O marido de juíza assassinada na porta de casa, Marcelo Poubel de Araújo, presta depoimento desde o final da madrugada desta sexta-feira na Delegacia de Homicídios na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio de Janeiro (RS). Vizinhos de Patrícia Lourival Acioli, 47 anos, também foram chamados para relatar o que viram. A magistrada da 4ª Vara Criminal de São Gonçalo foi executada a tiros dentro de seu carro, em Piratininga, região oceânica de Niterói (RJ), no fim da noite de quinta-feira.
Uma perícia complementar é realizada no veículo da vítima, um Fiat Idea, e foi encontrada uma bala do painel. O computador de trabalho de Patrícia também vai passar por um exame pericial. O enterro da juíza será nesta sexta-feira às 16h30, no Cemitério Marui Grande, no Barreto, em Niterói.
Linha dura
Segundo o primo da juíza, o jornalista Humberto Nascimento, ela era considerada "linha dura". "Ela era considerada 'martelo pesado' como se chama. Sempre com condenações em pena máxima. Ela condenou gente ligada a máfia do óleo, máfia das vans, milícia de São Gonçalo que estava crecendo absurdamente, policiais envolvidos com desvio, corrupção e tráfico de drogas. Há cerca de três, quatro anos, ela teve a segurança retirada por ordem do presidente do Tribunal de Justiça do Rio da época", afirmou Nascimento, se referindo ao atual presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Rio (TRE-RJ), Luiz Zveiter.
Ainda segundo ele, a prima sempre recebeu ameaças de pessoas envolvidas com máfias, grupos de extermínio e traficantes que atuam em São Gonçalo (RJ). As últimas, porém, eram relativas a milícias que atuam no município. De acordo com Humberto, a juíza participaria na próxima semana de um julgamento importante envolvendo milicianos.
Patrícia Acioli foi a responsável pela prisão de quatro cabos da Polícia Militar e uma mulher, em setembro de 2010, acusados de integrar um grupo de extermínio no município de São Gonçalo (RJ). A quadrilha sequestrava e matava traficantes para depois pedir resgates de R$ 5 mil a R$ 30 mil a comparsas e parentes das vítimas.
Ela também decretou, em janeiro deste ano, a prisão preventiva de seis policiais acusados de forjar auto de resistência na cidade. No início da semana, Patrícia Acioli condenou a um ano e quatro meses de prisão, por homicídio culposo, o tenente da PM Carlos Henrique Figueiredo Pereira, 32, pela morte do estudante Oldemar Pablo Escola de Faria, na época com 17 anos. Ele foi baleado na cabeça na boate Aldeia Velha, no bairro Zé Garto, em São Gonçalo, em setembro de 2008.
Patrícia estava numa 'lista negra' com 12 nomes possivelmente marcados para a morte encontrada com Wanderson Silva Tavares, o Gordinho, preso em janeiro deste ano em Guarapari (ES). Ele é considerado chefe do grupo de extermínio investigado por pelo menos 15 mortes em São Gonçalo nos últimos três anos. O presidente do Tribunal de Justiça, Manoel Alberto Rebelo dos Santos, esteve no local do crime e disse que ela já havia recebido ameaças.
O crime
Segundo testemunhas, o ataque foi feito por homens encapuzados em duas motos e dois carros, por volta das 23h30 desta quinta-feira. Pelo menos 16 tiros de pistolas calibres 40 e 45 foram disparados contra o Fiat Idea Weekend cinza da magistrada quando ela chegava em casa. Todos atingiram do lado da motorista, sendo oito diretamente o vidro. As balas atingiram principalmente a cabeça e tórax da magistrada. Ele não andava com seguranças. Imagens do sistema de segurança da região estão sendo analisadas pela Delegacia de Homicídios (DH) do Rio, que assumiu o caso.
Martha Rocha determina que DH do Rio investigue Conhecida pelo seu rigor contra grupos de extermínios formados por PMs, Patrícia Acioli foi a primeira juíza assassinada no Rio de Janeiro. Na hora do crime, ela estava sem seguranças. No Fiat Idea cinza da magistrada foram encontradas pelo menos 16 marcas de tiros. O veículo não era blindado.
De acordo com o primo da vítima, na época em que era presidente do TJ, Luiz Zveiter teria tirado a segurança da juíza. Apesar das ameaças sofridas, a escolta não teria sido restabelecida. Policiais da Delegacia de Homicídios de Niterói e São Gonçalo iniciaram uma perícia no local do crime. No entanto, por determinação da Chefe de Polícia Civil, delegada Martha Rocha, a DH do Rio também periciou o local até o fim da madrugada e assumiu as investigações.
O veículo da vítima e um computador com as imagens do sistema de monitoramento de segurança da associação de moradores do Jardim Imbuí, em Piratininga, estão na sede da especializada, na Barra da Tijuca.
Mudança de endereço e atentado no início da carreira
A juíza tinha se mudado para Piratininga há menos de três meses. Segundo Humberto Nascimento, a prima morou muito tempo em Pendotiba e depois em um prédio em Icaraí, zona sul de Niterói. Ela comprou e reformou o imóvel por preferir morar em casa, pelos filhos e os cães de estimação. "Era uma proposta de vida essa mudança. Ela estava tão despreocupada que o carro dela não é blindado e a casa não tem portão eletrônico. Ela ia sair do carro para abrir o portão. Ou seja, essa coisa (crime) foi encomendada, de profissional", acredita.
Segundo Humberto, Patrícia Acioli começou sua carreira como defensora pública na Baixada Fluminense. Na época, ela teve o carro metralhado. Ela exercia a função de juíza há cerca de 20 anos e estva há 12 na Vara de São Gonçalo.
"Ela sempre recebeu ameaça, há pelo menos cinco, seis anos. Sempre conversávamos nos encontros de família e ela relatava que recebia ameaças, mas evitava não entrar em detalhes para não assustar as pessoas. Era uma rotina, mas ela já nem ligava mais para isso. Já é rotina de um juiz criminal receber ameaças. Ela era uma juíza que não cedia. Para você ver, ela era juíza há 20 anos e morava numa casa sem luxo nenhum. O carro dela não é blindado, é um veículo popular inclusive. Várias vezes ofereceram dinheiro para ela liberar condenados e ela nunca libertou. Era uma pessoa corretíssima. Pode investigar o passado dela mesmo", disse.