Partido reforça as críticas de Serra à gestão de Meirelles
Marcello Casal/ABr
Dois dias depois de José Serra ter declarado que o Banco Central não é a Santa Sé, o PSDB divulgou um texto com críticas azedas à gestão de Henrique Meirelles.
O documento foi pendurado na internet, na página do Instituto Teotônio Vilela, órgão de estudos e de formação política do PSDB. “Muito barulho para muito juro”, eis o título do texto.
A pretexto de endossar as críticas de Serra à tática monetária do BC, borrifa querosene na fogueira. Classifica os juros de "jabuticaba monetária". Sustenta que, na crise, o BC cometeu um "erro calamitoso". Em ressalva velada à imprensa, anota que a algaravia das manchetes em torno das declarações de Serra não se justifica: “Muito barulho por muito pouco”.
Serra manifestara-se numa entrevista à rádio CBN. Irritara-se com a repórter Miriam Leitão, que o questionara sobre a autonomia do Banco Central. De acordo com o texto do PSDB, Serra não pronunciou nenhuma novidade. Ele “nunca se furtou a apontar os exageros da mais alta taxa de juros do mundo”.
Na sequência, o documento do partido endossa e até injeta veneno no pudim servido por Serra. Bate pesado no “BC de Lula e Meirelles”, um ex-tucano. Primeiro, o texto dedica-se a vergastar os últimos movimentos do BC, algo que, em sua entrevista, Serra se esquivara de fazer.
Anota que, ao retomar o ciclo de elevação das taxas de juros há duas semanas, o BC adicionou “pimenta no que já era um prato indigesto”. A taxa real de juros, que excede a variação da inflação, foi de 3,7% para 4,5% ao ano, diz o texto.
Servindo-se de um ranking elaborado pela consultoria UpTrend, o PSDB diz que, no rol das “40 principais nações do mundo”, o Brasil ocupa posição constrangedora. Afirma que, em fins de abril, os juros praticados por esses 40 países estavam, na média geral, em patamar negativo: -0,6%.
Acrescenta: “Desse grupo de 40, apenas 13 têm taxas positivas, que superam a inflação projetada. E em somente quatro destes países o juro real é maior do que 2% anuais: Indonésia, China e Austrália, além de nós...”
“...Como se vê, com seus juros reais de 4,5% ao ano o Brasil é um ponto inteiramente fora da curva”. Os juros praticados durante os dois mandatos de FHC, como se sabe, foram muito maiores. O texto do PSDB se abstém, porém, de comentá-los.
Limita-se a observar: “É verdade que as taxas já foram muito mais salgadas. Mas política econômica envolve, sobretudo, circunstâncias. E as atuais, com as economias nacionais ainda claudicantes, são de juros negativos ou muito próximos de zero em todo o mundo”.
Em seus últimos parágrafos, o documento do tucanato faz referência direta às críticas de Serra, reforçando-as. Recorda que, na segunda-feira, “Serra comentou a derrapada que o BC de Lula e Meirelles deu nos juros quando da eclosão da crise econômica de 2008/2009”.
O texto volta no tempo: “A débâcle financeira mundial já era algo que despontava no horizonte desde o início do ano retrasado (2007). Diante disso, os bancos centrais do mundo iniciaram cortes vigorosos nas taxas de juros. O que fez o BC brasileiro? Embicou a Selic para cima”.
O tucanato lembra que, entre abril e outubro de 2008, mês em que o banco Lehman Brothers foi à breca, a taxa básica de juros brasileira só “engordou”. “Nada menos que 2,5 pontos, passando de 11,25% para 13,75% ao ano”. Com isso, “os juros reais no Brasil saltaram de 6,6% para 8% ao ano”.
O texto faz uma analogia com os EUA: “O corte das taxas pelo Federal Reserve levava o juro real americano [na mesma ocasião] de 2,25% para 0% anual”. Pergunta: “Seria a inflação o motivo da nossa jabuticaba monetária?” Responde negativamente.
“Nos 12 meses a partir de agosto de 2008, quando a crise já entrava perigosamente por debaixo da porta, o IGP-M mensal foi negativo em nove ocasiões. Ou seja, o que havia era deflação e não escalada de preços. Mas este Gasparzinho era capaz de pregar sustos no BC”, ironiza o partido de Serra.
Só em janeiro de 2009, escreve o tucanato, o BC se animou a reduzir os juros. A essa altura, “a crise econômica atingia níveis insuportáveis, asfixiava a economia, paralisava fábricas e levava milhares de trabalhadores ao desemprego...”
“...Em apenas três meses na virada de um ano para o outro, 800 mil brasileiros tinham sido postos na rua. Foi este o "erro calamitoso" do BC”. A despeito disso, encerra o documento, “tem gente que parece achar que a calamidade não passou de um shakespeariano devaneio numa noite de verão”.
E quanto à autonomia do BC? Bem, sobre essa questão, miolo de todo o debate, o documento do PSDB não disse palavra.
- Serviço: Aqui, à íntegra do documento do PSDB.