POR ADRIANA CRUZ Rio - A juíza Patricia Lourival Acioli, da 4ª Vara Criminal de São Gonçalo, foi morta a tiros na porta de casa, em Piratininga, por homens em duas motos e um carro. É a primeira juíza assassinada no Rio de Janeiro. Ela foi a responsável pela prisão de quatro cabos da Polícia Militar e uma mulher, em setembro de 2010, acusados de integrar um grupo de extermínio no município. A quadrilha sequestrava e matava traficantes para depois pedir resgates de R$ 5 mil a R$ 30 mil a comparsas e parentes das vítimas. O presidente do Tribunal de Justiça Manuel Alberto Rebello dos Santos acabou de receber a notícia e está indo para o local.
UMA JUÍZA LINHA-DURA NO CAMINHO DOS PMS
Magistrada diz que crime cometido por policial em serviço é mais grave que o praticado por um cidadão comum
A JUÍZA da 4ª Vara Criminal, Patrícia Acioli: ela é a única que julga casos de homicídio em São Gonçalo
Daniel Brunet
Os policiais do 7º BPM (São Gonçalo) denunciados por homicídio em casos que foram registrados inicialmente como autos de resistência serão julgados pela juíza Patrícia Lourival Acioli, famosa por ser linha-dura e aplicar penas altas. Titular da 4ª Vara Criminal de São Gonçalo desde 1999, ela é a única que julga processos de homicídio — e crimes correlatos — na cidade. Conhecida pelo rigor na hora de inquirir os réus e por dar celeridade aos processos, ela considera o crime cometido por um policial durante o serviço mais grave que o praticado por um cidadão comum.
— Ao cometer um crime, o policial gera na população uma descrença no poder constituído. O povo passa a procurar o poder paralelo e desacreditar o estado — dispara.
Magistrada diz não ter medo de ameaças
Essa descrença ela conheceu de perto nos primeiros anos de vida profissional, quando ainda era defensora pública, na Baixada Fluminense. Certa vez, incumbida de representar parentes de vítimas de grupos de extermínio — muitos formados por policiais —, Patrícia era vista com desconfiança por seus assistidos.
— Eles não entendiam direito. Na cabeça deles, passava a dúvida: como pode o Estado (a defensora) estar me defendendo, se foi o mesmo Estado (os policiais) que matou meu filho, meu marido? — conta.
Patrícia Acioli, de 44 anos, 18 deles dedicados aos tribunais, coleciona ameaças e diz não ter medo de decretar prisões. Foi ela quem condenou recentemente quatro milicianos do bairro Luiz Caçador — responsáveis por mais de cem homicídios — e outros sete do bairro Engenho Pequeno. Além disso, mandou prender Luiz Anderson de Azeredo Coutinho, apontado como o maior bicheiro de São Gonçalo. Apesar de não temer ameaças, a juíza não permitiu que seu rosto fosse fotografado para a reportagem. Segundo ela, é uma forma de preservar sua família.
— Não tenho medo de ameaça. Quem quer fazer algo vai e faz, não fica ameaçando. Ninguém morre antes da hora. Sei que, no imaginário popular, a juíza é quem faz tudo, mas é a polícia que investiga, são os promotores que fazem a denúncia e é o júri que julga — conta ela, tentando explicar a fama de durona que tem na cidade.
A juíza diz não encontrar mais em São Gonçalo o sentimento de descrença que notou nos tempos em que atuava na Baixada. Segundo ela, as denúncias do MP e as condenações de milicianos, policiais e traficantes têm feito a população confiar mais no Estado. A magistrada ressalta ainda que percebe uma outra mudança: há 20 anos, viu júris inocentarem réus só porque as vítimas tinham passagem pela polícia. Hoje, segundo ela, as pessoas julgam com base nas provas:
— Quando a população viu que os casos estavam tendo resultado, as pessoas passaram a denunciar mais. Agora, o júri quer saber se o réu fez aquilo de que é acusado, por que fez e como fez. Se a vítima é bandido ou não, isso não importa mais.
Além do trabalho duro, ela guarda histórias raras. Ameaçada de morte por um agiota, que mandou prender, ela recebeu meses depois um pedido de proteção feito por ele. É que após sair da cadeia, o agiota foi ameaçado por cúmplices.
— E ela deu proteção — contou o promotor Cunha Júnior.
Jornal: O GLOBO
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