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quarta-feira, 11 de junho de 2008

Pessoa/120 anos: Presença do poeta nas artes plásticas é mais do que óculos, chapéu e bigode

**Ana Goulão, da Agência Lusa**


Lisboa, 07 Jun (Lusa) - Fernando Pessoa tem sido evocado nas artes plásticas "até à exaustão" com o seu chapéu, óculos e bigode, mas a identidade da arte portuguesa pode ter sido influenciada de forma mais profunda e inconsciente pela própria heteronímia pessoana.

O chapéu, o bigodinho, os óculos e o laço são sem dúvida os elementos que identificam o rosto de Fernando Pessoa (1888-1935) em inúmeras obras de artistas plásticos de várias gerações, inspirados pela grandeza da obra do poeta, nascido há 120 anos.

Existem as "incontornáveis" obras plásticas emblemáticas que o imortalizaram, e Almada Negreiros é disso exemplo, quando, no dia da morte de Pessoa, "fez um desenho rápido para o Diário de Lisboa, e a partir daí a cara que se passa a ver pintada é sempre a mesma", observou, em declarações à Agência Lusa, o crítico de arte Rui Mário Gonçalves.

O rosto anguloso de Fernando Pessoa, com os óculos, o chapéu e o bigode passam a ser os elementos figurativos que o identificam e foram "reproduzidos até à exaustão", criando até algumas "imagens anedóticas", na opinião do crítico de arte.

Existem também dois quadros pintados a título póstumo por Almada Negreiros - seu amigo e contemporâneo, também fundador do movimento modernista - que mostram o poeta a fumar sentado a uma mesa de café, com uma bica, um bagaço, papel e caneta, "companhias habituais".

Ao longo do tempo, o autor de "Mensagem" também inspirou artistas a criar obras mais abstractas em sua homenagem, como foi o caso de Maria Helena Vieira da Silva, assinalou o crítico de arte.

"Não nos podemos esquecer de que a verdadeira paixão pelo Fernando Pessoa nasceu nos anos 40. Anteriormente só alguns o liam. Agora é de leitura obrigatória. Tal como o Eça de Queiroz", comentou ainda Rui Mário Gonçalves.

Mas Alberto Cutileiro, João Luiz Roth, Mário Botas, Carlos Calvet, Bartolomeu Cid dos Santos, Eurico Gonçalves, Alfredo Margarido, António Dacosta, Jorge Martins, José João Brito, José de Guimarães (em pintura e escultura), foram alguns dos artistas que não quiseram deixar de representar Fernando Pessoa ou os seus heterónimos como a popular figura de chapéu, bigode e óculos.

O pintor Costa Pinheiro é "outro artista incontornável" na representação do poeta. Trabalhou a figura de Pessoa na tela sobretudo nos anos 70 e 80, nomeadamente com o famoso quadro "Fernando Pessoa e os seus Heterónimos".

Júlio Pomar retratou o poeta em vários desenhos com o seu inconfundível traço, expostos, por exemplo, nos painéis de azulejos concebidos para a estação de metro Alto dos Moinhos, em Lisboa, onde milhares de pessoas se "cruzam" com Pessoa diariamente.

Ainda no domínio da arte pública, Fernando Pessoa foi imortalizado pelo escultor Lagoa Henriques, sentado a uma mesa de café em frente à "A Brasileira", no Chiado, onde portugueses e estrangeiros gostam de fotografar-se na sua companhia.

Para o director do Museu de Arte Contemporânea de Elvas e também crítico de arte João Pinharanda, o que mais importa salientar da influência do poeta português nas artes plásticas "é a lição de heteronímia que Fernando Pessoa representa".

João Pinharanda acredita que o assumir de várias personagens é uma ideia que atravessa a criação artística portuguesa. "A arte portuguesa é muito heteronímica. Não quer dizer que isto seja consciente nos artistas. É algo que está no inconsciente", defende, em declarações à Lusa.

"Parece - considera ainda - que quando olhamos para a arte portuguesa não conseguimos fazer um fio condutor. Cada artista aparece isolado do outro. A arte portuguesa é, por um lado, muito rica, plural, mas, por outro, tem grande dificuldade de afirmação".

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