Investigação
Promotor diz que laudos permitem vincular pai e madrasta com agressões sofridas por Isabella
Publicada em 11/04/2008 às 21h06m
Wagner Gomes, Márcia Abos, O Globo OnlineSÃO PAULO - O promotor Francisco Cembranelli, que acompanha as investigações sobre a morte da menina Isabella Nardoni, de 5 anos, disse nesta sexta-feira que informações preliminares dos laudos do Instituto de Criminalística (IC) e do Instituto Médico Legal (IML) permitem vincular o casal Alexandre Nardoni e Ana Carolina Jatobá às agressões sofridas pela menina antes de ser jogada do sexto andar. Segundo o promotor, os laudos também permitem vincular pai e madrasta com o que ocorreu na cena do crime.
O casal foi libertado nesta sexta-feira depois que a Justiça concedeu liminar ao pedido de habeas corpus feito pelos advogados de defesa. O desembargador que concedeu o habeas corpus ao casal já havia, em 2006, reconduzido ao cargo o promotor Thales Schoedl , acusado de matar um jovem no Guarujá, litoral de São Paulo.
O promotor Francisco Cembranelli ainda afirmou que o depoimento de testemunhas desmente a versão apresentada pelo casal. Alexandre Nardoni contou à polícia que uma terceira pessoa, provavelmente um bandido, teria entrado no apartamento e jogado a criança, enquanto ele descia para buscar a mulher e os dois filhos menores.
- Revelarei apenas detalhes para não comprometer as investigações. Testemunhas absolutamente idôneas confirmam que dez minutos antes de tudo ocorrer deu-se uma ferrenha discussão entre o casal, inclusive com palavrões. A voz de Ana Carolina Jatobá foi reconhecida por uma testemunha como tendo participado dessa discussão. A testemunha ouviu a discussão e depois ouviu a voz de Anna Carolina quando ela falava ao celular ao lado do corpo de Isabella no térreo - explicou o promotor.
" A liberdade do casal prejudica o ritmo das investigações, mas não muda o meu propósito de esclarecer quem matou Isabella "
O promotor afirmou que a libertação de Alexandre e Ana Carolina compromete as investigações. Francisco Cembranelli disse que as investigações ficam prejudicadas pelos mesmos motivos que o levaram a concordar com a prisão temporária de ambos: possibilidade de coagir testemunhas que ainda estão sendo ouvidas e acesso ao local onde o crime foi cometido.
O promotor disse respeitar a decisão do desembargador Caio Canguçu, que concedeu liminar ao pedido de habeas corpus dos advogados de defesa, mas ele pensa que o pai e a madrasta de Isabella deveriam continuar detidos até o final da investigação.
- É uma decisão que eu respeito tomada por um desembargador. Não há crítica do Ministério Público em relação a isso, mas eu tenho a minha opinião, que foi compartilhada pelo juiz de direito que decretou a custódia temporária do casal e que foi muito bem fundamentada. A decisão agora prejudica o ritmo das investigações, mas isso não muda o meu propósito de esclarecer quem matou Isabella. Eu continuo com a fé inabalável de que descobriremos quem matou Isabella - disse Cembranelli.
Para o promotor a decisão de soltar o casal é apenas processual, ou seja, não se discute a responsabilidade criminal. Ele voltou a dizer que continua investigando a presença de uma terceira pessoa na cena do crime, mas disse que ainda não há nada que indique isso. Cembranelli disse que nada mudou nas investigações e que está bastante otimista em relação aos resultados. Ele afirmou que, no momento, a intenção é aguardar o desfecho das investigações com uma visão geral de tudo o que foi obtido até agora. Cembranelli não descarta, no entanto, a possibilidade de que haja um pedido de prisão preventiva mais para a frente e afirmou que passa pela cabeça dele sim a possibilidade de uma fuga dos únicos suspeitos do crime.
O promotor esclareceu que alguns laudos que ainda não foram mencionados poderão elucidar o caso. São laudos que dizem respeito a objetos encontrados na cena do crime, no sábado, dia 29 de março. Para ele, as imagens da família no supermercado, cinco horas antes do crime, não servem apenas para relatar a harmonia do casal e das crianças, mas também para analisar as roupas que todos usavam antes e depois do crime.
- Várias peças de roupas do casal foram apreendidas e ainda estão sendo analisadas. Tudo indica que houve troca de roupa dele e dela - afirmou.
Ainda segundo Cembranelli, uma testemunha ouviu uma "criança na hora do crime chamando por alguém e pedindo socorro como se estivesse agoniada".
Casal deixou prisão nesta sexta-feira
Alexandre Nardoni, 29, e Anna Carolina Jatobá, 24, vão aguardar em liberdade as investigações sobre a morte de Isabella de Oliveira Nardoni, 5, atirada pela janela do apartamento do casal. O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) considerou a prisão temporária irregular , já que não há provas contra o casal, que é investigado pela morte da menina.
Alexandre deixou às 14h34m o 77º Distrito Policial, em Santa Cecília, num camburão da polícia . Para despistar jornalistas e populares que estavam na frente do DP, uma pessoa foi colocada com a cabeça coberta em um viatura. Enquanto isso, Alexandre Nardoni saiu em um outro veículo, na lateral da delegacia. As ruas próximas foram bloqueadas para saída do comboio.
