcelo Casal Jr/ABR e Ed Ferreira/AE
Miriam Belchior (à esquerda), ex-mulher de Celso Daniel, também sabia da roubalheira em Santo André, de acordo com os dois irmãos do prefeito, o professor Bruno Daniel (ao centro) e o médico oftalmologista João Francisco Daniel (à direita)

Bruno Daniel é o irmão mais novo de Celso. Eles freqüentaram simultaneamente a Escola de Engenharia Mauá, em São Bernardo do Campo, iniciaram juntos a militância no PT (o mais velho dos irmãos, João Francisco, preferia ficar longe de política) e iam constantemente ao Estádio do Pacaembu, em São Paulo, para assistir a jogos do Corinthians. Sempre foram muito próximos. O assassinato de Celso traumatizou Bruno. Entre as mágoas que guarda do episódio, uma se destaca: a que nutre pelo deputado petista Luiz Eduardo Greenhalgh, o qual teria tentado abafar, a todo custo, os rumores de que o crime contra Celso Daniel teria motivação política. É importante lembrar aqui que, no enterro do prefeito, o então candidato a presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um discurso emocionado, em que disse: "Esse crime não foi coincidência. Tem gente graúda por trás disso, e nós vamos descobrir quem é". Dois meses depois, ninguém mais no PT queria saber de apurar o crime. Greenhalgh, destacado pelo partido para acompanhar o caso, tentava convencer a família a não aprofundar as investigações. "Para mim houve um acordo entre PT e PSDB nas vésperas das eleições. Certamente o PT temia que a apuração sobre a morte do meu irmão revelasse mais corrupção, e acertou com o PSDB um abafamento do caso, em troca de silêncio sobre possíveis falcatruas dos tucanos. O Greenhalgh, uma pessoa em que eu confiava, comprou essa versão e tentou vendê-la a nós", disse Bruno a VEJA.

A teoria do irmão de Celso ganhou corpo por causa do próprio silêncio da Polícia Civil do Estado de São Paulo, que durante muito tempo se negou a dar entrevistas sobre o caso. A verdade, no entanto, é que a investigação foi, sim, tratada como prioridade dentro da instituição. Para apurar o assassinato de Celso Daniel, o Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa destacou um de seus quadros mais experientes, o delegado Armando de Oliveira Costa Filho. Ele entrou no caso em 21 de janeiro, dois dias depois da morte do prefeito. Formou uma força-tarefa com 33 investigadores, seis delegados e cinco escrivães. Sua primeira suspeita era um homicídio encomendado. Mirando nessa direção, enviou detetives a Santo André e às faculdades nas quais o prefeito dava aulas, a Fundação Getulio Vargas e a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Não achou nenhum inimigo que pudesse ser considerado um suspeito forte. Os boatos de que havia sido crime passional também foram descartados por falta de fundamentação. Havia indícios de que o prefeito fosse homossexual e mantivesse um relacionamento com Sérgio Gomes da Silva. O delegado Armando recebeu a informação, vinda do médico-legista, de que Celso era realmente bissexual, mas considerou esse dado irrelevante pelo fato de o prefeito ter uma namorada firme – Ivone – e por nada apontar para outro relacionamento estável, com homem ou com mulher, no mesmo período.

A hipótese de homicídio encomendado começou a ser descartada em 7 de fevereiro de 2002, quando a polícia prendeu José Édison, um dos bandidos da quadrilha que seqüestrou Celso. Em seu depoimento, ele contou que a intenção era seqüestrar um comerciante da Ceasa paulistana. Seguiram-no na noite do dia 18, mas o perderam de vista. Para não voltarem para casa de mãos abanando – haviam roubado dois carros para o crime –, eles resolveram escolher outra vítima aleatoriamente. Foi quando passou a vistosa Mitsubishi Pajero a bordo da qual Sérgio Gomes da Silva e Celso Daniel voltavam a Santo André depois de um jantar no restaurante Rubaiyat, em São Paulo. Os bandidos renderam o carro. José Édison contou à polícia que, pelo biotipo de Sérgio Gomes, pensaram que se tratasse do motorista. No banco do carona, Celso Daniel, alto e branco, parecia um empresário. Partiram, assim, para o seqüestro que acabou desembocando na morte do prefeito. O bandido afirmou que ele e seu bando resolveram assassinar Celso Daniel depois de o identificarem como prefeito de Santo André. Ficaram com medo da perseguição implacável que sofreriam por parte da polícia. O delegado Armando e sua equipe prenderam os outros integrantes da quadrilha da favela Pantanal, que confirmaram a história. "Perícia, impressões digitais, tudo batia. Depois veio o Ministério Público, que não entende nada de investigação, e disse que o trabalho era malfeito. Isso é um absurdo", queixou-se o delegado a VEJA.

O caso foi reaberto por pressão dos irmãos de Celso Daniel, que conseguiram que o Ministério Público de Santo André, encarregado da questão da corrupção na prefeitura, passasse a investigar também a morte. Como ocorreu no que se refere à Polícia Civil, foi destacada uma elite de procuradores: Roberto Wieder, Amaro Thomé e José Reinaldo Carneiro, familiarizados com investigações complicadas de desvio de dinheiro. O ponto de partida deles era justamente o laudo do legista Carlos Delmonte Printes, que acusava a tortura. Havia manchas vermelhas em várias partes do corpo do prefeito assassinado, provavelmente produzidas por agressões com o cano do revólver. Havia também uma contusão no crânio. O cadáver de Celso Daniel fora encontrado atravessado na estrada. O prefeito vestia apenas uma cueca, colocada ao contrário. No código dos bandidos, isso poderia significar traição. Essa interpretação dos promotores foi reforçada pelo fato de Celso Daniel ter levado um tiro no rosto, o que poderia ser indício de vingança – matar alguém desfigurando-lhe a fisionomia é sinal de humilhação no mundo do crime organizado.

Os promotores passaram a suspeitar que podia haver algo mais do que crime comum. A possível conexão entre a corrupção na prefeitura petista e o assassinato, no entanto, só apareceria mais tarde. "Demos uma virada no caso, e a polícia se negou a investigar para não admitir que fizera um péssimo trabalho", acusou o promotor José Reinaldo Carneiro – o mesmo que, recentemente, denunciou o escândalo de arbitragem no Campeonato Brasileiro de Futebol. A virada seria o depoimento de um outro bandido, Ailton Alves Feitosa. Ele é até hoje o maior indício de que as duas tramas da história policial – assassinato e corrupção – podem estar de alguma forma interligadas.

IV MISTÉRIO

Existe alguma relação entre as
sete mortes ligadas ao caso?

L. C. Leite/AE
Heitor Hui/AE

O legista Delmonte: seus superiores o proibiram de dar entrevistas quando ele começou a defender a tese de que Celso Daniel havia sido torturado

Celso Daniel: revelações de sua diarista provocaram uma virada no caso. De acordo com ela, o prefeito morto guardava sacos de dinheiro debaixo de um lençol

Na sexta-feira passada, a Polícia Civil e o Ministério Público finalmente concordaram em alguma coisa relacionada ao caso Celso Daniel. Ambos trabalhavam com a hipótese de que o legista Carlos Delmonte Printes havia se suicidado. Na véspera, a polícia defendia a tese de morte natural por ataque cardíaco ou problemas pulmonares. A perícia do Instituto Médico Legal, no entanto, descartou causas naturais. As vísceras de Delmonte, assim, foram encaminhadas para um exame toxicológico. De acordo com a família, o legista andava deprimido com a morte de um filho e a doença grave de outro. Mais um indício de suicídio foi a carta que o médico deixou com um terceiro filho, na qual especificava detalhes sobre o próprio enterro e autópsia e listava números de contas bancárias e respectivas senhas. Na tarde de quarta-feira, o legista foi encontrado morto no chão de seu escritório no bairro paulistano de Vila Clementino. Na ocasião, ele estava de cuecas.

A morte de Delmonte é a sétima relacionada ao caso. Dos outros seis mortos, pelo menos três poderiam dar uma virada nas investigações. O mais importante era o bandido Dionísio Aquino Severo, um dos seqüestradores de Celso Daniel. Na manhã de 17 de janeiro de 2002, dois dias antes da ação criminosa, Dionísio e mais dois amigos protagonizaram uma fuga espetacular. Eles tomavam sol no pátio do presídio Parada Neto, em Guarulhos, quando um helicóptero apareceu e os resgatou. Só não foi mais cinematográfico porque os guardas do presídio não reagiram. Estavam, como se diz no jargão dos bandidos, com "os fuzis entupidos" – ou seja, haviam recebido propina para facilitar a fuga. Quem teria pago? Teria sido Dionísio, libertado propositalmente para que seqüestrasse Celso Daniel? Pelo menos uma pessoa acreditava nessa hipótese: o delegado Romeu Tuma Júnior, titular na ocasião da delegacia seccional de Taboão da Serra, sob cuja jurisdição estava a cidade de Juquitiba, município onde o corpo foi encontrado. Sondagens feitas por seus investigadores davam conta de que o helicóptero utilizado na fuga havia sido alugado na região do ABC. Quando passou a investigar a conexão, Tuma começou a receber ameaças de morte. Os recados vinham da parte do próprio Dionísio. Três meses mais tarde, o bandido seria preso em Maceió, onde tentava assaltar um banco. No dia 8 de abril foi levado ao delegado Tuma. Disse que sabia muito sobre o caso, mas só falaria se fosse possível negociar "condições especiais". Não teve tempo para isso. Foi assassinado dois dias depois dentro do presídio do Belém, em São Paulo. Dois dos outros mortos guardavam relação com Dionísio. O primeiro era o bandido Sérgio "Orelha", que escondera Dionísio logo depois da fuga do presídio. O outro, Otávio Mercier, investigador da Polícia Civil que procurava Dionísio depois da fuga e teria chegado a fazer um contato com ele por telefone. Ambos morreram assassinados a tiros.

Antônio Palácio de Oliveira, garçom que serviu o último jantar de Celso Daniel no restaurante Rubaiyat, morreu quando, perseguido por dois homens, espatifou sua motocicleta num poste. Paulo Henrique Brito, testemunha que poderia ajudar a esclarecer as circunstâncias do acidente com o garçom, foi assassinado com um tiro vinte dias depois. A penúltima morte relacionada ao caso foi a de Iran Moraes Redua, o agente funerário que reconheceu o corpo de Celso Daniel, jogado numa estrada de terra em Juquitiba. Redua foi assassinado a tiros em novembro de 2004.

É duvidoso que o legista Carlos Delmonte Printes soubesse algo além do que já havia dito – ele recentemente participou de dois programas de entrevistas da Rede Globo. Em agosto deste ano, Printes deu um depoimento a Roberto Wider e Amaro Thomé Filho, promotores de Santo André envolvidos com o caso, no qual disse que passou dois anos proibido de falar sobre o assunto pelo superintendente da Polícia Científica de São Paulo, Celso Perioli, e pelo diretor do Instituto Médico Legal, José Jarjura. No ano passado, em plena vigência da mordaça, VEJA conseguiu falar com Carlos Delmonte Printes numa entrevista à qual compareceram outros integrantes da Polícia Civil. Sob a vigilância de seus superiores, Delmonte deu uma versão intermediária sobre o caso. Celso Daniel havia sido torturado, sim, mas isso não significava necessariamente que se tratava de crime político, pois existem bandidos comuns que matam com requintes de sadismo. A revelação mais impressionante que fez na ocasião – e que repetiu no depoimento de agosto aos promotores de Santo André – foi a de que o corpo de Celso Daniel, a pedido dele, havia sido embalsamado. A intenção era que o cadáver pudesse ser exumado no futuro. A ação esteve a cargo da equipe do Aeroporto de Cumbica, especializada em embalsamamento de corpos para traslados internacionais. Carlos Delmonte Printes acreditava que muita coisa ainda viria a ser descoberta sobre o caso, e um novo exame do cadáver poderia fornecer revelações adicionais (o legista confirmou também que Celso morrera no sábado 19, e não no domingo 20, como está no túmulo do prefeito reproduzido na capa de VEJA).

Sete mortes depois, resta como testemunha mais importante Aílton Alves Feitosa, um dos companheiros de Dionísio Aquino Severo na fuga do presídio Parada Neto.

V MISTÉRIO

Qual a relação entre o assassinato e
o esquema de propina em Santo André?

Quando convidou Dionísio para jogar bola no pátio da cadeia num dia de céu azul, Feitosa ouviu do amigo: "Hoje o dia está propício para voar". Achou que o colega andava meio estranho e foi para o futebol. Minutos mais tarde, os dois times ficaram estarrecidos ao ver um helicóptero pousar no pátio da cadeia e resgatar Dionísio. Ele próprio, Feitosa, ficou mais surpreso ainda – de forma agradável – quando o companheiro gritou seu nome, chamando-o para fugir com ele. Foi essa a história que ele contou ao Ministério Público de Santo André em setembro de 2002. O mais grave de seu depoimento viria depois. Fugido da cadeia, Feitosa ficou escondido na casa de dona Dete, tia de Dionísio, e teria ouvido conversas dele com seus comparsas no seqüestro de Celso Daniel. Eles falavam que estava tudo pronto para levar o "peixe grande". Que o empresário que iria acompanhá-lo sabia de todo o plano e iria facilitar a ação. Que a perseguição, as colisões e os disparos na Pajero seriam apenas para "fazer a cena" – afinal, todos sabiam que o carro era blindado e ninguém em seu interior corria riscos. Que a morte do "peixe grande" seria uma "queima de arquivo". Que Dionísio havia sido resgatado do presídio para realizar uma série de operações criminosas, e que a principal delas seria justamente esse assassinato. Era fácil legendar a história. O empresário seria Sérgio Gomes da Silva, e o "peixe grande", Celso Daniel. Depoimentos posteriores de parentes e amigos de Dionísio e Feitosa confirmaram vários pontos da versão do segundo. Num dos depoimentos, Dionísio aparece como mentor da quadrilha, à qual ele se referia carinhosamente como "timinho de Diadema". Num depoimento, a mulher de Dionísio cita o "Sombra" como financiador da operação.

Foi com base principalmente nesse depoimento que Sérgio Gomes da Silva teve sua prisão preventiva decretada em dezembro de 2003, na condição de elemento de alta periculosidade. Klinger e Ronan escaparam por pouco. Quase foram condenados pelo Tribunal de Justiça de São Paulo em junho do ano passado. De três desembargadores, dois votaram a favor da prisão e um pediu vistas ao processo. Na segunda votação, um dos desembargadores mudou de idéia e eles se salvaram. Em julho do ano passado, Sérgio Gomes da Silva também foi solto. O juiz achou que não havia provas suficientes de que ele fosse o mandante do assassinato. De lá para cá, os personagens do caso Celso Daniel continuam levando vida normal. Quase todos eles, como José Dirceu, Gilberto Carvalho, Miriam Belchior, Maurício Mindrisz, Ronan Maria Pinto, Klinger Luiz de Oliveira Sousa e o próprio Sérgio Gomes da Silva, continuam participando de governos do PT, próximos ao PT ou fazendo negócios com o PT. Na semana passada, um relatório do Conselho de Defesa da Pessoa Humana, órgão ligado ao Ministério da Justiça, recomendou que se reabrisse o caso Celso Daniel. O parecer provocou ira no governo.

