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quarta-feira, 20 de julho de 2011

SP tem hospitais de custódia lotados e 650 infratores com problemas mentais aguardam vagas


Publicada em 20/07/2011 às 07h48m

Guilherme Voitch (guilherme.voitch@sp.oglobo.com.br)

SÃO PAULO - O estado de São Paulo não tem mais vagas para portadores de doenças mentais que cometeram crimes. Os Hospitais de Custódia e Tratamento (HCT) de Franco da Rocha, na Grande São Paulo, e Taubaté, a 134 km de São Paulo, as duas unidades que recebem estes detentos, estão com 1.078 pessoas, quando a capacidade é de 934. Segundo a Defensoria Pública, outros 650 infratores com problemas psiquiátricos aguardam vagas em uma fila de espera.

Parte desses doentes cumpre pena como detentos comuns, no sistema prisional, o que contraria a Lei da Reforma Psiquiátrica de 2001. Os demais aguardam em casa. Os doentes mentais são considerados inimputáveis. Quando cometem crimes, a Justiça determina o internamento em hospitais de custódia.

Os hospitais de custódia de tratamento já não tratam o doente mental como deveriam. Mas a existência dessa lista de espera é um absurdo completo

- Os hospitais de custódia de tratamento já não tratam o doente mental como deveriam. Mas a existência dessa lista de espera é um absurdo completo. Não dá para colocar um doente entre presos comuns - diz Patrick Cacicedo, coordenador do Núcleo de Situação Carcerária da Defensoria Pública de São Paulo.

Segundo a Secretaria de Administração Penitenciária (SAP), a falta de vagas deve ser amenizada com obras de ampliação no Hospital de Tratamento de Taubaté. De acordo com a pasta, "estão em andamento trâmites administrativos prévios à licitação para as obras." Quem consulta o site da SAP se depara com déficit de vagas ainda maior para estes detentos. Até a tarde desta terça-feira, a página da instituição indicava que o Hospital de Custódia e Tratamento de Franco da Rocha abrigava 5532 doentes, com uma capacidade para 465 presos. Questionada, a secretaria afirmou que se tratava de um "erro de digitação" e que 529 pessoas cumpriam medidas de internação na unidade.

Mesmo em relação aos pacientes que já estão nos hospitais, há uma divergência em relação ao tratamento oferecido. Para o presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-SP, Martim de Almeida Sampaio, eles não recebem a atenção necessária.

- Algumas atividades são feitas em parceria com ONGs, mas, no geral, os doentes recebem medicação e ficam soltos. Esquizofrênicos extremamente complicados misturados a doentes com um grau leve de comprometimento - afirma Sampaio.

Já o diretor-técnico do Hospital de Custódia de Taubaté, Adriano César Maldonado, diz que o tratamento é realizado de forma "individualizada por equipes multidisciplinares". Segundo ele, o hospital segue as determinações das diretrizes que regulam os direitos das pessoas portadoras de deficiência mental.

- Na medida do possível separamos os pacientes pelo perfil. Pacientes com transtornos sexuais ou com problemas com álcool e drogas ficam em Taubaté, enquanto os esquizofrênicos vão para Franco da Rocha. Todos trabalham e têm várias outras atividades recreativas e educativas - diz.

O debate sobre a situação dos detentos com transtornos mentais não está restrito a São Paulo. No começo de julho, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou uma recomendação aos tribunais de todo o país no sentido de que as penas envolvendo pessoas com problemas de saúde mental possam, sempre que possível, ser cumpridas em meio aberto.

A recomendação do CNJ determina a criação de um núcleo interdisciplinar, auxiliar ao juiz, para os casos que envolvam sofrimento mental e o acompanhamento psicossocial durante o tratamento. Outra medida importante da política antimanicomial é a permissão de que o tratamento ocorra sem que o paciente se afaste do meio social em que vive, visando a manutenção dos laços familiares, sempre que isso for possível.

A internação nem sempre é a melhor forma para o cumprimento das medidas de segurança - afirmou à época o conselheiro Walter Nunes, relator da recomendação. Segundo ele, acostumado às inspeções em presídios nos mutirões carcerários realizados pelo CNJ, a maioria dos presídios possui uma "ala manicomial", que na prática é uma cela em que as pessoas com problemas de saúde mental ficam por prazo indeterminado e, não raro, acabam sendo esquecidas.

Atualmente, sequer sabe-se ao certo quantas pessoas cumprem medidas de internação em todo Brasil. Nos relatórios enviados ao Departamento Penitenciário Nacional (Depen) do Ministério da Justiça, vários estados não informam quantas pessoas cumprem medidas de internação.

O Ministério prepara um censo para identificar quantos são e em que situação estão esses doentes. O projeto está sendo realizado pela cientista social e pesquisadora da Universidade de Brasília (UNB) Débora Diniz.

Débora diz que o censo estará pronto até o começo do ano que vem, mas adianta que no geral a Lei da Reforma Psiquiátrica (10.216 de 6 de abril de 2001) não foi incorporada pelos estados.

- Ainda se trata o paciente que cometeu o delito como questão mental e não como questão de saúde.


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