Grandes cidades poderão se endividar mais para fazer as obras preparatórias à Copa de 2014, mas a conta ficará para os sucessores. Isso é bom para o País?
Há nove anos, um acordo de renegociação de dívidas entre a União e os municípios tampou um dos maiores ralos das finanças públicas brasileiras. As prefeituras esticaram os pagamentos dos empréstimos por anos a fio e, em troca, foram obrigadas a limitar o endividamento a 100% da receita líquida corrente anual.
Na segunda-feira 19, a menos de três meses da eleição, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva aumentou em 20% este limite. Assim, seis das 12 cidades que vão sediar a Copa do Mundo poderão assumir novos compromissos financeiros para investir em estádios e outras obras de infraestrutura.
Se não estivesse altamente endividada, São Paulo seria a sétima beneficiada. As outras cinco já podiam captar até o limite de 120% da receita. Muitas cidades não têm nenhuma capacidade de tomar R$ 10 emprestados, disse o presidente Lula na cerimônia, em Brasília, que avalizou a gastança. Estabelecemos um caráter excepcional para as cidades da Copa do Mundo.
A jogada é interessante para o presidente, que terá a boa vontade dos prefeitos em final de mandato, e ótima para os prefeitos, que terão recursos para inaugurar mais obras nos próximos dois anos, antes de passarem o bastão. Mas a conta será paga pelos sucessores. Isso não é bom, diz o economista Amir Khair, ex-secretário de Finanças de São Paulo.
O governante faz a dívida, faz o cartaz político, mas quem vier depois é que vai ter que pagar a conta, critica. Em vez de contrair empréstimos para investir, eles deveriam usar os recursos disponíveis, sugere.
Alcides Leite, professor de economia da Trevisan Escola de Negócios, pondera que a Lei de Responsabilidade Fiscal foi criada num outro momento da economia. Com inflação e os juros mais baixos, o endividamento poderia aumentar porque os custos são menores, afirma.
Na média, os municípios brasileiros têm uma relação entre dívida e receita líquida corrente de 20%. A Lei de Responsabilidade Fiscal, de 2000, limita o endividamento a 120% da receita. Antes da promulgação da lei, São Paulo estourou esse limite, graças a uma combinação do alto endividamento durante a gestão Paulo Maluf (1993-1996) com os juros elevados.
A medida provisória editada por Lula na semana passada não muda a LRF, mas retira um outro teto, exigido pelo governo federal em 2001, quando a União assumiu a dívida de 180 municípios entre eles, sete das 12 cidades-sede da Copa (veja quadro).
Eles passaram a pagar mensalmente à União 13% da receita líquida e tiveram o endividamento limitado a 100% da receita líquida. É esse limite que cai agora, para a alegria dos prefeitos. Alguns municípios, como o Rio de Janeiro, não poderiam mais fazer empréstimos para obras de infraestrutura, diz o coordenador de projetos e investimentos do Tesouro, José Cordeiro Neto.
O endividamento da capital fluminense era de apenas 13,34% no primeiro quadrimestre do ano, mas a expectativa é de que a prefeitura tome novos recursos para preparar a cidade para os jogos da Copa e para a Olimpíada do Rio, em 2016.
O Planalto também vai gastar mais. O governo anunciou ainda a liberação de R$ 20,7 bilhões para obras em portos, aeroportos e mobilidade urbana, além de financiamentos do BNDES para o setor de hotelaria e construção de estádios e obras no entorno. Como diz o presidente Lula, recurso não vai faltar. Falta saber quem vai pagar a conta. |
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