Carolina Alves (calves@brasileconomico.com.br)
13/06/11 07:55
Presidente da Fenastc defende a criação de um órgão fiscalizador dos tribunais regionais, além de novos critérios de seleção de conselheiros.
Para elevar o controle das atividades desenvolvidas pelos tribunais regionais de contas do país e reduzir a corrupção nesse meio, a Federação Nacional dos Servidores dos Tribunais de Contas do Brasil (Fenastc) se movimenta no Congresso para a aprovação de propostas em trâmite há mais de três anos.
Elas visam à criação de um Conselho Nacional dos Tribunais de Contas (CNTC) e à exigência legal de qualificação profissional dos conselheiros, com o fim do cargo vitalício e da indicação partidária. Confira entrevista com o presidente da entidade, Marcelo Henrique Pereira.
Quase 30% dos conselheiros dos Tribunais de Contas regionais sofrem algum tipo de processo ou investigação criminal. Como a Fenastc vê isso?
É uma situação bastante preocupante pois é um número muito alto. Todos os Tribunais de Contas são dotados de uma instituição chamada Corregedoria, um órgão capaz de instaurar procedimentos de instaurar processos de apuração do caso.
Mas não é o que acontece. Dos 34 TCs do país, não há relato algum de conselheiros que foram afastados ou punidos após investigação.
O que gera essa impunidade?
Os tribunais de contas melhoraram muito nos últimos trinta anos, mas são a única instituição do país que não se modernizou quanto ao processo de nomeação de ministros e conselheiros.
Continua sendo um feudo do poder Legislativo, às vezes também do Executivo, para nomear amigos, compadres, pessoas vinculadas à coalizão político-partidária. Para ser conselheiro do TC do município, basta ser amigo da maioria dos vereadores, que indicam as pessoas aptas a ocupar o cargo.
Dificilmente um indivíduo que ficou 20 anos na carreira política rasga sua filiação, renuncia seu mandato parlamentar e desaparecem as relações com o Legislativo. A influência do posicionamento político é óbvia e tem sido notória nas manifestações da Corte.
Como deixar o sistema mais eficiente?
O modelo de seleção precisa ser reformulado. Há uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), de número 75, que está na Câmara desde 2007, em fase de apreciação das comissões para seguir ao Plenário.
A proposta rompe com o modelo da indicação político-partidária. Só servidores de carreira de nível superior da área de auditoria e fiscalização, com mais de dez anos na atividade, poderiam assumir o cargo.
O indivíduo teria de ser formado na área a fim do tribunal, como direito, administração, economia, contabilidade.
Para um cargo que é um dos maiores dentro da estrutura republicana de divisão de poderes, é preciso ter qualificadores e elementos que credenciem as melhores pessoas para ocupá-lo. Ainda hoje têm conselheiros com apenas o segundo grau completo.
O senhor acredita que esse tipo de projeto seria aprovado no Congresso?
O Judiciário todo usa esse modelo. Há o concurso para juiz, que depois vira desembargador e ministro por um processo de meritocracia.
Sabemos que é difícil, pois o loteamento de vagas que existe hoje dificilmente sofrerá um rompimento radical. Então, a Fenastc está desenvolvendo uma PEC para propor um modelo de transição.
No que consiste esse modelo?
Ao todo, quatro dos sete cargos de conselheiros seriam ocupados por servidores de carreira de nível superior da atividade fim (auditoria e fiscalização). É uma forma de não fazer uma ruptura muito grande.
Quem sabe o Congresso veja com mais interesse a proposta de mesclar. Com o tempo, chegaríamos a um modelo igual ao do judiciário: só técnicos de carreira. Também defendemos criação do Conselho Nacional dos Tribunais de Contas (CNTC).
Como o Conselho Nacional de Justiça (CNJ)?
Sim. Há duas PECS no Congresso que tratam do tema, a 28 e a 30. A diferença entre elas está na formação do CNTC. A PEC 30 prevê 17 membros, sendo 9 internos (conselheiros, ministros, auditores, procuradores) e 8 da sociedade civil.
Há um certo equilíbrio de forças, portanto.A PEC 28, contudo, já passou pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e pela Comissão Especial, com emendas e alterações. Só que ela prevê 9 membros para a constituição do CNTC: 7 internos e apenas 2 da sociedade civil.
O que tende a prevalecer?
A tendência é de aproximar as redações das PECs, o que tornará o CNTC um "conselho nacional de faz de contas". Pois não vai apurar nada. Na lei será um organismo fantástico, mas na prática será um mecanismo para manter a sujeira no tapete.
Como o CNTC poderia reduzir a morosidade dos processos?
O Conselho teria caráter normativo e determinaria, por exemplo, que tudo o que foi decidido em primeira instância só será derrubado quando houver nulidade do processo ou impedimento à ampla defesa.
Uma decisão que leva hoje mais de dez anos não poderia demorar mais que um ano e meio. O Conselho poderia determinar essas normas de caráter administrativo, processual.
Existe comunicação integrada entre os TCs regionais?
Não há uma lei processual única para todos eles. O que está em vigor em São Paulo é diferente da Paraíba, de Santa Catarina. Há tribunais com dez recursos, outros com mais de vinte.
Hoje, a gente sabe que pelo menos 80% das decisões tomadas na primeira instância foram derrubadas nos julgamentos seguintes. Nisso, uma multa de R$ 300 mil virou de R$ 200 - ou uma mera recomendação.
Como funciona em outros países?
O Brasil talvez seja o maior exemplo de um sistema quase que predominantemente político e isso é um diferencial quando mensuramos os resultados.
Quanto mais político, maior a impunidade. Tanto na Europa quanto na América Latina há modelos mais isentos e, portanto, melhores.
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