Apesar do repto socialista, a Oposição não mostra sinais de querer avançar na Assembleia da República com uma moção de censura ao Executivo de José Sócrates José Sena Goulão, Lusa
Com algumas vozes do PS a desafiarem a Oposição parlamentar a avançar na Assembleia da República com uma moção de censura ao Governo Sócrates, os partidos com assento no hemiciclo vêem neste repto uma cortina de fumo para os problemas do país e descartam ser esse o gesto de que Portugal necessita para clarificar a sua vida política.
De forma irónica, foi das hostes socialistas que partiu primeiro a ideia de uma moção de censura ao Executivo de José Sócrates. O antigo ministro socialista e vice-presidente da Comissão Política do PS Capoulas Santos lançou o desafio entre lamentos de que estará em curso uma tentativa de decapitação do primeiro-ministro. Desde logo, figuras do PS como António Costa e de Vitalino Canas vieram defender que José Sócrates tem todas as condições para continuar no Executivo. Numa altura em que procura um rumo interno para a sua estrutura, o PSD, maior partido da Oposição, declinou o repto que partiu das fileiras socialistas defendendo que o Governo deve permanecer em funções. Os sociais-democratas admitem no entanto que no caso de o clima político se tornar insustentável é real a possibilidade de virem a realizar-se eleições antecipadas.
Nesse sentido, defendem ser imperativo que o primeiro-ministro José Sócrates dê explicações ao país relativamente às denúncias de uma alegada orquestração do seu Governo para tomar controlo da comunicação social portuguesa.
A voz dissonante entre os sociais-democratas chega da Madeira, com Alberto João Jardim, presidente do Governo Regional e figura de peso no partido, a sustentar que o PSD já devia ter avançado com essa moção de censura.
Jardim declarou perante os jornalistas que o esperavam no aeroporto da Madeira após uma viagem a Bruxelas e a Lisboa que fosse ele líder parlamentar e teria apresentado uma moção de censura ao Executivo Sócrates logo após a aprovação da Lei das Finanças Regionais.
"Eu, se fosse líder do partido, tinha apresentado moção de censura ao Governo, mas previamente combinada com outros partidos, porque esta Lei de Finanças Regionais da Madeira confirmou ser possível haver um compromisso histórico entre os partidos da Oposição", explicou o líder madeirense, acrescentando que esta ideia foi deixada por si à líder do PSD, Manuela Ferreira Leite.
É necessário que Portugal "deixe de ser um país de carácter siciliano como tem sido nos últimos tempos", ironizou Alberto João Jardim, aproveitando para lamentar o facto de vivermos "num país de censura".
CDS-PP fala em desnorte do Governo O CDS-PP não entende "como é que um Governo que teve um Orçamento viabilizado há dois dias esteja a pedir à Oposição para o derrubar", o que levou os democratas-cristãos a apontarem "a inconsciência" dos socialistas.
Num comunicado, o líder parlamentar Pedro Mota Soares afirma não entender "como é possível que um Governo que teve um Orçamento viabilizado há dois dias esteja agora a pedir à Oposição para o derrubar".
O líder parlamentar questionou até que ponto irá "a inconsciência" do Governo e do PS, quando se permitem lançar este tipo de desafios à Oposição.
Acusando os socialistas de estarem a esticar a corda, Mota Soares considerou "inconcebível que um Governo que sabe os riscos que Portugal corre nos mercados internacionais, que conhece os avisos externos feitos ao país, esteja sistematicamente a criar instabilidade e a encenar crises artificiais, como quem procura pretextos para fugir às suas responsabilidades e atirar o país para eleições.
"Não ocorre sequer aos socialistas que pedem moções de censura que a Constituição protege a estabilidade e proíbe eleições neste momento?", deixou ainda este dirigente do CDS-PP.
Bloco aponta tentativa de criar uma crise O Bloco de Esquerda também reagiu com uma nega aos socialistas. Para o Bloco, o cenário de uma moção de censura faz parte de uma crise política artificial que os socialistas procuram neste momento difícil.
Francisco Louçã, coordenador do Bloco de Esquerda, lembra por outro lado que todos os dias há confusões respeitantes a quadros socialistas que têm de ser esclarecidas.
Esta ideia posição ganha corpo com o deputado bloquista Semedo, que fala numa tentativa do PS de provocar uma crise política artificial, resultado que serviria o posicionamento da direcção do PS, que "tem há muito definida, praticamente desde a tomada de posse deste Governo, uma estratégia conducente à abertura de uma crise política artificial".
"Na perspectiva do Bloco de Esquerda, as declarações de Capoulas Santos inscrevem-se nesta lógica do Governo e do PS de criarem um clima de dramatização e de crise política artificial", sublinhou João Semedo, respondendo ao vice-presidente da Comissão Política do PS com ironia: "(O Governo) acaba de receber uma verdadeira moção de confiança da parte do CDS e do PSD, partidos que viabilizaram o Orçamento do Estado para 2010 através da abstenção".
Moção de censura é uma cortina de fumo, apontam comunistas Em resposta a Capoulas Santos, o PCP denunciou o que considera tratar-se de uma tentativa artificial de fugir às respostas que o país espera do primeiro-ministro e do Governo socialistas. Jerónimo de Sousa lamentou que o ruído gerado á volta do processo Face Oculta permita deixar para segundo plano "a questão central da necessidade de ruptura na política nacional".
A partir do encerramento da 9ª Assembleia da Organização Regional do Porto, o secretário-geral dos comunistas deixou o alerta: "Há por aí muito ruído em questões que, tendo importância, lateralizam a questão central da necessidade de ruptura e de mudança na política nacional".
Abordando em concreto o processo Face Oculta, Jerónimo de Sousa disse que, "quando se iniciam retaliações na base de quem não é por nós é contra nós, se usa o poder político para defender interesses particulares, se promove o 'amiguismo' em rede e a promiscuidade entre o poder económico e o poder político, sabemos como começa mas nunca como acaba".
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