No Cemitério da Saudade, em Santo André, jaz um corpo embalsamado.



A Morte Misteriosa de Celso Daniel - 2

Executado a sangue frio
Seqüestrado, torturado e morto com sete tiros, o prefeito de Santo André, Celso Daniel, torna-se o maior símbolo da ousadia dos bandidos em São Paulo

Cesar Guerrero, Edwin Paladino e Tiago Ribeiro

VELÓRIO
RECONSTITUIÇÃO


Noite de terça-feira 22 Noite de sexta-feira 18 Noite de sábado 19


Epitácio Pessoa/AE
Policiais civis, militares e federais, além do então secretário de Segurança, Marco Petreluzzi, e do comandante geral da PM, Rui Cesar Mello, observam o corpo: Celso Daniel colocou as mãos no rosto na tentativa de se proteger dos tiros

A imagem do corpo do prefeito de Santo André, Celso Daniel, 50 anos, jogado no chão de terra batida sob o olhar impotente do secretário de Segurança Pública do Estado de São Paulo, Marco Vinício Petreluzzi, e de agentes das polícias federal, civil e militar, é reveladora. Fruto de um crime absurdamente cruel, ela é o ápice de uma escalada de seqüestros e insegurança, que abala a candidatura do governador Geraldo Alckmin à reeleição e coloca o combate à criminalidade no topo da agenda política do País.

Celso Daniel foi arrancado do interior de uma Pajero preta blindada às 23h30 de sexta-feira 18, quando voltava de um jantar, na badalada churrascaria Rubayat, com o amigo e empresário Sérgio Gomes da Silva. Perseguida por um santana e uma blazer, a Pajero não resistiu às colisões e aos disparos de armas de fogo. Com o câmbio automático quebrado, parou. O impacto das batidas fez as bolsas de ar estourarem e as portas se destravaram automaticamente. Os oito seqüestradores foram rápidos, pegaram Celso enquanto, desgovernado, o carro descia uma ladeira com Sérgio dentro.

Celso Lima
Celso Daniel com a ex-mulher Miriam Belchior no Carnaval de 1989

Durante mais de 24 horas, a família aguardou um pedido de resgate que nunca existiu. Às 7h40 da manhã de domingo, o corpo foi encontrado numa ruela estreita do município de Juquitiba, a 78 quilômetros da capital paulista, mas a confirmação só veio duas horas depois. Ao lado, a carteira continha todos os documentos, mas o rosto estava desfigurado por dois tiros. O assassinato ocorreu por volta da 1h30. Celso vestia jeans e camisa azul clara de manga comprida e nestas roupas está um dos indícios da premeditação do crime. Quando foi seqüestrado, o prefeito vestia calça social bege, camisa de manga curta e blazer. A polícia estranha não apenas a troca, como o fato das novas roupas servirem perfeitamente no prefeito, um homem magro e alto, com 1,88m.




Luciano Viciune
Na campanha presidencial de 1989, ao lado de Lula

“Ele ainda levantou os braços para se proteger dos disparos mas não teve chance”, diz o deputado estadual Jamil Murad, que acompanhou a necropsia. O prefeito recebeu sete tiros de uma pistola 9mm e a perícia constatou que ele foi torturado. É o segundo administrador municipal do PT assassinado em quatro meses. O prefeito de Campinas, Antônio da Costa Santos, o Toninho do PT, foi morto no dia 10 de setembro passado, um caso ainda não esclarecido. Amigo de Luiz Inácio Lula da Silva há mais de 20 anos, ele coordenava a equipe responsável pela elaboração do programa de governo da campanha do candidato à Presidência.

Durante um ato ecumênico realizado na tarde de domingo 20, no Paço Municipal de Santo André, Lula era um dos mais abatidos. Com o rosto inchado, olhos vermelhos e o colarinho da camisa encharcado de lágrimas, o presidente de honra do PT não teve sequer condições de falar à multidão que se aglomerava diante do palanque. Limitou-se a escrever uma frase na bandeira branca que mais tarde seria entregue à família do prefeito assassinado: “A luta vai continuar, pelo Celso e pelo Brasil”, dizia a mensagem. Lula só conseguiu falar sobre a morte do amigo num discurso na segunda 21, pouco antes do enterro. “Era o maior planejador do Partido dos Trabalhadores nos últimos tempos”, disse. “Não tenho provas, mas estou convencido de que a morte de Celso não foi fruto do acaso. Possivelmente foi planejada e tem gente grossa por detrás disso.”

“Ele tinha um censo de organização muito apurado
e fazia questão de manter tudo na mais absoluta ordem’’
Gilberto Carvalho, secretário de Governo


Valdevino Junior
O prefeito em ação pelo time de veteranos do clube de Santo André

As principais figuras do partido também não acreditam que a morte de dois prefeitos e os diversos atentados e ameaças contra lideranças petistas nos últimos meses sejam obras do acaso (leia reportagem à pág. 30). A prefeita de São Paulo, Marta Suplicy, criticou a ação da polícia de São Paulo. “Não dá para ter dois prefeitos mortos e achar que é coincidência”, reclamou a prefeita. A prefeita também reclamou da morosidade nas investigações. A polícia só localizou um dos carros que teriam sido usados no seqüestro na tarde de terça 22. José Dirceu, presidente do partido, foi mais contundente. “A polícia é parte do problema. Por que que não se desvenda o assassinato do Toninho? Todo mundo sabe que é porque bateu no crime organizado, no narcotráfico e na corrupção que chegaram até a polícia”, afirmou.





Heitor Hui/AE
No curso de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas

Celso Daniel estava no terceiro mandato na prefeitura de Santo André. Ele administrou o município de 1989 a 1992 e voltou ao cargo nas eleições de 1996. Fez uma reforma administrativa que parece ir na contramão do receituário petista. Demitiu 10 % dos servidores e ainda privatizou a empresa de ônibus municipal. A fórmula encontrou críticas até dentro do PT, mas garantiu à prefeitura o fôlego para implantar programas sociais como o Bolsa-Escola e o Renda Mínima. Celso foi reeleito, em 2000, no primeiro turno com 70,13% dos votos.

O contato de Celso Daniel com a política começou em casa. Seu pai, Bruno José Daniel, já falecido, foi presidente da Câmara Municipal, e empresta o nome ao estádio de futebol da cidade. Mas Celso parecia não contar com os atributos do político tradicional. Introvertido, não sorria facilmente, nem era um orador destacado. Só decidiu entrar para a política depois da fundação do PT em 1980. Dois anos depois, tentou a prefeitura da cidade pela primeira vez.

“Celso teria um papel importante e poderia até ser ministro
da República no caso de uma vitória do partido nas
próximas eleições. Mataram um pedaço do futuro’’
Deputado Aloizio Mercadante

Apesar de pertencer a uma família tradicional de Santo André, o prefeito petista vivia com simplicidade. Morava em um apartamento de dois dormitórios com área de 70m2, na Vila Assunção, um bairro de classe média de Santo André. E não possuía outros imóveis a não ser uma parcela do apartamento de sua mãe Lourdes, em Santos. Dirigia um Gol ano 1996, azul, e tinha ainda um outro Gol, branco, modelo 1994. Era com o carro azul que ia para os treinos do time de veteranos de basquete do clube da cidade. O esporte era uma paixão que ele cultivava desde os tempos de colégio.

Tinha quatro irmãos, nenhum filho e raramente era visto em eventos sociais fora dos compromissos da prefeitura. Mantinha um relacionamento com Ivone Santana há três anos, e o máximo que fazia era ir a restaurantes com a namorada ou com o amigo, o empresário Sérgio Gomes da Silva, com quem estava na noite do seqüestro. Celso foi casado com Miriam Belchior, de quem se separou há 10 anos. Ela hoje ocupa a Secretaria de Inclusão Social de Santo André. “Eles tinham um bom relacionamento”, revela o secretário de governo Gilberto Carvalho, amigo de Celso.

“Ele levantou os braços para se proteger dos
disparos mas não teve chance’’
Deputado estadual Jamil Murad,
que acompanhou a necropsia


“Não tenho provas, mas estou convencido de que a
morte de Celso não foi fruto do acaso. Possivelmente
foi planejada e tem gente grossa por detrás disso’’
Luiz Inácio Lula da Silva, presidente de honra do PT


Antônio Ledis
Jantar com a namorada Ivone Santana, em 2001

Sua mesa no gabinete não acumulava nenhum papel, apesar do volume de trabalho. “Ele tinha um censo de organização muito apurado e fazia questão de manter tudo na mais absoluta ordem”, diz Gilberto Carvalho. Formado em Engenharia Civil, com mestrado em Administração Pública e doutorado em Ciências Políticas, o prefeito dedicava especial atenção à sua estante de livros. Os títulos eram organizados por assunto e dispostos em ordem alfabética. “O Celso era mesmo metódico”, confirma o deputado Aloízio Mercadante, amigo há 24 anos do prefeito assassinado.

Os dois se conheceram em 1978 quando ambos davam aulas na PUC de São Paulo. “Ele conservava até hoje o mesmo desejo de lecionar que tinha quando o conheci nos corredores da PUC”, diz Mercadante. No último ano, ele se dividiu entre a prefeitura e as aulas na Fundação Getúlio Vargas e na PUC-SP, onde era professor. Com a coordenação do programa de campanha de Lula, o prefeito tinha outros projetos para 2002. “Celso teria um papel importante e poderia até ser ministro da República no caso de uma vitória do partido nas próximas eleições”, revela Mercadante. “Mataram um pedaço do futuro.”

Piti Reali
O senador Eduardo Suplicy acompanha
a chegada do corpo
do prefeito à Câmara Municipal de
Santo André

Fernando Ferreira
Celso Daniel e o amigo Sérgio Gomes da Silva, no paço municipal em 1989: amizade antiga








10.09.10

Esqueletos Petistas

por
Caio Camargo
, Seção: Geral 06:50:38.

O closet do PT abriga ao menos dois esqueletos para cujas mortes boa parte dos cidadãos deseja esclarecimentos definitivos. Refiro-me ao ex-prefeito de Santo André, Celso Daniel e ao ex-prefeito de Campinas, Antônio da Costa Santos, o Toninho. De acordo com informações públicas, ambos contrariaram interesses e acabaram assassinados. Seus cadáveres permanecem insepultos. Os manda-chuvas do Partido dos Trabalhadores dizem que cabe à Justiça a decisão final. Porque, segundo eles, foram dois crimes comuns. As famílias dos políticos que perderam a vida não pensam desta forma. Reclamam dos figurões petistas que entregaram todos- mortos e vivos- à própria sorte.

Celso Daniel era o principal interlocutor do então candidato Luiz Inácio na área econômica. Naquela primeira campanha, dizia-se que o político de Santo André seria Ministro da Fazenda. Mas antes disso ocorrer acabou sequestrado e morto. Não tenho expertise para investigador policial, mas fica difícil entender os motivos que cercam o episódio. O ex-prefeito teria protestado contra "um esquema" que vigorava na cidade do ABC. Algo pouco ortodoxo pra dizer o mínimo. Falou demais, ameaçou denunciar tudo e pagou com a vida. Lula perdeu o assessor e calou-se pra sempre. Quando instado, repete a cantilena do crime comum.

De lá pra cá, um assessor importante de Celso Daniel, naquela época já engajado na campanha de Lula, virou secretário-geral da Presidência: Gilberto Carvalho, o Gilbertinho. Mais: tem boas chances de continuar em Brasília num eventual governo Rousseff. Míriam Belchior, ex- mulher de Daniel, virou "mãe postiça" do Programa de Aceleração do Crescimento, PAC. Também pode ter assento na Esplanada dos Ministérios em 2011. E as testemunhas do crime? Vinte delas, diretas ou indiretas, morreram em circunstâncias estranhas. E os familiares? Eles têm medo: alguns até deixaram o País. Auto-exílio, meus amigos. Como explicar isso?

Outro fato difícil de engolir: quem ousou bradar contra os assassinatos, acabou mal. Por exemplo, o ex-tesoureiro do PT, Paulo de Tarso Venceslau. Ele denunciou desvios milionários em Prefeituras na coleta do lixo. Acabou expulso do partido e desclassificado pelos cardeais. Só faltou chamarem Venceslau de louco. Se não me falha a memória, colocaram em dúvida mesmo a sanidade mental do ex-companheiro. Agora, a Justiça pode reabrir o caso Toninho do PT. O assassinato do ex-prefeito de Campinas completa hoje nove anos. O juiz responsável, José Henrique Torres, quer dar prosseguimento nas investigações.

Antônio da Costa Santos foi morto na noite de 10 de setembro de 2001, atingido por três tiros. A arma do crime nunca foi encontrada. Versão da polícia: crime comum. A vítima estava no local errado, na hora errada. Então, tá... A família rechaça a versão e afirma que foi delito político e teve mandante. Quem está envolvido no assassinato? Wanderson Nilton de Paula, o Andinho, condenado a quatrocentos anos de prisão por diversos crimes. Em uma das versões, Toninho foi morto pela quadrilha que fugia após tentativa de sequestro. O ex-prefeito de Campinas teria atrapalhado a ação. Curiosamente, Andinho é o único vivo para recontar- ou mudar- a história.

Todos os comparsas citados pela Polícia também morreram. Hoje, a Organização Não Governamental "Quem matou Toninho?" vai relembrar o caso e homenagear o político. Um alerta será dado: " questões de política e de contrariedade de interesses nunca foram devidamente investigadas". A viúva de Toninho, Roseana Garcia, já pediu três vezes ao Ministério da Justiça a entrada da Polícia Federal no caso. Em vão. Márcio Thomaz Bastos foi procurado. Lula idem. Nenhuma satisfação. Um pedido de federalização das investigações aguarda um parecer da Procuradoria-Geral da República há dois anos e dois meses. Até quando? Será que dona Rousseff abrirá esse armário problemático?



A Morte Misteriosa do Prefeito de Santo André - Parte 1



Sex, 13 de Fevereiro de 2009 11:00

celsodaniel312/10/2005 - 18h56 Entenda o caso Celso Daniel da Folha Online O prefeito de Santo André Celso Daniel (PT) foi seqüestrado no dia 18 de janeiro de 2002, quando voltava de um jantar em São Paulo. Ele estava acompanhado do empresário Sérgio Gomes da Silva. Dois dias depois, o corpo do prefeito foi encontrado em uma estrada em Juquitiba (a 78 km de São Paulo), com sete entradas de bala. O inquérito da Polícia Civil sobre o caso sustentava que o crime não teve motivação política. Com o depoimento dos seis acusados e o do menor que confessou o crime, a polícia sustentou a versão do assassinato. Para a família, no entanto, a morte do prefeito está ligada às denúncias de cobrança de propina de empresários do setor de transportes em Santo André. O prefeito teria tentado impedir o funcionamento do esquema.

