O País dos Petralhas, de Reinaldo Azevedo, reúne textos em que há o melhor em matéria de defesa da liberdade individual
Rui Nogueira
A profundidade e o alcance podem ser medidos por (ao menos) meia dúzia de textos sobre o que há de melhor em matéria de defesa da liberdade individual, da democracia, do estado de direito, da denúncia consistentemente fundamentada da escatologia e do finalismo do esquerdismo bocó que reina em grande parte do pensamento intelectual brasileiro. São recomendáveis, em especial, O Tocador de saxofone do petismo; Os caminhos da liberdade e a idade da razão; O discurso do método; Terra sem lei de Lula; Silva, um morto sem sepultura, e Dorothy Stang, o vitimismo com ideologia; e Direita e Esquerda. De contrapeso, uma pérola antológica de um parágrafo avantajado intitulado: O jornalismo dualético vê a história dos três porquinhos. Juntos, esses textos, se obrigatórios nos cursos universitários, fariam mais pela elevação espiritual da juventude do que todas as bolsas em prol de todos os igualitarismos perseguidos pelo governo federal e congêneres.
O "petralha" do título, fusão de petismo e Irmãos Metralha, é filho dileto da denúncia do mensalão do governo Lula, mas o livro de Azevedo corta e expõe com as ferramentas da história e o riso de Arlequim (Castigat ridendo mores/Rindo, castigam-se os costumes) as imposições politicamente corretas que tiram do indivíduo o direito de arbitrar e tentam cassar o direito à opinião. Esse é, ao lado da denúncia do exercício da política como farsa, o outro grande alvo do jornalista, o que o transforma em uma máquina ferina ímpar, herdeiro do que o mundo produziu de melhor nessa escola - entre outros, Paulo Francis, HL Mencken e Karl Kraus.
Azevedo bate duro, mas, dotado de uma paciência professoral e sob o, digamos assim, heterônimo ?Tio Rei?, dedica-se a ensinar a "burritsia da intelligentsia brasileira", a mostrar que o marxismo de algibeira é uma variante da preguiça intelectual e que a fé no Estado como condutor da sociedade só pode ser defendida por quem tem segundas e más intenções na política.
Em um País com um presidente de popularidade na casa dos 70%, o livro é um corajoso estilo de nado contra a corrente e o consenso bovino. Como ele mesmo define, "há tanta gente boa no mundo mau que esses bonzinhos querem mudar, que eu decidi ser mauzinho no mundo bom que quero conservar".
Trata-se de uma frase lapidar de Azevedo sobre o bom mocismo de grande parte da classe média, que é capaz de fazer passeatas cheias de ternura em favor do crime organizado. O jornalista é transparente nos pontos de partida e objetivo nas conclusões, sem espaço para exercícios camaleônicos de nenhuma natureza. Do tipo: "Tenho medo de me tornar um sujeito bonzinho, desses que assistem Sex and the City enquanto os filhos adolescentes transam no quarto. Um pai liberal é um risco à sobrevivência da espécie, é uma ameaça à civilização."
Parece um homem deslocado nos tempos lulistas, mas é apenas uma trave de racionalidade que está sempre atirando nos mitos sagrados da esquerda - tem uma predileção especial por aquele que faz crer que matar por uma causa é mais nobre do que matar pelo dinheiro. Cada um, costuma lembrar Azevedo, "é lacaio de quem quer". Há quem ache as críticas ultrapassadas, porque o Muro de Berlim caiu faz tempo, ou desnecessárias, porque a democracia venceu. O País dos Petralhas prova que no Brasil, onde "estratagemas idiotas são apresentados como atos heróicos", o viés autoritário travestido de isenção é uma trapaça intelectual a combater.
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