Contrariando a orientação da equipe econômica e cedendo aos apelos da ala política do governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu autorizar o uso do FGTS para comprar ações da Petrobras na nova capitalização da estatal. A avaliação é a de que a permissão que favorece os trabalhadores pode dar dividendos eleitorais. Quem já tem FGTS Petrobras agora pode comprar novas ações usando até 30% do seu saldo. Foi a segunda derrota da ala econômica no mesmo mês: ela defendia o veto ao aumento dos aposentados. Com incertezas em relação à capitalização, as ações da Petrobras já caíram 25% no ano. REFORÇO NO CAIXA
Lula sanciona lei que permite uso de até 30% do Fundo para comprar mais ações da estatal
Por pressão da ala política do governo, preocupada com os dividendos eleitorais, e com a oposição da equipe econômica, a capitalização da Petrobras contará com recursos do FGTS. Na manhã de ontem, pouco antes de sancionar a lei que cede até cinco bilhões de barris de petróleo à estatal, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu manter o artigo que permite o uso do Fundo pelos trabalhadores que compraram ações da estatal com esses recursos em 2000 e mantêm a participação desde então. O cotista só poderá usar até 30% do total do seu saldo.
Não terão direito a usar o FGTS os trabalhadores que compraram ações da Petrobras com o Fundo mas já se desfizeram dos papéis. Também ficam de fora os que não utilizaram o Fundo para a compra de ações em 2000 ou que tenham ações da estatal compradas com recursos próprios.
A preocupação da equipe econômica é que, além de reduzir os recursos do FGTS destinados à habitação, saneamento e políticas públicas, a medida seria injusta, pois beneficiaria apenas um grupo de trabalhadores. A Caixa Econômica foi inicialmente contra, mas voltou atrás, ao constatar que a medida irá tirar R$1 bilhão do FGTS, caso todos os cotistas optem por reforçar seus investimentos. O saldo do Fundo está na casa de R$200 bilhões.
Para analista, oferta pode ser adiada
Em 2000, quando foi permitido o uso desses recursos, via Fundos Mútuos de Privatização, cerca de 300 mil pessoas optaram pelo negócio. Mas estima-se que entre 90 mil e cem mil ainda tenham ações da empresa. Na época, a procura atingiu R$1,7 bilhão dos R$3,4 bilhões autorizados.
Alexandre Espírito Santo, professor de finanças da ESPM, afirma que aplicar o FGTS na Petrobras pode ser boa opção. Ele lembra que o fundo de garantia tem frequentemente rentabilidade inferior à inflação. A remuneração do FGTS é de apenas a TR (Taxa Referencial) mais 3% ao ano.
- A longo prazo, a Petrobras tem um bom potencial, com as reservas do pré-sal e a economia em recuperação - diz Espírito Santo.
Com as incertezas em relação à capitalização da empresa, os papéis ON (ordinários, com direito a voto) caíram este ano, 24,59% e os PN (preferenciais, sem esse direito), 25,70%. E os fundos FGTS da Petrobras acumulam queda de 17% a 18%.
Agora, a Agência Nacional do Petróleo (ANP) e a Petrobras começam uma corrida contra o tempo. De acordo com o ministro de Minas e Energia, Márcio Zimmermann, a ANP tem até 20 de agosto para encerrar a avaliação dos barris em áreas do pré-sal a serem cedidas à estatal pela União, sistema denominado cessão onerosa. O valor será confrontado com o estabelecido pela empresa contratada pela Petrobras para fazer a mesma avaliação. O dia 31 de agosto é a data final para assinatura do contrato.
Em pagamento pelos barris, a União receberá, até 30 de setembro, os títulos que emitir para comprar ações e manter sua participação na Petrobras. A Petrobras adiou a chamada de capital de julho para setembro, para esperar a avaliação da ANP. O mercado estima que o barril poderá oscilar entre US$5 e US$7.
Só por meio da capitalização será possível aumentar a capacidade de endividamento da estatal, atualmente em 32,3% do seu patrimônio líquido, bem próximo do limite de prudência, de 35%. A empresa planeja investir R$88 bilhões em 2010, mas precisaria captar cerca de R$20 bilhões no mercado. Se o fizer nas atuais condições, ultrapassará o limite de 35% e perderia seu grau de investimento, o que tornará mais caro seu financiamento.
Segundo fontes do mercado, com a capitalização, o endividamento atual cairá para a casa de 9%, permitindo que a estatal contraia mais R$120 bilhões em empréstimos. A Petrobras prevê investir US$224 bilhões até 2014.
A sanção de ontem foi a primeira dos quatro projetos que compõem o marco regulatório do pré-sal, enviados ao Congresso em setembro. Numa cerimônia rápida, mas com cerca de 40 pessoas, entre políticos, técnicos e autoridades do setor, o presidente Lula vetou apenas os artigos relativos aos chamados "campos maduros", localizados em terra e de menor interesse comercial, que serviriam como parte do pagamento da cessão onerosa.
Especialistas estão apreensivos com os prazos e já há quem cogite o adiamento da emissão de ações para após as eleições de 3 de outubro.
- Se os prazos permanecerem estes, além de pouco tempo, a preparação da oferta será feita em plena campanha eleitoral. Está tudo muito afobado - diz Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infraestrutura. |