Em agosto deste ano, a Polícia Civil reabriu as investigações devido às recentes denúncias apresentadas na CPI do Mensalão. Segundo a polícia, Celso Daniel teria sido seqüestrado por acaso. Uma quadrilha da favela Pantanal planejara o seqüestro de um comerciante, mas ele não apareceu no local. Apenas o prefeito teria sido seqüestrado porque o carro em que ele estava desceu ladeira abaixo quando os seqüestradores tentavam retirar os ocupantes. Os integrantes da quadrilha disseram que Ivan Rodrigues da Silva, o Monstro, líder do grupo, teria ordenado a libertação do prefeito, mas a ordem teria sido descumprida por outro integrante da quadrilha, José Edson da Silva. José Edson da Silva afirmou à polícia que mandou matar o prefeito porque ele olhou para seu rosto. Ele negou a autoria dos disparos, que teriam sido feitos pelo adolescente.

Celso Augusto Daniel (Santo André, 16 de abril de 1951 — Juquitiba, janeiro de 2002) foi um político brasileiro. Prefeito da cidade paulista de Santo André pelo Partido dos Trabalhadores, foi assassinado em 2002. Entre os suspeitos encontram-se criminosos comuns e políticos da oposição. Após o início das investigações, sete testemunhas morreram, todas em circunstâncias misteriosas.

Assassinato

Celso Daniel, com cinqüenta anos de idade quando ocupava o cargo de prefeito de Santo André pela segunda vez, foi seqüestrado na noite de 18 de janeiro de 2002, quando saía de uma churrascaria localizada no bairro dos Jardins, em São Paulo.
Segundo as informações divulgadas pela imprensa, o prefeito estava dentro de um carro Mitsubishi Pajero blindado, na companhia do empresário Sérgio Gomes da Silva, conhecido também como o "Sombra". O carro teria sido perseguido por outros três veículos: um Santana, um Tempra e uma Blazer.

Na Rua Antônio Bezerra, perto do número 393, no bairro do Sacomã, os criminosos fecharam o carro do prefeito. Tiros foram disparados contra os pneus e vidros traseiro e dianteiro de seu carro. Gomes da Silva, que era o motorista, disse que na hora a trava e o câmbio da Pajero não funcionaram. Os bandidos armados então abriram a porta do carro, arrancaram o prefeito de lá e o levaram embora. Sérgio Gomes da Silva ficou no local e nada aconteceu com ele.

Na manhã do dia 20 de janeiro de 2002, domingo, o corpo do prefeito Celso Daniel, com onze tiros, foi encontrado na Estrada das Cachoeiras, no Bairro do Carmo, na altura do quilômetro 328 da rodovia Régis Bittencourt (BR-116), em Juquitiba.

Inquérito Policial

A polícia de São Paulo concluiu o inquérito sobre a morte de Celso Daniel no dia 1 de abril de 2002. Segundo o relatório final da polícia, apresentado pelo delegado Armando de Oliveira Costa Filho, do DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa), seis pessoas de uma quadrilha da favela Pantanal, da Zona Sul de São Paulo, cometeram o crime. Entre elas estava um menor de idade, que confessou ter sido o autor dos disparos que atingiram o prefeito. O inquérito policial concluiu que os criminosos seqüestraram Celso Daniel por engano, e que confundiram-no com uma outra pessoa, um comerciante cuja identidade não foi revelada, e que seria o verdadeiro alvo do seqüestro.

Os integrantes da quadrilha seriam: Rodolfo Rodrigo de Souza Oliveira (“Bozinho”), José Édson da Silva (“Édson”), Itamar Messias Silva dos Santos (“Itamar”), Marcos Roberto Bispo dos Santos (“Marquinhos”), e Elcyd Oliveira Brito (“John”). O líder da quadrilha seria Ivan Rodrigues da Silva, também conhecido como “Monstro”. O local do cativeiro foi escolhido por Édson, que alugou um sítio em Juquitiba para essa finalidade. Dois carros foram roubados para a realização do seqüestro: uma Chevrolet Blazer e um Volkswagen Santana. A quadrilha se reuniu no dia 17 de janeiro de 2002 e ficou definido que o seqüestro ocorreria no dia seguinte.

No dia 18 de Janeiro, à tarde, teve início a operação. Monstro e Marquinhos saíram no Santana e os outros criminosos foram na Blazer. Através de um telefone celular o Monstro coordenava toda a ação. Os meliantes na Blazer começaram a perseguir o comerciante que pretendiam deter, contudo perderam-no de vista. O líder do bando, Monstro, ordenou então que o grupo abortasse a ação e que atacasse o passageiro do primeiro carro importado que fosse encontrado no caminho. Os bandidos começaram a trafegar pelas ruas da região e Monstro escolheu como novo alvo a Pajero onde viajava o prefeito Celso Daniel e o empresário Sérgio Gomes. O bando começou a perseguir a Pajero do prefeito, e a Blazer a bater nele. Itamar e Bonzinho saíram da Blazer, atiraram na direção da Pajero e tiraram o prefeito Celso Daniel do carro, rendido à força. Ele foi levado até a favela Pantanal, na região de divisa entre Diadema e São Paulo. Na favela, os bandidos retiraram Celso Daniel da Blazer, colocaram-no no Santana e levaram-no até o cativeiro em Juquitiba.

No dia 19 de Janeiro, os criminosos souberam pelos jornais que tinham seqüestrado o prefeito de Santo André. Eles ficaram com medo e resolveram desistir. Monstro, ordenou a Edson que a vítima fosse “dispensada”. Segundo os outros integrantes da quadrilha, Monstro quiz dizer com isso que Celso Daniel deveria ser libertado. Contudo, Edson entendeu que deveria matar o prefeito. Edson contratou um menor conhecido como "Lalo" para matar a vítima. Edson, Lalo e Celso Daniel foram até a estrada da Cachoeira, em Juquitiba e Edson deu a ordem para Lalo matar o prefeito. Dois dias depois, o corpo de Celso Daniel foi encontrado, com oito perfurações a bala.

A família de Celso Daniel não ficou satisfeita com o resultado do primeiro inquérito policial que disse que o prefeito foi vítima de crime comum, assassinado por engano por uma quadrilha de seqüestradores. Para a família do prefeito o crime teve motivação política.

O empresário Sérgio Gomes da Silva, que era o motorista da Pajero onde viajava o prefeito Celso Daniel, disse que na hora quando foi fechado pelos bandidos, a trava e o câmbio do veículo não funcionaram, o que impossibilitou a fuga e permitiu aos bandidos abrirem a porta do carro e levarem o prefeito. Uma análise pericial foi feita na Pajero e a conclusão dos peritos é que o carro não tinha nenhum defeito elétrico ou mecânico que justificasse uma falha. Segundo os peritos, se houve falha na hora, ela foi humana.

Após a morte de Celso Daniel foram ainda assassinadas seis outras pessoas, todas em situações misteriosas, entre as quais estão: o agente funerário que reconheceu o corpo do prefeito jogado na estrada e que chamou a polícia, o garçom que serviu Celso Daniel na noite do crime e uma outra.

Um dos promotores do caso mostrou ao menor que alegou ter atirado no prefeito, uma foto de Celso Daniel. Este não conseguiu reconhecer a pessoa na foto, sendo posta em dúvida a hipótese de ele ter sido o autor dos disparos que vitimaram Celso Daniel.

A família pressionou as autoridades para que o caso da morte do prefeito fosse reaberto. Em 5 de Agosto de 2002 o Ministério Público de São Paulo solicitou a reabertura das investigações sobre o sequestro e assassinato do prefeito.

Hipótese de crime político

Muitos integrantes da família do prefeito morto acreditam na hipótese de crime político. Segundo o irmão de Celso Daniel, o oftalmologista João Francisco Daniel, a, o prefeito morreu porque detinha um dossiê sobre corrupção na prefeitura de Santo André. Tal hipótese é questionada por muitos, uma vez que João Francisco, filiado ao Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), fazia oposição a seu irmão, com quem era rompido pessoal e politicamente.

João alega que seu irmão Celso Daniel, quando era prefeito de Santo André, sabia e era conivente de um esquema de corrupção na prefeitura, que servia para desviar dinheiro para o Partido dos Trabalhadores (PT). O suposto esquema de corrupção envolvia integrantes do governo municipal e empresários do setor de transportes e contava ainda com a participação de José Dirceu. Empresários de ônibus da região do ABC Paulista, como a família Gabrilli, controladora da Viação São José/Expresso Guarará, confirmou que Sérgio Gomes da Silva, o Sombra, coletava mensalmente uma propina das empresas, com valores que variavam entre R$ 40 mil a R$ 120 mil. Ainda de acordo com estas denúncias, as empresas que participavam do suposto esquema seriam beneficiadas em Santo André. Para se ter uma idéia das denúncias, a filha do dono da Viação São José]]/Expresso Guarará, Ângela Gabrilli, contou em depoimento ao Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (GAECO), do Ministério Público de Santo André, e à CPI da Câmara Municipal de Santo André, realizada logo após a morte de Celso Daniel, que a Viação Padroeira, que supostamente participava do apontado esquema, ganhou a concessão de uma linha, a B 47 R (Jardim Santo André/Terminal Santo André Oeste), prejudicando a Viação São José que mantinha uma linha com itinerário semelhante. A linha da Viação Padroeira acabou fazendo com que a São José extinguisse a linha mais antiga, a T 45 (Vila Suíça/Estação de Santo André) e entrasse em prejuízo. Até então, a Viação São José não participava do suposto esquema.
Os acusados negam as denúncias e vêm se defendendo nos fóruns apropriados.

Ainda segundo depoimento do irmão de Celso, João Francisco Daniel, algumas pessoas começaram a desviar para suas contas pessoais o dinheiro, que por sua vez já era desviado ilegalmente para o PT. Celso Daniel descobriu isso e preparou um dossiê, que teria desaparecido após seu assassinato.

O presidiário José Felício, conhecido como "Geleião", disse à polícia ter ouvido falar sobre o suposto dossiê de Celso Daniel e de uma suposta ameaça de morte. O empresário Sérgio Gomes da Silva (o "Sombra"), que dirigia o carro em que viajava o prefeito na noite do seqüestro, foi indiciado pelo Ministério Público de São Paulo, acusado de ser o mandante do assassinato do prefeito. De acordo com o Ministério Público foi Sombra quem ordenou a morte do prefeito para que um suposto esquema de corrupção na prefeitura de Santo André não fosse descoberto. Sombra está preso e nega qualquer participação na morte do prefeito.

Os promotores Roberto Wider Filho e Amaro José Tomé, do Gaeco do Ministério Público de Santo André, pediram em 2005, a reabertura das investigações policiais. Por ordem do Secretário de Segurança do Estado de São Paulo, Saulo de Castro Abreu Filho, o caso foi encaminhado para a delegada Elisabete Sato, então titular do Distrito Policial de número 78, nos Jardins. Os promotores pediram que o caso não fosse encaminhado novamente ao Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) da Polícia Civil paulista, que já havia concluído pela tese de crime comum. Mesmo após a reabertura das investigações, o delegado-geral da época, Marco Antônio Desgualdo, declarou acreditar na tese de crime comum, o que é negado veementemente pelos promotores e pelos familiares de Celso Daniel.

Um segundo inquérito, conduzido novamente por Elizabete Sato, indicada pelo então secretário Saulo de Abreu, aberto no segundo semestre de 2005, novamente levou à tese de crime comum. O inquérito, com data de 26 de Setembro de 2006, é anterior ao primeiro turno das eleições presidenciais. Sua repercussão na mídia só se deu no final de novembro de 2006.
O que dizia a reportagem de VEJA

A execução bárbara do prefeito Celso Daniel, do PT, em Santo André, chocou o país. Até agora não há uma explicação clara para a morte do político, seqüestrado quando saía com um amigo de uma churrascaria e assassinado 24 horas depois. Em virtude de outro crime de morte em que a vítima foi um prefeito petista - Toninho do PT, de Campinas - chegou-se a falar em conspiração política destinada a matar integrantes do partido. A morte de Daniel, segundo essa interpretação, teria sido crime político. Os próprios líderes do PT, no entanto, admitem que essa é a mais fraca das hipóteses a ser investigadas. Outra possibilidade, bem mais forte, é a de crime comum. Mas há dúvidas a respeito dos depoimentos do amigo que estava com Daniel, o empresário Sérgio Gomes da Silva, dono do carro blindado que foi abordado pelos seqüestradores. Na polícia, ele contou uma história que depois se revelou cheia de contradições. Há um complicador. Silva é sócio de um certo Ronan Pinto, dono de empresas de ônibus e beneficiário de contratos milionários com a prefeitura de Santo André, muitos deles investigados por irregularidades. Todos esses detalhes deverão ser examinados pelos policiais envolvidos na elucidação do caso. Eles não descartam a hipótese de que o assassinato pode estar relacionado a interesses econômicos contrariados pelo prefeito.

O que aconteceu depois

Com a investigação ainda centrada na hipótese de crime comum, uma quadrilha da favela Pantanal passou a ser procurada pelo seqüestro e morte de Celso Daniel algumas semanas depois. Liderada por Ivan Rodrigues da Silva, conhecido como Monstro, essa quadrilha teria pelo menos seis pessoas envolvidas diretamente no crime, incluindo os bandidos conhecidos como Olho de Gato, André Cara Seca, Cara de Gato e Bozinho. Todos sustentavam a versão de crime comum. Um deles, José Edson da Silva, disse ter mandado um menor (então com 17 anos) matar Daniel pois ele tinha visto seu rosto - o adolescente confirmou isso. Monstro foi preso em junho de 2002 e disse que o próprio Silva fez os disparos. O PT e parte da polícia já dava o caso como solucionado quando um irmão de Daniel, João Francisco, prestou depoimento ao Ministério Público e mudou o rumo do caso. Ele contou que Daniel prometera denunciar um esquema de corrupção na área de transportes na cidade, envolvendo os empresários Sérgio Gomes e Ronan Pinto e o petista Klinger de Souza. Segundo João Francisco, eles desviavam dinheiro que seria entregue para campanhas do PT - os valores, em espécie, seriam cedidos a José Dirceu, conforme relataram a ex-mulher do prefeito, Míriam Belchior, e seu antigo secretário de Governo, Gilberto Carvalho. João Francisco prometeu apresentar o nome de testemunhas, mas recuou ao dizer que temia pela segurança delas.