Anna Carolina Jatobá deixou o 89º DP quase uma hora depois, às 15h23m, com blusa listrada e sem esconder o rosto, pela porta principal, escoltada por policiais do Grupo de Operações Especiais (GOE) . Poucas pessoas se aglomeravam no local para ver a saída da madrasta de Isabella, algumas a xingaram de assassina.
- Eu não sou assassina. Agradeço a Deus por estar solta - disse ela a jornalistas na saída da delegacia.Os dois foram submetidos a exame de corpo de delito no Instituto Médico Legal (IML), de onde saíram em carro particular.
Ao deixar o IML, o casal Alexandre Nardoni e Ana Carolina Jatobá foi para a casa do advogado Antonio Nardoni, pai de Alexandre, no bairro de Vila Mazzei, na zona norte da capital. Eles chegaram ao local às 17h50. Um carro do Grupo de Operações Especiais (GOE) estacionou dentro da residência para deixá-los. Em seguida, chegaram os advogados de defesa e familiares. Os filhos do casal - Pietro e Cauã, de 3 anos e 11 meses, respectivamente - não está na residência por motivos de segurança. A família está reunida para decidir os dois vão ficar refugiados, enquanto as investigações prosseguem.
O delegado Calixto Calil Filho, que conduz as investigações sobre o assassinato da menina Isabella Nardoni, disse que o apartamento onde o crime aconteceu e onde morava o casal continuará lacrado. O delegado afirmou que uma reconstituição do crime será feita assim que os laudos do Instituto de Criminalística (IC) e do Instituto Médico Legal (IML) ficarem prontos, o que deve acontecer na semana que vem. O delegado adiantou também que a irmã de Alexandre, Cristiane Nardoni, deverá ser intimiada para depor na próxima semana. Ela estava num bar, na noite do crime, e recebeu um telefonema. Testemunhas disseram que Cristiane disse uma frase após a ligação que poderia comprometer seu irmão.
Os peritos do Instituto Médico Legal (IML) e técnicos do Instituto de Criminalística (IC) informaram que grande parte do material que pode ajudar a esclarecer o assassinato da menina Isabella Nardoni, de 5 anos, já foi processado e examinado. De acordo com Adilson Pereira, diretor do Núcleo de Física do Instituto de Criminalística (IC), a equipe de dez peritos que trabalha exclusivamente no caso deve se reunir nos próximos dias para que seja feito o laudo final. No Instituto Médico legal (IML), o trabalho também já está em fase adiantada, afirmou Carlos Alberto Coelho, diretor do centro de análises, exames e pesquisa do IML.
- Estamos finalizando o exame na área de toxicologia e anatomia patológica. O laudos vão estabelecer a causa da morte de Isabella, além dos meios e instrumentos que a levaram à morte - explicou Coelho.
A decisão de colocar os dois em liberdade foi tomada pelo desembargador Caio Canguçu de Almeida, da 4ª Vara Criminal do TJ. Nela, ele afirma que o casal foi submetido a constrangimento ilegal, uma vez que não foram apresentadas provas contra qualquer um dos dois até o momento em que redigiu seu despacho.
Na argumentação, Canguçu de Almeida afirma que a "prisão é um mal a ser evitado a todo custo". Ao afirmar que o crime é inquietante, ele se pergunta se a morte de Isabella decorreu do "desamor exagerado" dos tempos atuais ou se o pai e a madrasta estão sendo vítimas de "imprevisíveis e inevitáveis" coincidências.
"Será que o desamor exagerado desses estranhos tempos que correm terá chegado a um extremo tal que pudesse levar um pai, ou sua companheira, a tão cruelmente eliminar uma graciosa filha de apenas cinco anos e que, certamente, muito os terá amado? Ou será que o estrepitoso evento terá levado às agruras da suspeita e da investigação alguém que as coincidências, algumas vezes imprevisíveis e inevitáveis, do destino, fizeram, em algum momento parecer autor de crime que, quiçá, não deva ser levado à sua conta?", afirma em seu despacho.
" Queira Deus não venham aumentar a estatística dos feitos onde a Justiça concreta não pôde ser feita e onde o mal terá prevalecido sobre o bem "
E o desembargador conclui o raciocínio apelando a Deus para que este crime não se junte a outros onde a Justiça concreta não pôde ser feita. (leia a íntegra da decisão)
- É muita irresponsabilidade que esta decisão não agrade as pessoas. O Estado direito existe para que possa ser avaliado - afirmou o advogado Marco Polo Levorin, advogado de defesa do casal.
Segundo Levorin, o casal será levado a local seguro, para que a integridade física seja garantida.
De acordo com funcionários do 89º Distrito Policial (Morumbi), Anna Carolina ficou sabendo da decisão pela tevê existente na delegacia e, emocionada, chorou.
Outro advogado do casal, Ricardo Martins, disse que o TJ decidiu pela liberdade porque houve um julgamento antecipado do casal.
- É uma grande vitória. Entendemos que agora está sendo feita a Justiça. Estamos no caminho certo - disse.
A polícia diz que já tem 99% da morte de Isabella reconstituída e aguarda apenas laudos do Instituto de Criminalística para terminar o inquérito.