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quarta-feira, 20 de julho de 2011

Hora de governar, Dilma


Brasil S.A
Autor(es): Vicente Nunes
Correio Braziliense - 20/07/2011

Com fama de boa gerente, de índole irretocável, esperava-se da presidente um início melhor de governo para cumprir as promessas que fez ao eleitorado

Dilma Rousseff está prestes a completar sete meses no comando do Brasil. E é impressionante ver como seu governo ainda não definiu prioridades para o país. Desde o início do ano, a atual administração só se ocupou em apagar incêndios, a administrar a herança maldita criada para elegê-la. Ministros e assessores foram demitidos por suspeita de corrupção e obras importantes de infraestrutura sofreram violentos cortes de verbas para se passar o mínimo de responsabilidade fiscal aos investidores. Hoje, o Banco Central anunciará mais um aumento da taxa básica de juros (Selic), provavelmente de 12,25% para 12,50% ao ano, com o objetivo de pôr a inflação no eixo.

Muitos vão considerar um exagero dizer que o governo Dilma ainda não começou. Mas basta um pouco de sensibilidade para perceber que, ao se cercar de uma equipe econômica sem expressão e não checar a folha corrida de alguns de seus principais ministros, a presidente corre um grande risco de perder o primeiro ano de mandato sem promover nenhuma mudança estrutural que contribua para o Brasil consolidar o crescimento econômico sustentado. Veremos, nos próximos meses, a continuidade de um debate pobre, restrito à necessidade de o BC continuar ou não a elevar os juros e a promessas furadas de medidas para dar maior competitividade ao setor produtivo brasileiro, atropelado pela forte valorização do real frente ao dólar.

Em um momento em que o mundo está enlouquecido com a perspectiva de a Europa ser engolida por uma crise sem precedentes e de os Estados Unidos se humilharem por mais um aumento do teto de sua dívida para não dar calote nos credores, falta ao Brasil um governo que represente, de verdade, rupturas com o atraso. Com fama de boa gerente, de índole irretocável, esperava-se da presidente um início melhor de governo para cumprir as promessas que fez ao eleitorado.

Por enquanto, Dilma está se dando ao luxo de contar com a condescendência dos mercados, que só têm olhos para o terremoto que promete varrer a Europa e os EUA, onde se instalou uma briga rasteira de políticos pelas eleições presidenciais de 2012. A presidente, por sinal, sabe que tem capital político de sobra para queimar nos próximos meses. Mas deve se preparar para quando os investidores retomarem as atenções às economias emergentes. Isso acontecerá caso ocorra o pior nos dois lados do Atlântico, pois o Brasil será solapado por uma crise muito maior do que a de 2008, ou se a tempestade passar sem deixar grandes feridos. A fatura a ser encarada pelos brasileiros, com certeza, será grande.

Europa de joelhos
As incertezas são muitas. Bob Doll, estrategista-chefe do fundo de investimentos BlackRock, afirma que o Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA deve ter crescimento menor do que 2% no primeiro semestre deste ano. Historicamente, desde 1960, todas as vezes que isso ocorreu, a maior economia do mundo entrou em recessão. Desta vez, acredita ele, será diferente. E lista alguns argumentos para o otimismo: os preços dos combustíveis estão no menor nível do ano, as perturbações provocadas pelo terremoto no Japão estão desaparecendo, o mercado de trabalho vem se recuperando, ainda que lentamente, e a demanda global permanece em patamares decentes.

Há, porém, a Europa no meio do caminho, com a Grécia prestes a dar um calote, ainda que parcial. Chama ainda a atenção o fato de a onda de desconfiança ter pulado para a Itália, a terceira maior economia da Zona do Euro, um claro sinal de que a situação é muito mais grave do que os infantis políticos da região admitem. Há informações de que vários bancos estão deixando de emprestar dinheiro entre eles. Se essa ruptura se der na economia real, ou seja, secar o crédito para o setor produtivo e o consumo, com certeza, os países europeus ficarão de joelhos.

Essa situação só agiganta a necessidade de o governo brasileiro sair das armadilhas nas quais se meteu. Se o pior acontecer lá fora, estaremos diante de um mundo ainda fragilizado pela crise de três anos atrás. Nos países mais ricos, os consumidores estão juntando os cacos, a confiança dos empresários está abalada e os investidores, muito ariscos.

Pura hipocrisia
Não se pode esquecer que, entre 2008 e 2009, o Brasil perdeu uma grande oportunidade para jogar as suas taxas de juros a patamares civilizados, entre 2% e 3% ao ano acima da inflação. Mas, ao exagerar na duração das medidas de incentivo ao consumo para turbinar a candidatura de Dilma à sua sucessão, o então presidente Lula mandou às favas o compromisso com o controle de preços. O BC interrompeu, antes do necessário, o aperto monetário e a gastança fiscal se multiplicou de forma alarmante.

Neste momento, sem o cataclisma global, não há a menor perspectiva de os juros caírem no Brasil. A inflação continuará acima do centro da meta (4,5%) até pelo menos a metade de 2013. Portanto, Dilma e todos os brasileiros terão de se contentar com taxas de crescimento bem abaixo do desejado. Dados do BC mostram que, para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficar dentro dos parâmetros definidos pelo governo, o incremento do PIB terá de se manter abaixo de 4%.

Diante de tanta restrição, Dilma corre o risco de fazer uma administração medíocre. Felizmente, ainda há tempo de o governo acordar para o dever de casa. A começar por enquadrar o Ministério da Fazenda, que precisa melhorar a qualidade dos gastos públicos e parar de jogar contra a política monetária. De nada adianta o ministro Guido Mantega posar ao lado do presidente do BC, Alexandre Tombini, como se estivessem em sintonia pura. Não passa de hipocrisia.

Vicente Nunes é editor de Economia







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