Dentro dessa nova linha de apuração, integrantes do Ministério Público e da CPI formada sobre o caso na Câmara de Santo André obtiveram novos relatos e indícios sobre o esquema ilegal - acreditava-se que Daniel sabia do desvio de dinheiro, mas ameaçou denunciá-lo ao constatar que os empresários ficavam com parte dos valores. Em agosto de 2002, a investigação foi reaberta, já com o foco do crime político. Depois de mais de um ano de apuração, o MP reuniu provas suficientes para implicar Gomes, que ficou conhecido como "Sombra", como suspeito de simular o seqüestro para que a execução ocorresse - uma "queima de arquivo" para impedir a revelação da corrupção. Gomes, que se dizia inocente, foi denunciado criminalmente enquanto a família de Celso Daniel acusava o PT de tentar atrapalhar a apuração e reavivar a versão de crime comum. A Justiça aceitou a denúncia contra Gomes como mandante do crime e, em dezembro de 2003, o empresário foi preso. A hipótese de "queima de arquivo" ganhou ainda mais força depois que, no início de 2004, o MP constatou que seis pessoas ligadas ao caso já haviam sido mortas a tiros - e nenhum assassinato havia sido elucidado até então. Entre os mortos estavam o agente funerário que reconheceu o corpo e chamou a polícia, o garçom que serviu o último jantar de Daniel no restaurante e dois suspeitos de ligação com o seqüestro. Mas a morte mais importante foi a de Dionízio de Aquino Severo, que seria o vínculo entre Gomes e a quadrilha. Os dois se conheciam havia anos - trabalharam juntos como seguranças na prefeitura.

Depois de ter negados vários pedidos de habeas corpus, o "Sombra" obteve a libertação em julho de 2004, justamente na instância máxima da Justiça, através de decisão do presidente do STF, Nelson Jobim - ele considerou que não havia razão jurídica para a prisão. Gomes passou cerca de 250 dias detido. As suspeitas, porém, não cessaram com sua soltura. Primeiro, em maio de 2005, um novo laudo indicou a possível presença de um terceiro carro na cena do crime, supostamente ocupado por Dionízio Severo. Depois, em agosto de 2005, um dos presos no caso escreveu para o "Sombra" ameaçando contar tudo e dizendo que "a bomba vai explodir". Em seguida, ainda em agosto, o médico-legista Carlos Delmonte Printes, que fez a necropsia do corpo de Daniel, revelou que o prefeito foi brutalmente torturado, o que não é consistente com a versão de crime comum, e que foi censurado ao tentar divulgar a informação. No mês seguinte, o preso que escreveu a carta ao "Sombra" disse à polícia e ao MP que Gomes prometera 1 milhão de reais à quadrilha pela morte de Daniel. E em outubro, mais um desdobramento intrigante no caso: o legista Delmonte foi encontrado morto em seu escritório. Sétima pessoa ligada ao caso a morrer de forma misteriosa, o perito deixou uma carta para a família dando instruções para depois de sua morte. A hipótese de causa natural foi afastada, e a morte foi atribuída a suicídio por envenenamento. Apesar das circunstâncias peculiares de todo o caso, os petistas citados continuavam insistindo na versão de crime comum.

Em novembro de 2006, o relatório de Elizabete Sato, delegada titular do 78º Distrito Policial (Jardins), enviado ao Ministério Público e à Justiça, concluiu que não havia provas de crime político no assassinato de Celso Daniel. Sato investigou o caso durante um ano e destacou no texto sua preocupação em "não transformar a investigação em um acontecimento político". Ela foi escalada pela Secretaria da Segurança para apurar denúncias dos irmãos do prefeito de que Celso teria sido alvo de crime encomendado porque teria decidido dar fim a um esquema de corrupção.

A delegada ouviu os sete pistoleiros presos sob acusação de terem sido os executores do prefeito. Eles confessaram o crime, como tinham feito na primeira etapa da investigação, conduzida pelo Departamento de Homicídios. Em sua avaliação, a única novidade foi a constatação de que L.S.N., o Lalo, na época do crime com 15 anos, assumiu a autoria dos sete disparos contra o prefeito "por mando e coação" de José Edson da Silva, o Zé Edson, "este sim o principal executor do crime e indivíduo que exala violência e descomprometimento com a vida humana".

Médico legista do Caso Celso Daniel é encontrado morto em São Paulo

13 de Outubro de 2005

Brasil — A Polícia Civil de São Paulo encontrou por volta das 14 horas de quarta-feira (12) o corpo de Carlos Delmonte Printes, 55 anos, médico-legista que examinou o corpo do prefeito de Santo André, Celso Daniel (Partido dos Trabalhadores- São Paulo) assassinado em 2002.

Delmonte dizia que o prefeito foi brutalmente torturado antes de ter sido executado. O médico também dizia que a hipótese de a morte de Celso Daniel ter tido origem num crime comum não era plausível.

Durante uma entrevista para o Programa do Jô, em Setembro, Delmonte disse que recebeu pressão de políticos, entre os quais o deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (Partido dos Trabalhadores- São Paulo), para que concordasse com a hipótese de crime comum. Na ocasião, Delmonte disse: "Eu fui proibido de falar pelo diretor do Instituto Médico Legal. Bem mais tarde, depois que eu comuniquei o fato ao Ministério Público, eles alegaram que era para a minha proteção e em seguida foi decretado segredo de Justiça".

Com a morte do doutor Carlos Delmonte, agora são sete o número de pessoas que morreram e que tinham alguma relação com o caso do assassinato do prefeito de Santo André.

As principais testemunhas que morreram até agora foram:

1. Dionísio Aquino Severo: morto dentro prisão, em 2002. Para os promotores, ele teria informações sobre o suposto autor intelectual do crime.

2. Sérgio “Orelha”: forneceu abrigo para Dionísio Aquino Severo. Foi morto a tiros em 2002.

3. Otávio Mercier: investigador da Polícia Civil. Morreu depois que sua casa foi invadida.

4. Antonio Palácio de Oliveira: garçom que serviu o prefeito na noite do crime. Ao fugir de uma perseguição sua motocicleta bateu num poste e ele morreu.

5. Paulo Henrique Brito: a única testemunha da morte do garçom. Foi assassinado 20 dias depois.

6. Iran Moraes Redua: agente funerário que reconheceu o corpo do prefeito no local do crime. Assassinado com dois tiros.

7. Carlos Delmonte Printes: médico-legista que examinou Celso Daniel, encontrado morto na sua casa, na Vila Clementino, zona sul, em 11 de Outubro de 2005.

As provas da tortura

Conforme ISTOÉ antecipou em sua última edição (1891), dois novos fatos contrariam a tese de que o assassinato do prefeito de Santo André, Celso Daniel (PT), não passou de crime comum. O primeiro fato é que o adolescente indiciado como o assassino fugiu da Febem e revelou não ter sido o autor dos disparos que mataram Celso Daniel. O segundo fato é que o Parecer Médico-Legal 001/06 comprova as marcas das torturas no corpo da vítima. Este parecer será apresentado nessa semana à CPI dos Bingos. Poderá mostrar o seguinte: ou o prefeito estava nu quando foi atingido por fragmentos de projéteis ou a sua roupa foi trocada antes dos disparos fatais – isso porque as vestes de seu corpo, quando ele foi encontrado, não são compatíveis com as marcas apresentadas pelo próprio corpo. Essas revelações caminham na direção de crime encomendado e essa é a linha de investigação adotada pela delegada Elisabeth Sato, responsável pelas diligências: “Nosso trabalho será encontrar esse adolescente. Queremos saber se ele assumiu um crime que não cometeu e, se assim o fez, quem está acobertando.” Para o advogado Roberto Podval, que representa na Justiça o empresário Sérgio Gomes da Silva, acusado de ser mandante do crime, “é comum menores assumirem crimes que não cometeram para acobertar adultos”. E, se isso aconteceu nesse caso, “esse fato não descaracteriza a constatação da polícia de que os criminosos são os acusados que já estão presos”. Quanto ao laudo, Podval diz que “a constatação da violência confirma o depoimento dos acusados porque eles já admitiram à Justiça terem usado de violência antes do assassinato”.

As revelações de ISTOÉ ocuparam lugar de destaque nos principais jornais brasileiros. Todos repercutiram a reportagem de ISTOÉ reinventando a roda – ou melhor, o furo jornalístico. As revelações de ISTOÉ modificam a versão oficial da própria polícia, segundo as conclusões do médico legista Paulo Vasquez. Ele corrobora a versão inicialmente apresentada por seu colega Carlos Delmonte Printes (encontrado morto em seu escritório no ano passado). As fotos publicadas agora por ISTOÉ comprovam a tortura em Celso Daniel, que levou oito tiros (antes dos tiros fatais no tórax, dois outros foram disparados em seu rosto).

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O corpo de Celso Daniel apresenta lesões na lateral do tórax (foto). E também na região interna do braço direito e na coxa direita. Os ferimentos foram causados por estilhaços de projéteis de arma de fogo (os chamados “tiros de esculacho”). As vestes com as quais o prefeito foi encontrado não apresentam sinais compatíveis com as perfurações encontradas no corpo

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O corpo de Celso Daniel tinha duas queimaduras produzidas pelo cano de pistola 9 mm aquecida. Isso sugere que a arma foi pressionada contra o seu corpo após uso contínuo. A camisa não apresenta nenhuma marca compatível com as queimaduras produzidas pelo cano da arma

22/11/06
Crime Perfeito


Polícia conclui que caso Celso Daniel não foi político


Odair Sene)- Dizem que não há crime perfeito.

Isto é, depende de quem investiga, de quem manda e de quem obedece (este último tem que ter juízo).

Em alguns casos os crimes podem até ser perfeitos. E, ao que parece, o bárbaro crime do prefeito de Santo André, Celso Daniel (do PT), ocorrido em janeiro de 2002, vai mesmo entrar para a lista das raridades perfeitas.


Se todo mundo sabe da bandalheira com os recursos desviados da cidade para as campanhas petistas, e isso teria motivado a ‘eliminação’ do ‘companheiro’, mesmo assim as forças ocultas (trazidas provavelmente pelos ventos palacianos), fizeram com que as suspeitas se resumissem em apenas ‘umas suspeitas aqui ou acolá’ como disse a delegada se referindo aos testemunhos, na conclusão do inquérito.

Segundo o relatório da delegada Elizabete Sato, titular do 78º Distrito Policial (Jardins), escalada pela Secretaria de Segurança, “suspeita sem a devida prova equivale a quase nada”. Concluindo que foram mesmo os indivíduos indicados no primeiro inquérito (aquele super questionado até pela própria polícia).

Isso é ruim para a democracia. Vermos como andam as leis dos alcaides brasileiros que mandam e, quem tem juízo obedece. Afinal, já foram mortos uma dúzia de envolvidos no caso Celso Daniel. Quem tem juízo obedece.

Quem ainda não têm juízo fala, esbraveja, denuncia, mas não é ouvido. Caso dos irmãos do prefeito que não conseguiram nada, nem mesmo depois de estarem frente aos deputados na CPMI dos Bingos em Brasília denunciando e pedindo justiça aos homens que aprovam ou reprovam leis. João Francisco e Bruno Daniel garantem que Celso foi alvo de crime de encomenda porque teria decidido dar fim a um suposto esquema de corrupção.

Caso ainda apareça alguma imperfeição neste crime, talvez a sociedade venha conhecer num futuro próximo o porque que neste mês de novembro de 2006, foi descartada a possibilidade de ser crime político. Até aqui fica a sensação de que a perfeição vai prevalecer, para o bem de muitos e tristeza das famílias dos mortos, cerca de uma dúzia.

Os promotores do Gaeco (sigla da unidade de elite do Ministério Público com missão de combater o crime organizado), estão convencidos de que o companheiro Celso Daniel foi morto a mando do empresário Sérgio Gomes, o Sérgio Chefe. Ele (claro) nega.

A polícia não reconvocou nem o Sérgio Chefe nem o ex-vereador Klinger de Souza (PT), apontados pela promotoria como peças de 'organização criminosa estável' que teria criado poderosa rede de propinas na gestão Celso Daniel. "É obvio que eles ratificariam suas declarações anteriores", anotou Elizabete, que destacou sua preocupação em "não transformar a investigação em um acontecimento político".

Entretanto o Klinger é um político e o Sérgio sempre teve estreita ligação política com o prefeito, ambos ligados ao PT. Mesmo assim a preocupação era de não transformar a investigação em acontecimento político.
Obedece quem tem juízo...
No final das contas, o crime não foi político.


Sábado, Maio 28, 2005


O "Sombra" está de volta - caso Celso Daniel
O caso Celso Daniel ganha fôlego comum novo depoimento que envolveo empresário amigo do prefeito

Entre as muitas perguntas que ficaram no ar no episódio do assassinato de Celso Daniel, em 2002, uma se refere a uma situação ocorrida quando o então prefeito de Santo André ainda estava vivo no cativeiro. Na ocasião, divulgou-se que tanto o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) quanto o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), haviam recebido telefonemas de um homem que se apresentava como um dos seqüestradores do prefeito – e que pedia, em troca da libertação do refém, a transferência de alguns presos de cadeias de São Paulo e do Rio de Janeiro. A negociação não foi adiante, entre outras razões, porque Celso Daniel foi encontrado morto logo após o último telefonema. Nunca se soube quem foi o interlocutor de Suplicy e Alckmin e nem se estaria blefando. No último mês de abril, o Ministério Público ouviu um homem que diz ser o autor desses telefonemas. Em depoimento ao qual VEJA teve acesso, o detento José Márcio Felício – o "Geleião", que foi um dos principais líderes da maior organização criminosa de São Paulo, o Primeiro Comando da Capital (PCC) – afirma ter tentado negociar a libertação do prefeito em troca de benesses para si. No mesmo depoimento, ele faz afirmações que complicam ainda mais a situação do empresário Sérgio Gomes da Silva. O empresário chegou a ficar preso por sete meses, acusado de participação no seqüestro de Celso Daniel, de quem era amigo e homem de confiança. Foi solto em julho do ano passado. No decorrer das investigações, o Ministério Público colheu depoimentos e provas que demonstram a participação de "Sombra", como ficou conhecido o empresário, num esquema de corrupção que beneficiaria não só a ele como também aos cofres do PT. Um dos irmãos de Celso Daniel, o médico João Francisco Daniel, afirmou, em depoimento à Justiça, ter ouvido de Gilberto Carvalho – ex-secretário de governo na gestão do prefeito de Santo André e hoje chefe-de-gabinete do presidente Lula – que o esquema de propinas na prefeitura de Santo André teria arrecadado 1,2 milhão de reais, em espécie. O dinheiro, ainda segundo o testemunho de João Francisco, teria sido entregue por Carvalho ao então deputado federal José Dirceu, hoje ministro-chefe da Casa Civil. Dirceu e Carvalho negam a existência da propina.

