O procurador-geral precisa tomar cuidado para não virar o inocentador-geral do que nem se investigou
Já escrevi ontem ontem sobre a esperada e, mais do que isso, pré-anunciada decisão do procurador-geral da Republica, Roberto Gurgel, de arquivar as quatro representações propostas pelas oposições contra o ministro-chefe da Casa-Civil, Antonio Palocci (íntegra aqui). O ministro já emitiu uma nota que faz da decisão do procurador u0ma espécie de prova de sua honradez. No fim deste texto, digo aonde isso pode chegar e como, nessa marcha, a Procuradoria-Geral ainda acaba desmoralizada, a exemplo do que aconteceu com as CPIs. Já chego lá.
Apontei no post de ontem duas coisas especialmente incômodas:
a- a decisão do procurador parece ter sido um tantinho acelerada para jogar um pouco de água na fervura — da própria Procuradoria vazavam informações de que Roberto Gurgel, o procurador-geral, só se pronunciaria na quarta; ocorre que houve elevação súbita da temperatura;
b – Gurgel faz considerações que me parecem mais politizadas do que seria desejável ao órgão, especulando, em último caso, se a celeuma toda não se deve à visibilidade da personagem em questão. Ora, sr. procurador, é claro que sim! Ele é o chefe da Casa Civil e teve um enriquecimento fabuloso. Boa parte do dinheiro foi recebido quando já era assessor da presidenciável Dilma Rousseff e presuntivo ministro de Estado — parcela considerável só foi parar na sua conta depois que Dilma já tinha sido eleita.
O procurador está, sem dúvida, certo numa coisa: para que se abra uma investigação, é preciso que se aponte ao menos algum indício de infração penal. Ocorre que ele não vê nenhum! Gurgel sabe quais são as empresas para as quais Palocci prestou consultoria, e é como se nos convidasse: “Confiem em mim”. Claro! É que a gente não sabe quais são elas . Empresários do setor privado, é verdade, não são obrigados a revelar a sua lista de clientes. Mas também não são chefes da Casa Civil…
No parágrafo 34, escreve Gurgel:
“Não há igualmente indício idôneo da prática do crime de tráfico de influência, que, segundo os representantes, decorreria necessariamente do fato de clientes da empresa Projeto terem celebrado contratos com entidades que integram a administração indireta e fundos de pensão”.
E continua no 36:
“Ressalte-se que, salvo em relação à empresa WTorre, não há nas representações a indicação de um único contrato celebrado pelos clientes da Projeto com órgãos da administração direta e indireta, de que se pudesse inferir uma eventual intervenção ilícita do representado.”
É, nas representações pode não haver, mas terão as empresas para as quais Palocci trabalhou relações, diretas ou indiretas, com o governo federal? Sem investigar, como saber? O fato é que o então deputado manteve uma empresa de consultoria e ganhou uma bolada quando já era ministro presuntivo — parcela considerável depois de Dilma já eleita.
Muito ponderado, escreve Gurgel nos parágrafos 12 e 13:
12 - Em nosso ordenamento jurídico, a existência de patrimônio incompatível com a renda somente adquire relevância penal quando tenha origem ilícita, porque havido pela prática de crime, contra a administração pública – peculato, corrupção, concussão – ou de outra natureza – tráfico de drogas, crime contra o sistema financeiro, estelionato –, revelando o acréscimo patrimonial a ação de inserir no mercado formal recursos oriundos da conduta delituosa – lavagem de dinheiro.
13. No presente caso, examinadas as representações, com toda a atenção que a alta qualificação dos seus autores e a gravidade do seu conteúdo impõem, e as matérias jornalísticas bem como as informações e os esclarecimentos prestados pelo representado, acompanhados de documentos, não é possível concluir pela presença de indício idôneo de que a renda havida pelo representado como parlamentar, ou por intermédio da Projeto, adveio da prática de delitos nem que tenha usado do mandato de Deputado Federal para beneficiar eventuais clientes de sua empresa perante a administração pública.
É nesse trechinho em destaque que está o busílis da coisa. Para afirmá-lo, a Procuradoria-Geral teria de ter procedido a uma exaustiva apuração envolvendo todos os clientes de Palocci — e estou certo de que isso não foi feito porque não houve tempo. Nem é seu papel nessa fase. O procurador não vê nem mesmo o indício do crime de tráfico de influência? Se não viu, tem de arquivar… Mas a sua argumentação parece apressada.
Risco de desmoralização
Se a negativa do procurador-geral de investigar uma determinada questão passa a funcionar como atestado de bons costumes e prática saudável, não tardará, e serão os próprios governistas — de qualquer governo — a recorrer céleres à Procuradoria com representações um tanto ligeiras para receber um “nada consta” e sair exibindo por aí.
Nessa hipótese, a procurador-geral da República se transforma no inocentador-geral da República. E será sempre um estranho atestado de inocência: “Fulano é inocente daquilo que não foi investigado”.
CARO REINALDO
Não adianta! Nós nunca conseguiremos “pegar” os políticos e metê-los na cadeia. Roberto Gurgel, Procurador Geral da República, está pouco se lixando para nós, que tentamos construir um país minimamente decente.
É uma vergonha o que fez o Sr. Gurgel! E ele chegará em casa como se nada tivesse acontecido: beijará a mulher, afagará o cachorro, brincará com filhos e netos, vai perguntar o que tem para jantar etc. E tudo ficará por isso mesmo. Será eleito, por dois anos, para o cargo que almeja e, daqui a pouco, o caso sairá do noticiário e ele voltará a negociar com seus escrúpulos, longe da mídia.
Assim foi com:
- Jáder Barbalho
- ACM
- Sarney (várias vezes)
- Roseana Sarney
- Marta Suplicy
- João Paulo Cunha
- Os anões do orçamento
- Renan Calheiros (várias vezes)
- Romero Jucá
- José Dirceu
- Valdomiro Diniz
- Antonio Palocci (várias vezes)
- Erenice Guerra
- Dilma Rousseff (várias vezes)
- Lula (incontáveis vezes)
- José Genoíno
- Wellington Dias
- Gim Argello
- Paulo Maluf
- Fernando Collor
- todas as grandes empreiteiras
- todos os grandes bancos
- todos fundos de pensões aparelhados pelo PT
A rigor, nunca um tribunal condenou nem vai condenar um político no Brasil. É tudo farinha do mesmo saco. Todo mundo sabe que juízes (de qualquer corte) são comprados. Os acertos em dinheiro e vantagens são feitos na quietude da noite, em restaurantes caros de Brasília.
A população se esquece de tudo e acaba elegendo de novo a mesma corja de cínicos e picaretas, que mantém os juízes venais em seus cargos, um amparando o outro.
Você compraria um carro usado deste senhor Gurgel? Eu não.
E um Gurgel do Palocci, você compraria? Eu também não.
FRANCISCO
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