Na época da captura do prefeito, Felício cumpria pena na penitenciária de segurança máxima Bangu 1, no Rio de Janeiro. No depoimento dado ao Ministério Público, ele conta que recebeu, pelo celular, o telefonema de um comparsa – espécie de subordinado seu dentro do PCC. O bandido pedia sua autorização para ajudar o seqüestrador Ivan Rodrigues da Silva, o "Monstro" – um dos envolvidos na morte do prefeito e atualmente preso –, a encontrar um cativeiro que abrigaria "um pássaro grande": Celso Daniel. Ao falar diretamente com Ivan, Felício conta ter proposto a ele que mantivesse o prefeito em cativeiro para que ele, Felício, por meio desse trunfo, conseguisse negociar sua transferência de Bangu 1. Ivan, porém, segundo Felício, avisou que não poderia atender o pedido porque o seqüestro havia sido "uma encomenda" e a ordem era "pau no gato". Na gíria da criminalidade, a expressão significa determinação expressa para matar. Ainda segundo o depoimento de Felício, um ano após o seqüestro, ele e Ivan se encontraram em outra penitenciária. Nessa ocasião, o seqüestrador teria revelado a ele o nome do mandante da "encomenda": Sérgio Gomes da Silva. Ivan ainda teria dito que, antes de morrer, Celso Daniel fora torturado para revelar onde havia escondido um dossiê com acusações contra Sérgio Sombra.

A menção a essa documentação fez com que os promotores procurassem a família de Celso Daniel, que já havia dito estar de posse de um dossiê contra Sérgio Sombra, encontrado no apartamento do prefeito depois de sua morte. No início do mês, o dossiê foi entregue ao Ministério Público. Trata-se de um envelope que, tendo como remetente um certo Gilberto, traz documentos obtidos em cartórios listando bens em nome de Sombra e amigos, além de nomes de empresas que, supostamente, pagariam propinas ao grupo. Embora, na opinião dos promotores, esse dossiê não seja aquele mencionado por Felício (teria sido produzido três anos antes da morte do prefeito e não apresenta poder de fogo para amedrontar Sombra ao ponto a que se referiu o bandido Ivan), ele reforça os indícios de que Daniel, havia muito tempo, tinha conhecimento das atividades ilícitas praticadas por seu homem de confiança.

O Ministério Público acredita que Felício fala a verdade – ao menos no que diz respeito ao fato de ter sido o autor dos telefonemas ao senador Suplicy e ao governador Alckmin. Mesmo assim, não se pode esquecer que o ex-líder do PCC é um bandido condenado e, como tal, merece que suas palavras sejam recebidas com o máximo de precaução. Seu depoimento, no entanto, somado à existência do dossiê entregue ao Ministério Público, reforça uma tese há muito defendida pelos investigadores: "Celso Daniel já sabia das acusações a Sérgio Sombra pelo menos desde 1999. Mas só passou a preocupar-se de fato a partir do momento em que se tornou coordenador da campanha presidencial do PT em 2002", afirma o promotor Roberto Wider. "Ao tornar-se uma 'vitrine', Celso Daniel pressionou Sérgio a acabar com o esquema de corrupção dentro da prefeitura, detonando o episódio que culminou com a sua morte."

O depoimento de Felício e o dossiê entregue pela família do prefeito provocaram, na semana passada, a reabertura das investigações sobre o assassinato de Celso Daniel. "Os fatos obrigam a instauração de um novo inquérito", diz o promotor Amaro Thomé. Logo após o assassinato do prefeito, o PT apressou-se em tentar sepultar o episódio, alegando que se tratava de um crime comum – mais um capítulo da violência urbana. Levantar qualquer outra hipótese seria uma vil tentativa de associar o partido a atividades espúrias, defenderam caciques petistas na ocasião. Vê-se agora que o PT pode estar errado. E que o sucesso efêmero de operações do tipo "abafa" não consegue impedir que os esqueletos continuem teimando em sair do armário.

Uma história misteriosa

Um assassinato em circunstâncias misteriosas, emoldurado por um entrecho que mistura corrupção política, sexo e uma série de mortes igualmente intrigantes de personagens relacionados ao crime. Os ingredientes clássicos de um bom romance policial temperam o homicídio do prefeito de Santo André, Celso Daniel, em 2002. Estrela de primeira grandeza do Partido dos Trabalhadores, Celso Daniel seria o coordenador da campanha presidencial do então candidato Luiz Inácio Lula da Silva, não tivesse sido seqüestrado e brutalmente morto em janeiro daquele ano. Ao contrário de um bom romance policial, no entanto, essa é uma história ainda longe de um final convincente. Até hoje muitas sombras (além de um "Sombra" em pessoa, Sérgio Gomes da Silva, que acompanhava a vítima na fatídica noite do seqüestro) turvam a visão dos motivos que levaram ao assassinato do prefeito. A última delas projetou-se poucos dias atrás. O legista Carlos Delmonte Printes, que concluíra que Celso Daniel havia sido torturado antes de ser abatido a tiros, foi encontrado morto em seu escritório em São Paulo. É o sétimo personagem ligado ao caso a perder a vida.

Para acompanhar os desdobramentos dessa história intrincada e inventariar os seus principais lances, VEJA destacou um de seus jornalistas mais experientes, o repórter João Gabriel de Lima. Ao longo de dois meses de apuração, ele leu 200 páginas de documentos, entrevistou dois dos três principais suspeitos de ter cometido o crime e todos os promotores e policiais encarregados da investigação. Além disso, conversou longamente com amigos e familiares de Celso Daniel, alguns deles defensores da tese de que se trata de um crime de vingança política. Na semana passada, João Gabriel foi surpreendido com a morte de um de seus entrevistados, o legista Delmonte Printes. Diz o repórter de VEJA: "Quanto mais se procura o assassino do prefeito, mais se esbarra com corrupção, com corruptos e com cadáveres".

Sex, 13 de Fevereiro de 2009 10:49

celsodaniel1Acusação que vem do cárcere - Juiz preso diz que o secretário particular de Lula é a chave para elucidar a morte de Celso Daniel O juiz João Carlos da Rocha Mattos, 57 anos, está preso há um ano e onze meses, sob a acusação de vender sentenças judiciais. Depois de passar por quatro cárceres diferentes, ele agora divide um dormitório com um preso no quartel da Polícia Militar, no centro de São Paulo. Na semana passada, na sala de reunião do prédio, Rocha Mattos recebeu VEJA para falar sobre o assassinato de Celso Daniel, o prefeito petista de Santo André morto com sete tiros em janeiro de 2002. Em quase duas horas de entrevista, pela primeira vez Rocha Mattos contou o que ouviu nas 42 fitas cassete que, gravadas entre janeiro e março de 2002, continham registros de diálogos telefônicos trocados entre os personagens do caso.

E fez uma revelação pesada. Diz que, na massa de diálogos registrados, os trechos mais comprometedores eram protagonizados por uma única pessoa: Gilberto Carvalho, atual secretário particular do presidente Lula. "Ele comandava todas as conversas, dava orientações de como as pessoas deviam proceder. E mostrava preocupação com as buscas da polícia no apartamento de Celso Daniel", conta o juiz. É a mais frontal acusação já feita contra Gilberto Carvalho no crime de Santo André. No início do ano passado, o jornal Folha de S.Paulo divulgou transcrições das conversas registradas nas fitas e, mais tarde, teve acesso a trechos de áudio de vários diálogos, mas descobriu divergências entre transcrições e áudios. Tanto nas transcrições quanto nos áudios, a presença de Gilberto Carvalho era freqüente mas não comprometedora. Agora, Rocha Mattos diz que as 42 fitas continham passagens bem mais graves do que aquilo que veio a público até agora e que Carvalho chegava ao ponto de dar dicas de comportamento a personagens do caso.

Há telefonemas em que ele pede à então namorada de Celso Daniel, a socióloga Ivone de Santana, que concedesse entrevistas à imprensa e não esquecesse de se mostrar emocionada com a morte do prefeito – o que de fato aconteceu. As conversas gravadas, diz o juiz, traziam até recados enigmáticos de moradores de uma favela de Santo André, hoje suspeitos de terem sido contratados para matar o ex-prefeito. "Os recados eram deixados na caixa postal do telefone de Gilberto Carvalho", afirma o juiz. "Ele comandava praticamente tudo."
Veja – O que quer dizer comandar "tudo"?

Rocha Mattos – Comandava as conversas, as orientações de como proceder, de como deveriam se comportar o "Sombra" (apelido do empresário Sérgio Gomes da Silva, acusado de ser o mandante do assassinato), a namorada de Celso Daniel, a preocupação com as buscas, o cuidado para que não resvalasse nada no PT. Nas gravações, existem até encontros marcados em apart-hotéis para entrega de numerário (dinheiro).

Veja – Conversas entre quem?
Rocha Mattos – Entre Klinger (refere-se a Klinger Luiz Oliveira, ex-secretário de Serviços Municipais de Santo André e apontado como braço-direito no esquema de corrupção na prefeitura de Santo André) e Gilberto Carvalho com pessoas não identificadas.

Não é a primeira vez que Gilberto Carvalho aparece envolvido no caso de Santo André. Francisco Daniel, irmão do prefeito assassinado, já disse em mais de uma ocasião que ouviu o próprio Gilberto Carvalho admitir que havia um esquema de corrupção na prefeitura de Santo André – esquema que teria sido a causa da morte do prefeito. Gilberto Carvalho sempre negou que tenha feito tal confissão. Agora, com as declarações de Rocha Mattos, a situação de Gilberto Carvalho se complica. O juiz garante que, ao escutar as fitas, constatou que o secretário particular de Lula conhecia o esquema de corrupção em funcionamento na prefeitura de Santo André e articulou a estratégia para difundir a tese de que o assassinato fora um crime comum – e não crime político, motivado por divergências a respeito do uso do dinheiro da corrupção. Rocha Mattos diz que não denunciou antes o que sabe porque só agora o país descobriu que a cúpula do PT era o ninho de uma quadrilha. "Imagina eu dizendo tudo isso há um ano... Quem ia acreditar?", declara ele.

Como quase tudo na investigação da morte de Celso Daniel, há versões e contraversões, palavras contra palavras. Rocha Mattos não oferece provas do que diz, mas é certo que teve acesso efetivo às 42 fitas. Na condição de juiz, ele recebeu a incumbência de esclarecer se elas tinham sido clandestinamente gravadas por agentes da Polícia Federal, conforme denunciara o Ministério Público Federal. Rocha Mattos concluiu que as fitas eram ilegais, pois a PF inventou uma investigação fajuta para conseguir fazer as gravações, e mandou que fossem destruídas – a incineração ocorreu em março de 2003, quando Lula já era presidente e Carvalho, seu secretário particular. Mais tarde, depois da destruição das fitas originais, apareceu um conjunto de cópias nas mãos de uma juíza, que o enviou a Rocha Mattos. O juiz então guardou as cópias, mas diz que, depois de ser preso pela Polícia Federal, elas desapareceram. Estavam na casa de sua ex-mulher, Norma, que também foi presa.

Rocha Mattos conta que era indisfarçável o interesse das hostes petistas na destruição das fitas. Ele diz que, antes de tomar a decisão de mandar incinerar o material, chegou a ser procurado em seu gabinete pelo delegado Francisco Baltazar, então chefe de segurança da campanha presidencial de Lula e, mais tarde, dirigente da Polícia Federal em São Paulo. Foram três encontros. "Ele sempre dizia que seria bom que as fitas fossem destruídas porque elas poderiam prejudicar o partido." Baltazar afirma que não se lembra de ter falado sobre esse assunto com Rocha Mattos. As acusações que lança contra Gilberto Carvalho são a terceira contribuição de Rocha Mattos ao caso de Santo André. Ele já indicou à Justiça duas testemunhas-chave do crime: uma mulher, cujo nome se mantém em sigilo, que diz ter testemunhado o seqüestro e presenciado o comportamento cúmplice de "Sombra", e um homem, hoje preso e também mantido no anonimato, que denunciou com antecedência que Celso Daniel (e também Toninho do PT, morto em 2001) seria assassinado. Procurado por VEJA, Gilberto Carvalho disse que "repudia com veemência" as acusações, promete que vai processar Rocha Mattos e informa que tem notícia de que há gravações montadas com sua voz, com o objetivo de incriminá-lo. Diz ele: "Nós, os amigos de Celso Daniel, não somos acusados, somos vítimas".

5 mistérios e uma certeza


Os bastidores do caso Celso Daniel, o crimecom elementos de romance policial que provoca calafrios na cúpula do PT

O cadáver de Celso Daniel, que jaz embalsamado no Cemitério da Saudade, em Santo André, ainda assombra o PT. Nos últimos dois meses, os dois irmãos do prefeito assassinado, João Francisco e Bruno Daniel, depuseram na CPI dos Bingos. Voltaram a bater na tecla de sempre – a de que dois petistas de alto coturno, José Dirceu e Gilberto Carvalho, puxavam os fios do esquema de corrupção que se instalou em Santo André. Nos próximos dias os irmãos serão colocados frente a frente com Gilberto Carvalho em uma acareação promovida pela CPI. Essa idéia provoca calafrios até no presidente da República – Lula declarou recentemente que a CPI dos Bingos estaria "perdendo o foco". Na quarta-feira passada, mais um morto se juntou à pilha de cadáveres de alguma forma relacionados com o caso. Carlos Delmonte Printes, médico-legista que fez a autópsia de Celso Daniel e constatou marcas de tortura, foi encontrado sem vida em seu escritório. Até sexta-feira o episódio ainda intrigava a polícia e o Ministério Público. O exame pericial descartou causas naturais como um ataque do coração, mas também não havia marcas de violência que sustentassem a hipótese de assassinato.

O crime que vitimou o prefeito petista, seqüestrado na noite de 18 de janeiro de 2002 e morto na tarde do dia seguinte, tem todos os ingredientes de um romance policial. Mistério, pistas falsas, sexo e luta pelo poder. A trama, no entanto, segue uma dinâmica peculiar: procura-se um assassino e, no lugar dele, são encontrados corruptos. Reduzido à sua essência, o caso se compõe de dois crimes. O primeiro é o assassinato do prefeito em si. O segundo, o esquema de corrupção formado na cidade que ele administrava. Há fortes indícios de que haja uma conexão entre ambos, mas não apareceu até agora uma prova definitiva. O primeiro crime, o assassinato, ainda está longe de ser solucionado. A polícia identificou e prendeu os integrantes da quadrilha que, na noite do dia 18, em São Paulo, seguiu o Mitsubishi Pajero onde estavam o prefeito e seu amigo Sérgio Gomes da Silva, rendeu-os, seqüestrou Celso Daniel e o abandonou no dia seguinte numa estrada, já sem vida e com marcas de tortura. Não é possível afirmar com certeza se houve um mandante. Suspeito de ser o arquiteto da ação, o empresário Sérgio Gomes da Silva teve prisão preventiva decretada e passou sete meses na cadeia. Foi solto em julho do ano passado por falta de provas. Já sobre o segundo crime, a propina que o PT cobrava de empresas que prestavam serviços à prefeitura, não há dúvidas. É um dos poucos casos de corrupção no Brasil que têm extrato bancário.

Os depoimentos na CPI e as investigações sobre a morte do legista fornecem uma grande oportunidade para esclarecer os mistérios relacionados à morte do prefeito e aprofundar a única certeza – a de que havia roubalheira em benefício do PT em sua administração. Enquanto não se souber exatamente o que aconteceu, o espectro de Celso Daniel continuará a assombrar o PT – assim como aqueles vilões de filmes de terror que morrem no final, mas ressuscitam no episódio seguinte provocando sustos ainda maiores.



A CERTEZA
Corrupção com recibo e extrato bancário

Examinando o caso Celso Daniel com óculos de hoje, pode-se dizer que a cidade de Santo André foi a precursora do mensalão. Na tarde do dia 24 de janeiro de 2002, cinco dias depois do assassinato do prefeito, a empresária Rosângela Gabrilli, dona de uma empresa de ônibus em Santo André, procurou o Ministério Público para fazer uma denúncia grave. Segundo ela, os donos de companhias rodoviárias da cidade eram obrigados a contribuir para uma caixinha do PT. O valor do mensalão seria proporcional à quantidade de ônibus que cada empresário possuía, à razão de 550 reais por veículo. A própria Rosângela, dona da Expresso Guarará, pagava 40.000 reais todos os meses. A empresária apontou três responsáveis pelo esquema de cobrança. Sérgio Gomes da Silva, o "Sombra", melhor amigo do prefeito. Klinger Luiz de Oliveira Sousa, ex-secretário de Serviços Municipais de Santo André. E Ronan Maria Pinto, sócio de Sérgio em três empresas, ele próprio um dos maiores concessionários do setor de transporte público na cidade. Em plena efervescência da campanha eleitoral, a denúncia foi desqualificada por vários petistas, que viram na atitude de Rosângela indícios de manobra eleitoreira. Mesmo assim, abriu-se uma CPI em Santo André e o Ministério Público foi chamado a investigar o caso.

A prova de que Rosângela falava a verdade veio em abril de 2003. A empresária encontrou no fundo de uma gaveta da Expresso Guarará, de sua propriedade, um fax datado de 30 de dezembro de 1998, em que se informava qual seria o valor da caixinha do mês – 100.000 reais – e qual parte caberia a cada uma das sete empresas de ônibus na cidade. No mesmo fax havia o número da conta bancária de Sérgio Gomes da Silva. Com base no fax, o Ministério Público pediu a quebra do sigilo bancário de Sérgio e constatou que havia depósitos na conta dele, na mesma data, exatamente nos valores discriminados no fax. Segundo Rosângela, a caixinha costumava ser paga em dinheiro vivo, transportado em envelopes – naquele tempo os corruptos ainda não se deixavam apanhar de cuecas recheadas. Em ocasiões especiais, o depósito era feito diretamente na conta de Sérgio Gomes da Silva. Trinta de dezembro, véspera de feriado e dia de folga dos office-boys das empresas de ônibus, era uma dessas ocasiões. Os extratos bancários levantados pelo Ministério Público mostraram que o dinheiro tinha entrada e saída. No histórico da conta de Sérgio, próximo às datas em que ele recebeu o dinheiro, havia vários depósitos em favor de amigos, entre eles Ivone de Santana, a namorada de Celso Daniel na época de seu assassinato. "Era um empréstimo pessoal, Sérgio e eu somos amigos há anos", disse Ivone a VEJA. Assim, a partir da única certeza do caso – a de que havia caixinha político-eleitoral em Santo André – surge o primeiro mistério: quem estava por trás do esquema? E quem se beneficiou dele?

I MISTÉRIO
Quem chefiava a quadrilha que arrecadava dinheiro para o PT em Santo André?

Durante muito tempo se difundiu a versão de que Celso Daniel foi assassinado porque tentou acabar com o esquema de propina de Santo André. A mais recente virada no caso, em setembro deste ano, trouxe um forte indício de que o prefeito sabia do esquema e se beneficiava dele. O Ministério Público de Santo André localizou uma diarista que prestava serviços ao casal Ivone de Santana e Celso Daniel. Ela concordou em falar desde que seu nome não aparecesse nos autos. Certa vez, durante uma faxina no apartamento, a diarista encontrou três sacos de dinheiro escondidos sob um lençol. No dia seguinte, os sacos não estavam mais lá. "Isso constitui para nós uma prova cabal de que Celso não apenas sabia do esquema como participava dele", diz o promotor Roberto Wider Filho, de Santo André, que investiga o caso desde o princípio. "Até então, o que sabíamos através de depoimentos de amigos e parentes era que o prefeito talvez conhecesse o esquema, mas o tolerava desde que o dinheiro fosse todo para o partido. E teria ficado chateado ao perceber que alguns correligionários se locupletavam."

Fica ainda mais difícil acreditar que Celso Daniel não participava quando se levam em consideração os estreitos laços de amizade entre os petistas de Santo André no tempo da administração do prefeito. Eram como uma quadrilha, no bom sentido do termo – o do poema de Carlos Drummond de Andrade que evoca uma dança. Miriam que amava Celso que amava Ivone que se casou com Michel mas que também amava Celso. Ronan que era sócio de Sérgio que era amigo de Celso que preparava Klinger para ser seu sucessor. Celso que é irmão de Bruno que é casado com Marilena que é amiga de Sérgio.

Ao contrário do que ocorre no poema, os petistas da quadrilha de Santo André têm nome e sobrenome. Miriam Belchior, a primeira mulher do prefeito, Ivone de Santana, sua última namorada, e os irmãos Michel e Maurício Mindrisz, amigos de toda a vida de Celso, se conheceram na adolescência. Eram da turma que freqüentava o boulevard Oliveira Lima, no centro de Santo André, um dos primeiros calçadões do Brasil. Chegaram a cunhar o verbo "boulevardiar", que significava paquerar no calçadão. Celso começou a namorar Miriam Belchior na juventude. Na mesma ocasião, outra moça, Ivone de Santana, se apaixonou por ele. Celso namorava firme uma, mas não desprezava a outra. Quando ele finalmente se decidiu por Miriam, Ivone se casou com Michel Mindrisz, um dos melhores amigos de Celso e filho da dona da loja de roupas onde ela trabalhava. Foram felizes, mas Ivone continuou vendo Celso durante o casamento. Chegou a ter uma filha desse caso extraconjugal, a qual Michel acabou assumindo. Depois que Celso se separou de Miriam, ele e Ivone, já bem mais maduros, voltaram a ter um relacionamento. Essa contradança amorosa é relevante para o caso por uma razão: toda a turma do Boulevard – Ivone, Miriam, Maurício e Michel – ocupou cargos em um ou mais mandatos de Celso Daniel à frente da prefeitura de Santo André (foram três no total, o último inconcluso). O fato ilustra uma característica marcante do estilo administrativo do prefeito. Ele gostava de se cercar de amigos íntimos, de extrema confiança.

O empresário Sérgio Gomes da Silva, por exemplo, era de máxima confiança. Foi apresentado ao prefeito por Marilena, mulher de seu irmão mais novo, Bruno Daniel. Corria o ano de 1988, Celso estava em campanha para prefeito e queria ter um esquema de segurança. Sérgio era versado em artes marciais, conhecia muita gente na área e montou uma equipe para o candidato. Eleito, Celso lhe deu a coordenação da guarda municipal e da defesa civil. Sérgio foi ganhando a intimidade do chefe e cresceu dentro da prefeitura. Logo estava pilotando os chamados "projetos matriciais", iniciativas que envolviam diferentes secretarias. Isso significa que era poderosíssimo, pois estava encarregado de cobrar os secretários, motivo pelo qual todos o chamavam de "Sérgio Chefe". Marilena, a mulher de Bruno, que havia sido nomeada secretária de Educação, largou a Pasta após uma divergência com o prefeito. O relacionamento entre os dois irmãos, que eram muito próximos, ficou estremecido. Sérgio de certa maneira ocupou o espaço vago, tanto que muitos dos amigos comuns a ambos definem a relação dos dois como fraterna. Ele ficou tão íntimo da turma do Boulevard que se tornou sócio de Celso, Maurício Mindrisz e Miriam Belchior numa empresa de consultoria. Esteve próximo às atividades políticas de Celso até 1996, quando fez um novo amigo, Ronan Maria Pinto, e entrou em sociedade com ele em três empresas de ônibus. Além disso, Sérgio tornou-se consultor de Ronan na área de coleta de lixo, atividade pela qual os petistas nutrem uma curiosa atração. Juntos, ambos prestaram vários serviços à prefeitura de Santo André durante os mandatos de Celso Daniel.

O Ministério Público de Santo André detectou irregularidades em vários desses contratos, e os investiga até hoje. Os rendimentos declarados de Sérgio Gomes se multiplicaram por dez entre 1996 e 2000. Enquanto o "Sombra" enriquecia, Celso Daniel também fazia um novo amigo. Arquiteto nascido no Maranhão, Klinger Luiz de Oliveira Sousa foi aluno do prefeito, que também era professor, na pós-graduação da Fundação Getulio Vargas de São Paulo. Acabou guindado ao cargo de secretário de Administração quando o prefeito se elegeu para o seu segundo mandato, em 1996. Corriam rumores de que Celso preparava Klinger para ser seu sucessor.

Não há indícios de rachas na "Turma do Boulevard" que sustentem a tese de que o prefeito, indignado com o esquema de corrupção, tenha brigado com seus até então fiéis colaboradores. Se alguma divergência houve, acabou em esfiha. Em janeiro de 2002, uma semana antes do crime bárbaro, Celso resolveu ir ao restaurante Arabia, em São Paulo, para comemorar sua indicação a coordenador da campanha eleitoral de Luiz Inácio Lula da Silva, que considerava o ápice de sua carreira política. Convidou três companheiros petistas para o evento. O primeiro era Sérgio Gomes da Silva. O segundo, Klinger Luiz de Oliveira Sousa. E o terceiro... Bem, o terceiro será revelado no próximo capítulo.



II MISTÉRIO
Qual a real participação de José Dirceu e Gilberto Carvalho no esquema de corrupção da prefeitura petista?

No dia 24 de maio de 2002, apresentou-se ao Ministério Público de Santo André uma testemunha que pediu para não ser identificada. Ela aparece nos autos do processo com o nome de "Testemunha Número Um". Diante de quatro promotores, o depoente, que declarou ser pessoa próxima do prefeito, disse ter conhecimento do esquema de caixinha denunciado por Rosângela Gabrilli. Endossou o nome dos coordenadores: Sérgio, Klinger e Ronan. A partir daí, fez acréscimos bombásticos. Segundo a Testemunha Número Um, Gilberto Carvalho, um dos homens mais próximos de Lula na burocracia petista, sabia do esquema. Mais do que isso. Gilberto Carvalho teria dito à Testemunha Número Um que ele próprio teria sido por diversas vezes o portador do dinheiro da caixinha, que entregava pessoalmente ao presidente do partido, o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu.
Um mês depois, em junho, a Testemunha Número Um assumiu sua identidade. Tratava-se de João Francisco Daniel, o irmão mais velho do prefeito. Na ocasião, vários cardeais petistas – entre eles o deputado Luiz Eduardo Greenhalgh, escalado pelo partido para acompanhar o caso – vieram a público desqualificar João Francisco, dizendo que ele estava a serviço da "direita" e que era brigado com o irmão. Contra esse argumento, o irmão do prefeito lembrou a VEJA que, meses antes do seqüestro, ele próprio, João Francisco, Celso e respectivas mulheres haviam viajado juntos para a Itália, de férias. Recentemente, João Francisco contou a mesma história envolvendo Gilberto Carvalho e José Dirceu à CPI dos Bingos. Em outro depoimento à mesma CPI, o irmão mais novo de Celso, Bruno, endossou a versão. De acordo com João Francisco, Miriam Belchior, a primeira mulher do prefeito, também sabia da história em seus detalhes.

Ex-seminarista e ligado à esquerda católica, Gilberto Carvalho foi um dos fundadores do PT no Paraná. Quando saiu de seu estado natal, ocupou várias funções na burocracia do partido, em geral diretamente ligadas a Luiz Inácio Lula da Silva. Por essa razão, quando Celso Daniel o nomeou secretário de Comunicação de sua prefeitura, ele foi visto pela turma do Boulevard como um enviado especial do próprio Lula ao ABC paulista. Era atípico Celso escolher colaboradores fora do círculo de seus amigos mais próximos. Gilberto, no entanto, se adaptou bem. Tornou-se próximo não apenas de Celso Daniel, mas também de Sérgio Gomes da Silva e Klinger Luiz de Oliveira Sousa, que os irmãos de Celso apontam como os chefões da corrupção. Naquela noite no restaurante Arabia em que Celso comemorava sua ascensão a coordenador de campanha no PT, Sérgio, Klinger e Gilberto Carvalho brindaram com ele. "Acho uma injustiça dizerem que Celso brigou comigo porque soube de algum suposto esquema. Éramos muito próximos até o fim da vida, e se alguém saiu extremamente prejudicado dessa história fui eu", disse Klinger a VEJA. A reportagem da revista tentou confirmar o encontro no restaurante com Gilberto Carvalho, mas ele não retornou as ligações. Além dele, Miriam Belchior e José Dirceu também foram procurados. Informados do assunto que seria tratado, não atenderam à reportagem de VEJA.



III MISTÉRIO
Por que o Ministério Público e a Polícia Civil chegaram a conclusões tão diferentes sobre o caso?

Bruno Daniel é o irmão mais novo de Celso. Eles freqüentaram simultaneamente a Escola de Engenharia Mauá, em São Bernardo do Campo, iniciaram juntos a militância no PT (o mais velho dos irmãos, João Francisco, preferia ficar longe de política) e iam constantemente ao Estádio do Pacaembu, em São Paulo, para assistir a jogos do Corinthians. Sempre foram muito próximos. O assassinato de Celso traumatizou Bruno. Entre as mágoas que guarda do episódio, uma se destaca: a que nutre pelo deputado petista Luiz Eduardo Greenhalgh, o qual teria tentado abafar, a todo custo, os rumores de que o crime contra Celso Daniel teria motivação política. É importante lembrar aqui que, no enterro do prefeito, o então candidato a presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um discurso emocionado, em que disse: "Esse crime não foi coincidência. Tem gente graúda por trás disso, e nós vamos descobrir quem é". Dois meses depois, ninguém mais no PT queria saber de apurar o crime. Greenhalgh, destacado pelo partido para acompanhar o caso, tentava convencer a família a não aprofundar as investigações. "Para mim houve um acordo entre PT e PSDB nas vésperas das eleições. Certamente o PT temia que a apuração sobre a morte do meu irmão revelasse mais corrupção, e acertou com o PSDB um abafamento do caso, em troca de silêncio sobre possíveis falcatruas dos tucanos. O Greenhalgh, uma pessoa em que eu confiava, comprou essa versão e tentou vendê-la a nós", disse Bruno a VEJA.

celsodaniel2A teoria do irmão de Celso ganhou corpo por causa do próprio silêncio da Polícia Civil do Estado de São Paulo, que durante muito tempo se negou a dar entrevistas sobre o caso. A verdade, no entanto, é que a investigação foi, sim, tratada como prioridade dentro da instituição. Para apurar o assassinato de Celso Daniel, o Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa destacou um de seus quadros mais experientes, o delegado Armando de Oliveira Costa Filho. Ele entrou no caso em 21 de janeiro, dois dias depois da morte do prefeito. Formou uma força-tarefa com 33 investigadores, seis delegados e cinco escrivães. Sua primeira suspeita era um homicídio encomendado. Mirando nessa direção, enviou detetives a Santo André e às faculdades nas quais o prefeito dava aulas, a Fundação Getulio Vargas e a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Não achou nenhum inimigo que pudesse ser considerado um suspeito forte. Os boatos de que havia sido crime passional também foram descartados por falta de fundamentação. Havia indícios de que o prefeito fosse homossexual e mantivesse um relacionamento com Sérgio Gomes da Silva. O delegado Armando recebeu a informação, vinda do médico-legista, de que Celso era realmente bissexual, mas considerou esse dado irrelevante pelo fato de o prefeito ter uma namorada firme – Ivone – e por nada apontar para outro relacionamento estável, com homem ou com mulher, no mesmo período.

A hipótese de homicídio encomendado começou a ser descartada em 7 de fevereiro de 2002, quando a polícia prendeu José Édison, um dos bandidos da quadrilha que seqüestrou Celso. Em seu depoimento, ele contou que a intenção era seqüestrar um comerciante da Ceasa paulistana. Seguiram-no na noite do dia 18, mas o perderam de vista. Para não voltarem para casa de mãos abanando – haviam roubado dois carros para o crime –, eles resolveram escolher outra vítima aleatoriamente. Foi quando passou a vistosa Mitsubishi Pajero a bordo da qual Sérgio Gomes da Silva e Celso Daniel voltavam a Santo André depois de um jantar no restaurante Rubaiyat, em São Paulo. Os bandidos renderam o carro. José Édison contou à polícia que, pelo biotipo de Sérgio Gomes, pensaram que se tratasse do motorista. No banco do carona, Celso Daniel, alto e branco, parecia um empresário.

Partiram, assim, para o seqüestro que acabou desembocando na morte do prefeito. O bandido afirmou que ele e seu bando resolveram assassinar Celso Daniel depois de o identificarem como prefeito de Santo André. Ficaram com medo da perseguição implacável que sofreriam por parte da polícia. O delegado Armando e sua equipe prenderam os outros integrantes da quadrilha da favela Pantanal, que confirmaram a história. "Perícia, impressões digitais, tudo batia. Depois veio o Ministério Público, que não entende nada de investigação, e disse que o trabalho era malfeito. Isso é um absurdo", queixou-se o delegado a VEJA.
O caso foi reaberto por pressão dos irmãos de Celso Daniel, que conseguiram que o Ministério Público de Santo André, encarregado da questão da corrupção na prefeitura, passasse a investigar também a morte. Como ocorreu no que se refere à Polícia Civil, foi destacada uma elite de procuradores: Roberto Wieder, Amaro Thomé e José Reinaldo Carneiro, familiarizados com investigações complicadas de desvio de dinheiro. O ponto de partida deles era justamente o laudo do legista Carlos Delmonte Printes, que acusava a tortura. Havia manchas vermelhas em várias partes do corpo do prefeito assassinado,
provavelmente produzidas por agressões com o cano do revólver. Havia também uma contusão no crânio. O cadáver de Celso Daniel fora encontrado atravessado na estrada. O prefeito vestia apenas uma cueca, colocada ao contrário. No código dos bandidos, isso poderia significar traição. Essa interpretação dos promotores foi reforçada pelo fato de Celso Daniel ter levado um tiro no rosto, o que poderia ser indício de vingança – matar alguém desfigurando-lhe a fisionomia é sinal de humilhação no mundo do crime organizado.

Os promotores passaram a suspeitar que podia haver algo mais do que crime comum. A possível conexão entre a corrupção na prefeitura petista e o assassinato, no entanto, só apareceria mais tarde. "Demos uma virada no caso, e a polícia se negou a investigar para não admitir que fizera um péssimo trabalho", acusou o promotor José Reinaldo Carneiro – o mesmo que, recentemente, denunciou o escândalo de arbitragem no Campeonato Brasileiro de Futebol. A virada seria o depoimento de um outro bandido, Ailton Alves Feitosa. Ele é até hoje o maior indício de que as duas tramas da história policial – assassinato e corrupção – podem estar de alguma forma interligadas.



IV MISTÉRIO
Existe alguma relação entre as sete mortes ligadas ao caso?

Na sexta-feira passada, a Polícia Civil e o Ministério Público finalmente concordaram em alguma coisa relacionada ao caso Celso Daniel. Ambos trabalhavam com a hipótese de que o legista Carlos Delmonte Printes havia se suicidado. Na véspera, a polícia defendia a tese de morte natural por ataque cardíaco ou problemas pulmonares. A perícia do Instituto Médico Legal, no entanto, descartou causas naturais. As vísceras de Delmonte, assim, foram encaminhadas para um exame toxicológico. De acordo com a família, o legista andava deprimido com a morte de um filho e a doença grave de outro. Mais um indício de suicídio foi a carta que o médico deixou com um terceiro filho, na qual especificava detalhes sobre o próprio enterro e autópsia e listava números de contas bancárias e respectivas senhas. Na tarde de quarta-feira, o legista foi encontrado morto no chão de seu escritório no bairro paulistano de Vila Clementino. Na ocasião, ele estava de cuecas.

A morte de Delmonte é a sétima relacionada ao caso. Dos outros seis mortos, pelo menos três poderiam dar uma virada nas investigações. O mais importante era o bandido Dionísio Aquino Severo, um dos seqüestradores de Celso Daniel. Na manhã de 17 de janeiro de 2002, dois dias antes da ação criminosa, Dionísio e mais dois amigos protagonizaram uma fuga espetacular. Eles tomavam sol no pátio do presídio Parada Neto, em Guarulhos, quando um helicóptero apareceu e os resgatou. Só não foi mais cinematográfico porque os guardas do presídio não reagiram. Estavam, como se diz no jargão dos bandidos, com "os fuzis entupidos" – ou seja, haviam recebido propina para facilitar a fuga. Quem teria pago? Teria sido Dionísio, libertado propositalmente para que seqüestrasse Celso Daniel? Pelo menos uma pessoa acreditava nessa hipótese: o delegado Romeu Tuma Júnior, titular na ocasião da delegacia seccional de Taboão da Serra, sob cuja jurisdição estava a cidade de Juquitiba, município onde o corpo foi encontrado. Sondagens feitas por seus investigadores davam conta de que o helicóptero utilizado na fuga havia sido alugado na região do ABC. Quando passou a investigar a conexão, Tuma começou a receber ameaças de morte. Os recados vinham da parte do próprio Dionísio. Três meses mais tarde, o bandido seria preso em Maceió, onde tentava assaltar um banco. No dia 8 de abril foi levado ao delegado Tuma. Disse que sabia muito sobre o caso, mas só falaria se fosse possível negociar "condições especiais". Não teve tempo para isso. Foi assassinado dois dias depois dentro do presídio do Belém, em São Paulo. Dois dos outros mortos guardavam relação com Dionísio. O primeiro era o bandido Sérgio "Orelha", que escondera Dionísio logo depois da fuga do presídio. O outro, Otávio Mercier, investigador da Polícia Civil que procurava Dionísio depois da fuga e teria chegado a fazer um contato com ele por telefone. Ambos morreram assassinados a tiros.
Antônio Palácio de Oliveira, garçom que serviu o último jantar de Celso Daniel no restaurante Rubaiyat, morreu quando, perseguido por dois homens, espatifou sua motocicleta num poste. Paulo Henrique Brito, testemunha que poderia ajudar a esclarecer as circunstâncias do acidente com o garçom, foi assassinado com um tiro vinte dias depois. A penúltima morte relacionada ao caso foi a de Iran Moraes Redua, o agente funerário que reconheceu o corpo de Celso Daniel, jogado numa estrada de terra em Juquitiba. Redua foi assassinado a tiros em novembro de 2004.

É duvidoso que o legista Carlos Delmonte Printes soubesse algo além do que já havia dito – ele recentemente participou de dois programas de entrevistas da Rede Globo. Em agosto deste ano, Printes deu um depoimento a Roberto Wider e Amaro Thomé Filho, promotores de Santo André envolvidos com o caso, no qual disse que passou dois anos proibido de falar sobre o assunto pelo superintendente da Polícia Científica de São Paulo, Celso Perioli, e pelo diretor do Instituto Médico Legal, José Jarjura. No ano passado, em plena vigência da mordaça, VEJA conseguiu falar com Carlos Delmonte Printes numa entrevista à qual compareceram outros integrantes da Polícia Civil. Sob a vigilância de seus superiores, Delmonte deu uma versão intermediária sobre o caso. Celso Daniel havia sido torturado, sim, mas isso não significava necessariamente que se tratava de crime político, pois existem bandidos comuns que matam com requintes de sadismo. A revelação mais impressionante que fez na ocasião – e que repetiu no depoimento de agosto aos promotores de Santo André – foi a de que o corpo de Celso Daniel, a pedido dele, havia sido embalsamado. A intenção era que o cadáver pudesse ser exumado no futuro. A ação esteve a cargo da equipe do Aeroporto de Cumbica, especializada em embalsamamento de corpos para traslados internacionais. Carlos Delmonte Printes acreditava que muita coisa ainda viria a ser descoberta sobre o caso, e um novo exame do cadáver poderia fornecer revelações adicionais (o legista confirmou também que Celso morrera no sábado 19, e não no domingo 20, como está no túmulo do prefeito reproduzido na capa de VEJA).

Sete mortes depois, resta como testemunha mais importante Aílton Alves Feitosa, um dos companheiros de Dionísio Aquino Severo na fuga do presídio Parada Neto.



V MISTÉRIO
Qual a relação entre o assassinato eo esquema de propina em Santo André?

Quando convidou Dionísio para jogar bola no pátio da cadeia num dia de céu azul, Feitosa ouviu do amigo: "Hoje o dia está propício para voar". Achou que o colega andava meio estranho e foi para o futebol. Minutos mais tarde, os dois times ficaram estarrecidos ao ver um helicóptero pousar no pátio da cadeia e resgatar Dionísio. Ele próprio, Feitosa, ficou mais surpreso ainda – de forma agradável – quando o companheiro gritou seu nome, chamando-o para fugir com ele. Foi essa a história que ele contou ao Ministério Público de Santo André em setembro de 2002. O mais grave de seu depoimento viria depois. Fugido da cadeia, Feitosa ficou escondido na casa de dona Dete, tia de Dionísio, e teria ouvido conversas dele com seus comparsas no seqüestro de Celso Daniel. Eles falavam que estava tudo pronto para levar o "peixe grande". Que o empresário que iria acompanhá-lo sabia de todo o plano e iria facilitar a ação. Que a perseguição, as colisões e os disparos na Pajero seriam apenas para "fazer a cena" – afinal, todos sabiam que o carro era blindado e ninguém em seu interior corria riscos. Que a morte do "peixe grande" seria uma "queima de arquivo". Que Dionísio havia sido resgatado do presídio para realizar uma série de operações criminosas, e que a principal delas seria justamente esse assassinato. Era fácil legendar a história. O empresário seria Sérgio Gomes da Silva, e o "peixe grande", Celso Daniel. Depoimentos posteriores de parentes e amigos de Dionísio e Feitosa confirmaram vários pontos da versão do segundo. Num dos depoimentos, Dionísio aparece como mentor da quadrilha, à qual ele se referia carinhosamente como "timinho de Diadema". Num depoimento, a mulher de Dionísio cita o "Sombra" como financiador da operação.

Foi com base principalmente nesse depoimento que Sérgio Gomes da Silva teve sua prisão preventiva decretada em dezembro de 2003, na condição de elemento de alta periculosidade. Klinger e Ronan escaparam por pouco. Quase foram condenados pelo Tribunal de Justiça de São Paulo em junho do ano passado. De três desembargadores, dois votaram a favor da prisão e um pediu vistas ao processo. Na segunda votação, um dos desembargadores mudou de idéia e eles se salvaram. Em julho do ano passado, Sérgio Gomes da Silva também foi solto. O juiz achou que não havia provas suficientes de que ele fosse o mandante do assassinato. De lá para cá, os personagens do caso Celso Daniel continuam levando vida normal. Quase todos eles, como José Dirceu, Gilberto Carvalho, Miriam Belchior, Maurício Mindrisz, Ronan Maria Pinto, Klinger Luiz de Oliveira Sousa e o próprio Sérgio Gomes da Silva, continuam participando de governos do PT, próximos ao PT ou fazendo negócios com o PT. Na semana passada, um relatório do Conselho de Defesa da Pessoa Humana, órgão ligado ao Ministério da Justiça, recomendou que se reabrisse o caso Celso Daniel. O parecer provocou ira no governo.
No Cemitério da Saudade, em Santo André, jaz um corpo embalsamado.

20/01/2007 - 08h40 - Atualizado em 20/01/2007 - 11h58
Meia década depois, caso Celso Daniel parece longe de solução
Ministério Público e Polícia Civil conduziram investigações concorrentes e divergentes.
O MP fala em crime político e a Polícia Cilvil, em crime comum.
Há cinco anos, em um 20 de janeiro, um caseiro caminhava na Estrada da Cachoeira, em Juquitiba, na Grande São Paulo, quando encontrou o que acreditava ser um bêbado caído. Quando chamou a polícia, o Brasil descobriu, junto com o caseiro: o bêbado não era bêbado, nem estava vivo, era o prefeito de Santo André, Celso Daniel, seqüestrado dois dias antes na Zona Sul da capital paulista.

A perplexidade da opinião pública com a notícia daquele dia 20 deveria ter se esgotado com o tempo e o avanço das investigações, mas este caso específico não seguiu o roteiro de outros. "Se eles que são especialistas não sabem, imagine a gente que não é", afirma a psicóloga Vera Kleimann, vizinha do prefeito. Vera mora no apartamento 51, Celso morava no 38.

Filho de um ex-prefeito de Santo André, jogador de basquete e professor universitário, Celso Daniel cumpria o terceiro mandato como prefeito de Santo André e era encarado como uma referência intelectual no ABC Paulista, berço do Partido dos Trabalhadores. Começava a projetar-se como liderança nacional na figura de coordenador da campanha de Luiz Inácio Lula da Silva para a Presidência da República em 2002.



O crime

Na noite de 18 de janeiro de 2002, uma sexta-feira, Celso Daniel e o empresário do setor de transportes, Sérgio Gomes da Silva, amigo e ex-assessor, jantaram no restaurante Rubaiyat, na Alameda Santos, na região da Avenida Paulista. Na volta para Santo André, por volta das 11 horas, notaram que a Pajero de Gomes estava sendo seguida.
Quando o carro alcançou as ruas Nossa Senhora da Saúde e Antônio Bezerra, na Vila das Mercês, Zona Sul de São Paulo, passou, de acordo com a polícia e o Ministério Público, a ser perseguido por três carros: uma Blazer preta, um Santana azul e um Tempra branco.

Os seqüestradores atiraram contra o veículo, retiraram Celso Daniel e o obrigaram a entrar na Blazer. Sérgio Gomes afirma que o carro parou após uma pane mecânica e foi deixado no veículo, sozinho. O corpo do prefeito foi encontrado no dia 20, um domingo, em uma estrada de Juquitiba, com 11 tiros e marcas de tortura.
A dúvida

Os dois pólos da investigação, a Polícia Civil e o Ministério Público, têm visões divergentes sobre casos. Desde 2002, o Ministério Público fala em crime político e a Polícia Civil, em crime comum.

Para o MP, Celso Daniel foi morto a mando de uma quadrilha, cuja atividade principal era supostamente limitada pelo prefeito: a extorsão de dinheiro de empresários do setor de transportes para financiar campanhas eleitorais.

Para a polícia, o prefeito de Santo André foi vítima da ação de criminosos comuns, que resolveram, de última hora, trocar de alvo: no lugar de um empresário da Ceagesp, um homem que aparentava ser rico (estava ao lado do motorista) e que não sabiam ser prefeito.

Embora a Polícia Civil paulista tenha indiciado seis pessoas e apontado que o assassinato de Celso Daniel foi resultado de um crime comum, em dois inquéritos encerrados em 2002 e em 2006, o Ministério Público insiste na tese de que o empresário do setor de transportes Sérgio Gomes da Silva, amigo e ex-assessor que estava com o prefeito na noite do crime, atuou como mandante do assassinato.

O promotor Roberto Wider, um dos três envolvidos na investigação em Santo André, avalia que serão necessários pelo menos mais quatro anos para levar o suposto mandante do crime para trás das grades. “Acredito que até o final do ano o julgamento comece, mas isso abre uma nova fase de recursos”, afirma o promotor. Em dezembro de 2004 e janeiro de 2005, o empresário chegou a ficar preso por 40 dias por supostamente atrapalhar as investigações, mas foi solto por determinação do Supremo Tribunal Federal.

O advogado de Sérgio Gomes, Roberto Podval, afirma que diante da falta de provas seu cliente deverá ser inocentado no processo em que é réu, mas não quis estimar prazos. "O que ele sofreu até agora já é uma pena bastante alta. Isso acaba com a vida de qualquer pessoa", disse Podval.

O próximo passo do processo é a tomada de um depoimento, ainda em janeiro, de uma testemunha que, segundo o promotor, garante ter visto um terceiro carro na cena do crime. A complexidade do caso é tão grande que esse mesmo depoimento interessa tanto à acusação quanto à defesa.

Se não conseguiram apontar culpados de forma definitiva, os cinco anos de investigações sobre o seqüestro e assassinato de Celso Daniel foram suficientes para abrir um debate sobre os limites de atuação que devem ser obedecidos pelo Ministério Público. Wider afirma que todo o trabalho realizado pelo MP até agora pode perder validade caso o Supremo Tribunal Federal (STF) decida que o Ministério Público não tem poder para investigar.

Anular a investigação do MP é justamente uma das pretensões da defesa do empresário. "Nunca vi na história desse país um caso com três promotores designados exclusivamente de um caso. Isso é desproporcional", afirma Podval, advogado de Sérgio Gomes.



O tempo

Sessenta meses, duas eleições presidenciais e uma disputa municipal depois, o caso ainda desperta a atenção da opinião pública. A expressão "Celso Daniel" surge 152 mil vezes no site de buscas Google, sete vezes mais do que "Toninho do PT" ou "Antônio da Costa Santos", o prefeito de Campinas assassinado em 2001.

Assim como a viúva de Toninho, a mãe e os irmãos de Celso Daniel reivindicam o esclarecimento definitivo do caso. A família denuncia repetidamente que sofre ameaças anônimas. E garante que a pressão provocou há um ano o auto-exílio do irmão mais novo de Celso Daniel, Bruno Daniel, e de seus dois filhos, para local não determinado.

A corretora de vendas Nádia Herculano, que mora na periferia de Santo André tem as mesmas dúvidas de Dona Vera, a vizinha de Celso Daniel. "Eu acho que não foi elucidado nem como ele morreu. É como se ele tivesse morrido ontem", diz.


O Seqüestro do Prefeito

O prefeito de Santo André Celso Augusto Daniel , 50 anos, janta com o amigo Sergio gomes da Silva no restaurante Rubayat, na zona sul de SP. Os dois deixam o local na Pajero blindada de Sergio Gomes com destino à cidade do ABC paulista. A Pajero cruza o complexo viário Maria Maluf e de la acessa as ruas Antonio Bezerra e Nossa senhora da Saúde, no Sacomã em direção a rodovia Anchieta, que corta Santo André. O trecho é conhecido como “tres tombos” por causa das subidas e descidas em seqüência. Nesse ponto Sergio e Daniel notam que são seguidos.

Embarcados em um santana azul, uma Blazeir e um tempra branco, os seqüestradores interceptam a pajero, depois de forçarem colisões e disparar tiros contra os vidros do veículo. Daniel é levado pelos seqüestradores por volta das 23h sem apresentar resistência. Sergio gomes, que estava dirigindo, é deixado no carro.

20 de janeiro de 2002 – o corpo de Celso Daniel é encontrado pela manhã abandonado com 11 tiros na Estrada da Cachoeira, próxima ao cativeiro onde teria ficado antes de ter sido assassinado em Juquitiba, na Grande SP, próximo a rodovia Regis Bittencourt. O corpo apresenta sinais de tortura, como queimaduras provocadas por cano de arma de fogo.

A CARTA DO IRMÃO DE CELSO DANIEL 17/04/2009

Abaixo, uma carta aberta de Bruno José Daniel Filho, um dos irmãos de Celso Daniel. Só para constar: Bruno e sua mulher, Marilena Nakano, eram militantes do PT. Ao lado do irmão, integraram o grupo de fundadores do partido. Marilena foi secretária da Cultura da primeira gestão de Celso em Santo André, entre 1987 e 1990. Ameaçada de morte no Brasil, a família decidiu morar na França, onse se sente numa espécie de exílio. Segue a carta:

Hoje, 16 de abril, Celso Daniel, meu irmão, estaria completando 58 anos de vida. Como todos sabem, foi seqüestrado, torturado e assassinado há mais de sete anos quando era prefeito de Santo André e coordenava a elaboração do programa de governo do então candidato à presidência da república Luis Inácio Lula da Silva. Sérgio Gomes da Silva, que o acompanhava no momento do seqüestro, foi denunciado pelo Ministério Público como mandante desse crime. Foi preso por um pequeno período, mas responde em liberdade, após obter habeas corpus do Supremo Tribunal Federal, sob a alegação de que não representa perigo para a sociedade.

Apesar de todas as evidências colhidas pelo MP que mostraram que o crime foi planejado e que há pelo menos um mandante, o Poder Judiciário ainda sequer decidiu se o julgamento deve ir a júri popular porque, segundo informações que obtivemos do MP, a última das testemunhas arroladas pela defesa de « Sombra » (conforme Sérgio é chamado pela imprensa e era conhecido nos meios petistas) ainda não foi ouvida, pois nunca é encontrada. Parece-nos que expedientes como esse e tantos outros são usados para que as tramitações legais se alonguem no tempo, de modo a tornar mais difícil sua solução.

Inúmeros outros assassinatos que ganharam amplo espaço na imprensa já foram resolvidos ou a justiça já se posicionou quanto ao encaminhamento a ser dado. Como explicar que no « caso Isabella », de cinco anos, morta em 2008 ao cair do apartamento onde residia, seu pai e sua madrasta já tenham ido a júri popular e até hoje o processo de Celso segue sem essa decisão após mais de 7 anos ? Como explicar que o promotor Igor Ferreira, 3 anos após ter tirado a vida de sua esposa já tenha sido julgado e condenado e o caso de Celso segue ainda sem resposta da justiça ? Como explicar que no crime de que foi acusado o promotor Thales Ferri Schoedl a decisão final tenha sido tomada em menos de 4 anos e os indiciados pelo crime contra Celso ainda sequer tenham ido a júri popular ? Como explicar que o jornalista Pimenta Neves tenha sido condenado em primeira instância após 6 anos pela morte de sua namorada, a jornalista Sandra Gomide, e o assassinato de Celso ainda se encontra em fase de arguição de testemunhas pelo juiz?

Poderíamos citar outros crimes, mas esses já são exemplares para afirmar : há algo de estranho que impede que o julgamento dos responsáveis por seu seqüestro, tortura e assassinato não seja solucionado. Quais são as razões dessa morosidade ? Quais são as pessoas e instituições que têm interesse no sentido de que nada seja resolvido ?

Não cabe a mim julgar os indiciados, mas cabe a mim denunciar esta morosidade. Além disso tenho o direito de apontar problemas de procedimentos correntes na justiça brasileira. Por exemplo, procedimentos que impedem o juiz de tomar a decisão se o processo relativo ao assassinato de meu irmão, passados mais de 7 anos de sua morte, vai ou não a júri popular enquanto não for ouvida a última testemunha de defesa de Sérgio Gomes da Silva.

Que país é o nosso em que pessoas já condenadas em primeira instância podem ficar soltas até que todos os recursos nas demais instâncias sejam analisados enquanto nós, minha família e eu, tivemos que deixar o país em 2006 em função de intimidações, perseguições e ameaças que sofremos e depois de terem ocorrido oito mortes relacionadas à morte do Celso ? Se é justo que um julgamento tenha que chegar a seu fim para que haja punições, é justo que os procedimentos legais possam se alongar quase que indefinidamente ?

Para aqueles que esperam que eu me cale, apesar da condição de exílio que hoje vivo, outorgado pelo Estado francês, uma vida que tem um lado amargo porque fico distante de meu país e sou impedido de ver amigos e parentes, quero dizer que o presente que tenho a dar ao meu irmão em cada um de seus aniversários é e será a minha luta, mesmo à distãncia, pelo aperfeiçaomento das nossas instituições através de nossas reivindicações de punição aos culpados pela morte de Celso e de mudanças ligadas às causas que lhe deram origem.

Como aceitar que Donizeti Braga, que teria tido seu celular rastreado na região do cativeiro de meu irmão, tenha direito a foro especial no processo de investigação pelo único fato de ser deputado estadual ? Como aceitar que o « Sombra » responda em liberdade por decisão da mais importante instância do Judiciário brasileiro enquanto somos obrigados a viver exilados ? Como aceitar que a lentidão de recursos interpostos possam retardar durante anos e anos a punição de criminosos, agora que o STF decidiu que a prisão de um condenado só pode ocorrer quando julgados todos os recursos ?

Sabemos que contamos com a solidariedade e apoio de muitos que lutam e também desejam que o Brasil seja um país mais democrático e menos injusto. Que esta carta ajude neste sentido e contribua para que o caso seja equacionado o mais rápido possível.

Bruno José Daniel Filho
França, 16 de abril de 2009

Fontes: http://pt.wikipedia.org/wiki/Celso_Daniel
http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u73195.shtml
http://vejaonline.abril.com.br/notitia/servlet/
http://pt.wikinews.org/wiki/M%C3%A9
www.terra.com.br/istoe/1892/1892_semana_02.htm
www.mundolusiada.com.br/.../Nov.Dez_2006.htm
veja.abril.com.br/191005/cartaleitor.html
veja.abril.com.br/191005/p_042.html






























"Obra do metrô não é rápida e é cara", argumenta Miriam Belchior

FOTO: ROOSEWELT PINHEIRO/ABR
"Obra do metrô não é rápida e é cara", argumenta Miriam Belchior

Política

Indefinição. Após ministro anunciar projeto e prefeito prometer linha 2, gestora do PAC descarta investimento
Obras do metrô não sairão do papel
Governo garante que a duplicação da BR-381 será licitada em breve
DOUGLAS COUTO
Especial para O Tempo

Depois de diversas informações desencontradas, a Casa Civil da Presidência da República confirmou ontem que as obras de expansão do metrô de Belo Horizonte não farão parte da segunda etapa do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 2).

Apesar de o ministro de Cidades, Marcio Fortes, e de o prefeito de Belo Horizonte (PSB), Marcio Lacerda, terem dito que o planejamento para as obras estaria em fase de análise, a coordenadora geral do PAC, Miriam Belchior, disse ontem, durante agenda oficial em Contagem, que não há recursos garantidos para a expansão.

Na semana passada, em visita a Belo Horizonte, Marcio Fortes garantiu que as obras estariam incluídas no PAC 2. Já Marcio Lacerda havia dito, em entrevista à TV OTEMPO, em maio, que a linha 2 do metrô - entre o Calafate e o Barreiro - seria inaugurada antes do início de 2014, visando à Copa do Mundo.

Miriam Belchior admitiu que a Casa Civil está ciente dos problemas viários da região metropolitana de Belo Horizonte, mas disse que a solução "ainda precisa ser melhor discutida". "A obra do metrô não é rápida, é cara e nem sempre é a melhor solução para o transporte urbano. É um projeto que ainda não consta nessa etapa do PAC", explicou a gestora.

BR-381. A única obra garantida no PAC 2 para a capital mineira é a duplicação da BR-381. "O projeto já está sendo feito, e a licitação da obra vem na sequência", disse, sem falar em prazos.
A gestora do PAC 2 esteve em Contagem para apresentar aos prefeitos de cidades com até 50 mil habitantes os critérios para ter acesso aos R$3,87 bilhões liberados no programa.

Remanejamento
Adiada. A votação do projeto que autoriza o governo a remanejar até 30% das verbas do PAC, previstas no orçamento de 2010, foi adiada, por falta de acordo. O limite para remanejamento é de 25%.

PAC em Minas
R$ 3,8 bi será o valor destinado

pelo governo às 370 cidades mineiras com mais de 50 mil habitantes para as obras do PAC 2. As prefeituras devem apresentar seus projetos ao governo até o dia 30 de julho.



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